Treta da Semana: Outra avaliação.
O decreto-lei 78 de Abril de 2006 transpõe a directiva 2002/91/CE do Parlamento Europeu para regular o desempenho energético e climatização de edifícios. A Agência para a Energia (ADENE) ficou responsável pelo funcionamento do Sistema Nacional de Certificação Energética e da Qualidade do Ar Interior nos Edifícios (SCE) criado por esse decreto-lei (1).
Em traços largos, o SCE regula a certificação de edifícios por meio de peritos qualificados que trabalham por conta própria ou em empresas públicas ou privadas. Tal como os arquitectos, engenheiros ou técnicos das companhias do gás, estes peritos certificam que certos aspectos dos edifícios estão em conformidade com a lei. A ADENE é responsável pela formação e fiscalização regular destes peritos. Nada disto teria interesse neste blog se não fosse o artigo 12º do DL-78/2006:
«1 - A ADENE fiscaliza o trabalho de certificação do perito qualificado, com base em critérios de amostragem a aprovar pelas entidades responsáveis pela supervisão do SCE.
2 - As actividades de fiscalização referidas no número anterior podem ser contratadas pela ADENE a organismos públicos ou privados.»(2)
Ou seja, a fiscalização pode ficar a cargo de empresas concorrentes. Que foi o que a ADENE fez. Contratou a Société Générale de Surveillance SA (SGS) para fiscalizar a certificação de edifícios de acordo com o SCE (3), um serviço que a SGS também oferece (4). Isto é bom para a ADENE porque não deve ter problemas em convencer a SGS a fiscalizar a concorrência. E é bom para a SGS porque pode aconselhar os seus clientes a escolher quem tem mais probabilidade de passar na fiscalização. E pode examinar tudo o que os seus concorrentes fazem quando os fiscaliza. E pode garantir que todos os seus concorrentes serão excelentes. É sempre bom competir com a excelência. Serão poucos. Muito poucos. Mas se sobrar algum será excelente.
O outro parceiro fiscalizador é o Instituto de Soldadura e Qualidade (ISQ), que é parte de um grupo privado de empresas (5) e cuja participação garante a idoneidade do processo. Não só porque evita que seja só uma empresa a fiscalizar a concorrência (assim são duas) como facilita chegar àquele sítio no meio das costas que dificilmente se alcança sozinho.
É claro que há pessoas insatisfeitas. Por muito bom que algo seja há sempre quem diga não gostar. Mas ignoremos a pequena minoria de todos os outros técnicos, clientes e utentes dos edifícios que não pertençam à ADENE, ISQ ou SGS, e abracemos este método de avaliação. Premiar os melhores professores perguntando a alguns se são eles ou os colegas que merecem a promoção. Garantir peritagens de qualidade pondo umas empresas a fiscalizar a concorrência. Proponho também que a ASAE contrate pastelarias para fiscalizar as pastelarias vizinhas. Afinal, os donos das pastelarias percebem o negócio e sabem ver, melhor que ninguém, se a pastelaria do lado merece ser fechada.
Até eu estou tentado. Em vez de perder tempo a avaliar trabalhos e exames, em cada 200 alunos vou nomear 100 para me dizerem quais são os 100 que merecem passar. E se alguém questionar o mérito do sistema justifico-o facilmente apontando que os 100 que nomeio são sempre os aprovados. Claramente os mais habilitados a avaliar o desempenho dos colegas.
1-Portal do SCE.
2- IAPMEI, Decreto-Lei nº 78/2006 de 4 de Abril de 2006
3- GETEP, Fiscalização aos peritos qualificados.
4- SGS Portugal, SCE – Sistema de Certificação de Edifícios
5- Grupo ISQ
Vamos NÃO falar nisto pode ser?
ResponderEliminarÉ a roubalheira do milénio, enfim...
bem visto...até fiquei com os olhos tortos com tanta fiscalização ;)
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