quarta-feira, julho 18, 2007

Filmes.

Tenho que voltar ao tema do copyright para dar (alguma) razão ao João Vasco e ao leitor que assina «NCD» (1). Ao contrário do que eu julgava, os bilhetes de cinema são uma parte menor dos lucros dos filmes. O grosso das receitas está nos DVDs e na bonecada associada a um filme de sucesso.

Mas apesar (ou por causa) disso a sétima arte é uma boa razão para deixar morrer o copyright. O João Vasco defende que o copyright é necessário para financiar mega-produções cinematográficas, mas os números não o apoiam. Sete dos dez filmes mais caros de sempre (2) foram produzidos nos últimos 4 anos, em plena era p2p, mesmo ajustando os valores à inflação. E o público destes filmes, como Terminator, Spider-Man, King Kong, Pirates of the Caribbean, coincide bem com as dezenas de milhões de participantes nas redes de partilha.

Não é estranho. Para o jovem que considera ir ao cinema com os amigos importa mais o dinheiro que tem no bolso do que o filme que sacou da internet. As camisolas e os bonecos não perdem com a partilha, e o original é uma prenda melhor que a cópia em DVD gravável. Os números confirmam: mesmo o aumento exponencial das redes p2p tem um efeito pequeno e gradual na industria.

Terá certamente algum efeito. Mesmo não sendo tão devastador como o João Vasco defende, nenhum negócio escapa ileso à perda de um monopólio. Mas não é mau para a arte, porque pagar à cópia é uma forma muito idiota de incentivar a inovação. Como inovação, vinte milhões de cópias de uma música são dezanove milhões, novecentas e noventa e nove mil novecentas e noventa e nove cópias a mais. Com o copyright estamos a incentivar o oposto da inovação, e isso vê-se bem nos filmes.

Na região da grande Lisboa exibe-se hoje 38 filmes em cerca de 160 salas de cinema. Trinta com o Harry Potter, outras tantas com o Transformers, umas vinte para o Die Hard IV (3). Hollywood produz um décimo dos filmes do mundo inteiro e arrecada três quartos do valor das vendas. O cinema Europeu é um décimo do que era no início do século XX. Este é resultado de conceder monopólios sobre a cópia. Não é má ideia quando queremos uma aspirinas ou lâmpadas, mas é disparate quando queremos arte. A arte requer diversidade. Como na culinária. Há McDonalds e bitoques, mas estávamos mal se em 160 restaurantes houvesse apenas 38 sabores, e todos tão parecidos como os filmes de Hollywood.

A partilha pode reduzir as vendas do que tem mais publicidade e menos substância, mas aumentar as de obras mais inovadoras e menos publicitadas. Isto ajuda a reduzir a McDonaldização da música e do cinema. E nem é preciso alterar a lei de uma vez. Basta deixar a tecnologia evoluir sem estar sempre a inventar penas de prisão por gravar no cinema, obrigar os ISPs a filtrar transmissões ou proibir aulas de guitarra. A tecnologia reduz gradualmente o efeito do copyright até se poder deitar fora esta legislação com um mínimo de perturbação. Isto libertará a criatividade artística dos custos de um sistema de distribuição que está ultrapassado: a proibição de obras derivadas, o período interminável de monopólio, e até a proibição de citação na música ou no cinema, onde usar uns segundos de outra obra é caso para tribunal.

Mesmo que se ignore o mais importante, que é a violação da liberdade de expressão e da privacidade que o copyright obriga hoje em dia, e mesmo que se considere apenas o problema de incentivar a criatividade, ainda assim o copyright é uma treta.

1- 18-7-07, Copyright, direitos de autor, incentivos e mercado.
2- Wikipedia, List of most expensive films
3- Cinecartaz

25 comentários:

  1. Ludwig, acho que te contradizes:

    «Sete dos dez filmes mais caros de sempre (2) foram produzidos nos últimos 4 anos, em plena era p2p, mesmo ajustando os valores à inflação. E o público destes filmes, como Terminator, Spider-Man, King Kong, Pirates of the Caribbean, coincide bem com as dezenas de milhões de participantes nas redes de partilha.[...]Os números confirmam: mesmo o aumento exponencial das redes p2p tem um efeito pequeno e gradual na industria.»

