Passa com a esponja.
O Orlando Braga respondeu ao meu post (1). Inicialmente sucinto, escrevu apenas «Este gajo não sabe ler inglês, e ainda arrota postas de pescada»(2), citando de seguida o trecho do artigo original, sobre o genoma da esponja, onde está escrito que esta tem quase o mesmo número de genes que nós. Comentei então que era melhor ele ler o que eu tinha escrito antes de dizer que eu não sei ler. Porque no meu post não disputo o número de genes; aponto é que não se pode inferir daí, como faz o Orlando, que a diferença entre um humano e uma esponja esteja na forma platónica e essas tretas.
Em resposta, o Orlando apagou o meu comentário e escreveu uma adenda ao seu post, sem mencionar sequer a minha chamada de atenção. Isto pode parecer aquela arrogância de quem mantém a sua certeza metafísica mesmo tendo metido o pé na argola. Mas no caso do Orlando julgo tratar-se de humildade. Ser humilde é admitir os seus próprios erros, e a adenda do Orlando demonstra claramente os erros que ele comete. Além disso, revela também que o Orlando tem muito por que ser humilde.
Depois de deambular por uma introdução, ironicamente, sobre a crítica de António Sérgio às introduções deambulantes que nada adiantam, o Orlando reitera que as esponjas têm sensivelmente o mesmo número de genes que nós, que os genes se alinham da mesma forma e que as esponjas partilham alguns genes com os humanos. Finalmente, aponta que os investigadores não sabem porque precisam as esponjas de 705 genes de enzimas de fosforilação. Infelizmente, o Orlando também não esclarece este enigma, concluindo apenas que compreende «o desespero do naturalista em causa (naturalista = darwinista + ateísta)». Penso que fala de mim, aqui.
Eu não estou desesperado. Talvez só um pouco desiludido por seiscentos milhões de anos de evolução, desde a esponja ancestral, terem feito tão pouca diferença a alguns ramos da família. Mas não vejo razão para duvidar dos mecanismos propostos para essa evolução. A selecção natural de alterações aleatórias e hereditárias.
Os genes controlam toda a bioquímica celular e a nossa é muito parecida com a da esponja. E se desenharmos a árvore da vida à escala das gerações ficamos juntos à esponja num raminho pequenino. Por isso da evolução não se espera diferenças tão grandes como as que exige o ego de quem sonha ser criado à imagem de um deus. E quando se diz que a esponja partilha genes com os seres humanos quer-se dizer que são parecidos. Não se quer dizer que sejam os mesmos, exactamente iguais, como se um criador tivesse feito copy-paste.
O alinhamento semelhante dos genes também não é mistério. Um gene não é uma unidade independente do resto. Os genes operam em conjunto, guiando a síntese de proteínas que interagem em redes metabólicas, na regulação do desenvolvimento e assim por diante. Muitos genes que operam em conjunto são parentes próximos, descendendo de um gene ancestral recente. E estes grupos tendem a ser regulados em conjunto, activados e reprimidos em grupo. Factores como estes levam a que os grupos de genes sejam preservados pela selecção natural, mantendo o tal alinhamento que tanto intriga o Orlando.
Noutro post onde o Orlando imagina ter muita razão, mesmo nunca dizendo em quê, afirma que: «Quando se pergunta, por exemplo, a um naturalista porque é que a esponja tem aproximadamente o mesmo número de genes do que o ser humano, o que pressupõe um desenho biológico e não apenas o império das forças do acaso na organização do universo, o naturalista invariavelmente responde: “a ciência ainda não sabe, mas vai saber”.»(3)
Não sei a que “naturalista” o Orlando perguntou isto. Talvez tenha confundido a palavra e passado a tarde numa praia de nudismo a perguntar por esponjas a quem passava. Porque os biólogos têm uma explicação bem fundamentada para isto. A bioquímica da esponja é muito parecida com a nossa e é preciso muitos genes para a controlar. Em geral, os organismos têm mais genes do que do que precisariam se fossem criados de forma inteligente, precisamente porque são produto de um processo cego de acumulação de características hereditárias. À esponja não calhou ficar com 705 cinases por criação inteligente, por exemplo. E aquilo que temos de especial como mamíferos, a nossa inteligência, vem principalmente da interacção com o ambiente. Ao contrário da esponja, nós temos de aprender para saber.
E talvez seja esta a lição mais importante aqui. A esponja nasce sabendo tudo o que pode saber. Está tudo de forma robusta nos seus genes; faça frio ou calor, luz ou escuro, a esponja cresce esponja. Nós precisamos dos estímulos certos. E precisamos de experimentar, pensar, duvidar, questionar e testar ideias para aprender. Podemos ir muito mais longe do que a esponja. Mas se passarmos o tempo a olhar para o nosso umbigo – ou a ler os ensinamentos de quem passou a sua vida a olhar para o seu – nos poucos instantes em que olharmos em volta tudo vai parecer um grande mistério. Talvez acontecesse o mesmo à esponja se tivesse umbigo e olhos mas continuasse desprovida de cérebro.
1- Treta da semana: a esponja do O.B.
2- Orlando Braga, Esta gente vota.
3- Orlando Braga, O eterno argumento naturalista: “A ciência ainda não sabe, mas vai saber”
"Em resposta, o Orlando apagou o meu comentário e escreveu uma adenda ao seu post, sem mencionar sequer a minha chamada de atenção."
ResponderEliminarCuriosamente num daqueles destaques feios que o blog do Orlando tem na barra lateral pode ler-se "AQUI A LINGUAGEM É LIVRE"
Orlando, aproveita a onda das adendas e acrescenta lá por baixo: "excepto quando expõe as tangas que eu tento impingir neste blog"
Vamos lá a ver se nos entendemos Ludwig. Os estúpidos e parvos fazem parte da vida. Eles existem e não vão deixar de o ser. Vive com isso e "let it be". Senão vais-te arrepiar e irritar demasiado. Confia em mim...
