Evolução: compaixão e ética.
«Durante o inverno no Zoo de Arnhem, depois de limpar o recinto e antes de soltar os chimpanzés, os tratadores lavavam os pneus com a mangueira e penduravam-nos num tronco horizontal preso à estrutura onde os chimpanzés trepavam. Um dia, Krom interessou-se por um pneu que ainda tinha água. Infelizmente, era o último da fila, atrás de vários pneus pesados. Krom puxou e empurrou o pneu que queria mas não o conseguiu remover do tronco. Tentou em vão durante dez minutos, ignorada por todos excepto Jakie, um chimpanzé de sete anos de quem Krom tinha cuidado quando era pequeno. Logo que Krom desistiu e se afastou, Jakie aproximou-se e, sem hesitar, empurrou os pneus um por um para fora do tronco. Quando chegou ao último, tirou-o com cuidado, levou-o direito para não entornar a água e colocou-o em pé perto da tia. Quando Jakie se afastou Krom já estava a tirar água do pneu com a mão.»(1)
Segundo o Nuno Gaspar, «Tudo no animal é realizado em função da sobrevivência, pelo que tudo é previsível. Onde aparece escolha livre começa a humanidade.»(2) Concordo em estender o conceito de humanidade para incluir todos os animais que demonstrem características humanas. Consciência de si próprio, por exemplo. Mas o Nuno quer fazer o contrário, inventando um “facto” como diferença radical entre nós e os restantes membros da família. Isto nem tem muito que discutir. É trivialmente falso.
Mais interessante é a ideia do Nuno que a evolução obriga todos os animais a ficar «orientados para a sobrevivência da espécie»(2). É completamente falsa, mas de uma forma menos óbvia. Primeiro, a evolução não orienta para nada. Não tem objectivos a cumprir. Mas como as características de uma geração vieram quase todas da geração anterior, a população tende para aquelas que melhor se correlacionam com o sucesso reprodutivo.
E não é a sobrevivência que conta. Nem do organismo nem da espécie. A selecção leva muitas vezes a características contrárias à sobrevivência dos organismos, como os salmões que morrem ao desovar, as abelhas que morrem quando picam, ou os machos de algumas espécies de aranha e louva-a-deus que são comidos (literalmente) pelas parceiras. E a “sobrevivência da espécie” nem faz sentido. Uma espécie é um conjunto de populações. É mais conceito que coisa. Nos organismos que se reproduzem sexualmente este conjunto é delimitado pelos cruzamentos que não produzem descendentes férteis. Nos outros organismos, a maioria, é delimitado por o que for mais conveniente ao biólogo. E como as populações variam ao longo do tempo é completamente arbitrário dizer que a espécie sobreviveu ou não.
O que importa é a correlação entre características e reprodução. É isso que determina a distribuição de características nas populações. Por isso, se animais vivem em grupos compostos por parentes próximos, características que promovam a cooperação vão se propagar. Porque quando um animal, com essa característica, ajuda o seu vizinho está provavelmente a ajudar um animal com cópias dos genes que conferem essa característica. E quando os animais são suficientemente inteligentes para compreender o que os seus vizinhos querem ou precisam temos as condições necessárias para a evolução da compaixão, do amor, da gratidão e sentimentos afins. Não é para a sobrevivência do organismo nem para o bem da espécie. É apenas porque, nessas condições, essas características se propagam.
Assim, a evolução biológica deu-nos a disposição para nos preocuparmos com os outros e a preocupação necessária para nos importarmos com o que fazemos. Muito antes de sermos Homo sapiens. E ainda hoje são estas disposições que regem a maior parte dos comportamentos que consideramos morais. A caridade, a compaixão, o amor. Tudo o que fazemos porque sentimos algo pelos outros, e tudo o que sentimos que nos leva a fazer algo pelos outros. Só que isto ainda não é ética*.
Há um passo importante que só surgiu depois da linguagem e raciocínio simbólico, depois de muita evolução cultural, e que é recente. É o “deve ser” como regra abstracta, independente do ponto de vista ou daquilo que sentimos pelo outro. As ideias de Platão, o imperativo categórico de Kant ou o cálculo de utilidade de Bentham**, por exemplo. Algo muito mais sofisticado do que “amar o próximo”, que apenas apela à nossa nobre herança de primatas. E foi esta sofisticação que nos permitiu coisas como a declaração universal dos direitos do Homem, os direitos dos animais e a democracia. Mas, como tudo o que fazemos, esta capacidade de abstracção também deriva de mecanismos biológicos que evoluíram. Não para a sobrevivência de cada um, e muito menos para a “sobrevivência da espécie”. Apenas porque estas características se propagaram melhor que as suas concorrentes no tempo dos nossos antepassados.
*Não é consensual, mas um post não dá para tudo...
**Que ele baptizou com o termo ironicamente infeliz de “cálculo de felicidade”.
1- Adaptado do livro “Primates and Philosophers”, de Frans de Waal, que recomendo a quem estiver interessado neste assunto. Podem ler aquium capítulo do livro, de onde tirei este excerto.
2- Comentários em Justiça ou Caridade
Ludi,
ResponderEliminaro teu artigo é bom enquanto explicação de que a evolução não é dirigida nem tem objectivos, mas creio que as objecções do Nuno Gaspar eram outras.
De qualquer modo, há algo com que não concordo: há efectivamente uma diferença substancial (não diria «radical»...) entre a nossa população (ou «espécie»...;) ) e as outras. Que é justamente o termos uma linguagem complexa. Foi essa diferença que permitiu o desenvolvimento da ética (como dizes no último parágrafo).
Ricardo,
ResponderEliminarA reciprocidade indirecta exige mecanismos de reputação, e concordo que não está assente se existe fora da nossa espécie. Mas ainda cai na categoria das coisas que fazemos por emoção ou sentimento. Achar que um tipo é uma besta porque não salvou a criança que se estava a afogar, ou que o outro é um heroi porque entrou no edifício em chamas para salvar a velhota é perfeitamente possível sem abstrair dessas emoções regras abstractas acerca de direitos, deveres, normas de conduta, etc.
Aquilo a que me refiro é algo que me parece ser muito recente na nossa espécie. Uma ideia que surgiu com a filosofia. Aquelas coisas do Sócrates perguntar o que era o bem, ou o dilema de Arjuna no Bhagavad Gita. Que não é acerca do que sentimos mas acerca do que devemos fazer.
Talvez isso seja muito antigo e só não vemos evidência disso mais cedo por não haver escrita. Mas é uma coisa que na maior parte dos casos nem ligamos. Nós fazemos o que sentimos estar certo e não o que concluímos estar certo.
Tu, com a tua ideia que os animais não merecem consideração ética, és um bom exemplo dessa atitude irreflectida. ;)
Caro Ludwig,
ResponderEliminarobrigado por este interessante post.
Alguns comentários:
Mais interessante é a ideia do Nuno que a evolução obriga todos os animais a ficar «orientados para a sobrevivência da espécie»(2). É completamente falsa, mas de uma forma menos óbvia. Primeiro, a evolução não orienta para nada. Não tem objectivos a cumprir. Mas como as características de uma geração vieram quase todas da geração anterior, a população tende para aquelas que melhor se correlacionam com o sucesso reprodutivo.
Parece-me que "tender para" se pode entender também como "orientar". Será assim? O que achas?
Por exemplo, se há selecção natural na evolução, há direccionalidade que se "orienta" para a sobrevivência de uma espécie, através de um conjunto de características, que em média, e por reprodução, adaptam a espécie ao meio ambiente de forma a que esta sobreviva. É claro que na evolução por deriva genética não é assim, mas dizer que a afirmação do Nuno é falsa parece-me precipitada.
É o “deve ser” como regra abstracta, independente do ponto de vista ou daquilo que sentimos pelo outro.(...)Algo muito mais sofisticado do que “amar o próximo”, que apenas apela à nossa nobre herança de primatas.
Gostei da tónica que colocas no "dever ser". Penso o mesmo. Aliás, partilho-te que, para o Cristão, "amar o próximo" é o seu "dever ser", logo a sua experiência de vida possui esta novidade de sintetizar estas duas expressões.
Gostei muito da experiência com que inicias o post. Reflecte relacionalidade no mundo animal, que erradamente pensamos como exclusivamente humana. Os traços de mutualismo, cooperação e simbiose aproximam-nos mais do mundo natural, fazendo-nos compreender que: i) nós não estamos no cosmos, mas "somos" cosmos; ii) e que fazemos parte da "família da Criação". Neste último ponto se compreende o Hino das Criaturas que exprime o relacionamento que São Francisco tinha perante a natureza e que o Cristão é chamado a prosseguir e aprofundar.
O teu post lembrou-me o que o teólogo católico John Haught disse uma vez: O que Deus quer, tal como disse muitas vezes o teólogo Wolfhart Pannenberg, é a independência da Criação, tal como Deus deseja a liberdade de cada um de nós, Deus quer um universo que nos dá origem, de tal forma que o próprio universo tem um tipo de autonomia e espontaneidade, desde o início. Por isso não nos deveríamos surpreender pela evolução.
(Evolução e Kenosis)
Cordiais saudações,
Miguel Panão
Miguel Panão,
ResponderEliminar«Parece-me que "tender para" se pode entender também como "orientar". Será assim?»
Não sei... No sentido em que a gravidade orienta a água, que, por isso tende a escorrer para baixo, sim. Mas não no sentido em que o atirador orienta a espingarda para atingir o alvo.
Infelizmente, dá para usar as mesmas palavras, mas o sentido correcto é aquele que exclui por completo qualquer ideia de um objectivo a ser antecipado. A selecção natural ocorre no momento, com uns a reproduzir-se mais que outros.
«Por exemplo, se há selecção natural na evolução, há direccionalidade que se "orienta" para a sobrevivência de uma espécie»
Não. O que tens é que as espécies de hoje são, necessariamente, compostas por organismos vivos descendentes de antepassados que tiveram (todos) sucesso reprodutivo. Mas é errado dizer que a selecção natural pressionou o meu avô no sentido de eu estar cá.
Uma analogia: a areia que fica por baixo da peneira não se fez fina para passar os buracos. Passou os buracos porque era mais fina, ao contrário dos torrões que ficaram por cima.
«dizer que a afirmação do Nuno é falsa parece-me precipitada.»
Pode ser. Se calhar o Nuno não queria dar ideia de um processo dirigido a um fim. Mas foi o que me pareceu. E é também a sensação que tenho do que tu estás a dizer.
«Aliás, partilho-te que, para o Cristão, "amar o próximo" é o seu "dever ser"»
Não consigo compreender isso. É como ter o dever de gostar de favas. O dever de as comer, quer se goste quer não, é concebível. Mas gostar não é uma opção.
Como é que o amor pelo próximo pode ser um dever? Como é que me posso obrigar a sentir algo que não sinto?
«e que fazemos parte da "família da Criação"»
Voltando ao inicio do comentário, é este o problema do tal "orientar". A criação implica um plano, um objectivo. Mas a evolução, o processo que observamos, é aquilo que se espera na ausência de tal coisa. Não há plano.
“E não é a sobrevivência que conta.”
ResponderEliminar“O que importa é a correlação entre características e reprodução”
Acho que é a mesma coisa dita com outras palavras.
Sobre a liberdade, repito a pergunta a Ricardo Alves num comentário ao post anterior. Qual o animal, que não o homem, capaz de passar fome com alimento à disposição ou capaz de recusar a cópula estando em período fértil, qual o que tem esta possibilidade de escolher (ponto de interrogação)
Exemplos fortuitos de cooperação entre animais há muitos. O outro dia, vimos uma manada de búfalos a proteger um dos seus membros que tinha sido apanhado por um leão, o cão que salvou o companheiro acidentado na estrada, este caso dos chimpanzés que citou (atenção que neste caso são animais com muito contacto com humanos sujeitos a eventual comportamento mimético). Tal não me parece suficiente para dizer que o comportamento altruísta está inscrito nos genes. Pelo contrário, se assim fosse ele seria evidente, repetível e não acidental.
O que tenho estado a dizer não tirei agora do chapéu. Luc Ferry, um ateu confesso, em “Aprender a viver” explica isto bem melhor do que eu. Vale a pena ler.
“Nós fazemos o que sentimos estar certo e não o que concluímos estar certo.”
Muito de acordo. E dando-lhe nomes diferentes e manifestando-o de muitas maneiras quase todos, agora, sentimos o amor pelo próximo como algo evidente em nós. E âncora do critério de toda a nossa acção.
«humanos sujeitos a eventual comportamento mimético). Tal não me parece suficiente para dizer que o comportamento altruísta está inscrito nos genes. Pelo contrário, se assim fosse ele seria evidente, repetível e não acidental.»
ResponderEliminarEle é evidente, repetível e não acidental em muitos casos. Abelhas, formigas, etc... sacrificam-se para proteger as suas "irmãs" na colónia, etc... O seu instinto leva-as a terem comportamentos altruistas nessas situações.
João Vasco,
ResponderEliminarVolta a falar de comportamento previsível, não proveniente de decisão e apenas com a finalidade de sobrevivência da espécie (ou dos conjuntos de genes semelhantes, que vai dar ao mesmo)
Diz que se o comportamento altruista estivesse inscrito nos genes, ele seria repetível e não acidental.
ResponderEliminarDou um exemplo que corresponde a estas características e diz-me que o meu exemplo não conta porque nesse caso o comportamento era "previsível". Se fosse imprevisível, seria "acidental", e o Nuno pediu-me um exemplo que não fosse acidental.
Se quer um exemplo que seja previsível, mas que não seja previsível, então isso concordo consigo que não existe. Nem nos humanos.
---
No caso de animais "simples" o seu comportamento é relativamente previsível. Quer quando o comportamento é egoísta, quer quando é altruista, ele é basicamente simples, e portanto previsível. É determinado pelos genes e pelas circustâncias, e em pequena medida pelo acaso, pelo que é possível prevê-lo.
No caso de animais mais complexos, como os mamíferos, o comportamento torna-se mais imprevisível.
Quer quando o comportamento é egoísta, quer quando é altruísta, a verdade é que é mais difícil - em vários casos - prever como é que o animal se vai comportar.
E é verdade que o ser humano é, sob certa perspectiva, o mais complexo dos animais que conhecemos. Nesse sentido, é muito pouco previsível.
Mas a diferença entre um ser humano e um chimpazé é, a esse nível, inferior à diferença entre um chimpanzé e uma barata, ou entre uma barata e uma bactéria.
Nada disto muda que temos instintos que dão propensão para comportamentos egoístas e altruistas (como os macacos), simplesmente o nosso comportamento é tão complexo que não é fácil (possível?) saber quais dessas propensões vão imperar em determinadas circusntâncias. Como com os macacos, com diferença de grau apenas.
Caro Ludwig,
ResponderEliminaro sentido correcto é aquele que exclui por completo qualquer ideia de um objectivo a ser antecipado
Concordo plenamente contigo, caso contrário, não estaríamos num universo aberto à novidade, inacabado, sem surpresas, o que seria um universo incompatível com a acção objectiva não-invervencionista de Deus.
é errado dizer que a selecção natural pressionou o meu avô no sentido de eu estar cá
Penso que sim, que não pressionou no sentido da intencionalidade. Eu não vejo a selecção natural como intencionalidade mas como condições de possibilidade, constragimentos, ou condições fronteira, por assim dizer.
«para o Cristão, "amar o próximo" é o seu "dever ser"» ... Não consigo compreender isso. É como ter o dever de gostar de favas.
Pois, estamos a falar de coisas diferentes. O "dever ser" como o entendo (e não sei se diferente da forma como o colocaste no post) relaciona-se com o "tornar-se" que assume o nosso "ser" como dinâmico e inacabado. Nesse sentido
Como é que o amor pelo próximo pode ser um dever?
Não é um dever no sentido de "sou obrigado a", o "dever ser" é diferente. Logo, o "amor ao próximo" faz parte do nosso "deve ser" porque nos projecta para fora de nós mesmos em direcção ao outro, a assumir em nós as suas alegrias, tristezas, problemas, sucessos, ao ponto de afirmarmos que "sou, porque existes". Mas ...
Como é que me posso obrigar a sentir algo que não sinto?
Na óptica deste "dever ser" e "amor ao próximo" que estou a falar, não faz sentido obrigarmo-nos a nós mesmo no sentido impositivo do termo, contra a nossa vontade.
Se o fizesse teria de ser sempre no sentido de termos sido persuadidos a "sentir algo que não sentimos" porque na conjugação do "dever ser" com o "amor ao próximo", saimos de nós mesmos para ir ao encontro do outro, implicando um acto livre de ser um nada por amor, renunciado ao que sinto, porque me dou a mim mesmo.
É esta a dinâmica que procuro viver. Aquele "dom-de-si" que falámos noutro post. Repara, não estou a aconselhar o "deves" fazer, isso seria impositivo da minha parte, não. A minha resposta vai no sentido de te responder na óptica da minha vivência Cristã, apenas como partilha de experiências. A tua será eventualmente diferente e enriquecedora certamente.
A criação implica um plano, um objectivo. Mas a evolução, o processo que observamos, é aquilo que se espera na ausência de tal coisa. Não há plano.
Concordo com a ausência de plano no sentido determinístico do termo, que penso ser aquele sentido de que falas. Plano no sentido de design. De facto, o "plano inteligente do cosmos" que fala Bento XVI é um plano de amor (O Cardeal e o Design Inteligente). A meu ver, o problema para entender isto poderá estar naquilo que se quer dizer quando no referimos ao "amor". O tema é demasiado amplo para se restringir a um comentário, mas "amor" no contexto de "plano" refere-se ao "Ser" de Deus, que ao criar o mundo, imprimiu nele a Sua marca. Que marca é essa? A relacionaldade.