    E ao mesmo tempo:

    «Hollywood produz um décimo dos filmes do mundo inteiro e arrecada três quartos do valor das vendas. O cinema Europeu é um décimo do que era no início do século XX. Este é resultado de conceder monopólios sobre a cópia»

    Ou conceder monopólios tem pouco efeito sobre o cinema que é produzindo, e acabar com ele não tirará mercado às grandes produções, ou então as grandes produções vão ficar em desvantagem face a outro tipo de produções.

    Cerca de metade dos filmes que vejo são de cinema europeu, por isso estou à vontade para fazer uma observação curiosa: a situação actual, em que «Hollywood produz um décimo dos filmes do mundo inteiro e arrecada três quartos do valor das vendas.» é fruto das escolhas dos consumidores.
    Os consumidores GOSTAM dos James Bond e dos Die Hard ou dos Titanic. Se a tua segunda previsão estiver correcta, e a "diversidade aumentar", isso acontecerá porque quanto mais pequena for a produção, mais vantagem competitiva ganhará face à situação actual. Terás mais diversidade, mas os consumidores de cinema estarão menos satisfeitos, pois não haverá incentivos suficientes para fazer certo tipo de filmes que só poderão ser rentáveis se não existir "free ride": e são precisamente os filmes que eles preferem se não puderem utilizar o free ride.

    É óbvio que não referi a questão da publicidade e marketing, e da forma como actualmente distorce as escolhas livres dos consumidores, e tenho de admitir que a perda de importância que esta actividade terá em vários domínios artísticos (música, cinema, menos na BD e literatura) será um dos aspectos mais felizes da profusão do P2P. Mas apesar de tudo, acho que em grande medida as pessoas escolhem as músicas e filmes que escolhem porque de facto gostam deles, e que a publicidade, tendo um efeito importante, não é o mais determinante.

    Posto isto, este é o cenário que eu vejo como previsível: menor importância do marketing face à qualidade (bom), maior diversidade (bom), diminuição drástica dos incentivos para produzir produtos de excelência (do ponto de vista do agrado ao consumidor e não do ponto de vista artísico) (mau), maior dificuldade para qualquer profissional nestas áreas (mau).


    Quanto ao teu cenário inicial, segundo o qual a produção de filmes e músicas caras quase não sofrerá, volto à mesma ideia: tu achas que toda a sociedade tem acesso à pirataria. Até já o escreveste nos comentários.

    Mas uma coisa é a teoria outra é a prática. Mais de 90% dos portugues NÃO SABE como sacar "Os piratas das caraíbas" da Internet, mesmo que queira.
    Dá-lhe uns aninhos, e facilmente verás que não resta mercado para estes filmes. Ninguém tem de os comprar, e os "fãs" que pagam mesmo sem precisar não pagam as despezas...



    Por fim:
    Eu não procuro argumentar que proibir a pirataria é bom. Eventualmente eu achava isto, mas já desde há vários meses que leio o teu blogue, e em muitos aspectos dou-te razão. Hoje eu não sei se deveria ser proibido ou não, mesmo que ache que a lei devia certamente ser alterada no sentido de evitar algusn ridículos que denuncias.
    Mas discordo de ti em dois pontos fundamentais:

    a) Não proibir tem aspectos negativos. Pode ser a melhor opção, mas tem custos - e importantes.

    b) É pouco ético "sacar" da internet um filme, uma música, ou um jogo de computador de tal forma que em resultado disso já não pagamos por eles, quando pagaríamos se não o tivessemos feito. Se eu gosto de um mp3 sacado, se eu estaria disposto a pagar pelo CD caso não tivesse alternativa, eu tenho a obrigação ética de o comprar. Não ir ao cinema ver o filme X - que iria ver - apenas porque o posso sacar e não gastar um tostão, parece-me pouco ético.
    Sacar algo que não estaríamos dispostos a pagar já não me parece grave a não ser pelo facto de estarmos a ser juízes em causa própria: às tantas podemos considerar que não estaríamos dispostos a pagar apenas para não o fazermos. Mas se a nossa avaliação conseguir, apesar disso, ser justa, então não acho mal.