ResponderEliminarBarba,
ResponderEliminarNão estão irritados. Quando a vida me dá limões, faço limonada. Quando me dá destas coisas, faço troça. :)
90% da net é treta.... digamos que tens muito combustível na paisagem :D
ResponderEliminarE a limonada é boa! ;-)
ResponderEliminarLudi,
Já não é a primeir vez que tu aqui dizes que não fazes troça das pessoas, mas das ideias. Eu sei disso, e só por isso é que alguns dos teus post mais sarcásticos não me incomodam.
Quando por exemplo comparas a crença em Deus, com a crença no Pai Natal, a mim tanto me faz, sinceramente estou-me nas tintas para o que pensas :-). Eu acredito eu Deus e se tu acha isso tolo, fixe pra ti!
Agora para muitas outras pessoas essas crenças são o que as define, fazer troça delas é fazer troça da pessoa, e ai o problema já é outro. As pessoas não vem os teus post como uma critica à ideia, mas sim como uma ofensa pessoal, nesse caso a resposta será, pessoal.
Quando tu dizes acreditar em Deuses é estúpido, eles sentem que lhes chamaste estúpidos.
«Este gajo não sabe ler inglês, e ainda arrota postas de pescada» Isto não me surpreende nada...Como não me surpreendem os comentários a sugerir a tua proximidade com o anti-semitismo e companhia limitada, bla bla bla etc.
Isto é mais a titulo informativo, se bem que suponho que já tinhas dado por isso.
beijos
Joaninha,
ResponderEliminarConcordo. Eu sei que criticar ou gozar com uma crença vai levar os crentes a pensar que estou a gozar com eles. E admito que a diferença entre dizer que alguém faz algo estúpido ou dizer que é estúpido pode ser muito pequena.
No entanto, não vou deixar de dizer o que penso só por poder ofender alguém. Quanto mais não seja porque se podem ofender com o que quer que seja. O mais que posso fazer é não me preocupar muito quando reagem dessa forma :)
Agora, tenho de te fazer uma pequena correcção. Tal como os outros crentes, tu não acreditas em Deus. Não podes, porque não tens aí um deus em quem acreditar. Tu acreditas é numa ideia que formaste acerca de Deus, em certas coisas que te disseram acerca desse deus (não em todas, certamente), e assim por diante. Ou seja, acreditas em parte do que por aí se pensa e se diz acerca de Deus.
O que não é mau. Acaba por ser o que eu faço também. Eu acredito em certas afirmações que penso e que oiço dizer acerca de Deus. Como "Deus não existe", por exemplo.
A questão interessante, visto que neste assunto o máximo que podemos fazer é acreditar em afirmações (o suposto objecto da crença nunca dá a cara ou se manifesta), é a forma como escolhemos em que afirmações acreditar.
Eu escolho as mais plausíveis, mais fundamentadas e mais prováveis de acertar na verdade. Pergunte-me como. :)
Ludi,
ResponderEliminar"No entanto, não vou deixar de dizer o que penso só por poder ofender alguém. Quanto mais não seja porque se podem ofender com o que quer que seja. O mais que posso fazer é não me preocupar muito quando reagem dessa forma :)"
Nunca deixes de dizer o que pensas, não faças que dás-me um desgosto!
Acredito que Deus existe, com base em quê? Não sei ao certo...Quando descobrir serás o primeiro a saber. Penso muito sobre o assunto, vou-me colocando questões, ouço aqui e ali, e claro como todas as pessoas tb tenho os meus momentos de duvida...(são muuuuuitos)
Esse pressuposto de que os crentes não pensam e não duvidam...é um bocadinho...huummm...infantil.
Para mim quem é crente tem necessariamente de duvidar, questionar etc...E pensar muito.
Mas a questão era só fazer ver que, às vezes, as ofensas pessoais que aqui te são dirigidas, são porque as pessoas tomam como pessoalmente ofensivos alguns dos teus textos, não os desculpa a meu ver, acusações de anti-semitismo são ridiculas, infundadas e injustas, o bom cristão devia ter mais tento na lingua ;-)
"Eu escolho as mais plausíveis, mais fundamentadas e mais prováveis de acertar na verdade. Pergunte-me como. :) "
Hahahaha! Soa a vendedor de tratamento estético ;-)
Vá eu compro, explica-me lá ;-)
beijos
Nem todas as razões são racionais.... muitas decisões que tomamos são um sentimento que temos. Perguntem ao António Damásio, que ele explica ;)
ResponderEliminarJoaninha,
ResponderEliminar«e claro como todas as pessoas tb tenho os meus momentos de duvida...(são muuuuuitos)
Esse pressuposto de que os crentes não pensam e não duvidam...é um bocadinho...huummm...infantil.»
Acredito que tenhas dúvidas e penses. Mas julgo que há uma diferença importante, e que carece de justificação.
Quando tens dúvidas acerca do Pai Natal, do Odin, das promessas do Sócrates ou da maior parte das coisas, as dúvidas funcionam como uma parede. A hipótese só passa e é aceite se as evidências forem mais altas que a barreira da dúvida. Por isso, todas essas coisas de que duvidas acabas por rejeitar.
Mas com as ideias que tens do teu deus parece que fazes algo diferente. Surgem-te também dúvidas, e são muitas, mas tens ali algo (fé?) que faz um buraco na parede e a ideia passa. As dúvidas continuam, são muito mais altas que as evidências, mas a crença entrou pelo buraquinho e pronto, já não sai.
É isso? Ou lidas com as hipóteses que aceitas acerca do teu deus da mesma forma como lidas com as outras todas (dos outros deuses ou de outros temas)?
«Vá eu compro, explica-me lá ;-)»
Não deixes buraquinhos. Lembra-te que tudo o que acreditas ser verdade acerca do teu deus não foi esse deus que te disse. Foram pessoas que, no fundo, não sabem mais disso do que tu (ou eu) nem mais dessas coisas que das outras que tu não acreditas ser verdade acerca do teu deus.
É claro, podes não gostar do resultado, se fizeres isso :)
Ludi,
ResponderEliminarTens fé nas pessoas? Ou se preferires, tens fé na humanidade?