É verdade que podemos (e devemos) questionar como pode um Deus-Amor criar um mundo onde coexistam o sofrimento, a dor e a morte. No artigo que apresentei nas Jornadas de Fé e Ciência, em Outubro de 2008, onde estivemos juntos, procurei dar uma possível pista em direcção a uma resposta, mas o livro que se pensava editar ainda não saiu para poder referenciá-lo.
Obrigado pelos teus comentários.
Cordiais saudações,
Miguel Panão
"Por outro lado, não conheço nenhum animal, que não o homem, que seja capaz de passar fome tendo alimento à disposição"
ResponderEliminarOra aí está a formulação acertada, Nuno: «não conheço». Afinal, é só um problema de informação.
Já o facto de não conseguir distinguir entre a atitude do chimpanzé descrita no post e a protecção instintiva que uma manada de búfalos dá a uma cria, parece-me mais problemático do que meras lacunas no conhecimento, que facilmente se preenchem. Ou é mera prvocação?
Cristy
EVOLUÇÃO DA BÍBLIA OU INTELLIGENT DESIGN DA BÍBLIA?
ResponderEliminarO nome da exposição parece ter uma intenção insidiosa.
Nos 200 anos de Darwin, em que se "celebra" a teoria da evolução, apresenta-se uma exposição sobre a "evolução" da Bíblia.
Esperamos que as pessoas sejam suficientemente inteligentes para compreender que a suposta "evolução" da Bíblia não é mais do que o desenvolvimento das tecnologias de edição e impressão, processo que nada tem de aleatório e irracional.
A suposta "evolução" da Bíblia não tem nada com a suposta "evolução" biológica.
A primeira é o resultado de inteligência e acumulação de informação, geradores de desenvolvimento tecnológico.
A segunda, se tivesse acontecido, teria sido o resultado de mutações aleatórias e selecção natural.
Sucede, porém, que a Bíblia é um bom exemplo de que a evolução biológica não pode ter acontecido.
É que, tal como a Bíblia, o genoma tem informação codificada, contendo todas as instruções necessárias à especificação das diferentes espécies de seres vivos.
E, tal como na Bíblia, a informação codificada tem sempre origem inteligente.
Não se conhece qualquer processo natural ou sequência de eventos que consiga produzir informação codificada sem origem inteligente.
Curiosamente, tanto a informação codificada na Bíblia como a informação codificada no genoma têm a mesma origem: DEUS, O VERBO, A RAZÃO.
A Bíblia ensina que o Universo, a Vida e o Homem têm uma origem racional, fornecendo uma explicação para a razão humana e para a racionalidade da natureza.
No entanto, ela ensina também que o pecado humano teve como consequência a corrupção de toda a Criação, que necessita de restauração.
Ela ensina que os milagres e a ressurreição de Jesus Cristo com um corpo incorruptível (factos efectivamente observados e registados por muitos) constituem a melhor garantia de que essa restauração irá efectivamente acontecer.
P. S. A bondade e a justiça têm primazia sobre a maldade e a injustiça porque Deus é bom e justo.
DEUS, AS LEIS MORAIS E AS CONSEQUÊNCIAS DA SUA VIOLAÇÃO
ResponderEliminarA lei do mais forte não é a lei de Deus. Deus é amoroso e justo. E isso está nos antípodas da lei do mais forte.
Mas Deus é um Deus pessoal e amoroso.
E o amor só pode existir se for livre, se existir a possibilidade do ódio.
A maldade só existe se existir um padrão absoluto e objectivo de bondade.
Um padrão absoluto e objectivo de bondade só existe se existir um Deus essencialmente bom.
Se o mal ainda existe é porque Deus ainda não castigou o pecado.
Se Deus ainda não castigou o pecado, isso não significa que não o vá fazer.
Significa apenas que, como a Bíblia ensina, "Deus não quer que os homens se percam, mas que venham a arrepender-se".
Tudo isso é cabalmente explicado pela Bíblia.
No entanto, a Bíblia diz que virá um dia em que Deus dirá: "game over".
E aí virá o julgamento final.
E aí iremos todos precisar de um bom advogado.
E Jesus Cristo propõe-se ser o nosso advogado, porque morreu pelos nossos pecados, tendo sido castigado por eles apesar de inocente.
A nossa escolha é:
1) a eternidade como salvação, com Jesus Cristo
2) a eternidade como sanção, sem Jesus Cristo
AINDA (E SEMPRE) A FORQUILHA CRIACIONISTA
ResponderEliminarNa base dos argumentos científicos a favor do criacionismo encontramos um raciocínio com a forma de uma forquilha tridente:
1) Sempre que num sistema temos informação codificada esta tem sempre origem inteligente;
2) No DNA encontramos informação codificada;
3) Logo, na origem da informação codificada do DNA está um ser inteligente.
A força deste argumento é que as premissas 1) e 2) são cientificamente irrefutáveis.
Elas baseiam-se na observação, não podendo ser desmentidas através da observação. Elas dizem respeito a factos observáveis.
Elas colocam os evolucionistas em xeque mate, na medida em que não existe nenhuma evidência científica que as possa contrariar.
Na origem da informação codificada em livros, enciclopédias, computadores, telemóveis, etc., está sempre uma inteligência.
Como o Ludwig sabe isso, a sua estratégia tem sido tentar negar que no DNA encontramos informação codificada.
Ou por autismo auto-imposto ou por incompreensão, ele acha que o código genético é o que os bioquímicos dizem sobre o genoma, e não o que o genoma diz sobre os bioquímicos.
O que os bioquímicos dizem sobre o genoma não consegue explicar a origem do genoma nem dos bioquímicos.
No entanto, essa estratégia falha completamente, pelo simples facto de que no DNA encontramos realmente informação codificada.
Isso não é um modelo humano.
É literalmente assim.
Sequências de nucleótidos são usadas para representar toda a informação (de que a comunidade científica não dispõe) que representa todas as instruções químicas necessárias à produção e reprodução de seres vivos extremamente diversos, complexos e funcionais.
As letras ATCG são as mesmas. O que muda é a sequência.
Que isso é assim, é amplamente corroborado pela comunidade científica.
Isto tem sido reconhecido mesmo pelos evolucionistas mais impenitentes.
Carl Sagan é um bom exemplo. Ele referia-se ao DNA como “o livro da vida”, reconhecendo que a dupla hélice do DNA é a linguagem, com apenas quatro letras, em que a vida está escrita.
A variação destas quatro letras é aparentemente infinita.
Com elas pode ser codificada toda a informação necessária à produção e reprodução dos diferentes seres vivos.
No que toca aos seres humanos, reconhecia Carl Sagan, o material hereditário requer múltiplos biliões de bits de informação, numa estimativa que hoje se sabe que foi feita muito por baixo.
Nas palavras de Carl Sagan,
"(these) bits of information in the encyclopedia of life-in the nucleus of each of our cells-if written out in, say English, would fill a thousand volumes.
Every one of your hundred trillion cells contains a complete library of instructions on how to make every part of you."
[Carl Sagan, COSMOS, Ballantine Books, 1980, p. 227.]
O Ludwig diz que no DNA não existe informação codificada.
Em sentido oposto, Carl Sagan diz que as nossas células contêm uma completa biblioteca com instruções sobre como fazer cada parte de nós (instruções essas que a comunidade científica não consegue abarcar).
Os criacionistas não poderiam concordar mais com Carl Sagan neste ponto, já que os factos são indesmentíveis.
No sentido oposto ao do Ludwig escreve quase toda a literatura relevante.
Toda ela se refere à informação codificada que existe no núcleo da célula e não à informação sobre o genoma que existe nos livros de biologia molecular.
Vejamos alguns exemplos das definições do código genético que surgem na literatura especializada.
“The genetic code is a set of 64 base triplets (nucleotide bases, read in blocks of three).
A codon is a base triplet in mRNA.
Different combinations of codons specify the amino acid sequence of different polypeptide chains, start to finish.“
-Cell Biology and Genetics, Starr and Taggart, Wadsworth Publishing, 1995
“The sequence of nucleotides, coded in triplets (codons) along the messenger RNA, that determines the sequence of amino acids in protein synthesis.
The DNA sequence of a gene can be used to predict the mRNA sequence, and the genetic code can in turn be used to predict the amino acid sequence.”
-50 years of DNA, Clayton and Dennis, Nature Publishing, 2003
“The most compelling instance of biochemical unity is, of course, the genetic code.
Not only is DNA the all but universal carrier of genetic information (with RNA viruses the sole exception), the table of correspondences that relates a particular triplet of nucleotides to a particular amino acid is universal.
There are exceptions, but they are rare and do not challenge the rule.”
-The Way of the Cell, Franklin M. Harold, Oxford University Press, 2001
“The genome of any organism could from then on be understood in a detailed way undreamt of 20 years earlier.
It had been revealed as the full complement of instructions embodied in a series of sets of three DNA nitrogenous bases.
The totality of these long sequences were the instructions for the construction, maintenance, and functioning of every living cell.
The genome was a dictionary of code words, now translated, that determined what the organism could do.
It was the control center of the cell.
Differences among organisms were the result of differences among parts of these genome sequences.”
-The Human Genome Project: Cracking the Genetic Code of Life, by Thomas F. Lee, Plenum Press, 1991
Ou seja, do que se trata aqui é da informação codificada que existe no núcleo da célula, a qual já era capaz de assegurar a produção, sobrevivência e reprodução de bioquímicos muito antes de os bioquímicos descobrirem a informação contida nas células.
O Ludwig, pelos vistos, é que não percebeu do que se estava a falar durante este tempo todo.
Ele estava a falar da informação que existe nos livros de bioquímica, ao passo que o código genético designa a informação que existe no núcleo das células dos bioquímicos.
Ele pensava que o código genético deve a sua existência aos bioquímicos.
No entanto, os bioquímicos é que devem a sua existência ao código genético, o qual já desde há muito transcrevia, traduzia, executava e copiava a informação necessária à produção e reprodução dos seres vivos.
É curioso.
Quando afirmava categoricamente que o DNA não codifica nada, o Ludwig, afinal, estava a mostrar que ele é que ainda não tinha percebido de que é que cientistas como Crick, Watson, Sagan, Dawkins, etc., estão a falar quando se referem ao DNA e ao código genético.
O Ludwig pensava que o código genético é o que sobre o genoma se encontra codificado nos livros de biologia molecular.
Para O Ludwig, a grande descoberta de Crick e Watson não terá sido mais do que perceber que se pode falar sobre o DNA!!!
Desengane-se, de uma vez por todas, Ludwig:
o código genético é a informação codificada nas sequências de nucleótidos com todas as instruções para o fabrico e a reprodução dos seres vivos!
Que parte disto é que ainda não percebeu?
Já ouviu falar na sequenciação de genomas para obter informação genética?
Como se vê, a estratégia do Ludwig está votada ao fracasso.
O Ludwig não tem, por isso, qualquer hipótese científica séria contra a forquilha criacionista.
Quase podemos dizer, em tom de brincadeira, que espetámos o Ludwig com ela e agora vamos grelhá-lo no seu próprio blogue.
Recordemos, numa formulação ligeiramente diferente:
1) Toda a informação codificada tem origem inteligente.
2) No DNA encontramos informação codificada em quantidade, qualidade, variedade, complexidade e densidade que transcende tudo o que a comunidade científica é capaz de produzir
3) Acresce que a informação codificada no DNA requer a existência de maquinismos de descodificação, o ribossoma, sendo que as instruções para construir ribossomas se encontram codificadas no DNA.
Além disso, a descodificação requer energia a partir de ATP (adenosina trifosfato), construída por motores ATP-sintase, construídos a partir de instruções codificadas no DNA.
4) Na origem do DNA encontramos uma inteligência que transcende a inteligência de toda a comunidade científica junta e que criou a vida de forma instantânea e sobrenatural.
É tão simples como 2 + 2 = 4
O Ludwig não tem qualquer hipótese científica contra este argumento. Nem ele, nem ninguém.
Este argumento, sendo aparentemente simples, tem implicações fundamentais para a análise do big bang, da origem da vida, do ancestral comum, das mutações, da selecção natural, da especiação, a interpretação dor registo fóssil, etc.
Além disso, ele explica porque é que a Palmira está errada quando compara os cubos de gelo ao DNA, porque o Ludwig está errado quando pensa que o facto de gaivotas darem gaivotas prova a evolução e porque é que o Paulo Gama Mota está errado quando pensa que a especiação dos Roquinhos prova a evolução.
A FORQUILHA CRIACIONISTA PELA BOCA DOS ATEUS KRIPPAHL, DAWKINS E DO EX-ATEU FLEW.
ResponderEliminar1) Ludwig Krippahl diz que um código tem sempre origem inteligente.
2) Richard Dawkins afirma que no DNA existe um código quaternário, com os símbolos ATGC, que codifica grandes quantidades de informação como um computador.
3) Por concordar com o Ludwig em 1) e Dawkins em 2), o ex-ateu Anthony Flew, ao fim de 60 anos a dizer o contrário, concluiu que então o código do DNA só pode ter tido origem inteligente, abandonando assim o seu ateísmo.
perspectiva,
ResponderEliminar"AINDA (E SEMPRE) A FORQUILHA CRIACIONISTA"
Eu pensava que o ateísmo já estava morto...
Nuno Gaspar,
ResponderEliminar«Acho que é a mesma coisa dita com outras palavras.»
A diferença entre sobrevivência da espécie e adaptação é importante se querermos ser rigorosos. Porque o sucesso reprodutivo pode ser medido enquanto que a sobrevivência da espécie é um conceito vago e arbitrário (posso seguir a minha linhagem para trás no tempo até a uma bactéria sem encontrar um ponto onde os filhos eram de espécie diferente dos seus pais).
«Qual o animal, que não o homem, capaz de passar fome com alimento à disposição ou capaz de recusar a cópula estando em período fértil, qual o que tem esta possibilidade de escolher»
Muitos humanos não são capazes de escolher comer menos quando têm peso a mais, ou evitar a cópula. Além disso, quando escolhem é sempre não comer por alguma outra opção (purificar o corpo, dar comida aos outros, etc). E isso os animais fazem também. Podem não comer, mesmo com fome, por cautela (os ratos, por exemplo), por querer alimentar as crias, etc.
O que os humanos têm de excepcional é a capacidade de controlarem as suas acções com narrativas. A linguagem não só nos serve para comunicar e manipular os outros como serve para nos manipularmos a nós próprios. Mas isso não é uma virtude nem um vício. É uma ferramenta. O que sai do seu uso pode ser bom e pode ser mau...
Em
Miguel Panão,
ResponderEliminar«Concordo plenamente contigo, caso contrário, não estaríamos num universo aberto à novidade, inacabado, sem surpresas, o que seria um universo incompatível com a acção objectiva não-invervencionista de Deus.»
Para perceber melhor a tua hipótese, pergunto-te como julgas que seria o universo caso esse teu deus não existisse e tudo isto se tivesse formado por processos naturais. É que me custa a ver que diferença faz esse deus...
«Pois, estamos a falar de coisas diferentes. O "dever ser" como o entendo (e não sei se diferente da forma como o colocaste no post) relaciona-se com o "tornar-se" que assume o nosso "ser" como dinâmico e inacabado. Nesse sentido»
Tudo bem. Mas continua o problema de só fazer sentido o dever de se tornar algo se esse algo estiver ao alcance de uma escolha voluntária. O dever de se tornar barbudo, por exemplo, não faz sentido para quem não tem barba. Porque não cresce só pela nossa vontade.
E é nessa categoria que se inclui o dever de amar o próximo. O dever de o tratar bem já é um dever que faz sentido. Quer gostes ou não de uma pessoa podes tratá-la com respeito e consideração. Mas o dever de te afeiçoares a ela parece-me irrazoável porque não podemos escolher o que sentimos.
«na conjugação do "dever ser" com o "amor ao próximo", saimos de nós mesmos para ir ao encontro do outro, implicando um acto livre de ser um nada por amor, renunciado ao que sinto, porque me dou a mim mesmo.»
Mas confundes à mesma o acto com o sentimento. Agir de certa forma para com os outros pode ser um dever. Sentir amor já não. Essas aspas e metáforas penso que só baralham esta distinção importante.
«A meu ver, o problema para entender isto poderá estar naquilo que se quer dizer quando no referimos ao "amor".»
Lá isso é verdade. Amor é um dever. Amor é compaixão. Deus é amor. Deus é compaixão. Deus é um dever. O plano de Deus é amor. O plano de deus é um dever. É, realmente, uma grande confusão... :)
«É verdade que podemos (e devemos) questionar como pode um Deus-Amor criar um mundo onde coexistam o sofrimento, a dor e a morte.»
E, como com qualquer hipótese, podemos (e devemos) considerar hipóteses alternativas. Por exemplo, que essa mistura confusa do plano, amor, dever, deus e afins ser a hipótese errada.
O Jónatas dá uma nova definição de escolha:
ResponderEliminar«1) a eternidade como salvação, com Jesus Cristo
2) a eternidade como sanção, sem Jesus Cristo»
Escolha: ou fazes o que te mandam ou levas.
Ludwig,
ResponderEliminarConfesso que já perdi o pé há muito tempo nos comentários desta discussão precisamente porque não compreendo a pressinha de ancorar o comportamento humano na matriz biológica. Percebo que é preciso desenganar quem defende com "narrativas" uma viragem na humanidade «inventando um “facto” como diferença radical entre nós e os restantes membros da família.» Mas tu mesmo reconheces que «Isto nem tem muito que discutir. É trivialmente falso.»
Portanto parece-me que o ponto de partida deste "diferendo" (e desdenho abertamente de tudo o que fica para trás) está precisamente nesta tua afirmação:
«Há um passo importante que só surgiu depois da linguagem e raciocínio simbólico, depois de muita evolução cultural, e que é recente. É o “deve ser” como regra abstracta, independente do ponto de vista ou daquilo que sentimos pelo outro.»
