domingo, dezembro 20, 2009

Treta da semana: telechatos.

Segundo a Lei de Protecção de Dados temos o direito de exigir que os nossos dados «sejam eliminados dos ficheiros de endereços utilizados para marketing» e de nos opormos ao tratamento de dados pessoais «para efeitos de marketing directo ou de qualquer outra forma de prospecção.»(1) Na esperança de poder exercer esses direitos, sempre que me telefonam com promoções e afins eu peço para ser retirado da base de dados de quem me contacta.

O problema é que «O exercício do direito de rectificação e eliminação é exercido directamente junto do responsável pelo tratamento», o que pode estar sujeito a diferentes interpretações legais. Como muitas destas chamadas são feitas por empresas de telemarketing sub-contratadas para isto, quando peço para deixarem de me chatear mandam-me contactar a assistência ao cliente da empresa que os contratou. Da última vez que tentei, com a TV Cabo, esperei um quarto de hora ao telefone antes de desistir. Há um limite para o tempo que quero perder ao telefone só para evitar perder tempo ao telefone.

Um dia recebi seis telefonemas da Portugal Telecom, para grande irritação minha e grande diversão dos meus filhos, que se fartaram de rir a ver-me a atender o telefone cada vez mais chateado. A cada vez disse que não queria receber mais telefonemas promocionais. E a cada vez me disseram para telefonar para a assistência ao cliente. Até que à sexta reclamei que não podia ser assim, que eu tinha o direito de não ser incomodado e que se não me retirassem dessa lista estavam a violar a lei. Não sei se é verdade mas parece que funcionou. Que me lembre não me voltaram a chatear. Até ver.

O último episódio foi com a ZON/Netcabo. Telefonaram-me a dizer que eu podia ficar com mais canais de televisão, passar de uma ligação de 20Mb para 50Mb e pagando menos um euro por mês do que pago agora. Bastava agendar uma visita do técnico para instalar a fibra óptica que a instalação seria gratuita. Eu disse que era uma proposta interessante mas que nunca aceito comprar nada por telefone, por isso depois ia ver à página e logo decidia, ao que o vendedor me disse que assim não tinha os descontos por ser um cliente antigo. Quais descontos, perguntei. Ah, e tal, não respondeu.

Fui ver à página da ZON e está lá tudo exactamente como ele descreveu. Incluindo a instalação gratuita. Mas tem também algo que, pelo telefone, ficou por dizer. É que o tal preço mais barato é uma promoção para o primeiro ano. Depois a mensalidade aumenta cinco euros. Não é muito, e se não fosse o risco de ficar sem os newgroups da Telepac por ter uma gama IP diferente, ou se não estivesse satisfeito com o serviço que tenho, até mudava. Mas mais de 20Mb não me faz falta, não preciso de mais canais de TV sem nada de jeito e incomoda-me o procedimento. Telefonam-me para casa a dar-me informação incompleta para me meter num negócio que pode não ser do meu interesse.

Enquanto que os telechatos são mais incómodos por serem muitos, por cabeça o pior é aquele que vem bater à porta. Começa logo por estender a mão para me cumprimentar, quando não o conheço de lado nenhum. E passou o dia a dar a mão a uma data de gente, a mão que a maioria das pessoas põe à frente da boca quando espirra ou tosse. É claro que custa dizer desculpe, não aperto a mão por causa das gripes e assim. A minha mulher diz que sou mal educado, e até tem razão. Vai contra tudo o que me ensinaram de boas maneiras. Mas aquele estranho só me estende a mão porque isso lhe facilita o trabalho de me vender algo que eu não quero. Não é razoável arriscar a minha saúde por isso.

