terça-feira, dezembro 04, 2007

E onde é que pára?

A discussão acerca da acupunctura está a ficar algo cómica. Ou trágica. Acupunctura para cães, acupunctura que se «pode fazer em bebés, não com agulhas, mas com sementes aplicadas nas orelhas» e mestres de quigong que «demonstraram a capacidade para transmitir calor através das palmas das suas mãos acima dos valores considerados possível pela "ciência ocidental"»(1). E no meio disto muita tacada na ciência, que agora até vem com aspas e é ocidental. Se calhar no Oriente o carbono não faz polímeros, a física é menos quântica e a relatividade só funciona às segundas, quartas e sextas, por isso precisam de uma ciência diferente da nossa.

A ciência é imperfeita, não explica tudo, falha muitas vezes e, por isso, temos que desconfiar sempre do que nos diz. Mas é a única forma de saber onde acaba a realidade e começa o disparate. Estes comentários, e a imensidão de crendices, curandices e aldrabices que há por todo o lado, demonstram o que acontece a quem se fia em alternativas. Nunca mais pára. Se não confrontamos as nossas hipóteses com a realidade acabamos a enfiar sementes nas orelhas.

1- Comentários de um anónimo e do Joaquim Amado Lopes, ao post Treta da Semana: Acupunctura.

12 comentários:

  1. Ludwig

    Como em muitas coisas, a virtude poderá estar no meio.

    Pelo teu lado, dizes que tudo na acupunctura é treta e não admites nada em contrário. Aparentemente, porque até chegas à conclusão que a tal imperatriz chinesa andaria a tratar as dores de costas. Ora se a acupunctura PODE (eu não disse que tenha) ter o poder de tirar as dores, isso deverá ser tirado a limpo.

    Por outro lado, chamar o Qi ou Chi ou a força de "energia" ou "the Force" é entre ridículo e pouco rigoroso. Não vou dizer nada quanto à "Force" porque estou com os abdominais doridos da sessão de ginásio de ontem (que já me valeu debitar uns disparates no meu estaminé), mas em relação à energia tenho uma coisinha a dizer.

    Todos usamos o termo "energia" empiricamente e para coisas mais mundanas. Estas não se medem em joules, como sabes. Dito isto, parece-me mais que abusivo insistir em "energia" e (pior) atribuir propriedades electromagnéticas a coisas que o não são. Isso justifica todo o tipo de tretas e é uma ideia peregrina que tem que ser combatida. Dito isto, as ideias New Age são muito resistentes, por isso se não é energia é outra porra qualquer.

    Os pontos de acupunctura, tanto quanto li (coisas dispersas, não tenho referências) não têm equivamente físico. A agulha penetra só 1-2 mm na pele, pelo que parece fazer algum sentido a pressão com uma semente ter o mesmo efeito que uma agulha. Ora eu não disse que a agulha tinha efeito nem qual este era!

    Mas parece-me perigoso atribuir resultados a umas sementinhas quando se podem dever à recuperação natural de uma criança. Pode haver a tentação de "curar" coisas mais sérias com sementinhas e fazer asneira. Do mesmo modo há quem atribua tudo aos antibióticos quando não é o caso. Alguns são médicos, diga-se.

    Acupunctura para cães... não consigo, doi-me mesmo os músculos.

    No meio disto, recupero a posição de Herr Krippmeister sobre reflexologia:

    "De reflexologia percebo o suficiente para conseguir formular uma opinião crítica e céptica sobre o assunto. Cai na mesma categoria que o Reiki, o Pai Natal e o Coelhinho da Páscoa.

    Mas pronto, massagem é massagem. Mesmo que não te cure a bronquite, pelo menos sabe bem :)"

    Resumido, acertado, sóbrio. Não é preciso mais que isto!! Cai na categoria oposta de uma amiga minha que jura a pés juntos que a acupunctura lhe curou um tumor no cérebro. E diz que o médico que a acompanha jura o mesmo, porque não era possível aquilo ter entrado em remissão sozinho e não tomou mais medicação que umas ervinhas e umas agulhinhas criteriosamente espetadas.

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  2. Abobrinha,

    «Como em muitas coisas, a virtude poderá estar no meio.»

    Para temperos, OK. Nem demais, nem de menos. Mas entre o verdadeiro e o falso não vejo como a virtude possa estar no meio. Viva a meia treta?

    «Pelo teu lado, dizes que tudo na acupunctura é treta e não admites nada em contrário.»

    Eu admito o contrário às minhas conclusões, e estou disposto a mudar de ideias quanto à acupunctura se houver evidências a seu favor.