E tal como propus num comentário ao post "Caridade ou Justiça", o es mus sein que podemos opor à caridade é a solidariedade. A justiça é um diálogo entre direitos e deveres que pede pouco à transcendência individual. (mereces a minha teimosia depois de me teres dado uma resposta algo encriptada, do tipo "vai comer as sementes desse saco para o Perspectiva" :)
Caro perspectiva,
ResponderEliminartemos "perspectivas" diferentes. Recordo-me de ter lido uma afirmação do Cardeal Ratzinger onde "não podemos pensar em Deus como um artífice, mas como o seu pensar é criativo". Ou seja, Criação não se opõe a evolução, mas a evolução é que seria de esperar de um Deus Criador.
Não se conhece qualquer processo natural ou sequência de eventos que consiga produzir informação codificada sem origem inteligente.
20% das concepções resultam num aborto espontâneo. Será isto design inteligente ou incompetente? Design inteligente? Não, obrigado!
O perigo do Design inteligente é maior para a teologia do que para ciência. Penso que não seja por aí, por um Deus-de-lacunas, que se consegue beneficiar das teorias de evolução (a de Darwin é apenas uma, mas há mais) no aprofundamento da reflexão teológica e filosófica.
A Bíblia ensina que o Universo, a Vida e o Homem têm uma origem racional, fornecendo uma explicação para a razão humana e para a racionalidade da natureza.
No entanto, ela ensina também que o pecado humano teve como consequência a corrupção de toda a Criação, que necessita de restauração.
Ela ensina que os milagres e a ressurreição de Jesus Cristo com um corpo incorruptível (factos efectivamente observados e registados por muitos) constituem a melhor garantia de que essa restauração irá efectivamente acontecer.
Mas isso em nada invalida a teoria da evolução por selecção natural de Darwin.
Se o mal ainda existe é porque Deus ainda não castigou o pecado.
Se Deus ainda não castigou o pecado, isso não significa que não o vá fazer.
Deus castiga?
A nossa escolha é:
1) a eternidade como salvação, com Jesus Cristo
2) a eternidade como sanção, sem Jesus Cristo
Permita-me. A nossa escolha é "amar" ou "não amar".
O problema da "forquilha tridente" é querer justificar a existência de Deus, ou da sua acção, com base na ciência.
Como Cristão sou muito céptico a um deus-intervencionista, que facilmente se pode tornar num demiurgo. Por outro lado, uma interpretação literalista da Bíblia é muito perigosa no sentido de desvirtuar a sua mensagem e querer que diga algo que não diz.
Há pouco vi um video de um criacionista com uma retórica impositiva. Essa, parece-me ser pouco inspirada num Deus que presuade e propõe, não impõe.
O que prova a evolução são estudos em biologia genética, cada vez mais abundantes e que merecem a nossa atenção.
A versão criacionista leva à visão de Deus como demiurgo, intervencionista, que preenche as lacunas do nosso conhecimento e nesse nível de reducionismo metodológico, torna-se problemática à reflexão teológica.
Cordiais saudações,
Miguel Panão
Bruce,
ResponderEliminarEu acho que é importante perceber que o nosso comportamento resulta da interacção da nossa "matriz biológica" com aquilo que nos acontece durante a vida. O que aprendemos e que nos molda o cérebro. Especialmente para combater a ideia que a nossa liberdade e ética são uns pós mágicos que o Grande Feiticeiro nos deu em vez de coisas que temos de ir aprendendo usando os (limitados) mecanismos biológicos que nos sairam na rifa evolutiva.
Quanto a «A justiça é um diálogo entre direitos e deveres que pede pouco à transcendência individual» penso que estamos de acordo. Não é acerca de amarmos, do nosso poder sobrenatural de escolha nem dos eventual tautau que levaremos do do menino Jesus.
O meu problema com o termo "solidadriedade" é que tem um sentido duplo. Se referir o sentimento pelo qual partilhamos os males alheios, então penso ter pouco a ver com o assunto. Se referir o dever de considerar os males alheios, então estou de acordo, é mesmo isso.
Por isso não me quero comprometer com a tua solidariedade porque depois vem alguém dizer que deus é solidariedade porque solidariedade é o dever de amor e deus é o amor ao dever de amar o outro com solidariedade ou o raio que o parta, e lá tenho de começar tudo de novo :)
Só para meter uma acha para a fogueira :).
ResponderEliminarA imposição de "amar" o próximo pode ser vista como um dever de cada um à predisposição de abertura de espírito e de ver o próximo como se de nós próprios nos tratássemos. Nesta abertura de espírito, seria normal ou mais fácil amar o próximo, sem haver qualquer imposição. Uma espécie de atitude de abertura de coração perante o outro.
Mas isto é suficientemente complicado de explicar que simplesmente se reduziu a uma fórmula: "ama o próximo". Levando porventura à ideia de que se está a obrigar alguém a amar.
"Ou seja, Criação não se opõe a evolução, mas a evolução é que seria de esperar de um Deus Criador."
ResponderEliminarMiguel, pode explicar porquê, por favor?
"Por outro lado, uma interpretação literalista da Bíblia é muito perigosa no sentido de desvirtuar a sua mensagem e querer que diga algo que não diz"
Mas não será mais honesto interpretar a bíblia literalmente, do que interpertar conforme dá jeito? Uma vez que se trata de um livro cheio de contradições normais para uma obra de ficção escrita a várias mãos, quem é que tem o direito de dizer «o que ela quer dizer»? O Papa não será, porque ao longo dos séculos bem vimos como as interpretações dos Papas se transformaram e inverteram, sempre que - por motivos muito temporais - tal pareceu necessário.
Cristy
"es mus sein"
ResponderEliminarBruce,
permite-me um pequeno reparo trivial mas com a melhor das intenções: "es muss (ou muß) sein). É que "mus", em alemão, quer dizer compota ;-)
Cristy
Ludi,
ResponderEliminara minha atitude face aos direitos dos animais é muito reflectida. ;)
Nem emocional nem reflectidamente consigo aceitar que os animais tenham «direitos» no mesmo sentido em que os reconheço às pessoas.
Justamente porque, como dizes, a nossa espécie desenvolveu uma capacidade de se colocar «à distância» das suas emoções que não existe noutras espécies. É por isso que podemos reflectir sobre o «dever ser».
Evidentemente, a discussão seria mais interessante se ainda houvesse por aí hominídeos de outras espécies capazes de usarem uma linguagem complexa. É possível que os neanderthal a tivessem. Ou os «homens das Flores». Infelizmente, parece que lidámos com eles da forma mais brutal...
«Qual o animal, que não o homem, capaz de passar fome com alimento à disposição ou capaz de recusar a cópula estando em período fértil»?
ResponderEliminarExemplos da primeira situação deve haver muitos. Existem até exemplos de progenitores que matam as crias doentes e/ou fracas em períodos de fome. Exemplos do segundo, embora mais difíceis, devem existir entre mamíferos em que ter relações sexuais com a fêmea do macho A pode ser perigoso para o macho B...
«Na óptica deste "dever ser" e "amor ao próximo" que estou a falar, não faz sentido obrigarmo-nos a nós mesmo no sentido impositivo do termo, contra a nossa vontade.
ResponderEliminarSe o fizesse teria de ser sempre no sentido de termos sido persuadidos a "sentir algo que não sentimos" porque na conjugação do "dever ser" com o "amor ao próximo", saimos de nós mesmos para ir ao encontro do outro, implicando um acto livre de ser um nada por amor, renunciado ao que sinto, porque me dou a mim mesmo.»
Isto é muito confuso. ;)
Ricardo, até porque de alguma maneira, direitos pressupõem deveres. Assim, o direito de não serem mortos, ou roubados, etc., pressupõe o seu dever de não matar, roubar, etc.
ResponderEliminarO problema é que o animal não percebe isto, porque como muito bem o Ludwig explica, não possui as ferramentas abstractas que nós possuímos.
Deste modo, embora possamos criar "direitos dos animais" para que os protejamos de certos ímpetos humanos que são ameaçadores à sua própria existência, nunca deveremos dizer que os animais gozam dos direitos humanos.
Porque senão, se hoje o Ludwig já propõe 500 mocas por mês para não se fazer nada, qualquer dia ainda acha que todo o animal também deve possuir livre expressão, habitação, educação, etc... :D
Ricardo,
ResponderEliminar«Nem emocional nem reflectidamente consigo aceitar que os animais tenham «direitos» no mesmo sentido em que os reconheço às pessoas.
Justamente porque, como dizes, a nossa espécie desenvolveu uma capacidade de se colocar «à distância» das suas emoções que não existe noutras espécies. É por isso que podemos reflectir sobre o «dever ser».»
Se tu defendesses que um ser só tem direitos se tiver essa capacidade, e só no momento em que lhe é possível exercê-la, então discordava de ti à mesma mas admitia que defendias uma posição consistente.
Se defendesses que um ser tem direitos quando tem essa capacidade mesmo que esteja temporariamente privado dela, então apontaria como inconsistente a tua posição acerca do aborto mas concederia a consistência acerca dos direitos dos animais, mesmo discordando do juízo de valor por trás dessa norma.
Mas tu defendes que um ser tem direitos se, e só se, a sua espécie desenvolveu essa capacidade, mesmo que esse ser tenha algum defeito congénito ou de formação que o prive dessa capacidade. E isso parece-me incoerente porque estás a atribuir direitos (ou a negá-los) a um ser em função da espécie a que pertence em vez de em função dos atributos desse ser.
Seja como for, discordo de ti porque, apesar de admitir que a ética só poderá compelir quem a compreender, daqui não segue que quem não perceba a ética não mereça consideração da parte de quem a compreende.
Barba,
ResponderEliminar«Ricardo, até porque de alguma maneira, direitos pressupõem deveres. Assim, o direito de não serem mortos, ou roubados, etc., pressupõe o seu dever de não matar, roubar, etc.»
Não é de alguma maneira. É de uma maneira específica, e só dessa: Quando A tem um direito, existe pelo menos um B que tem um dever para com A. É só isto que se pressupõe.
O teu direito de não ser roubado apenas pressupõe que alguém tenha o dever de não te roubar. Ao contrário do que muitas vezes, confusamente, se defende, que é pressupor que tu tenhas o dever de não roubar. Podes ter, mas não é pressuposto no direito de não ser roubado. Se fores um miudo de 2 anos, por exemplo, não é razoável imputar-te tal dever. Mas o direito continuas a ter, implicando o dever de outros para contigo.
«Porque senão, se hoje o Ludwig já propõe 500 mocas por mês para não se fazer nada, qualquer dia ainda acha que todo o animal também deve possuir livre expressão, habitação, educação, etc... :D»
Considero que haja um dever de partilhar recursos porque o "isto é só meu" tem uma legitimidade limitada. Parte do que me vem parar as mãos neste mercado livre (que é necessário) não devia ser para mim mas para outros que ficaram com menos do que lhes era legítimo. Daí os impostos, a redistribuição de riqueza, etc.
No caso dos animais também se aplica algo semelhante. Se há chimpanzés a viver numa floresta, mesmo que eles não tenham a noção de propriedade, nós temos o dever de reconhecer que aquela parte é deles e que é pouco legítimo matá-los e abater as àrvores só porque temos um papel onde escrevemos "é tudo nosso".
Ricardo Alves e Ludwig,
ResponderEliminar«Exemplos da primeira situação deve haver muitos.»
Diga um apenas!
(alimento inofensivo e abundante à disposição).
Por os animais não conseguirem escolher é que não podemos considerar as suas acções como boas ou más. Pelo contrário onde existe escolha livre surge a moral.
Ludwig, essa tua posição é indefensável. Quem determina o território de seja que animal for, sendo que a base do território é a propriedade privada e a consciência da parte do seu dono dos seus limites e responsabilidades? E a que animais atribuir essas responsabilidades, se não existe fronteira clara entre nós e uma bactéria? Será que as bactérias também têm territórios?
ResponderEliminarComo vês, a tua posição descamba num reductio ad absurdum. Os únicos detentores de territórios são aqueles que têm consciência e responsabilidade pelos mesmos e que são reconhecidos pelos seus semelhantes.
A única coisa que podes fazer é criar parques naturais, que tentem preservar os ecossistemas no seu estado mais desumano possível, de modo a criar um lugar habitável para todos os animais que não gostem nem sobrevivam na nossa presença demasiado assídua :).
Aquilo que nunca deves fazer no direito é atribuir aos animais direitos "humanos". Chama-lhe direitos "animais", e terão sempre qualidades e artigos bastante diferentes dos nossos (precisamente para colmatar a enorme assimetria entre nós e eles) :).
Outro problema na tua posição é quando referes que direitos não exigem deveres. Em sentido específico podes ter razão, mas em sentido lato não. Imagina que concedes aos animais esse tipo de direitos (não roubar). Isto cria imensos problemas logo aí. O que é "do" animal? Quem determina a sua posse? Se retirares bananas da sua árvore estás a "roubá-lo"? E se conseguires por recambolias legislativas determinar isto tudo (imagina o impossível), o que acontece quando um animal roubar outro? O que acontece à posse desse animal, etc.?
Pelas perguntas iniciais que se colocam neste problema cedo se percebe que este é o caminho errado. O mais simples e garante de que se está perante algo justo e claro, é dividir o direito animal do humano.
Pelo contrário onde existe escolha livre surge a moral.
ResponderEliminarDefina por favor "escolha livre". Sem se meter em grandes sarilhos, de preferência. Desde já, digo-lhe que acho isso muito difícil.
«Por os animais não conseguirem escolher é que não podemos considerar as suas acções como boas ou más.»
ResponderEliminarOs animais mais complexos (mamíferos em geral, humanos, símios e golfinhos em particular) conseguem escolher.
Eis um exemplo:
«Durante o inverno no Zoo de Arnhem, depois de limpar o recinto e antes de soltar os chimpanzés, os tratadores lavavam os pneus com a mangueira e penduravam-nos num tronco horizontal preso à estrutura onde os chimpanzés trepavam. Um dia, Krom interessou-se por um pneu que ainda tinha água. Infelizmente, era o último da fila, atrás de vários pneus pesados. Krom puxou e empurrou o pneu que queria mas não o conseguiu remover do tronco. Tentou em vão durante dez minutos, ignorada por todos excepto Jakie, um chimpanzé de sete anos de quem Krom tinha cuidado quando era pequeno. Logo que Krom desistiu e se afastou, Jakie aproximou-se e, sem hesitar, empurrou os pneus um por um para fora do tronco. Quando chegou ao último, tirou-o com cuidado, levou-o direito para não entornar a água e colocou-o em pé perto da tia. Quando Jakie se afastou Krom já estava a tirar água do pneu com a mão.»(1)
Não foi preciso procurar muito.
Nos formigas a propensão para ajudar/não ajudar numa determinada circunstância pode permitir prever o seu comportamento de forma simples. Nesse caso não dizemos que a formiga faz uma escolha.
No caso do macaco, do humano e de outros seres complexos, na mesma circustância coexistem propensões para comportamentos num sentido e noutro (egoístas/altruistas por exemplo) e devido à complexidade do ser não é previsível qual destas propensões acabará finalmente por determinar o comportamento. Podemos chamar "escolha" a este processo, mas ele ocorre noutros animais complexos, tal como nos seres humanos.
Eu pedi apenas um exemplo de um animal que sentisse fome, tivesse alimento inofensivo e abundante à disposição e se recusasse a comer.
ResponderEliminarCapaz de escolher entre comer ou não, evidência de uma vontade de acção consciente com liberdade, eu só conheço o homem. Mas se conhecem mais algum exemplo façam favor...
"Eu pedi apenas um exemplo de um animal que sentisse fome, tivesse alimento inofensivo e abundante à disposição e se recusasse a comer."
ResponderEliminarUm animal que fizesse isto seria estúpido e não inteligente..
Ludi,
ResponderEliminar«ética só poderá compelir quem a compreender, daqui não segue que quem não perceba a ética não mereça consideração da parte de quem a compreende».
Certo. Mas quem tem direitos também tem deveres. E quem não cumpre os seus deveres perde os seus direitos.
Por exemplo, quem mata ou tenta matar perde o seu direito à liberdade.
«tu defendes que um ser tem direitos se, e só se, a sua espécie desenvolveu essa capacidade, mesmo que esse ser tenha algum defeito congénito ou de formação que o prive dessa capacidade. E isso parece-me incoerente porque estás a atribuir direitos (ou a negá-los) a um ser em função da espécie a que pertence em vez de em função dos atributos desse ser»
ResponderEliminarIsso é um non sequitur.
Porque pertencer à espécie A faz parte dos atributos desse ser.
João Moedas,
ResponderEliminar«Um animal que fizesse isto seria estúpido e não inteligente..»
Você nunca passou fome para não chegar atrasado a um compromiso? Ou costuma abandonar uma reunião porque sente fome?
Examples of animal altruism.
ResponderEliminarCristy,
ResponderEliminarOps... erro freudiano. É que eu prefiro compota ao sentido de inevitabilidade. Amoras, sim! Beethoven, não!
Ludwig,
Fiquei esclarecido!
O Nuno gosta de questionar mas nunca responde. Fiquei esclarecido.
ResponderEliminarBarba,
ResponderEliminarNão percebeu o que entendo por «escolha livre»?
Qualquer coisa parecida com a possibilidade de decidir o que fazer de forma independente dos nossos instintos básicos relacionados com a sobrevivência.
Esclarecido?
Bruce,
ResponderEliminarBeethoven não? Porquê? (se não quiseres, não respondas, sei perfeita,ente que não tenho nada com isso e que não vem a propsito da conversa, é só curiosidade minha)
Cristy
Hmm. Isso quer dizer que um cão que me lambe as mãos porque gosta de mim tem "escolha livre"? Ou será que o faz unica e exclusivamente porque sabe que se assim se comportar tem mais hipóteses de sobrevivência? Acha que os donos de animais acreditariam nisso?
