sexta-feira, agosto 03, 2007

David Attenborough Censurado

Sir David Attenborough não defende a violência. Não é racista, não discrimina as mulheres. E quando se mete na vida dos outros é só para nos mostrar como é, não para lhes dizer como deve ser. Apesar destes defeitos o canal evangélico Holandês Evangelische Omroep (EO) transmitiu a série «The Life of Mammals»(1). Mas Attenborough tinha ido longe demais. Nesta série, o conhecido naturalista mostra a natureza como ela é. Não pode. A EO teve que intervir.

O décimo episódio aborda a evolução da nossa espécie, mas não menciona barro, sopro, ou costela. Por isso a série na EO tem nove episódios. Chega bem que o resto está na Bíblia. Mesmo nesses nove episódios havia muita coisa a mais. Por exemplo, no primeiro episódio. Attenborough senta-se, diz-nos que por vezes se encontra fósseis muito bem preservados, e mostra uma mandíbula que descreve em detalhe. É um fóssil com 15 milhões de anos. Um antepassado do ornitorrinco, o Obdurodon, que ainda tinha dentes, ao contrário dos seus descendentes modernos. Depois da descrição, levanta-se e vai-se embora. A versão EO é mais compacta. Attenborough senta-se, diz-nos que por vezes se encontra fósseis muito bem preservados, levanta-se e vai-se embora. Foca o que é importante e não perde tempo com o que não interessa.

A origem dos marsupiais também é simplificada eliminando qualquer referência ao assunto. No original da BBC, depois de mostrar uns cangurus, Attenborough explicava que os marsupiais tinham surgido há 100 milhões de anos, num continente que se dividira dando origem à Antárctica, Austrália e América do Sul, onde hoje em dia ainda se encontram alguns marsupiais na floresta amazónica. A versão EO passa do canguru ao Amazonas, e pronto. A tradução e dobragem da série também é imaginativa. Referências a qualquer número de milhões de anos são traduzidas para o Holandês como «há muito tempo». Fica menos confuso.

E não é só na televisão. Esta cadeia evangélica editou a sua versão melhorada em DVD, e como comprou os direitos exclusivos à BBC é a única cadeia holandesa que pode transmitir ou comercializar esta série. Penso que mencionei que me desagrada o copyright. Aqui está a razão 5,897. Já agora, para esclarecer, não sou contra os direitos de autor. Julgo que proibir que se copie não é direito de ninguém, por isso sou contra a exclusividade de cópia. Mas sou a favor de obrigar estes aldrabões a deixar claro que o que eles apresentam não é o que o David Attenborough fez. Nem devia ser permitido apresentá-lo como documentário. É um Contra Informação, mas sem piada.

Desta vez não vou falar da parvoíce que é o criacionismo. Deixo o leitor imaginar uma floresta tropical e um senhor grisalho de calções, agachado, a dizer num sussurro emocionado:

«[...] when Creationists talk about God creating every individual species as a separate act, they always instance hummingbirds, or orchids, sunflowers and beautiful things. But I tend to think instead of a parasitic worm that is boring through the eye of a boy sitting on the bank of a river in West Africa, [a worm] that's going to make him blind. And [I ask them], 'Are you telling me that the God you believe in, who you also say is an all-merciful God, who cares for each one of us individually, are you saying that God created this worm that can live in no other way than in an innocent child's eyeball? Because that doesn't seem to me to coincide with a God who's full of mercy.» (2).

Cheio de misericórdia não. Mas talvez cheio de treta...

1- BBC, The Life of Mammals
2- Wikipedia, David Attenborough
Fontes:
Swift, 3-8-07, Blatantly Supressing Science
«Songsoverruins», 2-8-07, Burning the temple of god
Este último tem ligações para uns clips no YouTube onde se pode ver as diferenças entre as versões da BBC e da EO.

18 comentários:

  1. Caro Ludwig:

    Você já mostrou neste blog, por várias vezes, a diferença entre o copyright e os direitos de autor.

    Com mensagem acaba de dar um exemplo de como as duas coisas não só são diferentes, como podem ser antagónicas.

    Pouco a pouco, vai-me convertendo às suas posições neste domínio (noutros, como a questão da racionalidade, já estava de acordo consigo muito tempo antes de o começar a ler.
    Obrigado.