Para tomar uma decisão devemos primeiro ter em mente o que precisamos. Saber bem o que queremos obter ou que problema queremos resolver. Depois precisamos conhecer as opções que estão ao nosso alcance. Quais as suas vantagens e desvantagens e como contribuem para o nosso objectivo. Só depois podemos finalmente escolher uma das alternativas. O tipo que telefona ou bate à porta vem vender uma solução para um problema que nem sabíamos ter, e diz-nos que é a melhor quando não conhecemos as alternativas. Temos tanta escolha como a água a escorrer pelo ralo.

Para evitar ser enganado por estes vendedores sigo uma regra simples. Só compro coisas quando a iniciativa é minha e nunca quando me as vêm vender. Não só porque acho indecente que me venham incomodar mas também porque não são circunstâncias adequadas para tomar uma decisão racional. Talvez assim venha a perder algum bom negócio mas, até agora, parece-me que não aconteceu. Pelo contrário, julgo que esta regra já me safou de muitos barretes.

Melhor ainda seria toda a gente fazer o mesmo. Se deixássemos todos de comprar coisas impingidas em pouco tempo deixava de haver telechatos. Era um descanso. Infelizmente, é como o spam. Basta uma pequena percentagem cair na esparrela para o negócio compensar.

1- Comissão Nacional de Protecção de Dados, Direitos dos Cidadãos

16 comentários:

  1. Não é preciso atender o telefone seis vezes a um vendedor agressivo desse calibre. Basta uma:

    -Estou sim, gostaria de falar com o Senhor Entrecosto para lhe falar numa promoção espectacular...
    -Com certeza, aguarde só um momento...

    E depois é só prolongar esse momento, basicamente indo à nossa vida até o tipo que deixámos pendurado se cansar e desligar o telefone.
    É tiro e queda, nunca mais ligam...

    :)

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  2. Eu aprendi um truqe engraçado num filme: «isso é muito interessante e vou querer com certeza mas agora não posso. Por favor dê-me o seu número, que ligo logo à noite. Não dá porquê? Então pode ligar-me para a minha casa para vender, mas eu não posso ligar para a sua para comprar? Aí há gato, assim não quero, veja lá se não quer mesmo que eu lhe telefone? Olhe que vai perder um bom negócio».
    É mais ou menos aqui que eles começam a perceber que estão a ser gozados.

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  3. Jairo e Cristy,

    Concordo que são soluções apelativas, e já me senti tentado a fazer coisas desse género. O problema é que a pessoa com quem falamos, se bem que culpada de ter aceite fazer um trabalho que implica chatear os outros, tem uma parte pequena da culpa pelo sistema. Não é esse o responsável por estarem a ligar para casa em vez de se limitarem a atender telefonemas dos interessados.

    Por isso, se bem que lhes dar uma seca seja gratificante do ponto de vista emocional, pode ser um pouco injusto.

    Mas talvez indique uma fonte importante dos problemas burocráticos e destas organizações. Quem está no topo decide fazer disparate e quem está em baixo é que ouve as reclamações...

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  4. Tens razão numa coisa Ludwig, o telefonista é quase sempre um contratado a recibos verdes a fazer pela vida. Mas a seca que lhe dou não é assim tão grande,menos de dois minutos e ele percebe onde eu quis chegar. E acabo por ajudá-lo; para a próxima ele já não me liga porque já sabe que vai gastar inutilmente tempo que lhe será precioso para tentar arranjar outros clientes. No fundo estou só a ajudá-lo a manter actualizada a sua lista de clientes.
    Se lhe disser verbalmente que não estou interessado, ele não vai perceber, porque não lhe ensinaram o significado da palavra no curso de dois dias de vendas agressivas que fez antes de ser contratado...

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  5. Outra estratégia provada é pôr os filhos pequenos atender o telefone.

    Nao só proporciona uns momentos de entertenimento longe do computador/televisor/PS3, como se revela didático para os rebentos, ajudando a desenvolver aptidões importantes para o seu futuro.

    A única desvantagem é que, de tão eficaz, deixaram de nos telefonar de todo.

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  6. Boa noite, estou a escrever para o Senhor Krippahl?