ResponderEliminarE se assim fosse, como provar que os humanos não fazem apenas isso, de um modo inconsciente?
Caro Ludwig,
ResponderEliminarcomo julgas que seria o universo caso esse teu deus não existisse e tudo isto se tivesse formado por processos naturais.
É uma afirmação pertinente e agradeço-ta. Eu penso que o facto é que o mundo não podia não ser formado senão por processos naturais. Isso é comum ao crente e ao não-crente. O que me questiono - e acredito que o faças também - é: o que dá o "ser" ao "não-ser"? Ou seja, a resposta à tua afirmação só pode ser feita no campo da filosofia.
Nesse sentido, porque evolui sequer o mundo?
Porquê desta forma? Em Deus encontro a base ontológica para o "ser" do mundo. Sem essa base que dá o "ser" ao que "não-é", o que faz o mundo "ser"?
Porquê estes processos naturais e não outros? Porquê por acaso? Porquê uma selecção natural, ou uma simbiogénese?
Não é do domínio científico dar estas respostas. Se acredito que Deus marcou o mundo com o seu "Ser", ao aprofundar como funciona o mundo, aprofundo também a forma como Deus se relaciona com ele e dessa forma conheço melhor Deus.
Se Deus não existisse, teria de procurar noutro pensamento filosófico razões ontológicas para o "ser" do mundo. Tu que acreditas que Deus não existe, como vês a natureza da existência do mundo do ponto de vista filosófico?
O dever de o tratar bem já é um dever que faz sentido. Quer gostes ou não de uma pessoa podes tratá-la com respeito e consideração. Mas o dever de te afeiçoares a ela parece-me irrazoável porque não podemos escolher o que sentimos.
Mas tratar uma pessoa com respeito e consideração é "amar o próximo". Espero que percebas agora que o alcance de "amar o próximo" na visão Cristã é mais amplo que os afectos.
Amor é um dever. Amor é compaixão. Deus é amor. Deus é compaixão. Deus é um dever. O plano de Deus é amor. O plano de deus é um dever. É, realmente, uma grande confusão... :)
Concordo, é uma grande confusão. O Cristão pensa mais: Deus é Amor. Sou imagem de Deus. Devo ser Amor. Se for Amor, serei para com a natureza, para o homem e para Deus.
como com qualquer hipótese, podemos (e devemos) considerar hipóteses alternativas. Por exemplo, que essa mistura confusa do plano, amor, dever, deus e afins ser a hipótese errada.
A que tipo de hipótese te referes?
.............................................
Cara(o) Cristy,
"Ou seja, Criação não se opõe a evolução, mas a evolução é que seria de esperar de um Deus Criador."
Miguel, pode explicar porquê, por favor?
Respondo com as palavras do teólogo John Haught:
«Enquanto [o universo] se adapta a um infinito amor que se dá a si mesmo e promessa de um futuro novo, o cosmos finito submete-se ao que nos parece ser a dramática evolução em direcção a um aumento de complexidade, vida, consciência, liberdade e expansão de beleza. ...A fé num Deus humilde, Deus da promessa e que se dá a Si mesmo, deveria ter-nos preparado para a revolução de Darwin»
John HAUGHT (2007), “Darwin and contemporary theology”, Worldviews, vol. 11, pp.44-57.
Mas não será mais honesto interpretar a bíblia literalmente, do que interpertar conforme dá jeito?
Penso que não se deve interpretar a Bíblia conforme dá jeito, e não o faço pessoalmente, caso contrário, não se justificaria a exegese e os estudos bíblicos. A Bíblia relata e reflecte, sobretudo, a relação de um povo com Deus, e essa relação evolui, tal como os relacionamentos que estabelecemos. Interpretá-la literalmente é desonesto na medida em que ponho de parte a "essência" e o Mistério contido na mensagem em toda a sua totalidade.
Do ponto de vista do relacionamento, é mais importante dar vida à Bíblia que interpretá-la. Quero com isto dizer que deveria ser possível escrever cada frase da Bíblia com a vida de um Cristão. É claro que isto só é possível numa interpretação exegética e literária, tomando a Bíblia no seu todo e não numa interpretação literalista de algumas das suas partes.
Cordiais saudações,
Miguel Panão
«Bruce,
ResponderEliminarBeethoven não? Porquê?»
Cristy,
Beethoven claro que SIM! Ich mach nur Spaß! (esta foi a Bruce Lina que me recomendou, que eu não dou uma para a caixa em alemão :)
Barba,
ResponderEliminarestamos a chover no molhado. Já vimos que o cão não tem essa possibilidade de escolher o que fazer. Tem comportamentos reactivos que podem demonstrar afecto, ternura, solidariedade,fidelidade, mas nunca pratica um acção contrária ao seu instinto de sobrevivência (pelo menos não vi isso aqui demonstrado), por isso o que faz não pressupõe liberdade no sentido que aplicamos aos humanos de poder fazer mal ou poder fazer bem.
Caro Miguel Panão,
ResponderEliminarNão é do domínio científico dar estas respostas
Asserção totalmente errada, não existe nada a priori fora do âmbito da investigação científica.
Por exemplo, quando pergunta, "o que faz o mundo "ser"? ", as respostas (ainda vagas, admito) já começam a pressentir-se nas físicas mais teóricas. Basicamente, o "não-ser" é mais instável do que o "ser", e quantifica-se isto. Ou quando pergunta, "Porquê por acaso", a física também se questiona isto, ou ainda "Porquê uma selecção natural", é a mais fácil de responder. A Selecção natural é aquilo que acontece sempre que estivermos perante a possibilidade de pedaços de matéria acidentalmente replicarem-se, e tempo. Muito tempo.
Dados estes dois ingredientes, um, matéria diversa e fértil (produzida pelas estrelas) e dois, tempo, a selecção natural é inevitável.
Se Deus não existisse, teria de procurar noutro pensamento filosófico razões ontológicas para o "ser" do mundo.
O problema não é este. É claro que é uma problemática muito interessante. A questão é se alguém possui a resposta. E não há razão nenhuma para acreditar que um padre, papa, dito santo ou profeta tenha realmente acesso priviligiado a estas respostas. A resposta mais honesta é dizer, enfim, sabemos isto e aquilo, temos toda uma cultura fascinante sobre o assunto, mas não conseguimos ainda dar uma resposta aceitável.
O que é o contrário do que as religiões afirmam.
Mas tratar uma pessoa com respeito e consideração é "amar o próximo".
De facto as discussões descambam todas em semânticas. Acho que o sr. Miguel Panão não sabe de facto o que é o amor, está a confundir um sentimento extraordinário com acções que podem, ou não, provir desse amor.
A que tipo de hipótese te referes?
Acho que à sua. Adianto também que a sua resposta à Cristy é um total non sequitur. Não vejo como é que determinados atributos de humildade de Deus têm algo a ver com um fenómeno tão amoral e desinteressado como é a SN.
É claro que isto só é possível numa interpretação exegética e literária, tomando a Bíblia no seu todo e não numa interpretação literalista de algumas das suas partes.
Bela maneira de dizer, "Não nos responsabilizamos pelas partes feias, só pelas bonitas". Não há nenhum outro campo ou filosofia que desculpabilizemos desta maneira, isto é inaceitável. Se a Bíblia é imperfeita, faça-se outra. Mas, claro, isso é impossível (seria a anarquia), e por isso como alguém aqui já disse, a teologia é filosofia antiga embalsamada e dogmatizada. Está presa a um texto da idade do bronze, e isso é, legitimamente, alvo de gozo.
Tem comportamentos reactivos que podem demonstrar afecto...
ResponderEliminarPortanto o afecto animal é apenas reactivo, não é "genuíno". Quando um cão encontra outro casuisticamente na rua e começa a brincar com ele também não é "genuíno", é apenas reactivo.
Começo a perguntar-me o que é que não é reactivo.
Barba,
ResponderEliminarAlguém disse, a propósito da guerra do Iraque, que é possível enganar poucas pessoas durante muito tempo, muitas pessoas durante pouco tempo, mas já não é possível enganar muitas pessoas durante muito tempo. Encontrar actualidade num texto da idade do bronze, nos dias de hoje e por tanta gente, é motivo não de gozo ou escárnio mais sim de admiração e respeito.
Barba,
ResponderEliminarTire o «reactivo» que o sentido não se altera muito.
Meu caro Nuno, nunca disse que a Bíblia não é excelente Literatura.
ResponderEliminarNão sou eu que argumento que a sua origem é algo mais que ... humana.
E se há coisa que o marketing para a guerra do Iraque não é, é literatura...
Muito bem, Nuno, e quando um cão se atira em defesa do seu dono, é também por instinto de sobrevivência própria?
ResponderEliminarObviamente que não espero que um cão ou outro animal pouco inteligente faça escolhas extraordinariamente humanas. Mas a génese encontra-se lá.
«E se há coisa que o marketing para a guerra do Iraque não é, é literatura...»
ResponderEliminarNão percebi.
«e quando um cão se atira em defesa do seu dono, é também por instinto de sobrevivência própria?»
ResponderEliminarLógico. Já viu algum cão atirar-se em defesa de quem ele não considera dono.
Ricardo,
ResponderEliminar«Porque pertencer à espécie A faz parte dos atributos desse ser.»
Nem por isso. O ser, por si só, não pertence a espécie nenhuma. É por comparação com outros seres que determinas isso. Ter 1.80m é um atributo do ser. Ser o maior da turna não é um atributo. É uma relação.
Mas o problema importante determinares os direitos de um ser com base nos atributos de outros membros do grupo no qual tu o colocas.
A incoerência é esta:
- Para ter direitos é preciso ter o atributo X.
- A maioria da espécie A tem o atributo X.
- B tem direitos porque pertence à espécie A, mesmo que não tenha o atributo X.
Nuno Gaspar,
ResponderEliminar«alimento inofensivo e abundante à disposição»
Há muitos casos de animais que perdem um ente querido (filhos, normalmente, ou os donos no caso de animais de estimação) e ficam sem comer, deprimidos.
Ricardo,
ResponderEliminar«Mas quem tem direitos também tem deveres.»
Porquê? Nunca chegaste a explicar isso...
Um recém nascido tem direitos. Que deveres tem se nem sequer percebe o conceito?
Barba,
ResponderEliminar«Quem determina o território de seja que animal for, sendo que a base do território é a propriedade privada e a consciência da parte do seu dono dos seus limites e responsabilidades?»
Cometes o erro do Ricardo de ver a coisa ao contrário. Tu tens um direito sempre que alguém reconhecer ter um dever para contigo.
Se nós reconhecermos que temos o dever de não ir lá matar os chimpanzés e destruir a floresta, ou quem diz os chimpanzés pode dizer uma tribo na Amazónia ou algo assim, isso basta para que essa zona seja reconhecida como deles -- mesmo que eles nem saibam que nós existimos ou não tenham noção de propriedade privada.
Por exemplo, muitas tribos de índios na américa do norte não tinham a noção que alguém pudesse ser dono de terras. Mas os negócios de lhes comprar terras por valores ridículos, aproveitando-se dessa diferença cultural, foram claramente imorais. Porque quem tomou posse das terras sabia que aquilo não era justo.
«o que acontece quando um animal roubar outro? O que acontece à posse desse animal, etc.?»
Tu podes descobrir uma tribo numa zona remota, decidir que aquela àrea pertence à tribo e não poderá ser explorada por lenhadores ou fazendeiros, mas mesmo assim não mandar lá polícia a ver o que os membros da tribo fazem uns aos outros. Essa objecção não é um problema moral fundamental, como a questão de quem pode ou não pode ter direitos. É uma mera questão prática de implementação.
Ludwig,
ResponderEliminarCom febre ou com stress um animal não come ou come menos, porque não sente fome. Não é bem disso que estamos a falar.
Miguel Panão,
ResponderEliminar«o que dá o "ser" ao "não-ser"?»
Nada. Ou é, ou não é. Ninguém lhe pode "dar o ser". Imagina uma montanha que não é. Alguém pode dar ser a essa montanha e transformar essa montanha numa montanha que é? Penso que isso não faz sentido. Se alguma montanha passar a ser, com certeza não será a mesma montanha que antes não era. Isso não faz sentido.
«a resposta à tua afirmação só pode ser feita no campo da filosofia.»
Isto de uma coisa subitamente ser é do domínio da física. Acontece com partículas subatómicas constantemente, e é perfeitamente capaz de criar um universo sem deuses.
Ou imagina, se preferires, que o teu deus fez o Big Bang e imediatamente desapareceu. Notava-se alguma diferença?
E agora imagina que o Big Bang não precisa de causa, por isso nem para isso era preciso deuses...
«Porquê estes processos naturais e não outros? Porquê por acaso? Porquê uma selecção natural, ou uma simbiogénese?»
São boas perguntas. Boas demais para um resposta tão pobrezinha como "por causa de deus".
«Não é do domínio científico dar estas respostas.»
Diz quem? Isso parece-me uma arrogância extraordinária. Por mim, os religiosos podem propôr as respostas que quiserem. Se deren uma resposta que seja melhor que as outras que possamos arranjar, aceitá-la-ei até vir melhor. É isso que faço com a ciência, não me importo de o fazer com a religião.
Mas não vou aceitar algo como "porque deus acordou virado para aí" só porque proíbem a entrada à ciência. Isso é batota.
Se é uma pergunta que vale a pena responder, então vale a pena abordá-la da melhor forma que pudermos e não andar a criar coutadas.
«A que tipo de hipótese te referes?»
Por exemplo: não há deuses. Nenhum. Zero.
Curiosamente, essa hipótese explica imensa coisa. E é testável. E prevê adequadamente o que observamos.
Nuno Gaspar,
ResponderEliminar«Já vimos que o cão não tem essa possibilidade de escolher o que fazer.»
Como é que determinou isso? Se puser à frente do cão dois pratos com comida, ele não consegue escolher qual deles vai comer? Se duas pessoas o chamarem, ele não consegue escolher com quem vai ter? Se lhe der uma ordem ele não pode escolher se obedece ou não?
Pode descrever que experiências conhece que demonstrem a incapacidade total de um cão em escolher o que faz?
«Se puser à frente do cão dois pratos com comida, ele não consegue escolher qual deles vai comer?»
ResponderEliminarNão. Vai escolher a mais apetitosa.
«Se duas pessoas o chamarem, ele não consegue escolher com quem vai ter?»
Não. Vai escolher aquela por quem sente mais proximidade.
Não. Ele nunca lhe vai obedecer se previamente não foi recompensado por isso.
É um pouco diferente da liberdade humana, não é?
«Pode descrever que experiências conhece que demonstrem a incapacidade total de um cão em escolher o que faz?»
ResponderEliminarVocê é que tem que descrever experiências em que um cão escolhe fazer algo que contraria os seus instinto primários. Em nenhum dos exemplos que referiu isso acontece. Que ele não tem capacidade de escolher em liberdade parece-me evidente.
Caro Barba Rija,
ResponderEliminartem nome? :)
não existe nada a priori fora do âmbito da investigação científica.
Isto é uma afirmação científica ou filosófica?
o "não-ser" é mais instável do que o "ser", e quantifica-se isto
Como se quantifica?
A questão é se alguém possui a resposta.
Concordo consigo, mas não só eu, também um padre, o Papa, etc, porque tanto o "Barba Rija" como nós procuramos a verdade. A minha proposta é que a procuremos "uns com os outros" e não "uns contra os outros".
Acho que o sr. Miguel Panão não sabe de facto o que é o amor,
Como sabe isso?
e está a confundir um sentimento extraordinário com acções que podem, ou não, provir desse amor.
Para si o amor é apenas um "sentimento extraordinário"?
Não vejo como é que determinados atributos de humildade de Deus têm algo a ver com um fenómeno tão amoral e desinteressado como é a SN.
Leva tempo ... como a evolução.
Se a Bíblia é imperfeita, faça-se outra. Mas, claro, isso é impossível (seria a anarquia), e por isso como alguém aqui já disse, a teologia é filosofia antiga embalsamada e dogmatizada.
Respeito que pense desta forma, mas espero que perceba que a minha forma de pensar (diferente) provém de uma experiência de vida, não de uma ideia que possa ter sobre o assunto. Há muitas histórias na Bíblia difíceis de entender e explicar o seu significado, mas não é essa dificuldade que nos deve demover de melhor a compreender e viver, mas precisamento o contrário.
Por fim, um último comentário. A postura do "Barba Rija" relativamente à extensão da explicação dada pela investigação aos "porquês" pressupões um reducionismo metodológico. Pode fazê-lo, mas existe quem não o faça.
Cordiais saudações,
Miguel Panão
Caro Nuno Gaspar,
ResponderEliminar«Em nenhum dos exemplos que referiu isso acontece. Que ele não tem capacidade de escolher em liberdade parece-me evidente.»
O Nuno está a condicionar a resposta á partida.
Se eu disser que só acredito que o Nuno Gaspar tem liberdade quando escolher nunca mais comentar neste blog, o Nuno Gaspar escolhe sair daqui e nunca mais voltar, só para provar o seu ponto de vista?
É claro que não. Simplesmente porque quer comentar e continuar a participar nas discussões.
Se eu conseguir explicar a um cão, por tentativa e erro e sem recurso a violência, que se ele não comer o biscoito que eu atirei para o chão à frente dele eu vou ficar feliz com ele, ele decide, facilmente, não comer. Considera isso liberdade suficiente? É que isso não só é possível como trivialmente fácil.