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  2. João,

    O que os números indicam é que o efeito não é uma desgraça e devastação. É gradual.

    Mas concordo que quanto mais gente partilhar maior será o efeito.

    Não vejo que haja contradição. Concordo contigo que haverá um efeito, e que vai haver menos vantagens no futuro em juntar tudo numa mega-produção que inunda todos os cinemas, mas discordo que vá acabar de vez como este tipo de coisas e que o faça de repente.

    Quanto à escolha, acho que estás enganado. A distribuição influencia a escolha. Se ganhas mais a vender 10 milhões de cópias iguais que 1 milhão de cópias de cada um de 11 produtos diferentes, vai haver uma tendência para ofereceres menos diversidade que o consumidor gostaria de ter.

    Em muitos casos não há nada a fazer. Não se consegue ter no supermercado toda a fruta diferente que todos gostariam ter. Mas no conteúdo digital não há restrições logísticas. É apenas a lei que limita a escolha.

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  3. Já estamos a chegar a alguns pontos de concórdia.

    Mas devo dizer esclarecer que lá porque eu não nego que o efeito se faça sentir gradualmente ao longo do tempo (à medida que mais e mais pessoas vão tendo acesso aos meios "alternativos" de ver cinema) mas acho que daí não decorre que o efeito deixe de ser catastrófico para muito do cinema que é produzido hoje, a longo prazo.

    De resto, a oferta actual é fruto das leis que protegem os filmes, mas também das escolhas dos consumidores. Podias ter leis igualmente restritivas, e ainda assim ter imensa diversidade, se porventura as pessoas não valorizassem mais a excelência.

    Imagina que as pessoas valorizavam ao máximo a diversidade, e não gostavam assim tanto de efeitos especiais ou actores "estrela". Mesmo com as leis actuais de copyrigth verias imensos realizadores e produtores a fazerem filmes mais baratos, numa enorme diversidade de oferta. Ninguém faria filmes caros, porque as pessoas, não valorizando especialmente tais filmes, não os comprariam em quantidade que justificasse o investimento.

    Os filmes caros são dependentes do copyrigth, mas não são fruto dele: são fruto das escolhas dos consumidores, que gostam de os ver.

    Mas ou bem, Hollywood desenvolveu toda uma indústria de dar às pessoas aquilo que elas querem ver: enredos simples, adrenalina, histórias fáceis de entender, excelência nos efeitos especiais, imagens apetecíveis ao olhar, música capaz de mexer com as emoções, etc..

    O fim do copyrigth não vai acabar apenas com este tipo de filmes. Vai acabar com todos aqueles que apenas podem ser feitos se muitas pessoas pagarem por eles - mesmo que sejam mais profundos, e que o profissionalismo na produção se revele a outros níveis.
    A questão é que actualmente as pessoas estão dispostas a pagar por eles, o que mostra que o futuro desaparecimento dessa oferta é um mau funcionamento do mercado. O "free ride", cujo efeito será tanto menor quanto mais as pessoas forem altruistas e "fãs incondicionais" e pagarem por aquilo que não precisam - não se comportando de todo como os agentes racionais egoistas da teoria económica clássica.

    Há alguma esperança que o efeito seja menor do que julgo, mas certamente será grande ao ponto disso ser lamentável. E quanto pior (socialmente) for vista a pirataria, menores serão os seus efeitos perniciosos, pois as pessoas terão mais incentivos para se comportarem como "fãs incondicionais".

    Quanto ao cinema muito caro, para esse não vejo esperança, a longo prazo.

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  4. Acho que estás a simplificar demais. Se vale a pena fazer mais filmes baratos depende da curva de retorno em função do investimento e do número de filmes. Não depende apenas do gosto do consumidor.

    Mas isto são trocos. Há coisas aqui em que concordamos, coisas de que discordamos, e outras que podemos bem concordar em discordar porque não faz diferença.

    Há três coisas que são determinantes. Primeiro, o copyright precisa de cada vez mais coacção para o proteger. Estamos a falar de centenas de processos por mês, da criminalização de actos banais e de penas de prisão pesadas por coisas com efeitos insignificantes para a sociedade.