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  2. Caro José Luiz,

    Muito obrigado pelo comentário. Eu gosto das críticas, porque me estimulam a repensar as minhas posições e a explicá-las melhor. Mas o feedback positivo também é bom :)

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  3. Para além do Bem e do Mal... ai Nietzsche, tal e qual! :)

    Ó mui sábio Ludwig, essa noção antropomórfica da Divindade... que só pode criar ou fazer coisas "boas"... é ainda própria de um estado muito infantil do pensamento humano. E creio que até os próprios criacionistas já a ultrapassaram, pelo menos a Igreja Católica fê-lo, vá lá!

    Logo, aqui vai um conto zen sobre isso do que é "bom" ou "mau"... where's the difference anyhow?!

    SORTE OU AZAR?

    Havia na China um camponês que utilizava um cavalo velho para lavrar os campos. Um dia, o cavalo fugiu para as montanhas. Os vizinhos do lavrador foram vê-lo, solidários com a sua má sorte. Mas ele respondeu:

    "Má sorte? Boa sorte? Quem sabe?"

    Uma semana mais tarde, o cavalo regressou das montanhas com um bando de potros selvagens. Os vizinhos foram dar-lhe os parabéns pela sua boa sorte.

    A resposta dele foi a mesma: "Boa sorte? Má sorte? Quem sabe?"

    Pouco tempo depois, quando o filho mais velho tentava domar um dos cavalos selvagens, caiu e partiu a perna. Todos acharam isso um grande azar. Menos o lavrador, cuja reacção foi: "Má sorte? Boa sorte? Quem sabe?"

    Passado umas semanas, o exército chegou à aldeia para recrutar todos os jovens saudáveis que lá encontraram. Quando viram o moço com a perna quebrada, não o levaram. Agora isso foi boa sorte ou má sorte?

    Quem sabe?


    Well... God knows... He really runs the show!!! :)

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  4. Esta deve ser a tal moral de escrever direito por linhas tortas. São insondáveis os desígnios do senhor!!! A tal criança africana com o verme no olho, haveria de gostar muito de ouvir essa história do camponês e do cavalo. É realmente muito didáctica, ensina-nos que realmente é tudo relativo nesta vida. E ficar cego terá certamente um qualquer designio benigno insondável por trás.
    Seja como for, não creio que a Igreja Católica tenha ultrapassado esse estado "infantil" do pensamento humano. Aliás, tenho a certeza, perderia todo o sentido, por exemplo, a natureza moral do catolicismo. Se deus está para além do bem e do mal, que interessa então ser-se bom ou mau? Não é indiferente, aos Seus omniscientes e omnipotentes olhos?
    Além disso, essa história é taoista. E é muito mais antiga que o catolicismo.

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  5. Caro Rui Leprechaun,

    Se perguntas «boa sorte ou má sorte?» e começas com um camponês na China já tens a resposta. Já sabemos à partida que levou uma vida miserável, por muito caricato que seja perder o cavalo ou o filho partir a perna.

    Além disso a historieta falha por completo o problema. O camponês diz que não sabe se a sorte é boa ou má porque não sabe que consequências tem. Mas sabe avaliar cada coisa que aconteça. Por exemplo que, sendo o resto equivalente, mais valia não haver guerra e o filho não partir a perna.

    Mas o que tu defendes é diferente. É nem se saber o que é mau ou bom. É ele perder o cavalo, o filho partir a perna e morrer de gangrena e ele ser levado para a guerra e pensar que, se calhar, isto até é bom, e muito melhor que viverem felizes e saudáveis.

    O problema disso é que a relação do homem com a sua religião implica um juízo de valor. Seja verdade ou mentira, ele tem que avaliar se é uma coisa boa ou má. Se a religião nega a capacidade humana de o fazer, então essa religião não é para seres humanos.

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  6. É o optimismo no "Cândido", de Voltaire ("estamos nos melhor dos mundos possíveis").