Caríssimo Ludwig:
ResponderEliminarO seu texto é um excelente ponto de partida para a análise da validade da perspectiva que lhe dá forma e da respectiva complexidade. Penso, aliás, que é somente isso: uma perspectiva. Que, na medida em que é verdadeira no seu aspecto funcional, esconde mais do que revela, tornando-se correlativa do obscurantismo criacionista (da treta). Se, em relação a Kant, ela se aplica, a meu ver, correctamente e por inteiro, no tocante ao conceito platónico de Ideia - utilizado, neste seu texto, no sentido da caricatura que dele é veiculada no ensino secundário e que é frequentemente prolongada nas licenciaturas - creio que um exame mais atento do que ele significa no plano gnosiológico abriria para outro plano de análise da questão ética (uma vez mais, esqueça as vulgatas).
Se se quiser dar ao trabalho...
E à disponibilidade, evidentemente, que é o que cada vez mais nos falta.
Francisco,
ResponderEliminarVocê não sabe se eu continuo a escrever comentários e eu não sei se o Ludwig os aceita para publicação. Nestas duas situações há liberdade.
No caso do cão
«Considera isso liberdade suficiente?»
Não. Acho que isso é um comportamento reflexo condicionado. O cão fará algo à espera de uma recompensa (comida, afecto). Liberdade acontecerá quando, sem fase educativa de Pavlov, ele fizer algo que contraria os seus instintos básicos, mostrando não estar condicionado por eles. Tente.
Joaquim Simões,
O que será que você quis dizer?
Caro Ludwig,
ResponderEliminarParece óbvio que o "ser" de uma montanha é diferente do "ser" de uma formiga, ou abelha ou homem. Isto é, possuem valores ontológicos diferentes, mas parece-me não haver dúvidas de que "são" por via da "existência", e que essa "existência" tem uma raiz. Que raiz?
Uma vez que não acreditas em Deus poderás dizer que essa raiz está nos processos de natureza cosmológica que geram a matéria constitutiva de um planeta numa estrela; processos de natureza gravitacional que aglomeram matéria até formar um planeta; processos de natureza geológica que informam a montanha. Contudo, estamos a falar de natureza cosmológica, gravitacional, geológica, mas não da natureza da existência, remetendo à famosa questão de Leibniz "Porque existe alguma coisa em vez de nada?"
Se na tua opinião nada é o que dá o "ser" ao que "não-é", significa que a tua posição ontológica é "niilista"?
Isto de uma coisa subitamente ser é do domínio da física.
Este é um exemplo típico de reducionismo ontológico, isto é, de reduzir o ser apenas ao que é material. Podes fazê-lo como materialista ateu, mas sabendo que existem outras visões que não o fazem.
imagina que o Big Bang não precisa de causa, por isso nem para isso era preciso deuses...
Eu posso imaginar, mas continuo a perguntar porque existe sequer?
São boas perguntas. Boas demais para um resposta tão pobrezinha como "por causa de deus".
Bom ... quando coloquei as questões não tinha em mente "por causa de deus", mas que são questões cuja resposta implica uma interacção mutuamente criativa entre fé e ciência, através do discurso filosófico. É claro que para quem não tem uma fé religiosa, encontrará as respostas interagindo a ciência com uma doutrina filosófica, mas o meu argumento é que limitar as respostas ao domínio científico, só produz respostas limitadas.
Diz quem? Isso parece-me uma arrogância extraordinária.
...não vou aceitar algo como "porque deus acordou virado para aí" só porque proíbem a entrada à ciência.
Diz quem? - pergunto agora eu. É essa a impressão que tens dos Cristãos? Que confundem "saber" com "sabedoria"? O Deus de Jesus Cristo é muitíssimo mais do que um demiurgo ou um deus-das-lacunas. Essa ideia está ultrapassada.
«A que tipo de hipótese te referes?»
Por exemplo: não há deuses. Nenhum. Zero.
Não te perguntei "qual" a hipótese, mas o tipo de hipótese. Devo presumir pela tua resposta que é uma hipótese de natureza estatística?
Cordiais saudações,
Miguel Panão
Caro Nuno Gaspar,
ResponderEliminar«Acho que isso é um comportamento reflexo condicionado.»
O Nuno respondo como naturalmente lhe convém...
Mas por acaso não se trata de um reflexo condicionado, porque estes são, como o nome indica, reflexos e têm base inconsciente. Como o salivar dos famosos cães de Pavlov. Não se escolhe salivar ou deixar de salivar. Mas escolhe-se obedecer ou desobedecer.
Nos seus termos eu também posso dizer que o regresso do Nuno Gaspar a este blog é "reflexo condicionado" porque também o Nuno espera algo das suas vindas ao blog: quer ver as suas ideias aceites, vencer um argumento, tem curiosidade em ler as respostas... Tudo isso interfere na sua decisão de vir aqui a esta caixa de comentários e como tal a sua opção não é totalmente livre.
Claro que não eu não penso que o Nuno só responde pelos seus instintos mas pela sua definição de liberdade de escolha sou levado a dizer que sim.
A um nível diferente dos nossos animais de estimação, é certo, mas não obstante semelhante, as nossas escolhas são condicionadas sempre que queremos tomar uma decisão. Não há decisões puramente livres.
Caro Miguel Panão,
ResponderEliminarSe carregar no meu nickname, verá um perfil do meu ser, e o meu nome escarrapachado no topo da página. Ainda não coloquei nenhuma foto, por falta de paciência...
Isto é uma afirmação científica ou filosófica?
É uma afirmação filosófica, como é óbvio, não desconverse por favor.
Como se quantifica?
Ainda não se chegou lá. Está tudo ainda a tentar perceber qual a variante da teoria das cordas que se aplica ao universo que vemos à nossa volta. Mas tudo indica que em termos do que se passa ao nível da mecânica quântica, o nada é mais instável do que "qualquer coisa".
Em relação ao seu "uns com os outros e não uns contra os outros", gostaria de dizer que na Igreja quem decide é o Vaticano, não há cá democracia nem tem de haver. Gostaria de lhe lembrar o credo cristão, que é o oposto da afirmação que não se possui a resposta. E gostaria por fim de lhe lembrar que a grande disputa neste momento nem se faz entre cristãos e ateus, mas entre a nossa civilização e a teocracia muçulmana.
Como sabe isso?
A partir do momento em que define o amor como um acto, torna-se claro que a sua mente não está esclarecida em relação ao conceito. Lembre-se que a discussão é sobre o amor compulsivo, e como o Ludwig se distingue de você ao invocar apenas a necessidade de respeito mútuo. Se vem você e diz que isso "é amor", estamos a desconversar. Ou então a não representar correctamente as coisas.
Leva tempo ... como a evolução.
Por favor desenvolva. Não percebi.
Respeito que pense desta forma, mas espero que perceba que a minha forma de pensar (diferente) provém de uma experiência de vida, não de uma ideia que possa ter sobre o assunto.
Gostaria que percebesse igualmente que eu levo a sério a diferença entre a teoria e a praxis de qualquer ideologia mais ou menos ridícula a primeiro relance. Isso não quer dizer que eu não possa apontar como ridículas as questões que a teoria diz, nem que eu veja praxis idiotas que nascem precisamente dessas teorias ridículas (como ameaçar de morte pessoas por "desecrarem" bolachas por pensarem que se trata do "corpo de Cristo"). Eu faço como o próprio teólogo da idade média aconselhava, aproveitem o bom e deitem fora o que não presta. O que, diga-se de passagem, não deixa restar muito do que é o núcleo da coisa...
Em relação ao reducionismo, afasto a crítica, não me revejo nela. Nunca fui reducionista, embora reconheça o valor histórico dessa metodologia nas descobertas feitas até hoje. Temos de compreender que é o método mais simples de estudar seja o que for, mas também temos de compreender que as coisas são mais do que a soma das suas partes.
Tenho uma visão mais fractal e escalar da vida e do universo. Talvez tenha a ver com a minha formação de arquitecto. Neste caso, considero que cada escala tem a sua estrutura própria, assente sobre a mais simples. E que cada escala tem os seus fenómenos próprios. E subindo na escala subimos na complexidade, até à nossa.
Há que concluir dizendo que embora uma visão holística seja sempre o desejável em relação a coisas muito complexas como é a vida, existem sempre balizas e limites lógicos até onde podemos ir com as nossas conclusões, e as metafísicas religiosas ultrapassam essa barreira.
Caro Luis, o "Barba Rija",
ResponderEliminarSe a sua afirmação não existe nada a priori fora do âmbito da investigação científica é filosófica significa que reduz toda a forma de conhecer à científica. Isto tem um nome. Chama-se reducionismo epistemológico. Pode fazê-lo, mas que saiba que há quem não o faça...
o nada é mais instável do que "qualquer coisa"
Portanto, o "nada" é para si o "não-ser" e penso o mesmo. O "qualquer coisa" é o ser. Não percebi se este qualquer coisa se refere ao que é apenas material ...
No que diz respeito ao "nada" ao nível da mecânica quântica que refere, é diferente do "nada" dos teólogos ou filósofos. O "nada" da mecânica quântica é um "nada" matemático que pode ser entendido como aquilo sobre o qual o modelo matemático "nada" sabe dizer.
na Igreja quem decide é o Vaticano
Como!? Na Igreja quem decide é o Espírito Santo, mas se não acredita no Espírito Santo, então não se deveria pronunciar sobre uma coisa que não sabe, ou acredita. Mas concordo consigo, em Igreja não há democracia, mas "trinitacia", o que dificilmente iria compreender uma vez que duvido que acredite em Deus-Trindade... estarei errado?
Gostaria de lhe lembrar o credo cristão, que é o oposto da afirmação que não se possui a resposta.
Não percebi.
a grande disputa neste momento nem se faz entre cristãos e ateus, mas entre a nossa civilização e a teocracia muçulmana.
Ai sim? Não sabia. O que entende por civilização? Os muçulmanos não são civilizados? Parece-me um abuso de linguagem que toma a parte pelo todo, mas posso estar enganado ...
A partir do momento em que define o amor como um acto
Lamento, mas eu nem sequer defini "amor", logo, não percebo como o possa ter definido como acto ...
Se acha que "respeito mútuo" não é amar, respeito a sua opinião, mas gostaria que respeitasse a minha e que fosse mais humilde na forma como acha saber aquilo que está na minha mente.
Leva tempo ... como a evolução.
Por favor desenvolva. Não percebi.
Eu disse que levava tempo, por isso, não espero que venha a perceber de imediato. Disse-me que
não vejo como é que determinados atributos de humildade de Deus têm algo a ver com um fenómeno tão amoral e desinteressado como é a SN.
Em primeiro lugar confundiu "evolução" com "selecção natural". Não são a mesma coisa. Em segundo existe um significado para a humildade de Deus, e para a promessa em Deus que dá sentido à forma como o mundo evolui. Um mundo "criado" por Deus possui marcas do seu Criador. A humildade de Deus pode significar este dar espaço ao outro (universo) para que "seja" (dando-lhe o "ser") e se "torne", ou seja, evolua. Por outro lado, o universo está aberto à novidade, está inacabado, porque o todo não é igual à soma das partes (como reconheceu), mas é algo novo, o que significa que muita coisa pode ainda acontecer e isso dá-nos a esperança de que a realidade não fica por aqui, o que se designa como um universo da "promessa".
Eu faço como o próprio teólogo da idade média aconselhava, aproveitem o bom e deitem fora o que não presta. O que, diga-se de passagem, não deixa restar muito do que é o núcleo da coisa...
É bom conselho que exige maturidade, pois, como sei que algo que não preste não seja bom, ou algo que não tenha como bom, possa prestar?
Que núcleo? Que coisa?
Nunca fui reducionista, (...)
Pode não ter-se apercebido disso, mas se o desejou sempre é um passo que valorizo.
existem sempre balizas e limites lógicos até onde podemos ir com as nossas conclusões, e as metafísicas religiosas ultrapassam essa barreira
Caro Luis, tem toda a razão. É por isso que procuro sempre uma abordagem transdisciplinar para conseguir a unidade na diversidade de saberes, mas apenas do amor vem a sabedoria. Nesse sentido, apesar de discordar (como seria de esperar) de alguns dos seus pensamentos, agradeço a sabedoria que me partilha com a sua experiência de vida como arquitecto. É um empenho de uma riqueza extraordinária.
Cordiais saudações,
Miguel Panão
Francisco,
ResponderEliminarNão percebo a diferença.
o cão de Pavlov tem a expectativa de encontrar comida ao ouvir uma campainha. O seu cão tem a expectativa de uma recompensa se lhe obedecer.
As nossas decisões são condicionadas mas nós, ao contrário dos outros animais, temos a possibilidade de escolher as consequências. A liberdade deve estar à volta disso. Como diz São Paulo, "tudo posso fazer mas nem tudo me convém"
Miguel
ResponderEliminarentão não se deveria pronunciar sobre uma coisa que não sabe, ou acredita.
Treta. Assim sendo estás a fazer o que condenas, pois pronuncias sobre algo que não acreditas: a crença na não existência.
A evolução... seja do que for, tanto animado como inanimado... é simplesmente inteligência em acção. Sem esta simplicíssima compreensão não é possível entender nem explicar toda a sucessão que conduz a matéria a formas sucessivamente mais complexas, organizadas e auto-suficientes.
ResponderEliminarPor sua vez, a inteligência natural é tão simplesmente a capacidade de resolução de problemas e superação de obstáculos, que se traduz na adaptação bem sucedida a novas situações. No caso dos seres vivos, tal representa a perfeita integração no seu ambiente, conducente à sua sobrevivência individual e como espécie.
Logo, neste sentido, a inteligência tem uma finalidade óbvia, claro. Todo o texto confirma esta afirmação, mormente quando se diz no final que estas características se propagaram melhor que as suas concorrentes no tempo dos nossos antepassados. Ou seja, inteligência em acção igual a evolução... easy to see as we certainly agree! :)
A explicação dos mecanismos biológicos ou quaisquer outros é apenas a descrição do modo como essa inteligência actua. Uma vez que estamos imersos nela... TUDO é inteligente!... sucede que por vezes nem nos apercebemos da sua presença, tal como o peixe que não sabe o que é o mar onde vive.
Como os seres mais evoluídos e inteligentes neste planeta temos a antropocêntrica tendência a nos julgarmos o centro único da inteligência, definida como faculdade que tem o espírito de pensar, conceber, compreender; juízo, raciocínio. Mas ela já existe muito antes de termos surgido como Homo sapiens e permanecerá mesmo que nós desapareçamos, se não formos suficientemente espertos para reconhecermos que somos apenas uma parte dessa infinita inteligência natural, com a qual devemos cooperar para a nossa própria sobrevivência e a total evolução do Cosmos.
Logo, a inteligência evolui para se propagar e multiplicar, desdobrando-se em múltiplas formas surpreendentes e novas. E, nesse sentido, claro que tem um propósito e finalidade óbvios. Ao negarmos ou não compreendermos algo tão simples que qualquer criança facilmente consegue perceber, estamos a minimizar a nossa própria inteligência e humanidade, separando-a do todo universal do qual é indissociável.
Átomos inteligentes, genes inteligentes, seres inteligentes... natureza inteligente e autoconsciente!
E agora cada vez mais o sabemos...
Rui leprechaun
(...dentro e fora, em todo o lado a vemos! :))
All kinds of everything remind me of You!
como julgas que seria o universo caso esse teu deus não existisse e tudo isto se tivesse formado por processos naturais. É que me custa a ver que diferença faz esse deus...
ResponderEliminarÉ isso mesmo, ó sábio Ludwig!!!
Inteligência natural ou imanente... em cada mínima partícula já está tudo presente!
Por isso eu digo atrás que somos esse peixe que não tem consciência do mar onde vive, tal como nós separamos a nossa consciência individual do mar da consciência universal... sea of joy! :)
O Miguel diz de forma brilhante e bem eloquente a mesmíssima coisa, com uma roupagem mais teológica, mas isso não é importante. Basta só reconhecer que há mesmo um elo perdido ou que falta em tudo isto, e claro que não me refiro aos fósseis nem nada disso!
Esse "missing link" é o subtil motor de todo este incrível processo de formação de um universo a partir do vazio primordial, já pleno de possibilidades que lentamente se concretizaram.
The Tao is like a well:
used but never used up.
It is like the eternal void:
filled with infinite possibilities.
It is hidden but always present.
I don't know who gave birth to it.
It is older than God.
Sempre o Ser Humano o soube e reconheceu, pois no seu âmago intuitivamente compreendeu. Logo, como é tão espantosamente irónico que, em nós, a parte racional dessa inteligência nos queira julgar separados do todo único de onde proviemos... por processos naturais, como tudo o que fazemos!
Inteligência... inteligência... inteligência!...
Rui leprechaun
(...semente invisível da consciência! :))
Caro Miguel Panão,
ResponderEliminaro John Haught fala muito bem, mas não diz muita coisa. É acérrimo adversário dos criacionistas e lembro-me de ter ouvido dele qualquer coisa como (tradução livre): "Teologicamente faz mais sentido um deus que não se sabe bem como fez um mundo que se faz a si próprio, do que um
que está permanentemente a intervir na sua criação, como defendem os criacionistas».
Ora, teologicamente isso talvez faça sentido, logicamente não faz nenhum. Havendo um deus omnipotente, ele também pode optar por ser com os criacionistas (islâmicos, adentistas, etc) querem que seja. E sendo ominpotemte, podia ter criado um mundo que se criasse a si próprio sem tanto defeito, não acha? Uma coisa perfeitinha à nascença que não obrigasse ao espinhoso caminho da evolução. E, sobretudo, que nos pusesse cá na terra tpdps 100% à imagem dele, e evitasse que nos tresmalhássemos aos milhares e milhões.
Quanto ao resto, penso que no meio de tudo se esqueceu de responder à minha pergunta: dos muitos que o fizeram e ainda fazem, quem, a seu ver, interpreta correctamente a bíblia? E porquê?
