Novos modelos de financiamento.
No dia 27, o Simon Klose abriu no Kickstarter um projecto para um documentário sobre o Pirate Bay(1). O Kickstarter é um site onde qualquer pessoa pode submeter um projecto a apreciação pública e pedir financiamento. Cada interessado compromete-se com o valor que quiser, através da Amazon, e o dinheiro só é cobrado se for atingido o mínimo pedido pelo criador do projecto e o projecto avançar. Na página do projecto o Simon Klose explica que tem cerca de duzentas horas de filmagens, entrevistas com os fundadores do Pirate Bay e outro material, e precisa de $25.000 para tempo de estúdio e edição profissional.
No dia 28 recebi um email a avisar disto mas, como o cartão de crédito que tinha na Amazon já estava caducado, só hoje é que lá voltei, depois de actualizar os dados de pagamento. Neste momento as contribuições vão em $29.947. O Simon Klose tinha dado um prazo de 30 dias para conseguir os $25.000. Demorou três. Mesmo assim lá prometi os $30 que tencionava contribuir. Não é dinheiro que eu desse para comprar um DVD, porque pagar para ter acesso à informação é uma treta. Mas dou de bom grado para ajudar a fazer algo que me interessa. Estou a pagar pelo trabalho de fazer este documentário, e isso vale a pena. E se ele tiver mais algum dinheiro sempre pode fazer algo melhor. Ou ficar com mais no bolso, que também merece.
Muita gente ainda está céptica acerca disto. Acham que um autor não consegue cobrar pelo seu trabalho, que tem de ceder os seus direitos para poder ganhar dinheiro e que o único modelo viável de financiamento é pagar pelo acesso aos bytes em vez de pagar pelo trabalho de produzir as obras. Pois aqui têm. Se o Simon Klose tentasse vender este projecto à Time Warner ou à Sony Entretainment o mais provável era mandarem-no dar uma curva. E se aceitassem financiar aquilo ficavam com os direitos exclusivos sobre o trabalho dele, vendiam-no com as condições que eles quisessem e cobravam pelo acesso ficando com o dinheiro quase todo.
Este modelo é mais justo. É um modelo de mercado livre, em que as partes participam na transacção celebrando um acordo voluntário. E não precisa de legislação especial que proíba o acesso ou a partilha só para se poder cobrar portagens à informação. Uma vez pago o trabalho e feito o documentário, o autor tem o que quer. Dinheiro no bolso e público a apreciar a sua obra.
É claro que isto não satisfaz toda a gente. Por exemplo, não dá para fazer coisas como a Sony fez com os actores da série Glee. É uma série musical que tem tido sucesso, e a banda sonora com as versões cantadas pelo elenco da série tem vendido bastante. O que é bom para a Sony mas os actores, que cantam essas músicas, não recebem nada pelas vendas(2).
O que me parece é que se não fosse a propaganda dos distribuidores – e terem os legisladores no bolso – isto seria bastante óbvio. Um sistema em que o autor tem de ceder direitos exclusivos e o distribuidor fica com o poder legal de controlar o acesso à obra é um sistema que beneficia o intermediário. Não é concebido para proveito de quem cria nem do público que aprecia e quer financiar as obras. Infelizmente, continua muita gente convencida que a melhor forma de promover a inovação na arte é com monopólios, direitos exclusivos, proibições e batalhões de advogados.
1- Simon Klose, TPB AFK: The Pirate Bay – Away From Keyboard. Obrigado pelo email com o link para o projecto.
2- MSN Música, Elenco de Glee furioso. Obrigado pelo email com a notícia.
Outro exemplo de que este tipo de financiamento (o público pagar por algo que quer) funciona, ainda que não seja propriamente relacionado com arte, foi o sucesso estrondoso do kickstart do projecto Diaspora (http://www.kickstarter.com/projects/196017994/diaspora-the-personally-controlled-do-it-all-distr), para o qual queriam angariar $10000 em pouco mais de dois meses, conseguiram-no em apenas 12 dias (http://www.joindiaspora.com/2010/05/08/we-did-it.html) e no final do prazo do kickstarter, acabaram com $200000 no bolso - só 20 vezes o que pediram.
ResponderEliminarSe este tipo de coisas não mostra que o público está disposto a pagar coisas que realmente interessem, não sei o que mostra.
E isto leva-me a pensar que o que as grandes editoras querem é poder continuar a enfiar-nos as mesmas porcarias repetidas pela goela abaixo sem que ninguém faça muitas ondas, para que eles possam continuar a ganhar os seus milhões à conta de praticamente 0 de inovação.
Outro exemplo é o site sellaband.com, onde músicos podem vender os seus projectos directamente ao público. Com vários casos de sucesso, como a holandesa Hind Laroussi, que tinha, precisava de 40 000 euros para produzir o novo álbum e contava ter que esperar meses por um resultado do apelo: reuniu o dinheiro em onze dias.
ResponderEliminarPequeno senão: a plataforma não é gratuita, os artistas pagam uma taxa. Mas não deve ser muito, porque este ano a sellaband já teve que declarar falência e agora encontra-se em fase de relançamento.
Ludwig,
ResponderEliminarProponho que faças um projecto no kickstarter para compilares um livro com os melhores argumentos, melhores comentários, as alegações mais parvas, enfim, uma espécie de "ktreta best of".
Para além dos custos de produzir essa compilação, inclui também alguma remuneração pela pachorra infidável que tens tido com jairos, zeca portugas (lembras-te?), perspectivas, mats e afins. ;)
Se fizeres isso, terás pelo menos um tipo disposto a pagar: eu. :)
Pois Pedro, eu confesso que não daria um chavo por esse livro... já que posso lê-lo de graça aqui mesmo!