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  7. Ludwig,

    Isto das férias obriga-me a ginasticas esquisitas para te acompanhar, e usar computadores alheios irrita-me. Há dias perdi um comentário que demorou um bocadito a escrever por causa de alguém ter usado o computador antes e ter feito um login a algo do google. E as trocas de login como são programadas por gajos "espertos" e de open source, implicam abrir a página limpa e expirar o conteudo anterior na cache.
    Se não me bastasse esse exemplo, surges-me aqui com uma falácia.
    O que o EO fez à série do Attemborough não tem nada a vêr com copyrights. O dono dos direitos de cópia, não tem o direito de modificar a obra. Se o fez, ou está a pagar para o fazer e contratualizou isso, ou, haverá alguma jogada, ou razão para não ter sido levado a tribunal por isso.
    Tens também andado a discutir coisas que no fundo são acessórias. O teu ponto fundamental é que achas que se paga demais por algo, por haver um monopólio. O copyright não tem nada a vêr com esse mecanismo. É apenas manipulado para que quem vende mantenha o monopólio. Essa manipulação é excessiva e fascizoide, e nisso concordo contigo, levo a questão mais além, quando digo que devia ser proibido transmitir direitos exclusivos sobre propriedade intelectual, como no caso de o Michael Jackson ser proprietario de todos os direitos sobre as canções do Beatles, já que não foi o intelecto dele que gerou esses trabalhos, e por isso não faz sentido que seja ele a receber todos os lucros associados.
    O que acho é que estás a enveredar por um caminho à criacionista. Estás a distorcer os conceitos por completo para encaixar na tua cruzada. O copyright serve para garantir que ninguém possa usar o trabalho intelectual de alguém, e modificar o mesmo, obter rendimentos indevidos do mesmo, e outras protecções aos autores. A questão é que vives num mundo que os economistas e juristas moldaram de modo a que tudo possa gerar negócio.
    Se alguém vende exclusivos de trabalho por sí executados a outrem e isso é contratualizável, estás perante um negócio como outro qualquer. O teu problema real não é com o copyright, mas, com as formas contratuais legais que exsitem actualmente, fruto de demasiados anos de neo-liberalismos ridiculos, e outras manipulações de mercados a todos os níveis.
    No comentário que perdi ($#%"@@$#) rebatia a tua concepção de cultura, pois ao contrário do que dizes, a cultura não é apenas o que é generalizado e de acesso livre. A cultura desde sempre é feita por estratos. A cultura dos pobres é diferente da cultura dos ricos, e estas variam regionalmente. O acesso sempre foi condicionado e nem tinha nada a vêr com a cópia. Tem a vêr com o dinheiro e as raizes de cada individuo.
    Tu defendes que a cultura deve ser de livre acesso, e mais do que a cultura, tu queres que todo o entretenimento seja gratuito de copiar. Só que isso é igual a exigir entradas gratuitas no Zoo para todos, ou em todos os cinemas, ou exigir que alguém te escreva romances, ou grave discos, ou faça filmes. Não o podes exigir a ninguém! Se não lhes quiseres pagar, ninguém te dará nada em troca! Se pensas que alguém vai gastar 200 mil euros a gravar um disco para todos ouvirem à borla, esquece-te que algum dia alguém o fez, porque ninguém o vai voltar a fazer, se acreditas que alguém vai fazer um filme de milhões para todos verem à borla quando quiserem, esquece!
    O exemplo do free riding que o João Vasco deu é clarissimo. Só quem está numa de obter o "lucro" imediato de usufruto gratuito de algo é que acredita que esse modelo é generalizável. A longo prazo a morte de uma industria inteira é inevitável. As unicas tretas que sobrevivem nesse modelo são aquelas que vão viver do merchandizing... Por isso o cinema vai-se cingir a cinemas para crianças e adolescentes que são quem gasta dinheiro em merchandizing, e na música, são aqueles que vivem da palhaçada e dos autocolantes e campanhas publicitárias, tipo D'ZRT, e afins.
    Se é essa a "cultura" que pretendes, acho que estás no caminho certo!
    Vamos passar a ter milhões de aparelhos de reprodução e storage onde só vai haver "porcaria" nova e saudades de variedade antiga.
    Ainda estou para vêr como é que se vai fazer para dar aulas... Porque no dia em que se puder copiar à vontade, quem é que vai criar conteudo? Vamos ter milhares de cópias de tudo o que existe actualmente, mas, não vai haver novos livros com novos conteudos, porque ninguém vai querer trabalhar para aquecer.
    Uma vantagem vamos ter... Os bons professores, aqueles que sabem ensinar vão deixar de andar na sombra de todas as nódoas que vivem do nome.
    E com o Toy continuas com um problema bem grande. O problema dele não é falta de conhecimentos músicais... É falta de gosto! Aquele é outro dos exemplos de quem sobreviveria a uma eliminação de copyrights. Ou seja, todos os artistas de romaria, com a sua qualidade musical.