Cumprimentos
Cristy
Bruce
ResponderEliminarEntão este é para a Bruce Lina (com os meus cumprimentos pelo excelente alemão): Spass muss sein. ;-)
Cristy
"Alguém disse, a propósito da guerra do Iraque, que é possível enganar poucas pessoas durante muito tempo, muitas pessoas durante pouco tempo, mas já não é possível enganar muitas pessoas durante muito tempo"
ResponderEliminarDuvido, Nuno, o Abraham Lincoln não teve muito a ver com a guerra no Iraque ;-)
Cristy
Cara(o) Cristy,
ResponderEliminarPenso que aquilo que John Haught deve ter dito, uma vez que conheço o seu trabalho, foi de teologicamente fazer mais sentido pensar que Deus fez um mundo que se faz a si mesmo, mas que lhe dá tal liberdade que não sabe onde irá o mundo chegar, abdicando desse conhecimento por amor. Um Deus que intervém da forma como os criacionistas o entendem é um demiurgo, não um Deus que se faz nada, por amor, para que algo diferente de si possa surgir, tal como o nosso universo.
E sendo ominpotemte, podia ter criado um mundo que se criasse a si próprio sem tanto defeito, não acha? Uma coisa perfeitinha à nascença que não obrigasse ao espinhoso caminho da evolução. E, sobretudo, que nos pusesse cá na terra todos 100% à imagem dele, e evitasse que nos tresmalhássemos aos milhares e milhões.
A pergunta podia ser posta da seguinte forma: se fossemos Deus que tipo de mundo criaríamos? Partilho uma citação feita pelo John Haught sobre este assunto que encontrou em Guy Murchie: «Honestamente, se fosses Deus, poderias sonhar um mundo mais educativo, contranstante, emocionante, belo, deslumbrante que a Terra para desenvolver nela o espírito? ... Tentarias, por outras palavras, tornar o mundo bonito e seguro - ou deixarias que fosse provocativo, perigoso e excitante? De facto, se alguma vez se chegasse a esse ponto, estou certo que darias como impossível fazer um mundo melhor do que aquele que Deus já criou». Por isso - conclui Haught - este é o melhor dos mundos possíveis, pois, a providência Divina manifesta-se no rigor, assim como na criatividade da evolução.
Outros pensamentos poder-se-iam encontrar em John Polkinghorne, Arthur Peacocke, e outros, infelizmente, ainda desconhecidos.
quem, a seu ver, interpreta correctamente a bíblia?
Aqueles que a vivem e com essa vida reescrevem-na tal como a lemos.
Cordiais saudações,
Miguel Panão
Caro Nuno Gaspar,
ResponderEliminar«o cão de Pavlov tem a expectativa de encontrar comida ao ouvir uma campainha.»
Mas isso não descreve um reflexo incondicionado. A salivação sim. Essa é a diferença - o reflexo não depende das nossas decisões. A habituação diária levou a que a salivação fosse provocada pelo toque do sino, quer o tratador desse comida ou não aos animais.
Quanto às espectativas todos os animais com memória as podem ter, em princípio. Mas as abelhas não fazem escolhas enquanto que pelo menos alguns mamíferos fazem.
O Nuno diz que as escolhas dos outros animais que não o ser humano são completamente condicionadas pelos seus instintos mas isso não é verdade. Tal como não é verdade que as escolhas dos seres humanos sejam completamente independentes dos nossos instintos e emoções. Não é isso que vinca a diferença entre homo sapiens e demais bicharada.
Se um escuteiro ajudar uma velhinha a atravessar a rua eu posso argumentar como o Nuno Gaspar e dizer que a decisão do escuteiro foi influenciada pela recompensa moral de saber que teve a atitude certa, pelo temor de ser censurado pelos pares por não o fazer, etc, e que, como tal, essa atitude não foi completamente altruísta. Porque quem ajuda sente-se bem por ter ajudado, ou não? Quem não ajuda quando podia é criticado, certo? Isso torna-nos 100% egoístas? Eu acho que não...
Este último parágrafo não obsta a que os outros animais só respondam pelos instintos. Mas os resultados da observação de primatólogos e outros biólogos levam-nos a crer que sim - há animais capazes de fazer escolhas de forma minimamente livre.
O Nuno Gaspar tem simplesmente sofismado ad hoc para encaixar esses comportamentos na sua crença de que os animais não são livres.
"Honestamente, se fosses Deus, poderias sonhar um mundo mais educativo, contranstante, emocionante, belo, deslumbrante que a Terra para desenvolver nela o espírito?"
ResponderEliminarCaro Miguel Panão,
responderia que honestamente, sim. E sem grandes dificuldades.
"De facto, se alguma vez se chegasse a esse ponto, estou certo que darias como impossível fazer um mundo melhor do que aquele que Deus já criou"
O Sr. Murchie tem o direito à sua opinião, mas não vejo onde ela se aplique a mim. Discordo plenamente.
"Aqueles que a vivem e com essa vida reescrevem-na tal como a lemos."
Caro Miguel, a sua crença permite-lhe dar uma única resposta concreta a uma pergunta clara e inquívoca? Se for o caso, peço que seja a esta. Se não, deixe lá, está a resposta mais que dada.
Cristy
Joaquim Simões,
ResponderEliminarObrigado pelo comentário, mas não percebi esta parte:
« no tocante ao conceito platónico de Ideia [...] creio que um exame mais atento do que ele significa no plano gnosiológico abriria para outro plano de análise da questão ética»
Dei-o como exemplo de uma tentativa de saír daquilo que sentimos pelo outros (amar o próximo, por exemplo) e fundamentar a ética em algo que seja independente dessa perspectiva pessoal (no caso de Platão uma ideia de bem, no caso de Bentham o agregado do que todos sentem, que vai além do que cada um sente acerca disso).
Nuno Gaspar,
ResponderEliminarParece-me que o seu problema é querer forçar a realidade às suas definições.
Se o cão escolhe o prato A é uma reacção mecânica automática porque o prato A lhe parece preferível.
Se a pessoa escolhe o prato A é porque exerceu a sua liberdade de ser humano e escolheu aquele prato que preferia.
Esta distinção é absurda.
Uma distinção importante entre nós (a partir de certa idade, em pessoas saudáveis) e pelo menos a maioria dos outros animais é a possibilidade de moldarmos muitas das nossas escolhas impondo orientações simbólicas -- linguagem, rituais, pensamentos, etc.
Podemos ensinar um cão a nunca comer carne de porco. Mas podemos ensinar uma pessoa a nunca comer carne de porco usando apenas palavras, e isso não dá para fazer com o cão.
E isso é relevante para a ética porque a ética é uma expressão simbólica que tenta justificar regras de conduta. Qualquer animal incapaz de manipular conceitos simbólicos não será capaz de contribuir deliberadamente para a ética.
Mas isto não tem nada a ver com a capacidade de escolher ou a tal "liberdade" que ninguém sabe bem o que é ou se existe. Pelo contrário. Vendo bem as coisas, a nossa capacidade de sermos guiados por linguagem é algo que nos tira liberdade, permitindo criar "programas" que guiam a nossa conduta.
E é essa restrição que nos permite ser agentes éticos. Podemos usar a ética para criar normas de conduta e obrigar-nos a cumpri-las.
Miguel Panão,
ResponderEliminar«Parece óbvio que o "ser" de uma montanha é diferente do "ser" de uma formiga, ou abelha ou homem. Isto é, possuem valores ontológicos diferentes, mas parece-me não haver dúvidas de que "são" por via da "existência", e que essa "existência" tem uma raiz. Que raiz»
Um parágrafo com tantas aspas indicando que as palavras não querem dizer o que normalmente significam é tudo menos óbvio...
Um modelo refere-se a algo que existe se, e só se, o modelo corresponde à realidade. A existência é, primeiro, o problema epistemológico de saber se há esta correspondência.
Só depois de sabermos o que estamos a dizer é que podemos passar ao problema de falar do que existe. Por isso a ontologia está forçosamente dependente da epistemologia. Qualquer tentativa de falar do que é ou não é sem primeiro averiguarmos como podemos saber e distintuir essas coisas está condenada ao fracasso, ou mesmo ao ridículo.
«Uma vez que não acreditas em Deus»
Não tem nada a ver com o que eu acredito mas sim com o que podemos fazer dos modelos. Pega no teu modelo de Deus. Tenta ver se ele corresponde a algum aspecto da realidade. Se não conseguires encontrar essa correspondência então deves concluir que o deus descrito nesse teu modelo não existe. Não é razoável viciar o processo saltando logo para a afirmação categórica que sim, existe, só porque acreditas.
Por isso proponho que comeces pelo modelo do teu deus e que expliques como averiguar se este corresponde à realidade.
«Não te perguntei "qual" a hipótese, mas o tipo de hipótese. Devo presumir pela tua resposta que é uma hipótese de natureza estatística?»
A hipótese, em rigor, é sempre acerca da correspondência do modelo com a realidade. Por isso a forma de a testar depende do modelo.
Por exemplo, se eu tenho um modelo de um homem careca sentado em cima da estátua do Marquês do Pombal podemos testar a hipótese que esse modelo corresponde à realidade (i.e. que o homem existe) indo à praça do Marquês e olhando para a estátua.
Se o meu modelo diz que este homem está lá a maior parte das vezes, então teremos que avaliar a hipótese de correspondência por métodos estatísticos.
O problema aqui, e temos de o resolver muito antes de entrar em considerações ontológicas, é perceber o teu modelo. Atiras muitas perguntas, propões limitar o que a ciência pode ou não pode responder, mas não dizes, em concreto, que modelo propões. E sem isso não se faz nada...
Caro Miguel Panão,
ResponderEliminar«Como!? Na Igreja quem decide é o Espírito Santo, mas se não acredita no Espírito Santo, então não se deveria pronunciar sobre uma coisa que não sabe, ou acredita.»
Diz-me que é um espírito que decide. Se alguém que não acredita e que acha que isso é uma aldrabice, não se deve pronunciar?
Um astrólogo diz que os astros definem a nossa personalidade. O Miguel Panão não acredita mas nesse caso não se pode pronunciar...
Isso não faz sentido nenhum.
Francisco,
ResponderEliminarSentido, não faz. Mas tens de admitir que dá um jeitão :)
Ludwig,
ResponderEliminarDá muito jeito e serve para tudo, Espírito Santo ou Satanás. Se calhar é o mafarrico que manda na Igreja. Não acreditam? Ora aí está...
Francisco,
ResponderEliminar"Mas isso não descreve um reflexo incondicionado. A salivação sim"
E o que é a salivação senão a manifestação fisiológica dessa expectativa?
"há animais capazes de fazer escolhas de forma minimamente livre."
Você e o Ludwig ainda não foram capazes de dizer claramente quais e quando. Mas se houver, então temos que passar a julgá-los pelos seus actos e condená-los se, ouvidas defesa e acusação, for provada a prática do mal.
Caro Miguel Panão,
ResponderEliminarEstou a ver que esta discussão está difícil. Vamos por partes.
Primeiro, eu não disse que todo o conhecimento se reduz ao científico. Embora essa seja a posição do Ludwig, não é a minha. O que eu disse é que não existe nada que não seja investigável pela ciência a priori, o que é bem diferente. Mais uma vez acusa-me de algo sem fundamento.
No que diz respeito ao "nada" ao nível da mecânica quântica que refere, é diferente do "nada" dos teólogos ou filósofos.
Não tenho assim tanta a certeza, mas é uma hipótese aceitável.
Como!? Na Igreja quem decide é o Espírito Santo, mas se não acredita no Espírito Santo, então não se deveria pronunciar sobre uma coisa que não sabe, ou acredita.
Lá porque eu não acredito não quer dizer que não saiba, lá porque eu não acredito ou saiba, não quer dizer que eu não me pronuncie. Remeto para a famosa analogia de que quem não percebe as questões mais delicadas da tecelagem não possa ver claramente que o rei vai, de facto, nu.
Não percebi.
O credo não é uma pergunta, mas uma resposta. Diz claramente em que é que o cristão acredita que a resposta é, que existe um Deus, que se crê neste, no Espírito Santo, e no Cristo, e numa única Igreja, santa, católica e apostólica... etc. Que um cristão diga estas coisas e depois venha apresentar o cristianismo como uma "pergunta" é falacioso, no mínimo, embora saiba que é essa a mensagem espalhada.
Ai sim? Não sabia. O que entende por civilização? Os muçulmanos não são civilizados? Parece-me um abuso de linguagem que toma a parte pelo todo, mas posso estar enganado ...
Falei claramente, e pode rever, da Teocracia Muçulmana. Não falei dos muçulmanos em geral. Estou a falar de uma realidade concreta e ameaçadora. Quem viu o que se passou com os cartoons holandeses (onde embaixadas inteiras de um país que sempre apoiou a causa palestina, porque o seu presidente não quis fazer algo ilegal, censurar os cartoons) não pode estar com o seu ar de despreocupado e distraído do tipo "não se passa nada". Que negue a própria existência deste confronto civilizacional já diz muito.
Se acha que "respeito mútuo" não é amar, respeito a sua opinião, mas gostaria que respeitasse a minha e que fosse mais humilde na forma como acha saber aquilo que está na minha mente.
Concordará comigo em achar que amar é algo mais do que "respeito mútuo". Concordará também que se alguém ordenar "amar" e não "respeitar", está a fazê-lo considerando a totalidade do conceito, e não somente a parte. Concordará finalmente que se alguém tentar confundir os dois conceitos como se fossem iguais e igualmente delimitados, não sabe do que fala. Ou então desconversa.
...e isso dá-nos a esperança de que a realidade não fica por aqui, o que se designa como um universo da "promessa".
Muito bem. Ao seu estilo aponto que a sua maneira de ver é muito diferente da usual cristã, porque ainda por cima coloca a "promessa", que irremediavelmente se liga à "salvação", num futuro distante. Isto é contrário à ideia de que Cristo veio para salvar o hoje e agora. Ou seja, veio, e a promessa cumpriu-se, já. Não é necessário qualquer "evolução" ou promessa futura.
É bom conselho que exige maturidade,
Exige experiência em muitas coisas. Uma experiência vivida pela razão, pela inteligência. Muito bem. Qual é o seu argumento para além de insinuar que sou jovem e tal, que ainda tenho muito que aprender e tal.
Caro Luis, tem toda a razão.
Acho que não compreendeu o que eu disse, porque senão não teria concordado comigo. Ou isso, ou não teria dito atrás que quem decide é o espírito santo.
Cumprimentos.
Verificação de palavras: terno
ResponderEliminar"Um parágrafo com tantas aspas indicando que as palavras não querem dizer o que normalmente significam é tudo menos óbvio..."
ResponderEliminarSim, faz-me lembrar a crítica de David Stove aos pós-modernistas do séc XX, que apontava o modo como esta gente abusava das aspas visíveis ou subentendidas como maneira de apagar a força das palavras ou dizer que as coisas são mais ou menos assim, mas talvez porventura, colocando o esforço mental não no autor mas no leitor.
Cristy,
ResponderEliminar«o Abraham Lincoln não teve muito a ver com a guerra no Iraque»
Mas teve razão duzentos anos antes: Uma mentira descabelada não dura muito tempo.
Nuno Gaspar, as respostas para perguntas que indicaste para os cães são as mesmas para as crianças.
ResponderEliminarAcha que não é possível fazer a humanos o mesmo que é feito ao cão de Pavlov?
Ainda há pouco tempo descobriu-se que cães recusam-se a realizar tarefas quando verifica que outros animais são tratados de melhor forma e roubam comida noutras circunstâncias em que não teriam roubado (no exemplo da experiência, quando os humanos próximos estão de olhos fechados).
Lembro-me que no antigo programa Arca de Noé uma senhora disse - por gestos - a um chimpazé que não devia comer uma banana. Quando a senhora parecia demorar algum tempo, o chimpanzé olhou para os lados, pegou na banana e quando viu que a senhora voltou, largou a banana logo assustados. Aproximou-se da senhora e abraçou-a, como gesto de pedido de desculpa. No Candid Camera fizeram uma experiência semelhante com crianças e um bolo.
No National Geographic fizeram uma experiência com crianças e chimpanzés, que aprendiam a retirar doces de uma caixa. Quando a caixa passou a ser transparente - esquema -, os chimpanzés passaram a adoptar uma solução diferente - as crianças mantiveram o mesmo processo.
"nunca pratica um acção contrária ao seu instinto de sobrevivência"
ResponderEliminarPratica sim, ou de outra forma não se explicaria os cães que entram em casas em chamas para salvar os donos, ou os que se atiram a lagos gelados para salvar criancinhas...Nada disto implica a sua sobrevivencia, antes pelo contrario e no entanto eles fazem-no. Existem varios casos destes, não são cães treinados.
Há pouco tempo deu nas noticias, aquando dos incêndios na Austalia, uma cadela, quando a casa começou a arder, subiu ao 1 andar para acordar os donos, saiu com eles e depois já com a casa a arder, entrou dentro de casa para salvar 3 gatinhos bébés, da gata dos senhores. Não ela não achava que os filhotes eram dela.
A verdade é que todos os instintos de sobrevivencia deste animal lhe diziam para fugir...Mas não fugiu, contrariou-os. E não pela sobrevivencia da especie como se costuma dizer. Ela não entrou para salvar os seus filhotes.
PS: A cadela foi depois tratada pelos bombeiros, com direito a mascara de oxigénio e tudo. Um amor.
O comportamento animal é fascinante, e em particular o dos mamíferos que é bastante mais complexo do que lhe damos crédito. Quando se vai para animais como o macaco então...
Os direitos dos animais são aqueles que lhes assistem pelo facto de serem seres vivos com capacidade de sofrimento. São os que assistem a todos aqueles que vivem e sentem. São universais...Não são apanagio do homem. O direito de ser respeitado como ser vivo não deve ser exclusivo de uma especie.
É obvio que não vamos dar "direitos de propriedade" a um animal, mas parece-me que o direito a uma existencia digna e com o minimo de sofrimento deveria ser um direito de qualquer ser vivo com consciência da dor.