(desculpa a falta de assentos mas isto do eepc no colo é complicado de gerir)
As duvidas que tenho sobre o "meu Deus" são exactamente as mesmas que tenho sobre Odin, até porque o meu Deus podem bem ser o Odin...Não sei, é como te digo, quando descobrir serás o primeiro a saber.:-)
Agora acredito que ele existe.
Não tenho nem nunca tive grande jeito para a retórica e para a conversa da treta por isso não te vou aqui escorrer um enorme comentário cheio de seres que são um e três e os mistérios da fé e essas coisas todas.
Sei no entanto que, as pessoas apreendem o mundo de forma diferente, cada um interpreta e assimila os dados que lhe são fornecidos de forma diferente.
Tu tens a tua forma de analise e interpretação dos dados e a tua forma de apreender a verdade acerca do que te rodeia.
Acreditas firmemente que a única forma de chegar à verdade é essa, e interpretas a informação exterior através dos filtros que tu estabelecestes como os melhores.
Esses filtros que vais construindo são consequência de muita coisa.
Os meus filtros serão diferentes, assim como os filtros dos outros comentadores serão diferentes. De outra forma não terias politicos de quadrantes diferentes, religiões diferentes, filosofias diferentes etc, etc,
Nada de estranho até aqui certo?
Mas importante mesmo era responderes à questão em cima, please :)
Beijos
Ludwig,
ResponderEliminaralguém o acusou de anti-semita?
E se o acusassem, por exemplo, de estar nos antí-podas das evidências? De anti-cristão?
Joaninha,
ResponderEliminar«Tens fé nas pessoas? Ou se preferires, tens fé na humanidade?»
Sim e não. O problema é que a palavra “fé” dá para muita coisa. Quando compro uma garrafa de água tenho fé que não vem envenenada. Quando alguém me pergunta as horas na rua tenho fé que não vai sacar de uma pistola e matar-me.
Mas apenas nos sentido de ter confiança por razões que posso partilhar. Imagina que estou a discutir isto com alguém que está indeciso. Posso mostrar as estatísticas, que o tiroteio na rua é muito raro, que há muitas garrafas de água consumidas todos os dias. Ou mostrar os processos, como é embalada, os motivos que levam as pessoas a perguntar as horas, etc.
Se encontrares uma pessoa racional que não saiba se há de fugir quando lhe perguntam as horas, penso que lhe podes explicar facilmente porque não precisa ter esse medo todo.
Mas isto é uma fé diferente da fé que Jesus é Deus, por exemplo. Se quiseres explicar a essa mesma pessoa que Jesus é Deus já não consegues. Porque aí não tens razões para essa fé que possas partilhar com alguém que não tenha a fé logo à partida. E, nesse sentido, “fé” é algo diferente. É algo que substitui as razões em vês de vir como consequência das razões.
«Tu tens a tua forma de analise e interpretação dos dados […] Os meus filtros serão diferentes, assim como os filtros dos outros comentadores serão diferentes»
Não tenho a minha forma de análise que seja minha. Uso a que funciona. A que se usa na investigação científica, nos tribunais, no diagnóstico de doenças, na mecânica automóvel, na construção civil, etc. E se comparares as várias que andam por aí, verás que essa ideia de cada um ter a sua não é muito boa. Como é que seria o sistema de justiça se assumíssemos que todas as formas de interpretar os dados são igualmente válidas? Ou como é que construíamos casas?
O meu problema aqui não é o que tu acreditas. Se acreditas num deus porque queres, tudo bem. O meu problema é essa ideia que a tua crença num deus resulta de um processo de interpretação de dados tão legítimo como qualquer outro. Disso discordo. Se interpretares os dados da forma que sabemos conduzir a ideias correctas da realidade – testando as hipóteses e avaliando-as sem preconceitos ou favoritismos – chegas à conclusão que as crenças religiosas são fruto da imaginação humana. Para concluíres que existe um deus tens de abrir uma excepção. Tens de decidir que, para esta hipótese, não vais exigir evidências objectivas mas simplesmente uma interpretação subjectiva que te permita chegar à conclusão que queres.
Se isso estiver claro não há problema. Mas se confundes esse atalho com uma forma legítima de chegar à verdade dá muita confusão (como podes ver facilmente aqui nestas caixas de comentários :)
Carlos,
ResponderEliminar«alguém o acusou de anti-semita?»
Até de nazi, e só por causa do nome.
«E se o acusassem, por exemplo, de estar nos antí-podas das evidências? De anti-cristão?»
Não percebo a pergunta. Quer saber o que eu faria? Nada. Quer saber se teriam razão? Não. Sou um bocado anti-cristianismo, porque acho a ideia absurda, injusta e assente em premissas falsas. Mas não sou contra as pessoas só por lhes terem ensinado isso em criança.
Ludi,
ResponderEliminarNão considero que tenhas propriamente respondido à pergunta, mas faço-a de outra maneira.
Tens fé nas generalidade das pessoas na generalidade das situações? Ou seja, acreditas que as pessoas são tendencialmente boas?
"Não tenho a minha forma de análise que seja minha. Uso a que funciona. A que se usa na investigação científica, nos tribunais, no diagnóstico de doenças, na mecânica automóvel, na construção civil, etc"
Tens, desculpa mas tens, a maneira com que as pessoas apreendem aquilo que as rodeia difere de pessoa para pessoa, isso é um facto, a maneira como as pessoas interpretam um texto, um resultado estatistico, os sintomas de uma doença difere consoante a pessoa.
Vamos por exemplo para a interpretação da lei. Existem na primeira parte do codigo civil art 9 e 10 regras de interpretação legal. Devem ter-se sempre em conta estas regras aquando da interpretação de um art. legal, se não o fizeres a tua interpretação corre o risco de não ser valida.
No entanto, mesmo seguindo estas regras, o mesmo texto legal é interpretado de forma diferente.
Chegando ao ponto de duas partes em litigio usarem os mesmos preceitos legais para justificar posições opostas.E ambas as interpretações são correctas. Caberá ao juiz decidir, e nestes casos a sua decisão é muitas vezes subjectiva, com base em factos que podem gerar várias interpretações.