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  8. António,

    Lamento causar-te tanta irritação nas férias (nah... é bem feita para não seres teimoso, he he :)

    Se queres usar o computador de outra pessoa, corre uma nova instância do browser. Raramente os aplicativos são feitos para vários utilizadores em simultâneo.

    Mas ao que interessa. O problema que eu apontei foi «como comprou os direitos exclusivos à BBC é a única cadeia holandesa que pode transmitir ou comercializar esta série». E este é um problema de copyright. É sempre o mesmo, é o problema de exclusividade, que para dar um «direito» a um marmanjo restringe todos os outros. Isso justifica-se com alguns direitos importantes, mas com uma coisa destas mais vale não o fazer.

    Quanto às alterações, a questão é mais complexa porque eles podem ter o direito de transmitir a série no todo ou em parte, e por isso são livres de remover as partes que quiserem. Pode também haver clausulas que permitam edição de conteúdos, o que é normal em muitas situações. Por exemplo, os filmes que dão nos aviões normalmente têm as cenas de sexo cortadas por causa das crianças (violência e pessoas a morrer costumam deixar, que isso não faz mal a ninguém... mas isso é treta para outro dia...)

    «Tens também andado a discutir coisas que no fundo são acessórias. O teu ponto fundamental é que achas que se paga demais por algo, por haver um monopólio.»

    Não. É que se paga demais PARA haver monopólio. Pagamos em direitos que prescindimos, em castigos para os que são apanhados, em impostos para suportar a fiscalização e polícia dedicada a isto. No meio disto tudo mais dez euros por DVD é uma ninharia.

    «Se alguém vende exclusivos de trabalho por sí executados a outrem e isso é contratualizável, estás perante um negócio como outro qualquer.»

    Não pode. O Chico vender ao Manuel o direito exclusivo a algo implica restringir as acções da Joana, da Ana, do Pedro... É esse o problema da exclusividade. O Chico pode vender as calças ao Manuel, mas não pode vender ao Manuel o direito exclusivo de usar calças.

    O problema do copyright é precisamente esse tal «direito» de exlcuir terceiros, que não é direito nenhum. É abuso. E é isso que impede algo sob copyright de ser verdadeiramente cultura.

    Cultura não é aquilo que todos fazem da mesma forma. Como tu disseste, uns podem fazer umas coisas e outros outras. E ninguém pode fazer tudo. Mas não podemos considerar cultura algo do qual a lei exclua algumas pessoas.

    «Porque no dia em que se puder copiar à vontade, quem é que vai criar conteudo?»

    Exactamente os mesmos. Nenhum artista deixa de criar arte só porque outros o podem copiar, tal como nenhum matemático deixa de fazer matemática, nenhum filósofo deixa de filosofar, e nenhum desportista deixa de praticar desporto. E relembro que esta treta do copyright foi implementada em 1886.

    «E com o Toy continuas com um problema bem grande. O problema dele não é falta de conhecimentos músicais... É falta de gosto!»

    Esse é problema dele, não é meu. O meu problema, e de todos, é a polícia andar a chatear quem copia as músicas do Toy. É um problema moral (o Toy não tem nada a ver com o que os outros fazem nem com que música ouvem), e é um problema que nos afecta directamente porque são os nosso impostos que pagam este «direito» absurdo que a lei confere ao Toy, o direito de proibir que copiem música.

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  9. Uma pequena correcção...

    Ao comentário do António

    «Porque no dia em que se puder copiar à vontade, quem é que vai criar conteudo?»

    Eu respondi «exactamente os mesmos». É falso. No dia em que se puder copiar à vontade praticamente todos vão criar conteudo. É o que está já a acontecer com o YouTube e os blogs. Na prática, pode-se copiar quase à vontade, e toda a gente participa com algo seu. Nem que seja um breve comentário.

    E parece-me que isto enriquece muito a nossa cultura. Muito mais que conceder direitos exclusivos aos distribuidores.