(Credo granda comentário)
Caro Nuno Gaspar,
ResponderEliminar«E o que é a salivação senão a manifestação fisiológica dessa expectativa?»
É de facto uma manifestação fisiológica, mas inconsciente. Não é a mesma coisa que dizer "aquele naco de bife na pedra parece ser mesmo bom". Isto não é uma manifestação inconsciente.
Mas isso era para lhe explicar a diferença entre decisão e reflexo. Salivar é um reflexo, como abrir os olhos e aumentar o ritmo cardíaco quando apanhamos um susto.
Escolher comer peixe em vez de carne não é a mesma coisa que sentir fome.
«Você e o Ludwig ainda não foram capazes de dizer claramente quais e quando.»
Já foram dados vários exemplos que o Nuno rejeitou com argumentos ad hoc só para concluir o que quer confirmar. Se vai continuar a fazer o mesmo, parece-me uma perda de tempo insistir.
«Mas se houver, então temos que passar a julgá-los pelos seus actos e condená-los se, ouvidas defesa e acusação, for provada a prática do mal.»
Para isso é preciso provar que também esses animais têm consciência das consequências dos seus actos e se reconhecem a identidade de outros animais e o que significa a sua liberdade. Caso contrário, é difícil condená-los.
Francisco,
ResponderEliminarsempre que me queimo, tenho primeiro a expectativa da queimadura para afastar a mão do calor. Senão ela ficava a cozer como um bife numa figideira. Quando somos nós a salivar, é por causa da expectativa, e quando é um cão, é por causa do instinto. É por isso que a experiência de Pavlov não funciona com humanos. É daquelas coisas que aprendemos na básica e que toda a gente sabe - devias ir lá voltar.
Verificação de palavras: matine
Francisco
ResponderEliminar«Para isso é preciso provar que também esses animais têm consciência das consequências dos seus actos.»
Ah bom. Então estamos de acordo. Não é com liberdade de consciência que praticam os seus actos.
Sympathetic Hippo
ResponderEliminarChristian the lion
African Lion Kisses, Hugs Woman Who Saved It
Do documentário que tinha assistido com a experiência que descrevi:
Chimpanzee vs. Human child learning (1/2)
Isso não faz lembrar algo?
Which one of these chimps will pass the AP test?
Pedro,
ResponderEliminarDa próxima vez que me queimar, raciocinarei assim:
"Estou a queimar-me, pois sinto dor. É melhor tirar a mão da frente do soldador de oxiacetileno porque me arrisco a ficar sem mão, o que trará graves consequências para a minha vida e carreira profissional."
Caro Nuno Gaspar,
ResponderEliminarSe preferir, dê-me um exemplo concreto de uma acção por parte de um animal que o satisfaça. Que confirme que são, de facto, capazes de decidir sem ser como reacção instintiva. Um qualquer à sua escolha.
Ninguém vai dar tau-tau a uma giboia se ela defecou onde não devia. Como a giboia não é um animal muito complexo, ela não "escolheu" fazê-lo no mesmo sentido em que um gato ou um homem escolheriam.
ResponderEliminarQuanto aos gatos, eles fazem essa escolha. Às vezes tentam aguentar, às vezes escolhem aguentar mais tempo, outras menos. Às vezes o dono castiga-os por não terem tentado aguentar o suficiente. Da vez seguinte em que a situação se coloca podem escolher aguentar mais tempo, ou preferir arriscar o castigo.
A minha gata era muito bem educada :).
«Ah bom. Então estamos de acordo. Não é com liberdade de consciência que praticam os seus actos.»
ResponderEliminarNão foi isso que eu disse. Eu disse que eles eram capazes de fazer escolhas.
O Nuno já está a reformular a hipótese, que é a de terem uma consciência semelhante à nossa...
João Vasco,
ResponderEliminar"A minha gata era muito bem educada :)."
Sorte a tua.
A minha cadela por exemplo nem por isso. O "aqui" é palavra que ela não entende...Há quem teorize que não é por não entender que ela não vem, é mais porque se está nas tintas e não lhe apetece...Se assim for, prova que os animais não só escolhem, como escolhem mesmo sabendo das consequencias dos seus actos...
Mas lá porcaria dentro de casa ela nunca fez, e coitadinha tem dias que aguenta bem para lá do razoavel ...Culpa dos donos que andam sempre a correr.
beijos
Francisco, não era assim que fazes?! É assim que faço, porque sou racional e os meus animais de estimação não são. Quando uma cauda de um gato é pisado, ele reage por instinto. Eu faço tudo de forma consciente. Se der uma cotevelada numa mesa, reajo afastando o braço violentamente, a gritar e a baixar-me agarrando no braço por causa da expectativa. Se cair, protejo a cara porque sei que devo fazê-lo. Fogo, não me digas que és um animal irracional?!
ResponderEliminarNuno Gaspar,
ResponderEliminartens animais de estimação?
PAC,
ResponderEliminarMoro numa cidade em que muitos milhares (milhões)de animais de estimação vivem com muitíssimo mais dignidade que muitos milhares (milhões) de pessoas, lado a lado. Estou sempre a olhar para essa realidade. E isso faz confusão.
É impressionante o modo como o Nuno consegue sempre dar a volta a um argumento perdido para se queixar de qualquer coisa da sociedade actual... muito talentoso :p
ResponderEliminarNuno Gaspar,
ResponderEliminarnão perguntei se vive numa cidade onde muita gente os tem - perguntei se tem animais de estimação. Como fugiu à pergunta, assumo que não tem. Eu tenho uma gata e um peixe.
Quando era puto vivia numa quintinha nos Açores, com porcos, vacas, cordeiros, coelhos, um cão (o Dembsy), gatos... e montes de baratas e aranhas das grandes. Ainda tenho fotos que representa a minha figura rodeada de pintos e galinhas, ao lado do corral dos porcos e com coelhos. Os meus avós paternos tinham uma galinha que se colocava à parte para comer, em vez de se juntar às outras. Morreu velha, em vez de ir ao tacho. Aqui, no continente, tive duas gatas, uma periquita e peixes. Agora tenho uma gata e um peixe.
Tive uma gata que foi morta por injecção letal, há alguns anos, com um tumor maligno na barriga. A última vez que a vi com vida, ela olhava para mim com uma pata na minha mão. Como homenagem fiz a minha primeira aguarela, que levei duas semanas a terminar - img.
ResponderEliminarEla esperava que todos fossem deitar para roubar comida. Ela quando chegou a casa aguentou montes de tempo para ter uma caixinha e PZZZZZZZZZZ. Nunca pedia - preferia roubar ou ver como se faz as coisas. Ela conseguia abrir portas, era vingativa, recusando a comida de quem lhe tinha feito mal.
A gata que tenho agora, pelo contrário, pede para que limpem a caixinha antes de usá-la, pede para que lhe abrem a água da torneira -, mesmo tendo o recipiente de água cheio. Também pede para que vão ter ao sítio onde come para fazer companhia - se a pessoa sai do sítio, ela vai atrás. Pega nos brinquedos que gosta mais e dirige-se com eles na boca até alguém para brincar com ela, deixando-o cair e miando. O meu pai, por brincadeira, uma vez imitou um som que ela faz quando encontra bichos - a gata reagiu procurando algo no ar. É muito mansa. Mas burrinha, comparada com a outra.
Os gatos podem ser ensinados a comunicarem carregando em botões. Num canal brasileiro, foi mostrado um aparelho com os botões "comer", "brincar" e "dormir". Um gatinho carregava num botão e ouvia-se um som: "quero comer". Lá lhe deram comida. Depois de comer tudo, voltou a carregar: "quero comer". Repetiu, até lhe darem comida. Quando terminou, carregou em "quero dormir". Colocaram uma caminha para ele no estúdio e ele dirigiu-se para lá, acabando por dormir.
Muitos animais não são tão estúpidos como pensam. Podem parecer que têm tanta alma como um humano.
Verificação de palavras: sonia
Cara(o) Cristy,
ResponderEliminarCaro Miguel, a sua crença permite-lhe dar uma única resposta concreta a uma pergunta clara e inquívoca?
Não.
-----------------------------
Caro Ludwig,
a ontologia está forçosamente dependente da epistemologia
Esta afirmação é importante para todo o teu argumento. Onde assentas a sua veracidade? Parece-me que sem "ser", sem existência, ou melhor, sem ontologia, não há epistemologia, logo, quem está forçosamente dependente de quem?
Pega no teu modelo de Deus. Tenta ver se ele corresponde a algum aspecto da realidade. Se não conseguires encontrar essa correspondência então deves concluir que o deus descrito nesse teu modelo não existe.
Existem, de facto, vários modelos de Deus porque sendo Deus é insondável, daí a importância da revelação. Contudo, como dizes e concordo, se fizer a tua análise apenas posso concluir algo sobre a existência do modelo de Deus que tenho, não sobre a existência de Deus.
O problema aqui, e temos de o resolver muito antes de entrar em considerações ontológicas, é perceber o teu modelo.
O modelo de Deus que tenho é aquele que experimento no dia-a-dia: Deus-Trindade. Um Deus relacional, Pessoa-em-Comunhão. Um Deus que é Amor e que, sendo amor, criou-me como ser-amor. Um Deus imanente no mundo e transcendente a ele. Um Deus próximo e se faz presente quando nos amamos reciprocamente. É claro que muito mais gostaria de dizer, mas sou cientista, não teólogo e assumo essa limitação.
Se fizeres com esta apresentação limitada do que chamo, pobremente, "modelo de Deus", o que fizeste em Braga, será que não negas à partida o modelo para concluir isso mesmo? Essa é a maior reserva que tenho na tua abordagem à análise de Deus como hipótese.
-------------------------
Caro Francisco,
Diz-me que é um espírito que decide.
Não, é o Espírito Santo, que é diferente.
Se alguém que não acredita e que acha que isso é uma aldrabice, não se deve pronunciar?
Sim, mas pronunciando-se com honestidade intelectual, consciente que muito se falou sobre o assunto e a menos que tenha aprofundado essa matéria com literatura credível, assumir as limitações naquilo que se pronuncia.
Um astrólogo diz que os astros definem a nossa personalidade. O Miguel Panão não acredita mas nesse caso não se pode pronunciar
Não acredito, mas se me pronunciasse, fá-lo-ia no sentido de procurar compreender o que o astrólogo quer dizer com isso, uma vez que não aprofundei essa matéria.
-------------------------
Caro Luis "Barba Rija",
não existe nada que não seja investigável pela ciência a priori
Deus não é investigável pela ciência, logo, a minha afirmação (não acusação) tem fundamento.
Lá porque eu não acredito não quer dizer que não saiba
É verdade, mas pelas suas palavras pareceu-me que o grau de aprofundamento em matérias de Igreja é muito superficial. Gostava de saber a sua experiência para perceber se estou enganado.
O credo não é uma pergunta, mas uma resposta.
Está a ver? O credo é uma afirmação de fé, não uma resposta. Não digo "eu acredito que a resposta é Deus-Pai", eu digo "eu creio em Deus-Pai. O credo contém a dogmática Cristã, evolutiva na forma, imutável na sua essência.
Que um cristão diga estas coisas e depois venha apresentar o cristianismo como uma "pergunta" é falacioso
Lamento, mas não é assim. É precisamente na "pergunta", na dúvida que um Cristão deve caminhar, ao contrário do que muitos pensam. Permita-me sugerir o último post que coloquei no meu blog Relação entre crente e não-crente.
Concordo com o que diz sobre o respeito e o amor. Eu penso que o respeito é um fruto do amor. Isto é, não posso amar sem respeitar, nem respeitar sem amar. É nesse sentido que amar implica respeitar porque estão intimamente ligados.
porque ainda por cima coloca a "promessa", que irremediavelmente se liga à "salvação", num futuro distante. Isto é contrário à ideia de que Cristo veio para salvar o hoje e agora.
Não é contrário, mas pressupõe-no e por isso se chama escatologia: "já mas não ainda". O teólogo Wolfhart Pannenberg possui reflexões filosófico-teológicas sobre essa matéria muito interessantes. Sugiro que procure alguns textos dele.
Qual é o seu argumento para além de insinuar que sou jovem e tal, que ainda tenho muito que aprender e tal.
Um jovem não pode ser maduro? "Insinuar" nesta frase pressupõe uma interpretação negativa do que eu disse, demonstrando que entendeu o contrário.
Acho que não compreendeu o que eu disse, porque senão não teria concordado comigo.
Sinceramente, agora percebo que o Luis não percebeu o que disse, porque, aparentemente, a mesma frase pode ter duas interpretações :)
esta gente abusava das aspas visíveis ou subentendidas como maneira de apagar a força das palavras (...) colocando o esforço mental não no autor mas no leitor
Quando coloco aspas é para assinalar que a forma como se lê pode depender de quem a lê, procurando chamar atenção ao leitor de que poderá estar a ler de uma forma contrária ao sentido de quem a escreveu. Mas aceito e agradeço a observação.
Cordiais saudações,
Miguel Panão
«Não»
ResponderEliminarCaro Miguel Panão,
que pena. Tinha começado tão bem que eu pensei, finalmente um crente com o qual vale a pena discutir. Afinal, faz o mesmo que a maioria dos outros: fugir às perguntas, fazer afirmações cripticas, espalhar palavras caras e esvaziadas de sentido. Tudo serve para fabricar um nevoeiro bem espesso para tapar os buracos das suas teorias.
Cristy
Caro Miguel Panão,
ResponderEliminar«Não, é o Espírito Santo, que é diferente.»
Diferente como? É algo comparável a um "espírito de equipa", "inspiração colectiva" ou trata-se de uma entidade real completamente independente de nós e que nos influencia? Adjectivar e capitalizar não é suficiente...
«Sim, mas pronunciando-se com honestidade intelectual, consciente que muito se falou sobre o assunto e a menos que tenha aprofundado essa matéria com literatura credível, assumir as limitações naquilo que se pronuncia»
Mas primeiro falou em acreditar. Em relação ao conhecer, é sempre possível apontar desconhecimento a quem não concorda connosco. E no que toca a conceitos que são ajustavelmente vagos, pior.
De qualquer maneira, a posição inicial não é sempre de descrença? Eu não tenho de dar razões pela descrença numa tese qualquer. Pelo contrário, preciso de provas para a aceitar como verdadeira. Dizer que estamos afastados da possibilidade de compreender até que aceitemos a tese por completo não é aceitável - é confundir compreensão com aceitação de forma falaciosa.
«Não acredito, mas se me pronunciasse, fá-lo-ia no sentido de procurar compreender o que o astrólogo quer dizer com isso, uma vez que não aprofundei essa matéria.»
Certo. E se por mais que aprofundasse o seu conhecimento, rejeitando ainda a Astrologia, o astrólogo lhe disser constantemente que não compreendeu bem ou que não aprofundou o suficiente? Passa a dar mais valor às alegações de que os astros nos influenciam?
No fundo o que estou a pedir é um pouco de objectividade.
PAC,
ResponderEliminarEra bonita a sua gata. Tive uma vez um gato assim parecido. Muito inteligente. Só se aproximava de duas ou três pessoas que conhecia. Morreu de acidente. Nesse dia eu e o meu pai choramos.
Caro Miguel Panão,
ResponderEliminarDeus não é investigável pela ciência, logo, a minha afirmação (não acusação) tem fundamento.
Logo, é uma hipótese que não levo a sério. Porque se algo se afirma como extraordinário e absolutamente indispensável à nossa vida e ainda como garante da nossa salvação, e depois vem dizer que não há qualquer evidência disto, nem sequer é possível qualquer investigação mais rigorosa do que a simples asserção da crença (leia-se, ciência), cheira-me a esturro. Compreendo que seja assim e não levo a mal. Mas igualmente não levo a sério.
Gostava de saber a sua experiência para perceber se estou enganado.
A minha experiência é parca mas existente. Sempre convivi com cristãos e tive bastante interesse num grupo de estudantes que lia bastante um autor chamado Luigi Giussani, já falecido. Discutia com eles e li alguns livros, encíclicas e afins. Fiquei com uma percepção de que há sempre um momento em que saltam para conclusões demasiado rápido. Deve ser a fé.
Não digo "eu acredito que a resposta é Deus-Pai", eu digo "eu creio em Deus-Pai.
A segunda implica a primeira, necessariamente. Não vou acreditar em alguém que não exista.
Lamento, mas não é assim. É precisamente na "pergunta", na dúvida que um Cristão deve caminhar, ao contrário do que muitos pensam.
Eu sei do que fala, mas não me convence. Sobretudo porque me parece haver aqui uma confusão de termos. É normal entre os mais fanáticos de qualquer convicção ter problemas de "fé". Faz parte da experiência humana. Ora aqui pretende-se confundir um comportamento normal humano com uma característica da religião. Repito em termos abstractos. Pessoa A acredita em afirmação ou crença B. Mas tem dúvidas sobre B, problemas de "fé". Isto não quer dizer que a experiência de B inclui os problemas de fé. Estes problemas são exteriores a B.
Pior, nem é verdade. Cristo disse claramente a um dos apóstolos quando este quis ver com as suas próprias mãos o Cristo ressuscitado, "Felizes os que acreditam sem terem visto”, o apelo à crença sem dúvidas e sem evidências do impossível. Ideia que me parece maléfica.
Concordo com o que diz sobre o respeito e o amor.
Se assim é, tem ainda o dever de responder à questão inicial do Ludwig, porque apenas a respondeu parcialmente. Como é que se mandata o amor (e não o respeito, a la Kant).
Não é contrário, mas pressupõe-no e por isso se chama escatologia: "já mas não ainda".
Sim, mas não talvez, porventura também. Sim, conheço o estilo. Não, muito obrigado, gosto de manter a sanidade mental.