Tu não aceitas como válidas interpretações de factos que não tenham por base provas cientificas, ou que possam ser testadas cientificamente. Eu, depende...Depende de várias coisas. Não gosto de me limitar ao, "ou se prova cientificamente ou é mentira!"
depois continuo.
Beijos
Há aqui alguém que não sabe distinguir entre "Anti-Cristão" e "Anti-Cristianismo". Imagine o senhor Carlos que lhe pergunto se é Anti-Comunista? Quer isso dizer que é a favor do desprezo e descriminação contra os comunistas? Não, obviamente. Quer dizer que é contra a ideia do comunismo.
ResponderEliminarO problema do cristianismo como a maior parte das religiões é o apego extraordinário que os aderentes têm à ideia, de modo que qualquer ataque a esta, é lida como um ataque pessoal. Veja-se o parvo do Nuno, que repete esta ideia ad nauseam, apesar de se lhe ter explicado isto mil vezes (e daí ser parvo.... há certos insultos que são objectivamente verdade...)
Joaninha,
ResponderEliminar«Tens fé nas generalidade das pessoas na generalidade das situações? Ou seja, acreditas que as pessoas são tendencialmente boas?»
Acredito que a maioria das pessoas é tendencialmente boa, se o ambiente em que crescem o proporcionar. Isto quer dizer que não fujo das pessoas na rua e que interajo com elas sem grande desconfiança. Mas não quer dizer que deixe os meus filhos com estranhos, dê a chave de casa a qualquer um ou confie na primeira pessoa que encontre para me guardar a carteira enquanto eu vou a casa. Tenho uma confiança temperada pela minha experiência e pela margem de erro nas minhas estimativas do comportamento alheio.
E não é por fé, pelo menos não pelo que se entende por “fé” no contexto de uma discussão sobre religião. É por extrapolação de dados objectivos.
«a maneira com que as pessoas apreendem aquilo que as rodeia difere de pessoa para pessoa, isso é um facto»
Concordo. E é mesmo isso. A maneira de apreender difere de pessoa para pessoa. E isso é um facto. Um facto. Não algo subjectivo que seja verdade para uns e falso para outros. Pensa bem nas implicações do que tu própria escreveste.
Supõe que eu apreendia o que me rodeia de forma a concluir que todas as pessoas apreendem tudo da mesma forma. Nesse caso tinha apreendido isto de forma diferente da tua, porque tu concluis que as pessoas podem apreender o que as rodeia de formas diferentes. Mas, além disso, tu estás também a alegar que isto é um facto. De facto, as pessoas apreendem de formas diferentes. E, por isso, de facto, eu estaria enganado se concluísse que as pessoas apreendem as coisas todas da mesma forma.
Esta é a diferença entre crença e conhecimento. Crença é tudo o que julgamos. Mas só pode ser conhecimento se corresponder aos factos – e esses não somos nós a decidir – e se pudermos justificar que corresponde aos factos.
E é esta diferença que eu aponto. Uns lêem a bíblia e interpretam aquilo como histórias escritas por pessoas. Outros como a palavra literal e inerrante de Deus. Outros como uma obra de inspiração divina a ser interpretada desta forma, outros da outra, outros como um livro de uma falsa religião, porque a deles é que é, e assim por diante.
E, no meio disto tudo, há um facto. E é esse que me interessa. Por isso defendo que não se interprete os dados como se queira, mas que se siga as evidências daquela forma que melhor nos leva aos factos. E, parece-me, essa não é a fé.
«Vamos por exemplo para a interpretação da lei. [...] mesmo seguindo estas regras, o mesmo texto legal é interpretado de forma diferente.
Chegando ao ponto de duas partes em litigio usarem os mesmos preceitos legais para justificar posições opostas.»
A lei é uma invenção humana, escrita por humanos, e que só tem efeitos quando interpretada e seguida por outros humanos. Se toda a gente decidir ignorar uma lei (toda a gente, incluindo polícias e juízes) essa lei deixa de ter efeito. Se toda a gente interpretar “homicídio” como significando assobio, vai muita gente presa por assobiar.
O caso é diferente se lidares com factos como, por exemplo, a existência de um deus. Ou existe, ou não existe. Não é matéria de interpretação, argumentação ou assim. É facto. E com esses factos se duas pessoas chegarem a conclusões opostas uma está, de facto, enganada.
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderEliminarLudwig,
ResponderEliminarTalvez só um pouco desiludido por seiscentos milhões de anos de evolução, desde a esponja ancestral, terem feito tão pouca diferença a alguns ramos da família.
Sim, de facto é de se ficar desiludido com o que a evolução não fez durante estes (provisoriamente) "600 milhões de anos". (Amanhã esta data pode ser alterada)
Dinossauros vieram e forma, mamíferOs vieram, répteis passaram a ser pássaros, mamíferos passaram a ser baleias, a crença na teoria da evolução evoluiu, mas a esponja está como está.
O alinhamento semelhante dos genes também não é mistério. Um gene não é uma unidade independente do resto. Os genes operam em conjunto, guiando a síntese de proteínas que interagem em redes metabólicas, na regulação do desenvolvimento e assim por diante. Muitos genes que operam em conjunto são parentes próximos, descendendo de um gene ancestral recente. E estes grupos tendem a ser regulados em conjunto, activados e reprimidos em grupo. Factores como estes levam a que os grupos de genes sejam preservados pela selecção natural, mantendo o tal alinhamento que tanto intriga o Orlando.
Isto não explica como é que formas de vida tão distintas podem ser genéticamente tão semelhantes.
O que estás a dizer pode ser dito como: "Ah, os genes andam em bandos, portanto se um muda, todos mudam. hehehe!"
Que tipo de explicação "científica" é essa?
Além disso, existem evidências de que estruturas semelhantes (supostamente análogas) são controladas por genes distintos. Se uma evoluiu da outra, ou se há um parente comum, isto nunca deveria acontecer. Se a evolução encontrou uma "solução" para codificar para pernas, porque é que as formas de vida que supostamente evoluiram da forma onde se surgiu essa "solução" progrediram usando formas de codificação distintas uma das outras?
ResponderEliminarA típica resposta darwinista é: a evolução escolhe o que é melhor. "Se aconteceu é porque é a melhor opção". Ou seja, não explica nada.
