Treta da Semana: Bento XVI
O prémio desta semana vai para Joseph Alois Ratzinger, agora conhecido como Bento XVI, pela sua ofuscante carreira a confundir superstição e ciência. Um exemplo é a lição de 2006 na universidade de Regensburg (1), onde Ratzinger alerta para a “auto-limitação” da razão moderna porque a ciência «pressupõe a estrutura matemática da matéria, a sua racionalidade intrínseca, que torna possível compreender como a matéria funciona e usá-la eficientemente »
A matemática na ciência é consequência do conhecimento que a ciência produz. Não é pressuposta. Antigamente não era preciso matemática na ciência. Para dizer que as plantas são verdes basta a linguagem corrente. Mas quanto mais rico e detalhado é o conhecimento mais expressiva e rigorosa tem que ser a linguagem que o codifica. Para descrever uma proteína, um avião a jacto ou uma sinfonia é preciso uma notação própria. Pode ser com equações, desenhos, zeros e uns no computador ou qualquer outra coisa, mas o significado dos símbolos tem que ser tão preciso como a informação que transmitem.
Segundo Ratzinger, porque a ciência depende deste pressuposto e se fundamenta na experiência «este método exclui a questão de Deus, fazendo a parecer uma questão não científica ou pré-científica. Consequentemente, estamos frente a uma redução do âmbito da ciência e da razão, uma redução que tem que ser questionada»(1). Mas este método não exclui deus nenhum. Pelo contrário.
Se existissem deuses a melhor forma de os descobrir seria estudando a realidade com rigor. A teologia natural, mais antiga que o Cristianismo, visava conhecer o criador do universo através do universo que ele criou. Eventualmente tornou-se ciência porque enquanto método de estudar o universo funciona bem. É enquanto teologia que só faz sentido se o tal deus existir, e tudo indica não haver tal coisa neste universo.
É o truque de pintar a ciência como se fosse mais um sistema axiomático assente numa crença inquestionável. A teologia assume que existe um deus, a ciência assume que não há deuses. O criacionismo, a astrologia, a homeopatia e tantas outras tretas fazem exactamente a mesma coisa. Tentam repartir o conhecimento entre os que assumem uma coisa e os que assumem outra. Mas a ciência não se amarra a axiomas. A ciência põe hipóteses que a qualquer momento podem ser trocadas por outras. A hipótese de haver deuses já lá esteve, mas como se pode ver pelos resultados práticos da teologia não leva a lado nenhum.
Este truque serve sempre para vender alguma treta, e é nisso que a teologia é rainha:
«O homem constitui algo que vai muito além do que se pode ver ou do que se pode perceber pela experiência. Descuidar a questão sobre o ser humano leva inevitavelmente a negar a busca da verdade objectiva sobre o ser em sua integridade e, deste modo, à incapacidade para reconhecer o fundamento sobre o que se apoia a dignidade do homem»(2)
É banha da cobra por excelência. Não estica, não dobra e nem sequer se pode perceber pela experiência. Mas não a podemos descuidar. A teologia não se limita ao universo todo. Enfiando o barrete da fé consegue ver muito além. Vê o fundamento da dignidade. Vê a verdade objectiva. Vê Deus que é amor e é pai e é filho e é três e é um. E se esfregar os olhos com força até vê luzinhas.
1- Bento XVI, 12-09-06, Lecture of the Holy Father
2- Bento XVI, 28-1-08, Por uma ciência com consciência