    Em segundo lugar, o copyright digital é um absurdo. Só se pode aplicar copyright a algo que sabemos corresponde a uma obra e não a outra. Mas 1001010100101 pode corresponder a qualquer coisa. É arbitrário. Pode-se fazer uma rede p2p que transmite qualquer ficheiro codificado em sonetos de Camões.

    Finalmente, há um enorme custo de oportunidade. Temos uma tecnologia que permite qualquer pessoa enviar qualquer ideia ou informação para qualquer outra pessoa instantaneamente. E estamos a invadir a privacidade, limitar a liberdade de expressão e atravancar a inovação para proteger coisas que são comparativamente insignificantes.

    Eu julgo que deixar morrer o copyright é o melhor que podemos fazer pela arte. Vai espevitar as coisas, dar mais liberdade aos artistas e, sobretudo, mais possibilidade de criar. Não há nada mais importante para o desenvolvimento do desporto, da culinária, ou da engenharia que a liberdade de os praticar e usar o conhecimento criado pelos outros. O mesmo se aplica à arte.

    Mas isto é insignificante face ao verdadeiro problema: o enorme custo social, ético, e de oportunidade de manter vivo o copyright.

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  5. «Mas isto é insignificante face ao verdadeiro problema: o enorme custo social, ético, e de oportunidade de manter vivo o copyright.»

    Mas nota bem que não é isso que eu tenho contestado.

    Se não existisse nenhum mal na abolição do copyrigth, isso poderia querer dizer que não haveria qualquer aspecto menos ético na atitude de sacar um filme que de outra forma se iria pagar para ver no cinema ou num clube de video.
    Mas existe, creio eu, mesmo que seja um mal "menor" e a abolição do copyrigth seja a melhor solução (coisa de que não estou certo, mas posso admitir).

    Ou seja: a atitude de sacar gratuitamente filmes, músicas e livros pelos quais estaríamos dispostos a pagar, sem ser por vontade expressa do autor, prejudica-o, e diminui os incentivos para criar (não estou preocupado com os incventivos à distribuição, mas apenas à criação) esse tipo de bem cultural.
    Por outro lado, a maior facilidade de acesso aos bens culturais alheios facilita a produção amadora, e o consumo de bens culturais (que forem produzidos). Posso acreditar que o balanço é positivo, mas se as pessoas tivessem uma atitude mais ética ao "sacar" talvez pudessemos ter o melhor dos dois mundos, mas não me parece que isso seja possível, e acho que a produção profissional vai realmente saír prejudicada.

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  6. João,

    Quanto à questão ética discordo.

    Considera: a atitude de praticar gratuitamente um desporto sem ser por vontade expressa de quem inventou as regras. É um problema ético? Prejudica?

    Eu penso que tu estás a fazer da música e dos filmes uma excepção apenas porque foste educado a isso. Não há qualquer problema ético em usar uma ideia, venha ela de onde for, porque as ideias não se gastam.

    O problema do incentivo não é ético. A «ética» de incentivar a música de uma forma e o desporto de outra é como a ética de ter as taxas de juro a 2.3% ou 2.5%.

    E discordo que abolir o copyright diminua o incentivo à criatividade. O que demonstra o desporto, a culinária, o software open source, o youtube, o artistshare, o flikr, toda a investigação científica, a wikipedia, e tantas outras é que o acesso livre é o maior incentivo a prática e à criatividade em qualquer àrea.

    Mas diminua ou não nunca será um problema ético. Nunca poderá ser imoral decidir não comprar um CD, seja porque razão for.

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  7. «O problema do incentivo não é ético. A «ética» de incentivar a música de uma forma e o desporto de outra é como a ética de ter as taxas de juro a 2.3% ou 2.5%.»

    Mas eu acho que isso das taxas também pode ser um problema ético.

    Na minha forma de ver a ética, a comparação de cenérios alternativos consequentes de diferentes decisões é importante. A avaliação das consequências de cada decisão que tomas é importante.