ResponderEliminarLigeiramente fora de tópico:
ResponderEliminarSe eu puser online um desenho do rato Mickey feito pela minha filha, a Disney pode (tentar) forçar-me a retirá-lo, apesar do anos já passados desde a criação do boneco e da morte do Walt.
Uma das razões “sentimentais” por vezes apesentadas seria para proteger a “dignidade” do obra (proteção que a Gioconda não necessita?), e não apenas o vil metal.
No entanto é a própria Disney que faz disto.
Ludwig, comentei aqui há uns minutos sobre a Disney, mas acho que o filtro de spam comeu o meu comentário. :-\
ResponderEliminarZarolho,
ResponderEliminarJá está. Deve ter sido por dizeres que estava ligeiramente fora de tópico ;)
Barbas,
ResponderEliminarEstás no teu direito em não quereres dar nada. Mas da forma como vejo a coisa, o Ludwig conseguiria reunir muito melhor aquilo que de mais relevante foi discutido aqui. Há toneladas de lixo (p.ex., perspectiva), comentários sem nada que se aproveite, outros mais ou menos e outros muito bons. Ao longo de todo este tempo, quer o Ludwig quer os habitués deste blog foram também evoluindo na sua forma de pensar. Há posts e / ou comentários que são paradigmáticos.
Como gosto do Ktreta e porque sei que o Ludwig faria uma compilação muito mais eficiente do que eu (nem que seja pelo facto dos posts serem dele e de acompanhar melhor do que ninguém os vários temas), não me importaria nada de contribuir para um livro que fizesse um apanhado do que mais relevante se foi discutindo por aqui.
Acho que o princípio é o mesmo que aplico ao meu jardim. Tenho ainda uma casa nos Açores com uma vista para o mar fabulosa e um terreno bastante grande que dá para fazer um belo jardim. Eu até acho fixe aquela coisa de plantar uns arbustos e umas flores, cuidar da terra, ver as coisas crescer e tal... Mas como faço um trabalho muito pior do que um jardineiro que conheço e porque sou (ou melhor, era enquanto vivi nos Açores) mais eficiente a dar explicações de estatística do que a podar, pago a quem me cuide do jardim e que sei que faz um trabalho muito superior ao meu. Ao fim e ao cabo também recebia (passando recibo) para explicar aquilo que os alunos poderiam descobrir por eles próprios.
Mas ao falar de uma compilação, poderia também ser vários "mega-post", cada um deles um capítulo, sobre vários temas (por exemplo, sobre criacionismo, outro sobre o que se discutiu sobre crenças em geral, etc). É que já há material mais do que suficiente para ir escalpelizando o acessório e ficar com um livro porreiro.
Eu pagaria.
tens tanta memória ó barbas
ResponderEliminarse também a tens para as coisas úteis
tens um grande futuro
ou acabas estrangulado
Pois Pedro, eu confesso que não daria um chavo por esse livro... já que posso lê-lo de graça aqui mesmo!
não é de graça seu Barbas
o meu consumo eléctrico duplicou desde que interneticamente
fui ligado
tem sempre custos
o que é um Pedro Ferreira???
Para além dos custos de produzir essa compilação, inclui também alguma remuneração pela pachorra infidável que tens tido com jairos, zeca portugas (lembras-te?), perspectivas, mats e afins. ;)
ah é o estatístico do desemprego pagante
ResponderEliminara propensão dos estatísticos para o ateísmo não é generalizada
mas existe uma tendência...
e o livro tem de ser em inglês
porque senão
os brasileiros não pagam
esperam que apareça no Baixaki
e os zeca's zépovitos ficava melhor só chateiam
e não esportulam nada
nem todos consomem os sonhos dos outros
e 30 euros por um sonho alheio
ao menos que invista nos seus/deles que pelo pensamento que expressam como perspectivas, mats e pedros ferreiras
aspiram à imortalidade impressa
já agora em papel de bíblias recicladas...pendor e penhor ecológico
Pedro, isso é tudo muito interessante, mas estás a falar de um projecto de pesca editorial que é, mais ou menos, um pesadelo do nível do SAW.
ResponderEliminarAté porque o formato de livro é incapaz, a meu ver, de traduzir a imensa variedade e riqueza das discussões neste blog. Fazer isso sem ao mesmo tempo expressar o muito de ridículo que contém, imagina o editorialismo... não vejo a forma da coisa. O mais fácil é simplesmente escolher os artigos mais incisivos e pô-los num livro. Mas o problema é que muitos dos melhores artigos não têm sentido sem o contexto dos hiper-links.
Não é ideia nova. Estive há anos num forum onde houve a ideia de colocar posts num livro. Mas a dificuldade editorial foi tanta que o projecto nunca arrancou. Como eu previ na altura.
Barba,
ResponderEliminarSe me meter numa coisa dessas (e já tive uma oferta de um amigo para ajudar) seria para compilar os posts, não os comentários. Até porque não me sentia bem escrever um livro com as coisas dos outros...
Talvez fosse engraçado escolher uma ou duas centenas de posts que encaixassem em temas diferentes, ordenar cada grupo de forma a fazer algum sentido e rescrever o que fosse preciso para criar uns capítulos com princípio, meio e fim. Não seria um mero trabalho de copy-paste, mas pegar nas ideias, sintetizar o resultado das discussões e organizar os vários textos numa coisa coerente.
Tipo Que Treta, o livro...
Já agora, tenho aqui 1285 posts. Mesmo que aproveite só 10%, escrevendo mais umas coisas e restruturando os textos já deve dar um livro...
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