Ainda dizes tu que o "Modelo naturalista" é superior ao modelo Bíblico. Tu com o esse modelo podes apontar para a mesma força como responsável por resultados mutuamente exclusivos. Desta forma, a "evolução" fica totalmente salvaguardada de falsificação uma vez que acomoda qualquer cenário que seja observado. ISto não é ciência, mas, como disse Karl Popper, "metafísica" mascarada de ciência.
Mais outra confusão: o número de genes não é igual à informação contida nos genes. Qualidade =/= Quantidade. A provar está a quantidade incontável de livros nonsense que os nossos amigos criacionistas produzem todos os dias versus as 46 paginazinhas que o nosso amigo Einstein usou para revolucionar toda a física mecânica no séc XX.
ResponderEliminarAinda dizes tu que o "Modelo naturalista" é superior ao modelo Bíblico. Tu com o esse modelo podes apontar para a mesma força como responsável por resultados mutuamente exclusivos. Desta forma, a "evolução" fica totalmente salvaguardada de falsificação uma vez que acomoda qualquer cenário que seja observado. ISto não é ciência, mas, como disse Karl Popper, "metafísica" mascarada de ciência.
ResponderEliminarNão é totalmente verdade. Aliás, Karl Popper mais tarde revogou esta sua opinião sobre o "darwinismo". Existem vários postulados que permitiriam falsificar a teoria geral. Dawkins está farto de propor uma: "Rabbits in the Pre-Cambrian layer", como demonstração da facilidade em desprovar a teoria... e de como ela nunca o foi.
«ISto não é ciência, mas, como disse Karl Popper, "metafísica" mascarada de ciência.»
ResponderEliminarA semelhança entre o Karl Popper e os criacionistas é ambos chegaram a ser ignorantes a respeito da teoria da evolução por selecção natural.
A diferença é que o primeiro aprendeu a esse respeito, admitiu a sua ignorância prévia, e corrigiu o seu erro. Os segundos quando o fazem deixam de ser criacionistas, claro está. Os que ainda são, não o fizeram.
Calma aí, JV. Antes de começares a chamar nomes a pessoas que, sem dúvida, têm ou tiveram mais QI do que todos nós juntos, mais vale ver o que ele realmente disse sobre o assunto. A questão de ele ver algumas partes da teoria darwiniana como tautológicas não é assim tão "ignorante" como isso (existem bastantes críticas a neo-darwinistas que se levam demasiado a sério com as chamadas "just-so stories", como por exemplo o Stephen Jay Gould, que não é "ignorante" nenhum).
ResponderEliminarUm pouco de pesquisa faz bem às mentes, evita esta mania de ver tudo a preto e branco (antes ele estava errado, depois corrigiu-se, etc)
Barba,
ResponderEliminarClaro que a teoria da evolução é tautológica. Qualquer teoria científica é -- assume uns princípios, e deduz daí consequências em proposições tautológicas.
Por exemplo, se numa população de replicadores há mutações que afectam características herdadas e que têm influência na taxa de reprodução, a população vai evoluir tendencialmente para o aumento da frequência dessas características. isto é tautológico -- esta proposição é necessariamente verdadeira.
O que é testável é a aplicação de modelos gerados pelas teorias. Não é tautológico que a vida num dado planeta se conforme a esta afirmação condicional, e isso tem de ser testado gerando modelos de acordo com esta teoria e vendo se correspondem ao que se observa.
E Popper disse exactamente, explicitamente, enganei-me e agora corrijo-me:
«“I have changed my mind about the testability and logical status of the theory of natural selection; and I am glad to have an opportunity to make a recantation” (Dialectica 32:344-346).
[...]
[B]iologists employ optimization analyses to predict which combinations of morphological, behavioral, or physiological traits are more likely to be advantageous (i.e., to increase “fitness”) in the range of environments actually encountered by a given living form. They then sample natural populations of organisms, determine in which environments they actually live, measure those traits they hypothesize are more likely to make a difference, and obtain statistical predictions on where natural selection should push the population next. Finally, biologists wait until the next generation of organisms comes out and measure their characteristics again.»
daqui
Ludwig, por tautológico, tanto eu como Popper estamo-nos a referir a uma ideia que seja sempre verdade, independentemente das observações empíricas, tu estás-te a referir à "óbviosidade" de que todas as inferências lógicas de premissas são "tautológicas".
ResponderEliminarDou um exemplo que te explica bem a coisa. Por exemplo, eu não olho para o exterior mas digo: "Ou está a chover ou não está". Esta afirmação é tautológica. É sempre verdade, indepedentemente de estar a chover ou não. A questão é se a teoria darwinista é uma teoria que diz qualquer coisa do tipo "Está a chover lá fora" ou se está a dizer "Ou está a chover ou não está".
Popper referia-se à teoria darwinista como provavelmente sendo tautológica neste segundo sentido. Ou seja, a teoria estaria sempre certa, independentemente dos dados empíricos que se encontrassem. Por exemplo, se é encontrado que determinado ser vivo tem determinada característica aparentemente herdada por outro ser vivo, então esta característica é verificada pela teoria. Se por outro lado se confirmar que essa característica não é, afinal, herdada, este facto também é confirmado pela teoria.
Claro, como bem dizes, ele refere-se depois a testes empíricos que podem muito bem confirmar a teoria em muitos casos específicos. Embora seja de referir que estes casos são argumentos estatísticos, o que não é tão confortável como dados empíricos directos, como uma observação de um fotão, etc. Mas a quantidade deste tipo de dados é-me perfeitamente suficiente.
"Acredito que a maioria das pessoas é tendencialmente boa"
ResponderEliminarEu acredito no contrário, acredito que as pessoas são tendencialmente más. Mas pronto é a minha interpretação do que me rodeia.
Acredito que o ambiente as condiciona para agir de determinada forma, mas tendencialmente são más e sempre que podem mostram-no.
Eu não estou a falar da veracidade do facto, estou a falar da interpretação desse mesmo facto.
Ou seja, o perfume por exemplo Channel 5.