Um jovem não pode ser maduro? "Insinuar" nesta frase pressupõe uma interpretação negativa do que eu disse, demonstrando que entendeu o contrário.
Na internet, é fácil desentendermo-nos. De facto entendi assim.
Quando coloco aspas é para assinalar que a forma como se lê pode depender de quem a lê, procurando chamar atenção ao leitor de que poderá estar a ler de uma forma contrária ao sentido de quem a escreveu.
Exacto, foi o que disse. O Ónus está no leitor e não no autor de quem escreve assim. Deste modo, qualquer desentendimento, qualquer erro, está na parte de quem lê, e não de quem escreveu. O que é injusto. "Repare", que eu bem podia fazer "isto", e "pouco" restaria da compreensão do que se "disse". Leia Stoves, no link que ofereci. Vai achar muito interessante.
Cumprimentos.
PS: Francisco Burnay, bem colocado o seu raciocínio.
Cara(o) Cristy,
ResponderEliminarAs razões do meu não.
Perguntou: Caro Miguel, a sua crença permite-lhe dar uma única resposta concreta a uma pergunta clara e inquívoca?
A minha resposta foi não porque a minha crença permite-me estar aberto a que possa haver muitas respostas possíveis para perguntas claras e inequívocas. A dúvida, a procura da verdade é o que procura o crente. Mas o não-crente também a procura! Se houvesse respostas únicas, como poderíamos dialogar?
---------------------------------------------
Caro Francisco,
O Espírito Santo é uma Pessoa da Trindade. É o próprio Deus. É reciprocidade do Amor entre o Pai e o Filho (na tradição Latina) e Amor do Pai e do Filho que se derrama na Criação (na tradição oriental). Ele reflecte-se na nossa vida na medida em que entre nós houver reciprocidade de amor.
Dizer que estamos afastados da possibilidade de compreender até que aceitemos a tese por completo não é aceitável - é confundir compreensão com aceitação de forma falaciosa.
Não me fiz compreender. Dou um exemplo. Quando preparo um artigo científico é muito importante documentar-me sobre o que foi feito sobre o assunto que pretendo publicar. Se não desenvolver a "mente disciplinada" como diria Howard Gardner, corro o sério risco de me pronunciar sobre algo que não aprofundei, aumentando a probabilidade de dizer coisas incompletas, ou até incorrectas. Isto nada tem a ver com confundir compreensão com aceitação.
E se por mais que aprofundasse o seu conhecimento, rejeitando ainda a Astrologia, o astrólogo lhe disser constantemente que não compreendeu bem ou que não aprofundou o suficiente? Passa a dar mais valor às alegações de que os astros nos influenciam?
Se tiver aprofundado o suficiente, compreenderia quais as razões de não aceitar a astrologia e seria capaz de "objectivamente" dizer porquê. Quando falo em Espírto Santo e o Francisco pergunta-me
É algo comparável a um "espírito de equipa", "inspiração colectiva" ou trata-se de uma entidade real completamente independente de nós e que nos influencia?
claramente a ideia que depreendo que tenha de Espírito Santo seja a de uma entidade real completamente independente de nós e que nos influencia, que traduz muito debilmente quem é o Espírito Santo (se é que sabemos quem "é"...), ou que tenha aprofundado o que a teologia estuda e isso é que quero dizer com aprofundar o suficiente. Repare, ser "independente de nós" ou que "nos influencia" traduzirá um pouco sequer a Reciprocidade de Amor entre Pai e Filho? Se é independente de nós como pode interagir connosco?
Espero ter ido encontro à objectividade que pretendia. Caso contrário, peço desculpa.
Cordiais saudações,
Miguel Panão
Caro Luis "Barba Rija",
ResponderEliminaralgo se afirma como extraordinário
Deus não é algo, mas alguém. É diferente.
e depois vem dizer que não há qualquer evidência disto, nem sequer é possível qualquer investigação mais rigorosa do que a simples asserção da crença (leia-se, ciência), cheira-me a esturro.
Isto é um exemplo de redução de toda a forma de conhecimento à científica, daí um reducionismo epistemológico, aquele que o Luis afirma não fazer ...
Obrigado pela sua experiência! Conheceu jovens do movimento Comunhão e Libertação. É um bom movimento da Igreja que dá muita importância ao encontro com Jesus, também através da intelectualidade, juntamente com a vivência Cristã.
pretende-se confundir um comportamento normal humano com uma característica da religião.
Um Cristão é um ser humano, logo tem um comportamento humano normal. Aquilo que identifica como característica da religão, a dúvida, é, deste ponto de vista, comum ao crente e ao não-crente e é por isso que Massimo Cacciari diz que é a "procura" o ponto de unidade entre nós. Acho este pensamento de uma profundidade fantástica. É mais importante o que nos une do que aquilo que nos divide.
o apelo à crença sem dúvidas e sem evidências do impossível. Ideia que me parece maléfica.
Mas não é isso que Jesus diz! Ele apela "sejam felizes". Como? Acreditando n'Ele, no que Ele viveu, sobretudo, mesmo sem O terem visto.
tem ainda o dever de responder à questão inicial do Ludwig
Qual delas?
gosto de manter a sanidade mental
Ai sim? Quer dizer que não sabe o que é escatologia? É que "já mas não ainda" nada tem a ver com "Sim, mas não talvez, porventura também" ... Não quero com isto dizer que o Luis não tem sanidade mental, claramente que tem, mas ao menos que tenha argumentação mais elaborada e que mostre que me compreendeu e porque não concorda comigo.
Leia Stoves, no link que ofereci. Vai achar muito interessante.
Obrigado pela sugestão. A qual dos artigos do Stoves se referia num comentário anterior?
Cordiais saudações,
Miguel Panão
Caro Miguel Panão,
ResponderEliminar«Espero ter ido encontro à objectividade que pretendia. Caso contrário, peço desculpa.»
Bem, a sua resposta foi
«O Espírito Santo é uma Pessoa da Trindade. É o próprio Deus. É reciprocidade do Amor entre o Pai e o Filho (na tradição Latina) e Amor do Pai e do Filho que se derrama na Criação (na tradição oriental). Ele reflecte-se na nossa vida na medida em que entre nós houver reciprocidade de amor.»
e vejo-me obrigado a lamentar que não.
Eu já fui católico. Fui, em tenra idade, apresentado ao Mistério da Santíssima Trindade. Fui baptizado e frequentei a catequese. As explicações que me deram na altura revelaram-se insuficientes quando comecei a fazer perguntas. Na minha opinião, padecem do mesmo mal que as respostas do Miguel Panão: não respondem a nada em concreto. São articulações retóricas elaboradas mas que em termos de conteúdo nos deixam sempre na dúvida.
Gostaria de explicar porquê.
1) Dizem os católicos que Jesus é Verdadeiro Deus e Verdadeiro Homem (não sei porque gostam tanto das maiúsculas). E dizem que o Espírito Santo é o próprio Deus. Se o Miguel Panão afirma que o Espírito Santo é [uma certa noção de] reciprocidade do amor entre Pai e Filho, a confusão surge.
Em termos literários, pode confundir-se a laranja com o sabor ou a cor desta. Mas confundir pessoas de carne e osso com caracterizações de relações filiais é antónimo de clareza no discurso.
É por isso que acho que a sua descrição de Espírito Santo não é satisfatória.
Fica no ar: como pode exactamente ser Deus o amor que Deus tem pela criação de Deus? Como pode uma propriedade de uma acção exterior a um objecto ser idêntica a esse objecto?
Diz ainda o Miguel Panão:
«claramente a ideia que depreendo que tenha de Espírito Santo seja a de uma entidade real completamente independente de nós e que nos influencia, que traduz muito debilmente quem é o Espírito Santo (se é que sabemos quem "é"...), ou que tenha aprofundado o que a teologia estuda e isso é que quero dizer com aprofundar o suficiente.»
Atentemos então à forma como caracterizou a manifestação do Espírito Santo na nossa vida. Como é que a sua explicação do que é o Espírito Santo suporta a sua afirmação de que é ele quem decide no Vaticano?
Quando elabora artigos científicos, tem certamente cuidado com a obscuridade do discurso. Porque quanto menos clara for a sua exposição, mais difícil se torna refutá-la.
Posso, no meio da obscuridade, não conseguir refutar coisa nenhuma. Mas não vou considerar verdadeira uma tese que se sustenta em tão pouca clareza...
Um exemplo.
ResponderEliminarEu não acredito na existência de um mostro no Lago Ness. Isto é, se me disserem que o mostro é um réptil gigante que vive no Lago Ness.
- Se me disserem que é o próprio Lago Ness, só posso interpretar isso como uma metáfora.
- Se me disserem que a água do Lago Ness é exactamente o Lago Ness, admito perfeitamente o abuso de linguagem.
Mas se me disserem que o monstro do Lago Ness é um réptil que é o próprio Lago Ness, que é a Fluidez e a Humidade do Líquido mas também a Aspereza do Fundo do Lago, fico um pouco confuso...
Como posso, nestas circunstâncias, negar a existência do monstro do Lago Ness?
Caro Francisco,
ResponderEliminarDizem os católicos que Jesus é Verdadeiro Deus e Verdadeiro Homem (não sei porque gostam tanto das maiúsculas). E dizem que o Espírito Santo é o próprio Deus. Se o Miguel Panão afirma que o Espírito Santo é [uma certa noção de] reciprocidade do amor entre Pai e Filho, a confusão surge.
Não é uma noção. "É" reciprocidade do amor entre o Pai e o Filho. É óbvio que este não é o espaço apropriado para expôr tudo o que a teologia actual diz sobre a Trindade, nem sou a pessoa mais indicada para o fazer. A forma concreta de me explicar é através dos relacionamentos. Se esses se desenvolvem no amor recíproco, são expressão desses relacionamentos trinitários, sobretudo pela unidade na diversidade. Na reciprocidade de amor, não há espaço para o egoísmo, fechados para nós mesmos, excluindo quem pensa de maneira diferente, mas abre-se ao bem de todos. A síntese de viver no sentido trinitário consiste em "aceitar sempre, ter sempre a iniciativa, unir sempre". Ser capaz de perder a minha ideia para acolher a ideia do outro. Estar desapegado dos meus desejos para procurar com o outro desejos comuns. E se o outro é diferente de mim, por exemplo, não acredita em Deus, tanto melhor! Se juntos contruirmos algo no amor, para mim será expressão do sentido trinitário desse relacionamento e para ele será expressão da fraternidade universal pela qual aspiramos todos como família humana. Não me assusta a diversidade, mas a incapacidade de construir a unidade.
Fica no ar: como pode exactamente ser Deus o amor que Deus tem pela criação de Deus? Como pode uma propriedade de uma acção exterior a um objecto ser idêntica a esse objecto?
Eu não referi o Espírito Santo como o "amor que Deus tem pela Criação", mas o Amor do Pai e do Filho derramado pela Criação, imprimindo nela a sua marca: a relacionalidade. Hoje a própria ciência ecológica reconhece que tudo está em relação com tudo, o que não admira a um Cristão que procure aprofundar o seu relacionamento com Deus-Trindade, ou que procura os relacionamentos trinitários no quotidiano.
Como é que a sua explicação do que é o Espírito Santo suporta a sua afirmação de que é ele quem decide no Vaticano?
Tudo no Vaticano e na Igreja é visto na unidade, na oração e na vivência da fé. O Espírito Santo manifesta-se no amor aos outros, na tarefa que fazemos, etc, manifesta-se nas relações. Quando a Igreja decide, não é "o Cardeal Manel" - por assim dizer - que decide, mas aquele "um só" que somos na unidade, que apenas pode ser conseguida na presença do Espírito Santo, Aquele que nos ensinará todas as coisas, como está escrito no Evangelho.
não vou considerar verdadeira uma tese que se sustenta em tão pouca clareza...
Se aquilo que é clareza é o que vai de encontro à sua visão sobre o assunto ... então não há problema, apesar de não ser tese, basta não considerar o que disse até aqui, mesmo se tenho pena ...
Contudo, agradeço os seus comentários, questões e reflexões.
Cordiais saudações,
Miguel Panão
Caro Miguel Panão,
ResponderEliminarAgradeço as suas palavras. Não me leve a mal quando digo que não são claras.
Mas a ideia com que fico é que o Espírito Santo é apenas um símbolo. Uma abstracção de uma forma de amor fraterno a que o Miguel Panão se referiu como "o amor entre Pai e Filho derramado pela Criação".
Este "amor entre Pai e Filho derramado pela Criação" só pode ser entendido como uma figura de estilo. Porque em rigor o amor existe apenas entre seres vivos, não se derrama nem é um objecto. Aceito a sua descrição tanto quanto aceito que o amor é "fogo que arde sem se ver". Lendo o verso de Camões literalmente, em vão encontrarei um fogo que arda sem ser possível vê-lo, ou uma ferida que dói sem doer. Porque caso se trate de uma metáfora de um sentimento bem humano, nada há a obstar. Mas sei que para os cristãos não se trata apenas de metáforas. As metáforas não morrem por crucificação e não ressuscitam.
Quando diz
«A síntese de viver no sentido trinitário consiste [...] Ser capaz de perder a minha ideia para acolher a ideia do outro. Estar desapegado dos meus desejos para procurar com o outro desejos comuns.»
é bastante mais concreto. Só que entretanto a ligação entre isso e uma suposta trindade já se perdeu (a menos que seja só uma metáfora).
«Se aquilo que é clareza é o que vai de encontro à sua visão sobre o assunto ... então não há problema, apesar de não ser tese, basta não considerar o que disse até aqui, mesmo se tenho pena ...»
Para mim ser claro é distinguir o que é metáfora do que é literal. Porque eu, e digo-o sinceramente, não me consigo aperceber dessa distinção nos seus comentários. Em concreto, onde é que nessa trindade entra o Cristo real, que os cristãos dizem ter vivido nos vales do rio Jordão há cerca de 2000 anos.
Caro Miguel Panão,
ResponderEliminarOs seus comentários não clarificam, não ajudam. Para mim tanto se me dá se Deus é "alguém" ou "algo". Claramente, é qualquer coisa ou "alguém" ou o que quiser que seja com importância para si. Nada disso perturba o raciocínio que eu estava a fazer. Depois acusa o meu raciocínio de reducionismo. Engana-se mais uma vez. Eu não disse que todo o nosso conhecimento é conhecido através de metodologias reducionistas. Mas toda a realidade é conhecível através da ciência, que é algo (não alguém, neste caso!) mais do que reducionismo. É frustrante o facto de ter de ser um arquitecto a dizer isto a um cientista.
Conheceu jovens do movimento Comunhão e Libertação.
Sim. Se os conhecer, dê um abraço ao prof. Pedro Abreu, por quem tenho grande estima, embora não concorde com ele em muitas coisas.
É mais importante o que nos une do que aquilo que nos divide.
Meu caro, nunca pela minha cabeça passou a noção de que o senhor por ser cristão não era um ser humano, e que por isso partilhava comigo arquetipos de comportamento, dúvida um deles.
Mas não é isso que Jesus diz! Ele apela "sejam felizes". Como? Acreditando n'Ele, no que Ele viveu, sobretudo, mesmo sem O terem visto.
Leia de novo o que escreveu, dez vezes. E depois ponha a mão à frente da cara com a vergonha de quem disse um enorme disparate. O que ele viveu é, por definição, milagroso, e ele pede que acreditem nisto sobretudo se não tiverem evidências nenhumas. Que concorde com a afirmação é uma coisa. Que negue o óbvio é outra.
Qual delas?
Começo a desconfiar da sua honestidade. Eu disse, logo a seguir, "Como é que se mandata o amor (e não o respeito, a la Kant).". Se não quiser responder não responda.
Ai sim? Quer dizer que não sabe o que é escatologia? É que "já mas não ainda" nada tem a ver com "Sim, mas não talvez, porventura também" ...
Eu acho que tem. Porque das duas uma. Ou a promessa cumpriu-se, e o reino de Deus começou quando Cristo ressuscitou (tal como era profetizado pelo próprio), ou ainda está para se cumprir. Esta coisa do "já mas não ainda" é bonita como poesia, mas cheira mais àquele tipo de raciocínios de vigarista apanhado em contrapé e que tem de improvisar uma desculpa à última hora.
A qual dos artigos do Stoves se referia num comentário anterior?
A este. É comprido, porque não é um artigo, mas um pequeno livro.
Cumprimentos.
PS: Não resisto a fazer um reparo cruel, quando o Miguel diz:
Quando a Igreja decide, não é "o Cardeal Manel" - por assim dizer - que decide, mas aquele "um só" que somos na unidade, que apenas pode ser conseguida na presença do Espírito Santo, Aquele que nos ensinará todas as coisas, como está escrito no Evangelho.
... Mais conhecido por Groupthink.
Pontos interessantes na página da Wikipédia:
To make groupthink testable, Irving Janis devised eight symptoms indicative of groupthink (1977).
1.Illusions of invulnerability creating excessive optimism and encouraging risk taking.
2.Rationalising warnings that might challenge the group's assumptions.
3.Unquestioned belief in the morality of the group, causing members to ignore the consequences of their actions.
4.Stereotyping those who are opposed to the group as weak, evil, disfigured, impotent, or stupid.
5.Direct pressure to conform placed on any member who questions the group, couched in terms of "disloyalty".
6.Self censorship of ideas that deviate from the apparent group consensus.
7.Illusions of unanimity among group members, silence is viewed as agreement.
8.Mindguards — self-appointed members who shield the group from dissenting information.
"Liberdade significa responsabilidade. É por isso que tanta gente tem medo dela."
ResponderEliminarGeorge Bernard Shaw
Mais do ateu convicto George Bernard Shaw:
ResponderEliminar"We know now that the soul is the body, and the body the soul. They tell us they are different because they want to persuade us that we can keep our souls if we let them make slaves of our bodies."
Cristy