    Se as consequências de "sacar" algo pelo qual estarias disposto a pagar forem que os incentivos para a produção desse tipo de produtos serão bastante desincentivadas, ao ponto da oferta diminuir e isso prejudicar terceiros, então para mim essa atitude estará longe de ser neutra do ponto de vista ético.

    É como o caso dos foguetes do meu exemplo. Todos os mil habitantes gostariam de pagar 10e para ver o espectáculo. A empresa Pim-pam-pum começa a pensar em fazer o espectáculo (que lhe vai custar 1000e), vendendo 500e bilhetes a 8e.
    Se cada habitante pensa "se eu não comprar o bilhete, vejo o espectáculo à mesma", ele vai prejudicar-se a si e à comunidade. A si prejudica-se em 2e, mas o problema é seu. Mas à comunidade prejudica em 4e em média.

    Por um lado, sei que discordas que as consequências desse acto sejam tão devastadoras, mas se acreditasses que eram, continuarias sem ver qualquer problema ético nessa atitude?

    Por outro lado, o copyrigth não é tanto uma diminuição do incentivo à criatividade por si, mas sim à actividade criativa profissional. Hoje existem vários escritores profissionais, cieastas profissionais, compositores profissionais.
    Na escrita amadora pode haver muita criatividade: se os amadores não têm muito tempo para escrever (não são pagos para isso) podem pôr muita criatividade no pouco que produzem. E como há muitos amadores, o melhor da escrita amadora pode ser bastante criativa. Mas a produção artística e cultural não é só criatividade, também é trabalho, esforço, técnica, profissionalismo.

    Na culinária não existe ninguém que seja pago apenas para inventar receitas. A actividade de criação de receitas está muito pouco desenvolvida, e mal de mim se a literatura estivesse tão desenvolvida como a culinária... A produção de excelência (na óptica do consumidor e não na óptica artística) de bens culturais está de facto ameaçada pelo p2p, e é realmente prejudicada quando as pessoas sacam aquilo pelo qual estariam dispostas a pagar.

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  8. Caros,

    Eu só quero aqui fazer uma correcção ao que o Ludwig diz. Quando o Ludwig tentou comparar o copyright da musica à liberdade, á liberdade das ideias, está a incorrer numa falácia. O copyright não impede o Ludwig de tocar qualquer musica que tenha sido composta por outrem. Isso é a ideia. O que o Ludwig quer, comparativamente, é que a ideia seja "interpretada" pelo autor, ou outro do agrado sem pagar. Ludwig, isto é lógica da batata.
    Eu já tinha dado a comparação entre seres tu (na altura era outro professor qualquer) a explicar-me a teoria da relatividade, e ser o Einstein a fazer isso. Não tem o mesmo valor, por muito que goste da tua lógica. ;-) Eu pagaria e paguei, para ter todos os CDs de Cure, mesmo depois de ter cópias gravadas, mas, se algum de vocês cantar alguma das canções deles, eu pago é para vos meter a rolha na boca. :-) Liberdade de usar as ideias é isso, não é copiar o suporte de divulgação das mesmas, nem o disseminar as mesmas à borla.

    O João dá ainda outro bom exemplo: O músico profissional. A editora pagalhe um salário para ele tocar e gravar e isso é um investimento. Se ele se for embora, o trabalho é propriedade de quem o pagou, e é assim com qualquer emprego. E esse trabalho representa investimento, que só com o copyright estará protegido.
    No fundo é uma mera questão laboral... Se alguém compra ou vende trabalho, tem que ser protegido.

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  9. António,

    A ideia a que me refiro é acima de tudo uma sequência de números e um algoritmo de descodificação. É uma abstracção matemática, e todo o conteúdo digital não passa disso.

    Se propões que ninguém me impeça de transmitir sequências de números ou de ter sequências de números no PC, estamos de acordo. Se quiseres até especificar algumas sequências proíbidas, como se faz com os livros, também não há problema. Mas no conteúdo digital isso não serve para nada porque a codificação é arbitrária.

    E essa do salário não é verdade. Contrata um matemático, ele demonstra um teorema, e nem tu nem ele são proprietários dessa demonstração. Ou contrata um matemático para gerar uma sequência de números e também ninguém fica dono da sequência de números.