Existe é um facto, tem cheiro e outras características físicas que são factos. Ninguém está a discutir esses factos.
Agora para mim o perfume é bom, eu gosto dele e é agradável para o meu olfacto.
Para ti (não faço ideia) pode ser péssimo e dar-te enjoo.
Isso não quer de todo dizer que a minha interpretação esta errada nem que a tua está errada, quer dizer apenas que interpretamos as coisas de forma diferente.
A teoria da evolução é verdade, é um facto e eu não ponho isso em causa. A interpretação que eu faço da verdade dessa teoria desse facto é que é diferente da tua.
A vida existe é um facto
desenvolveu-se de determinada forma facto aliás mais que demonstrado.
Para ti isso foi tudo fruto do acaso, esse acaso basta-te. eu acho que esse acaso é um grande grande acaso e interpreto esse acaso de forma diferente da tua.
Não digo que foi o Deus A B ou C nem que o faz assim ou assado, nem sequer considero que Deus seja algo com propriedades físicas...
"Não tenho a minha forma de análise que seja minha. Uso a que funciona. A que se usa na investigação científica, nos tribunais, no diagnóstico de doenças, na mecânica automóvel, na construção civil, etc. "
Só falei da lei porque tu deste o exemplo aqui.
Não sei se me fiz entender...
Beijos
escrevu.....já ninguém aponta os erros
ResponderEliminarmeu deus
Um gene não é uma unidade independente do resto.....
Os genes operam em conjunto,
podemos ter características poligénicas
mas também há monogénicas
em esponjas de espículas calcárias um gene estimula the creation. of extra nerve cells, um gene num organismo sem sistema nervoso
tal gene não existe nas esponjas de espículas siliciosas
ou sobre a morte programada apoptosis
pode ler...sobre as esponjas são 50 ou 54 páginas
depende da versão
pdf ou ...
Marine Biotechnology Research in
Florida Sea Grant 1996-2003: An
Outreach and Communication Foundation
Mark Schrope
Florida Sea Grant College Program
March 2004
Technical Paper 134
????,
ResponderEliminar«mas também há monogénicas»
Sim. Mas características monogénicas são características que variam pela mutação de um só gene. Não são características que resultem de um gene sozinho. Para formar o organismo, e todas as suas características, é preciso a interacção coordenada de muitos genes. E, por isso, é de esperar pressões selectivas para manter uma certa estrutura no alinhamento dos genes.
Barba,
ResponderEliminar« tanto eu como Popper estamo-nos a referir a uma ideia que seja sempre verdade, independentemente das observações empíricas,»
Mas é isso. E é essa a confusão.
A base da teoria da evolução é sempre verdade independentemente das observações empíricas. Dadas umas certas premissas, segue-se aquela conclusão. É como a geometria Euclideana, as geometrias não euclideanas, a álgebra de Boole, a física de Newton, etc. Por si só, as teorias são conjuntos de proposições em que umas seguem tautologicamente das outras.
Mas a questão interessante é em que situações, na prática, se pode aplicar uma teoria para prever algo acerca da realidade. E isso já não é tautológico. É uma questão empírica. E é a resolução desse problema que faz com que a teoria deixe de ser um mero jogo de símbolos e passe a ser uma descrição da realidade, e conhecimento.
E esta foi a confusão de Popper, também. Ele considerou a teoria da evolução apenas em abstracto desligada das evidências que mostram que a teoria se aplica à origem e transformação das espécies que temos aqui na Terra.
Joaninha,
ResponderEliminarO que estamos aqui a discutir não é análogo a se o Chanel No. 5 é bom ou mau. Isso seria se estivéssemos a discutir se o teu deus é bom ou mau. E, nesse caso, admito que podíamos acabar discordando mas sem que nenhum de nós tivesse mais razão que o outro (ou a outra ;) porque seria uma questão de valor.
Mas o que estamos a discutir é análogo a discutir se existe o perfume chamado Chanel No. 5. Essa é uma questão de facto da qual, se discordarmos, pelo menos um de nós estará enganado. E é uma questão que se resolve melhor não por opiniões subjectivas mas por evidências objectivas.
Mats,
ResponderEliminar«Além disso, existem evidências de que estruturas semelhantes (supostamente análogas) são controladas por genes distintos. Se uma evoluiu da outra, ou se há um parente comum, isto nunca deveria acontecer.»
Podes dar um exemplo específico. Assim em abstracto não sei se estou a perceber o que estás a dizer (mas nota que os genes também evoluem -- por duplicação e mutação -- pelo que a regulação de um processo numa espécie pode ser diferente da regulação de um processo análogo noutra, mesmo descendendo esses conjuntos de genes de ancestrais comuns).
Ludi,
ResponderEliminarMas eu não estava a discutir isso :-). Eu bem me parecia que havia aqui uma falha de comunicação.
Para mim Deus o facto de Deus existir não é o mesmo que o channel existir.
Para mim Deus existir é uma opinião subjectiva a que eu chego pela interpretação que faço daquilo que me rodeia. Por isso mesmo admito e tenho todo o respeito por quem não acredita, por saber que a minha opinião se baseia na minha interpretação pessoal daquilo que me rodeia.
beijos
Joaninha,
ResponderEliminar«Para mim Deus existir é uma opinião subjectiva a que eu chego pela interpretação que faço daquilo que me rodeia.»
OK. Tu achas que é uma coisa boa viveres a vida como se fosse verdade aquilo que julgas de Deus. E é uma opção perfeitamente legítima. E reconheço-te o mérito adicional de aceitares que outros façam o mesmo com outras opiniões acerca desse deus, de outros deuses ou de deus nenhum. Nisso estamos de acordo. Enquanto decisão subjectiva de aceitar certas ideias como se fossem verdade, não tenho nada a dizer.
O que me preocupa é a confusão, que ainda não sei se tu fazes mas que vejo muitos fazer, entre essa decisão subjectiva de "vou viver a minha vida como se isto fosse verdade" e a alegação objectiva de "isto é mesmo verdade".