    Gostaria de ter mais canais de televisão com mais e melhores programas? De ultrapassar a limitação de 20 Mb/s na sua ligação à Internet e bater limites de velocidade a 50 Mb/s? Tudo isto pagando menos de um euro por mês? Enviaremos um técnico a sua casa sem ter de pagar nada!

    Mas assine já este novo serviço e não perca os nossos descontos especiais para um cliente antigo como você! Promoção apenas válida nesta caixinha de comentários. Não dispensa a consulta do seu médico ou farmacêutico.

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  7. No meu caso pessoal, atendo todas as chamadas de telemarketing da PT, Zon e cartões de crédito (os únicos que me telefonam). Se me telefonam num momento inconveniente (visitas em casa, jogo do Benfica na TV, etc) digo que não posso atender naquele momento (explico o motivo) e peço o favor de telefonarem no dia seguinte. Delicadamente desligam e tornam a telefonar no dia seguinte conforme pedi.

    Quando os atendo, escuto com atenção a proposta e se demoram muito tempo interrompo com um "desculpe, mas já me fizeram essa proposta 35 vezes e eu sempre a recusei" o que se segue o inevitável "porquê" e eu apresento as razões que me levam a rejeitar a proposta. Agradecem-me e despedimo-nos cordialmente. Se a proposta é nova, procuro analisá-la e demonstrar-lhes a falta de interesse, para mim, o que inevitavelmente conduz ao fim da chamada com um "obrigado" de ambas as partes.

    Faço isto porquê? As empresas devem ter bases de dados ondem os operadores de telemarketing apontam os motivos da recusa do pedido. Se eu disser "não posso mudar para a Meo porque tenho uma fidelização que ainda dura mais 6 meses" sei que nos próximos 6 meses só por acidente é que recebo uma chamada do mesmo tipo. Claro que depois avanço para o passo seguinte: "Tenho um primo que instalou o Meo e correu muito mal, está muito insatisfeito, nem me fale disso". Ou uma atitude mais radical: "Como consumidor, não me parece racional depender de um único fornecedor de serviços porque se o telefone avaria, lá vai a internet e a tv".

    Se não fizer isto, a empresa fica convencida que é incompetência do operador e além de gerar mais um desempregado nunca desistem porque a emprea manda outros operadores cativarem o cliente (a mesma pessoa nunca liga duas vezes ao mesmo cliente como devem ter reparado). Além disso, os operadores devem conversar entre eles coisas do tipo "ah, já ligaste ao senhor entrecosto? o gajo é difícil! o quê? eu dou-lhe a volta! e o senhor krippahl de santo antónio de cavaleiros? o gajo pensa que é esperto mas esta noite vou apanhá-lo!". Se todos falamos das nossas profissões, porque não os operadores de telemarketing?

    Há mais estratégias que desincentivam futuras chamadas. Por exemplo, as empresas de cartões de crédito que telefonam cobram juros altíssimos. Basta dar-lhes um exemplo de um cartão de crédito que cobre 16% em vez de 28% e não voltam mais a telefonar porque sabem que o consumidor está informado. Se disserem "ah, mas não precisa comprar com juros, paga sempre a dívida total" aí diz-se "ah, mas eu estou muito habituado a comprar coisas a crédito, é como um vício, ainda ontem fui ao casino e levantei dinheiro com um dos meus visas para meter na roleta". Em 10 chamadas, 10 operadores despedem-se imediatamente.

    Há um caso que me irritava (deixaram de telefonar): "ah, sr. parente, é para o informar que ganhou uma torradeira, venha ao hotel y hoje às 15h com a sua esposa para receber a torradeira e participar num cocktail". Nestas situações, digo alguns palavrões e grito para dentro: "mulher, dá aí a pistola, não me posso esquecer de a pôr à cintura". Geralmente, desligam sem eu pedir.