    Não vejo porque discográficas e músicos podem ser donos de sequências de números, ou de ideias em abstracto.

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  10. «A ideia a que me refiro é acima de tudo uma sequência de números e um algoritmo de descodificação. É uma abstracção matemática, e todo o conteúdo digital não passa disso.»

    Um programa (TV etc..) que seja transmitido via ondas hertzianas, não digital, como é? A codificação pode ser não digital e arbitrária.

    «E essa do salário não é verdade. Contrata um matemático, ele demonstra um teorema, e nem tu nem ele são proprietários dessa demonstração.»

    Se dentro dessa demonstração estivesse um fármaco inovador, a coisa não seria assim como dizes!

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  11. Ludwig,

    Se eu olhar para um quadro (ou um livro) através de um sistema óptico (analógico) que me dá uma saída
    diferente, poderei representar essa saída, e vende-la, sabendo que com um inversor óptico obtenho o original? Pergunta de retórica...

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  12. Miguel,

    Num sistema analógico tu podes especificar que esta representação corresponde a esta coisa representada, e assim podes proibir certas representações e apenas essas representações.

    Mesmo num sistema como o texto em língua natural podes fazer isso. É possível regular a cópia deste texto que estou a escrever sem proibir a cópia de outros textos ou a reprodução da mesma ideia de outra forma. Basta olhar para uma sequência de caracteres para saber se é uma cópia deste texto ou não.

    Isto porque quer na linguagem natural escrita quer na codificação analógica há uma forma de descodificar a representação que se pode fixar à partida. Tocar a cassete num leitor destes, ler isto numa lingua humana, captar esta transmissão com um receptor detes, etc.

    Na codificação digital isso não existe. Em geral, analizar uma sequência de bits não nos diz nada acerca do que lá está. Toda a encriptação depende disso, por exemplo. E a descodificação é arbitrária. Por exemplo, qualquer ficheiro pode ser enviado dizendo apenas em que partes de uma representação binária de pi se podem encontrar as sequências de bits necessárias a reproduzir o ficheiro.

    Vamos proibir a transmissão dessa informação? E de qualquer outra?

    Já escrevi bastante sobre este problema do copyright digital. Clica na tag «digital» que a maior parte é sobre isso.

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  13. Quanto ao fármaco, era sim.

    Seria possível patentear o processo de fabrico do fármaco. E isto dava um monopólio sobre a aplicação comercial deste processo. Mas, ao contrário do copyright, a informação em si tornava-se do domínio público, e estava acessivel a todos.

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  14. «Na codificação digital isso não existe. Em geral, analisar uma sequência de bits não nos diz nada acerca do que lá está. Toda a encriptação depende disso, por exemplo»

    Ora essa? E eu não posso codificar um sinal analógico? Na 2.ª Guerra era mato! E a essa codificação posso arranjar um algoritmo analógico que me dê o que eu bem entender.

    «Seria possível patentear o processo de fabrico do fármaco. E isto dava um monopólio sobre a aplicação comercial deste processo. Mas, ao contrário do copyright, a informação em si tornava-se do domínio público, e estava acessível a todos.»

    Pois, mas ficava na mesma, não o podia usar. Ora bolas!

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  15. Podes encriptar qualquer sinal. Mas uma vez que há encriptação deixa de haver copyright. Se alguém escrever «poirwoig soig gois gasoid aosidfp ashdf uash pfasfçasjdh fas» eu nunca vou convencer o juiz que me violaram os direitos de autor pela frase anterior mesmo que haja uma forma de converter essa sequência naquilo que eu escrevi (e há infinintas maneiras de ou fazer).

    O copyright só pode funcionar se pudermos dividir as mensagens entre mensagems que são propriedade de um e outras que são propriedade de outros. Mas da forma como funcionam as transmissões digitais isso é impossível. Se transmitires uma música da Ágata codificada em sonetos de Camões estás a violar copyright ou a usar algo no domínio público? Pior: todos os sonetos de Camões codificam músicas da Àgata, se aplicarmos o algorítmo certo para os descodificar...