Acerca dos deuses e das hipóteses que me propõem para os descrever, eu optei por só considerar verdade aquilo que objectivamente se justifique considerar verdade. Ou seja, vou fazer como se deve fazer em ciência, na construção civil, no tribunal, no diagnóstico médico e na mecânica automóvel. Vou pôr de lado o que eu gostaria ou não gostaria que fosse verdade, e analisar a questão como julgo o faria qualquer pessoa que não tivesse qualquer preferência pelo desfecho.
E é por isso que eu digo que, ao contrário da tua crença, o meu ateísmo não é uma opção meramente subjectiva, mas, no que toca aos factos, resulta de uma tentativa sincera de ser objectivo.
É claro que também admito que, se o teu deus existisse, então eu provavelmente seria ateu como tu és crente. Por uma opção puramente subjectiva. Admitindo que nada posso fazer quanto aos factos, ainda assim sentiria tal repugnância que preferiria viver como se esse deus não existisse. Felizmente, não parece ser necessário fazer isso :)
Beijos,
L
Ludwig, há aqui um pequeno equívoco quando dizes que a "base" da teoria é tautológica. Não, não é, nem tu acreditas nisso pois és empiricista, e não propriamente um aderente a platonismos ou a ideias a priori, etc.
ResponderEliminarPasso a explicar. Quando Popper disse que a TE (darwiniana) é provavelmente tautológica, ele referia-se à incapacidade de a falsificar. Que, independentemente das observações empíricas, todas elas confirmavam-na, pois todas seriam "compatíveis" com a teoria. Daí a acusação de "metafísica". Concordarás comigo que qualquer teoria científica, se não for falsificável empiricamente, não é científica. Pelo menos ainda não.
Quando dizes que todas as teorias são tautológicas, estás a abusar de uma palavra que é usada de modo diferente. A tautologia refere-se a uma circularidade lógica, a uma inevitabilidade lógica. A TE depende, apesar de tudo, da validade das observações empíricas sobre os fósseis, sobre a sua datação, estratificação, hierarquias de complexidade, etc. Qualquer teoria científica é, primeiro, uma hipótese que se levanta através da confrontação entre teorias existentes e observações que apontam para uma verdade mais profunda qualitativa ou quantitativamente.
Neste sentido, não há teoria científica que seja tautológica. Toda ela assenta numa base empírica instável. Aquilo que se pode dizer é que a ciência usa bastante de tautologias: "Ora isto só pode ser assim ou assado, por isso vou experimentar a ver o que acontece..." Mas isto é fundamentalmente diferente do que Popper alegava.
Ludi,
ResponderEliminarQuanto a essa confusão eu realmente não a faço, não digo que Deus existe, digo que perante aquilo que observo e da maneira como interpreto parece-me plausivel a existencia de Deus. Mas isto é uma opinião minha, subjectiva, pensada e claramente influenciada pelos meus filtros cognitivos.
Confesso-te que acho a prespectiva ateista do mundo redutora, como acho o fundamentalismo religioso igualmente redutor.
A coisa é assim.
Uma flor tem petala, sepalas, e cheiro e etc e tal, tem o seu objectivo, cada um dos orgãos, foi criada e desenvolveu-se daquela maneira que sabemos cientificamente, etc etc e tal.
Tu dizes, com base em dados cientificos isto é fruto do acaso. Eu não digo que não, acho é que esse acaso é extraordinário, fabuloso, lindissimo, e chamo-lhe Deus.
Mas eu não sou boa da cabeça por isso não me dês muita atenção. Concentra-te nos teologos de serviço, tem coisas mais interessantes para dizer :-)
beijinhos
Joaninha,
ResponderEliminar«Tu dizes, com base em dados cientificos isto é fruto do acaso.»
Não. Tem causas. Tem razões. As flores são como são porque as que não eram ficaram pelo caminho e não deixaram descendentes.
Imagina que no chão há pedras, areia e terra fina. Vem um vendaval e ficam as pedras, alguma areia, e a terra fina voo. É por acaso? Claro que não. É porque a terra fina é mais leve. É por plano divino? Também não é preciso invocar isso; já temos uma explicação para o fenómeno sem ter de imaginar que veio um deus tirar de lá a terra fina e a areia mais leve e deixar só os pedregulhos.
A teoria da evolução é uma explicação assim. Não é por acaso. Mas também não é por milagre. É por processos naturais que podemos descrever e compreender em detalhe sem precisar de deuses.
«Concentra-te nos teologos de serviço, tem coisas mais interessantes para dizer :-)»
Sinceramente, nem por isso. A conversa contigo é bem mais interessante -- mais clara e honesta. Só dedico mais tempo a eles porque me irritam :)
Beijos,
L
Barba,
ResponderEliminar«Quando Popper disse que a TE (darwiniana) é provavelmente tautológica, ele referia-se à incapacidade de a falsificar.»
E estava correcto. Uma teoria científica, por si só, não é falsificável. É como tentar falsificar a geometria Euclideana.
A forma de testar estas teorias é instanciando-as em modelos. Essa foi uma que escapou ao Popper, e uma razão pela qual não é boa ideia ficar pelo Popper quando se quer perceber filosofia da ciência. Lakatos, por exemplo, explica melhor isto (se bem que com uma terminologia diferente).
O problema, a meu ver, é assim. F = m.a não pode ser testado por si só. Tens de medir massas, velocidades e forças, e para isso precisas de modelos dos instrumentos, modelos do sistema com os valores que medes, etc. E o que acabas por testar são esses modelos. Supõe que medes que a aceleração de uma bola de 1kg sujeita a 1N é de 2ms-2. Não falsificaste a teoria mas sim o modelo. Ou o modelo de um dos instrumentos de medição, ou o modelo com os valores que puseste, etc.
A teoria só é testada indirectamente pela sua capacidade de gerar modelos falsificáveis que, esses sim, passem nos testes. Porque a teoria é um gerador de modelos (Lakatos fala em programas de investigação, que não é bem o mesmo mas dá uma ideia boa do problema de distinguir as premissas nucleares das premissas auxiliares testáveis).