    Se leram este comentário até ao fim é porque prendi a vossa atenção e consegui gastar uns preciosos minutos do vosso tempo. Daqui a 15 anos, quando me reformar, iniciarei então um part-time como operador de telemarketing. Estejam atentos, Srs. Entrecosto e Krippahl.

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  8. António Parente,

    Eu penso que além do conflito de interesses entre mim e o vendedor que me telefona, há outro entre a empresa de telemarketing para quem ele trabalha e a empresa, como a PT ou TVCabo, que contratou este serviço. A empresa de telemarketing não tem interesse nenhum em reduzir a base de dados porque o seu rendimento é função do tamanho dessa.

    Senão teriam um sistema que permitisse retirar dessa lista quem invocasse o direito legal de ser retirado dessa lista, não só por força da lei mas pela manifestação clara que não é um bom alvo para telemarketting. Se eles trocassem informação entre si veriam que comigo só têm desperdiçado chamadas -- e telefonar seis vezes no mesmo dia à mesma pessoa revela que essa informação não é utilizada.

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  9. Já agora, há uma vantagem em pedir para ser retirado da lista. Mesmo que não o façam, a conversa acaba logo por aí. Não perco eu mais tempo e o operador já tem a desculpa que precisa para passar ao cliente seguinte, onde a comissão será mais provável.

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  10. António Parente, parabéns!

    Não só conseguiu cativar este cliente fazendo-me ler o seu texto até ao final com bastante interesse, como me convenceu de que tenho sido um desprezível mal-educado para os trabalhadores do telemarketing, sem qualquer necessidade.

    Portanto, parece que daqui por 15 anos teremos mesmo possibilidade de de falar pelo telefone. Se nessa altura eu gritar uns palavrões e dizer à minha fictícia mulher para me ir buscar a pistola, não se assuste, foi um expert na matéria que me aconselhou esse método. :)

    Cumprimentos.

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  11. Errata:

    "e dizer à minha fictícia mulher para me ir buscar a pistola"

    E "disser", claro. E a pistola também será fictícia, para além de feio e antissocial também sou/serei pacifista.

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  12. Vendo bem, antissocial não combina bem com pacifista...

    É do sono, vou-me retirar.

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  13. Ludi,
    não sei quantas vezes já pedi para ser retirada das listas todas, com bons modos, com crescente impaciência e finalmente com exasperação. E não sei quantas vezes me esforcei por não perder as estribeiras, apenas para apanhar com respostas malcriadas quando insistia que não estava interessada. Não condeno quem trabalhe em call centers (embora também aqui haja uma história muito interessante por contar), mas se digo que não quero e em vez de me deixarem logo em paz começarem a insistir na esperança de terem apanhado quem não se saiba defender (o perfil das vítimas faz parte da formação), aí sujeitam-se.

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  14. Ludwig:

    Tambem acho um abuso telefonarem-nos para vender coisas. Os vendedores de comunicações lideram com uma certa segurança, mas tambem tenho aturado de outras areas. Produtos de limpeza, contabilidade (sobretudo la na clinica), moveis...

    É dificil não perder a paciencia quando nos respondem "Mas não está interessado porque?" ...

    Bem lembrado este post.

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  15. Cristy,

    Sim, eu também tenho os dois modos. O primeiro é dizer que não estou interessado e pedir para me retirarem da lista. Quando são empresas grandes isso resulta apenas a indicação de contactar o apoio ao cliente, obrigado e boa tarde.

    Mas às vezes é como o João conta, lojas aqui de Odivelas ou algo assim mais pequeno, e aí perguntam porque digo que não estou interessado se ainda não me explicaram o que era. Nesses casos digo que não sou obrigado a justificar o meu desinteresse, digo eu boa tarde e desligo.

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  16. A história mais gira em relação a um call center foi eu uma noite ter reclamado pelo tempo que levaram a atender e terem-me respondido "desculpe, devem ter pensado que era um cliente".

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