    Aquilo que não admito é em trocar este método de exigir evidências pelo métod de acreditar que é verdade ou o método de aceitar tudo o que se faz há mais de mil e tal anos. O meu método não é infalível (é por isso que admito mudar de opinião), mas esses outros métodos são treta.

    «Todos usamos o termo "energia" empiricamente e para coisas mais mundanas. Estas não se medem em joules, como sabes.»

    É correcto aplicar o termo energia quando vais ao ginásio ou coisas dessas. Muitas vezes até falamos nas calorias que gastamos ou consumimos. Esse é quantificável.

    Onde é treta é nas energias positivas, nas energias que fluem nos meridianos e outras dessas.

    Como já escrevi várias vezes, não tenho nada contra agulhas, piercings, massagens, tatuagens e afins para quem goste. Divirtam-se. Mas se é para vender como tratamento tem que ser testado e dar provas de eficácia e segurança. Independentemente se os chineses o usam há três mil anos.

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  3. Ludwig

    toda essa conversa é muito bonita, mas há um problema: muitas vezes a acunpuctura funciona. Já funcionou comigo, mas pronto, já sei, foi a minha mente a delirar, não se pode confiar.

    A verdade é esta: quando a ciência não se conforma com a realidade torna-se a maior das tretas.

    É claro que há muitos discursos falsos, a par da acunpunctura. Mas o papel da ciência aqui deveria ser verificar os resultados, formular novas teorias e infirmar as antigas. Em oposição, o que é que fazem alguns "cientistas ocidentais"? Dizem: é treta.
    Muito evoluido, muito adequado, muito científico.

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  4. Ludwig,

    "Como já escrevi várias vezes, não tenho nada contra agulhas, piercings, massagens, tatuagens e afins para quem goste."

    Mas uma massagem nas costas depois de um dia de trabalho não te sabe bem Ludwig?
    Claro que não cura nada, mas sabe bem como tudo ;)

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  5. NCD,

    «toda essa conversa é muito bonita, mas há um problema: muitas vezes a acunpuctura funciona. Já funcionou comigo, mas pronto, já sei, foi a minha mente a delirar, não se pode confiar.»

    Isso não é problema nenhum. Basta saber quais são as vezes em que funciona e quanto é que funciona para podermos avaliar a relação custo/benefício e saber quando a usar.

    Mas nota que o que te aconteceu foi que espetar agulhas num sítio foi seguido de um efeito cuja causa pode ter sido as agulhas. Resta saber se foi mesmo essa a causa (e é isso que exige mais informação), e resta o problema de a acupunctura ser muito mais que as agulhas. É uma parte integrante da tal medicina tradicional que está cheia de coisas incompatíveis com o que sabemos hoje.

    E para separar o que houver aí de real de toda a superstição associada é preciso ciência.

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  6. Sygiro a visualização deste vídeo de Michael Shermer da Skeptics Society precisamente sobre esta matéria.

    http://www.youtube.com/watch?v=866YvYJRvWw

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  7. Ludwig

    Talvez não seja meia treta: talvez seja só uma massagem que sabe bem mas não cura a bronquite. As coisas não têm que ser só uma coisa ou a outra. Mas há que saber dar o nome às coisas, e o facto de as rotulares imediatamente como "treta" não seja bem recebido por todos. Uma questão de estilo, não necessariamente de conteúdo, mas podes fazer a mensagem perder-se pela abordagem e não pelos argumentos.

    Dito isto, a tradição milenar não é necessariamente sinónimo de provas dadas. Pode ser simplesmente uma massagem que sabe bem e dá prazer e um pouco de alívio por qualquer motivo e por isso fez a diferença em povos habituados ao sofrimento como condição humana (lembra-te que coisas como anestesias e analgésicos são mais que recentes).

    A afirmação que a "tradição milenar" cura tudo não está documentada objectivamente. Não se pode pegar numa máquina do tempo e ir fazer ensaios controlados aos casos milenares de curas documentadas. Além de que acho estranho que se cure tanta coisa com nome e apelido de órgãos... que não são conhecidos nem em forma nem em função há tanto tempo assim!

    Voltando à condição humana, ela continua a mesma (o sofrimento e a morte) a menos de mais algum espaço e tempo conquistado ao prazer de viver e qualidade de vida; mas hoje há anestesias e uma série de droga mais disponíveis. Há ainda mais conhecimento, mas isto não é coisa que satisfaça todos os espíritos inquietos.

    A ti e a mim e a muitos participantes neste blogue o saber dá um prazer imenso e preenche muito, mas não somos todos iguais. E enquanto para ti o conhecimento objectivo chega e sobra e preenche-te completamente, não é o caso de toda a gente (participantes neste blogue incluídos).