Ludwig, bom, já me ensinaste qualquer coisa hoje, obrigado. Mas no fundo a diferença entre o meu modelo da ciência e o teu é apenas a adição de um termo "modelo", que pode ser importante em termos formais, mas não altera significativamente o que eu estava a dizer. As teorias são testadas pela sua capacidade de gerar modelos testáveis, como tu dizes e me parece bem escrito, enquanto que eu estava a dizer que as teorias são testadas empiricamente.
ResponderEliminarPosso reformular o que eu estava a dizer sobre "teorias tautológicas", ala Popper com a tua terminologia sem grandes alterações:
Uma teoria "tautológica" é aquela que só gera modelos intestáveis, enquanto que uma teoria não "tautológica" é aquela que é capaz de gerar modelos testáveis.
Por exemplo. Uma teoria climática super-simplista (que não existe, calma!) que diga que o planeta pode aquecer, mas também pode arrefecer, é uma teoria tautológica que não oferece modelos testáveis. Por outras palavras, é inútil, já que todos os cenários estão incluídos (quer aqueça, quer arrefeça, quer se mantenha "na linha"). Já uma teoria como a lei "F=ma" produz modelos testáveis incrivelmente precisos. É de uma facilidade atroz produzir modelos que podem, potencialmente, falsificá-la.
Mas convences-me de que terei de ler Lakatos. (E já agora Feyereband, etc.)
Barba,
ResponderEliminar«Uma teoria "tautológica" é aquela que só gera modelos intestáveis, enquanto que uma teoria não "tautológica" é aquela que é capaz de gerar modelos testáveis.»
Na prática, é mais complicado.
Por exemplo, a astrologia pode criar modelos tão testáveis como o astronomia. O problema é que quando os modelos da astrologia falham, os astrólogos não põem em causa a teoria central e vão postulando hipóteses auxiliares que a protegem.
O que também não é mau por si. Por exemplo, quando se reparou que Úrano tinha uma órbita anómala postulou-se que era por causa de um planeta ainda por descobrir e não por uma falha na teoria de Newton.
O problema surge quando se faz isso demasiadas vezes, e se protege cada vez mais a teoria central mexericando sempre em hipóteses adicionais. Como fazem os criacionistas e os astrólogos, por exemplo. E os teólogos na interpretação da Bíblia.
Já agora, se quisres, Kitcher tem uma formalização bastante densa mas interessante (The Advancement of Science), e também gosto do Giere (Scientific Perspectivism, por exemplo, é curtinho e apanha bem algumas coisas).
Acima de tudo, desconfia de soluções fáceis como o falsificacionismo e afins, e de quem diz "o não sei quantos determinou que a ciência coiso e tal". O problema é bastante mais complexo que isso e com muitas questões em aberto...
Ah sim, claro Ludwig. Não sou esse simplório :). Falsificacionismo é uma ideia bestial que funciona bastante bem se pegarmos no exemplo clássico de Newton e Einstein, mas já não funciona tão bem com modelos estatísticos, por exemplo (já que a falsificação de modelos estatísticos não existe "per se" e tão à vontade como os outros modelos mais claros).
ResponderEliminarMas é apenas uma de muitas. Gosto particularmente de uma frase de Feyereband, parafraseando diz qualquer coisa do género, a metodologia da ciência é "whatever goes", ou seja, não há metodologia "objectiva", existem é processos que adoptamos conforme a praticalidade dos mesmos. Que a prática da ciência evolui a par da própria ciência.
Gosto da ideia porque adivinha bastante bem que hajam neste século mudanças radicais na metodologia do fazer ciência, devido à criação de tecnologias e inteligências artificiais (leia-se algoritmos de busca de padrões, não a coisa do fantasma na máquina), o que me parece bem plausível. Mas há definições e práticas que dificilmente se alterem (como a importância das observações empíricas, por exemplo).
????,Aplicando o correcto estímulo, consegue-se por vezes a resposta..
ResponderEliminar«mas também há monogénicas»
Sim.
curioso....já agora se libertamos 75 megatones de CO2, da queima de combustíveis fósseis,é possível,o nº é seu, Portugal tem capacidade para os absorver
Um hectare de trigo produz uns 1500kg de grão mais 2,5 tones de palha
mais raízes e caules que ficam no solo, uns 6 a 7 tones de biomassa
essencialmente carbohidratos fixados num ano
campos com culturas irrigadas absorvem dezenas de tones de CO2 por hectare
8.000.000de ha mesmo a 10 tones de CO2 por ha absorvem 80 megatones
e há que contar com a absorção oceânica
não seriam precisas décadas, para repor equilíbrios, bastariam uns indivíduos baixarem significativamente os seus consumos.
Reposição das reservas de petróleo só daqui a muitos milhões de anos, mas temos ainda triliões de ton's de carbono para queimar
e vamos queimá-lo
os projectos de extracção do querogénio dos xistos betuminosos, estão de novo a arrancar, as areias asfálticas canadianas atingiram um pequeno pico de produção em 2009, portanto a sua descendência é capaz de ter alguns contratempos no futuro.
Ludi,
ResponderEliminarEu entendo o que queres dizer, e concordo.
Acontece porém que para mim, toda esses mecanismos da natureza, a selecção natural, o movimento das placas tectonicas, o funcionamento da celula, são de alguma forma aquilo que me faz crer que Deus talves exista mesmo.
"Não. Tem causas. Tem razões. As flores são como são porque as que não eram ficaram pelo caminho e não deixaram descendentes." Mesmo isto é de tal forma genial que me leva a concluir que é possivel que Deus exista. Mas é como te digo, é uma conclusão muito subjectiva, não digo que seja verdadeira, digo que é a minha.
Ok é uma visão romantica do mundo (nada o teu genero). Mas tb tenho dias em que duvido dessa beleza toda, quando dou de caras com uma aranha ou com uma centopeia, por exemplo ;-).
E sou profundamente ceptica relativamente a nós humanos, ainda estou para ver onde está a dita "beleza" no ser humano...
"Só dedico mais tempo a eles porque me irritam :)"
Tens um lado maso muito curioso ;-),
Acho mesmo que deve dar-lhes a devida atenção, porque eles merecem...Vai pois em paz e que Odin te acompanhe...hihihi
beijos