    Quanto à patente, repito: a única coisa que regula é a aplicação comercial, e tem que se provar em tribunal que houve prejuizo para poder receber indemenização, e só em função do prezuizo. Por exemplo, se alguém patenteia um método de produzir pastéis de nata tu podes transmitir o método a quem quiseres, e fazer pastéis em casa à vontade. Só se montares uma fábrica de pastéis é que te podem chatear.

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  16. Ludwig:

    Entendo os teus argumentos, mas a verdade é que, por razões logísticas, surgem sempre métodos de desencriptação que, por esta razão ou por outra, são mais populares.

    Um texto é considerado cópia porque aqueles desenhos a que chamamos caracteres tendem a ser desencripatados sempre da mesma forma. É um método de desencripação muito popular.
    O formato mp3 não chega a este extremo de popularidade, mas realmente se não existirem certos padrões de desincriptação comuns a muita gente, o p2p seria inútil para partilha de músicas e filmes.

    E se um conjunto de dados "çlhdasºlkhgçlkhagsºdlhkgsadºlhfaagdslºkafºldsgafadlkhgs(...)" por "coincidência" quando desencripatado por um leitor de mp3 começar a tocar o último exito dos metallica, terá mesmo sido coincidência?
    Eu também podia fazer um conjunto de "pinturas abstractas" e mandar vender, e lá porque as pessoas lessem nessas gatafunhos bizarros o último livro do Harry Potter, eu poderia sempre dizer que é apenas uma das muitas formas de interpretar os meus desenhos, e não era aquela que eu pretendia, mas duvido que alguém engula isso.

    O método de desincriptação de desenhos denominado "leitura em português" é suficientemente popular para justificar que muitos desenhos diferentes sejam considerados "o mesmo texto". Basta pensares nas diferentes formas como eu posso desenhar um "a", já sem falar no espaçamento entre linhas e todo um universo de possibilidades.

    Posto isto tudo, não sei se era boa ideia andar "em perseguição" dos p2p.
    Mas acho isso tudo menos simples.

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  17. João,

    «surgem sempre métodos de desencriptação que, por esta razão ou por outra, são mais populares.

    Um texto é considerado cópia porque aqueles desenhos a que chamamos caracteres tendem a ser desencripatados sempre da mesma forma. É um método de desencripação muito popular.»

    Isso é descodificação. Encriptação é o que se usa nas transmissões p2p, e é função de uma chave que é única para cada transmissão.

    O resultado é que sempre que alguém envia o primeiro bloco de um mesmo mp3 envia uma sequência de bits diferente da do mp3 e diferente das sequências de bits de todas as outras transmissões desse mesmo bloco.

    E não é só isto. Considera uma função matemática que transforma sequências de bits. Inputs diferentes dão outputs diferentes. E se o input for Pi em binário o output é um mp3 de uma música da Àgata. Essa função deve ser propriedade da Àgata? Deve ser ilegal transmitir essa função?

    Com conteudo digital não há diferença entre procedimentos e dados, ou entre conjuntos de dados diferentes (a interpretação é arbitrária). O copyright explicitamente deixa de fora receitas e descrições de processos. Mas nesse caso basta enviar a receita ou o processo para construir um ficheiro, e pronto.

    Em suma, a única forma de definir o copyright em conteúdi digital é proibindo não a troca de certas sequências, mas certas utilizações. Por exemplo, nenhuma sequência pode ser usada para gerar músicas da Ágata. Mas isto é ridiculamente restritivo, é como proibir que se cante no duche.

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  18. «Isso é descodificação. Encriptação é o que se usa nas transmissões p2p, e é função de uma chave que é única para cada transmissão.»

    Ups! Grande calinada. Referia-me obviamente à descodificação (sendo a desencriptação parte de alguns processos de descodificação em particular).



    «Em suma, a única forma de definir o copyright em conteúdi digital é proibindo não a troca de certas sequências, mas certas utilizações. Por exemplo, nenhuma sequência pode ser usada para gerar músicas da Ágata»

    Isso seria muito restritivo, visto que não defines a descodificação usada.