    Ou seja, nada contra bruxarias de vários tipos (tu chamas-lhes tretas; vai dar ao mesmo) desde que as pessoas não se encostem a elas como factos comprovados e não as usem em detrimento de outras que são objecticas (milagrosas é diferente: nunca ninguém disse que a medicina moderna faz milagres).

    O que eu me preocupa é que pessoas se encostem a estas "verdades" de forma dogmática. Mais que a religiões por vezes! Com uma diferença: mesmo algum discurso religioso bafiento parece 10 000 vezes mais sensato que diversas tretas que me tentaram impor. Por exemplo, ficas a saber que não senti nada no Reiki porque não acredito (ou não aceito, ou não estou receptiva, ou racionalizo demais ou assim uma porra qualquer). Claro que não é por o Reiki ser uma treta que só funciona para quem tem carências e precisa de um toque mais ou menos carinhoso de vez em quando!

    Isso é um pensamento perigoso que em mim resultou em risos e deixar gente desequilibrada a sós com a sua palermice. Em outras pessoas mais frágeis (ou mesmo em mim numa altura em que pudesse estar mais carente) isto podia fazer muito mal, porque seria mais um facto de insatisfação e de culpabilização: isto funciona, mas não em mim porque nem disso sou capaz!

    E é contra estas tretas que as pessoas precisam de se defender. Mas isto nem sequer é uma questão de conhecimento científico: é senso comum muito puro e muito simples. Que falta a muita gente, juntamente com auto-estima.

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  8. NCD

    "Já funcionou comigo, mas pronto, já sei, foi a minha mente a delirar, não se pode confiar."

    Se funcionou, óptimo! Mas tem a certeza que foi a acupunctura e não outra coisa qualquer, como remissão espontânea de uma coisa qualquer que ia passar na mesma? Ou um medicamento que andava a tomar ao mesmo tempo? É que comigo o Reiki não funcionou... por minha causa!

    "A verdade é esta: quando a ciência não se conforma com a realidade torna-se a maior das tretas."

    O objecto de estudo da Ciência é a realidade. A Ciência não só se conforma com a realidade como tenta compreendê-la e/ou manipulá-la. A Ciência não tem por hábito negar observações: aceita-as desde que válidas, estuda-as e tenta compreendê-las.

    Não é o mesmo que dizer que todos têm boa prática. Nem é o mesmo que dizer que o Ludwig tem razão automaticamente por ser céptico. mas esta afirmação simplesmente não faz sentido. Pode mesmo ir-se ao ponto de dizer que não é exacta. Ou por outras palavras, simplesmente não é verdadeira.

    O que há são indivíduos que camuflam egos e teorias arrevezadas por detrás de roupagem científica, algumas verdades comprovadas e outras que nem por isso. Acho que foi o caso do Tim Crow, no post que tenho algures no meio do lixo todo que tenho postado ultimamente. Mas debaixo de fogo cerrado a teoria dele há-de ter ou não aceitação. Não depende de fé ou dogmas ou conhecimentos milenares.

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  9. Será isto mais uma treta.

    http://dererummundi.blogspot.com/2007/12/grandes-erros-prmio-santilli-galileu.html#links

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  10. É como a panóplia de mestres visionários que com as suas mezinhas, poderes, talentos ou privilégios concedidos por via divina, dizem eles, prometem mundos e fundos usando e abusando daquilo a que chamo "esoterismos de banca de feira!"

    Mas a culpa nem é deles, é de quem vai na conversa. Haja paciência para tanta falta de discernimento!

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  11. Boa Helder, bom vídeo.

    Chamo especial atenção ao final. A acupunctora chama alma ao chi, e o Shermer diz que com mais investigação podemos unir a tradição à medicina.

    Aquilo em que eu insisto é que esta investigação tem que ser científica (não há outra forma) e que se unimos ou rejeitamos vai depender dos resultados.

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  12. Eu quero fazer acupunctura para me curar as dores de cabeça. Pode ser que funcione, por estar a ser espetado com agulhas liberto endorfinas que me aliviam as dores de cabeça, mas se der um corte tem o mesmo efeito, e se tomar um comprimido tanto melhor porque cura-me a dores de cabeça e não fico nem com buracos nem com cicatrizes.

    Estas tretas da acunpuctura e afins, são boas quando não é a serio, quando é a serio vão falar com medicos a serio. Quando a coisa é seria, e os medicos a serio não resolvem, vão em busca de tretas como a acupunctura, e ficam com o mesmo mal.

    Ou será que a acunpuctura só cura o que a medicina normal também cura? Porque não a vejo curar mais nada.

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