    Mas imagina que eu uso um p2p e saco um ficheiro de dados. Isso não tem mal nenhum, obviamente.
    Mas se esse ficheiro de dados, no meu leitor de mp3 (o winamp), começar a tocar a música da Ágata, posso dizer que é tão provável que isto seja coincidência como tu fazeres um desenho ao acaso e teres lá um soneto de camões traduzido para mandarim.

    Por isso, se realmente se pretendesse lutar contra a violação dos direitos de autor no p2p, aquilo que se teria de fazer seria usar os métodos de descodificação mais populares.

    É um ficheiro de dados? Muito bem. Agora vamos passar isto nesta meia dúzia de programas mais usados para reproduzir filmes/música através de um ficheiro de dados. Alguma das músicas/filmes assim gerados está protegido?

    Não sei se isto seria exequível na prática, e tenho sérias dúvidas que seja desejável. Mas conceptualmente, é possível.

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  19. «É um ficheiro de dados? Muito bem. Agora vamos passar isto nesta meia dúzia de programas mais usados para reproduzir filmes/música através de um ficheiro de dados. Alguma das músicas/filmes assim gerados está protegido?»

    Isso funcionava, mas era trivial dar-lhe a volta. Crias uma lei, e uma lista dos algoritmos de descodificação considerados standard. Qualquer um que queira ter todas as musicas e estar dentro da lei basta guardar os ficheiros com uma codificação não standard, e acrescentar um filtro no pipe de processamento do ficheiro.

    E o problema principal é que se quer legislar os dados transmitidos. E esses são encriptados, e por isso codificados de uma forma que é unica para cada transmissão. Os pacotes que recebes numa rede p2p moderna não têm nada intrinsecamente reconhecivel como sendo partes de filmes ou músicas, e cada um tem que ser descodificado usando uma chave única gerada só para essa transmissão.

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  20. Pois, entendo que seja impraticável.

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  21. Ludwig,

    A questão dos dados transmitidos serem diferentes de source para source, em termos legais é treta. Se queres tentar contornar a questão não vás por esse caminho. A lei também te acha culpado de homicidio qualificado se cortares os travões do carro de alguém, mesmo que não mates directamente a pessoa. Para a lei, o que interessa não é a forma, mas, os fins, e as intenções. Se um download visa obter parte de um filme, seja que sequência for em termos numericos, estás enquadrado pela lei do copyright.
    Se te lembrares de ir comprar polvora e forforos, não precisas de dizer que tencionavas arrasar o prédio.
    Se andares a 200km/h dentro da cidade, não precisas de dizer que queres atropelar alguém.
    Esta coisa do direito é mesmo obra de crentes, não é? :-)

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  22. António,

    Se tu, com a intenção de matar uma pessoa, pensares com muita força "quero que morra", ou pegares numa varinha e gritares avada kevadra a lei não te vai fazer nada.

    Por outro lado, se cortares os travões com a intenção de causar um leve desconforto podes ir preso à mesma. A intenção conta, mas não tanto. E nunca conta só a intenção.

    E o problema do copyright é mais grave. O copyright é o direito de fazer cópias. Se tu venderes mil cópias do harry potter a pessoas que só têm a intenção de o usar para limpar o rabo estás a violar o copyright à mesma, porque há um critério bem definido na lei para determinar que aquilo que tu estás a vender são cópias do harry potter.

    Com o conteúdo digital é impossível definir o que é que é cópia do quê. Nem faz sentido. É como dizer que o 123 é cópia do 45. Isso é disparate. Não podemos aplicar o direito de cópia aos números.

    Por isso descamba numa lei como tu descreves, que pune intenções. Mas nem isso. Tem que punir apenas intenções presumíveis no caso geral. Aposto que a lei também iria punir uma comunidade de surdos que partilhasse mp3 para ver as animações no windows media player, apesar de isto não ter nada a ver com música.

    Tem que se mudar tanto esta lei para a aplicar ao conteúdo digital que já não se parece nada com uma lei aceitável.

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  23. Ludwig:

    Não queres debater esse ponto com o Ricardo Pinho?

    http://costapinho.typepad.com/ensaiogeral/2007/07/pj-e-asae-chega.html

    Tenho curiosidade em saber quais os argumentos dele a esse respeito.

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  24. Ai o maroto. Já lhe vou dizer das boas :)

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