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  10. Ludwig,

    :-) Se fosse uma chatice não estaria aqui a comentar. O estimulo é haver alguém que discuta as coisas e contra argumente. Se fosses um yes man, como me pareceu começar a acontecer com o De Rerum Natura, já me tinha pisgado como pisguei de lá!...

    O mal não foi o browser novo... O mal é esta validação ser por cookies, e as preferencias pessoais gravadas... Treta tecnológica. Adiante... :-)

    Eu aqui discordo contigo noutro pormenor. :-) Tu sentes-te satisfeito com a cultura "You Tube"iana, eu não! Eu sou contra a globalização, e contra a perda de identidade regional, e contra os mais baratos fabricarem e os mais ricos consumirem mais, e mais barato. Os excessos de oferta momentânea baixam o valor das coisas abaixo do seu valor real. Se custa 100 produzir algo, não se deve vender por 10 só porque saiu bem demais a produção a demasiada gente. É esta filosofia que está a dar cabo dos mares! Foi assim que muitas coisas boas se arruinaram.
    A cultura barata feita por todos, é uma treta normalizada por baixo. É como comer peixes de 15cm processados e alimentados a farinha, porque é muito caro produzir o peixe de 50cm, ou até encontrar numero suficiente destes num oceano. Por isso dizima-se os jovens, e arruina-se o futuro. Como a cultura barata... :-)

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  11. António,

    O problema é confundires a cultura com um bem escasso. Os peixes nos mares acabam-se. Se todos comermos muito peixe deixa de haver peixe.

    Mas quanto mais cultura consumimos mais cultura produzimos. Cultura são ideias, e a quanto mais ideias alguém é exposto mais ideias tem, mais criativo se torna.

    O efeito da livre (e eficaz) circulação de ideias tem se sentido imenso na ciência. O trabalho de Mendell esteve perdido 50 anos nuns anais da sociedade naturalista de Brunn. Se fosse hoje uma pesquisa na pubmed era o que bastava para Darwin resolver o problema da hereditariedade. Isto não esgota o peixe. Pelo contrário, acelera imenso a criação de novas ideias.

    O que devemos fazer com a música, com a cultura, com a informação em geral é precisamente o contrário do que devemos fazer com os recursos naturais. Os últimos, quanto mais se gasta menos se tem. Mas os primeiros quanto mais se espalha mais se cria.

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  12. Ludwig,
    A boa cultura é um bem escasso. Se eu escrevo um post ou um comentário num blog, não espero ser pago por isso, porque o faço nos meus tempos livres e tenho outras fontes de rendimento.

    Mas se eu quiser escrever um romance ou um ensaio que implique centenas ou milhares de horas de trabalho em investigação, organização, redacção, revisão, etc., alguém vai ter que me pagar, caso contrário não o poderei fazer.

    Não é uma questão de não querer, é de não poder.

    E se tenho que ser remunerado, parece-me natural que essa remuneração seja proporcional ao número de leitores (excepto se escrever em troca de um salário, caso no qual quem assume o risco de os leitores serem poucos e o benefício de poderem ser muitos é quem me tiver pago o salário).

    A única maneira de calcular o número de leitores é pelo número de cópias vendidas. Daí que o meu «direito de autor» se realize na prática através de um «direito sobre as cópias».

    Trata-se, porém, de dois direitos diferentes. O meu direito de autor, não o posso vender. Nenhuma editora pode afirmar ter escrito o romance que eu escrevi. Mas posso vender o direito sobre as cópias. E ao vendê-lo vendo um exclusivo, como é natural.

    «Exclusivo», porém, não é necessariamente a mesma coisa que «monopólio». Ao vender a alguém o direito de copiar a minha obra não tenho, em tese, que me comprometer a não vender esse direito a mais ninguém. Posso comprometer-me apenas, por exemplo, a não o vender por um preço que seja inferior a um certo limite, ou a não o vender antes de decorrido um certo prazo.

    Até posso não assumir nenhum destes compromissos, mas neste caso não vou ter comprador para os meus direitos sobre a cópia...

    O que me parece é que nesta matéria, como noutras, os governos têm favorecido os monopólios em vez de os combater como deviam. Mas esta seria já outra conversa, não é verdade?

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  13. José Luiz,

    Escasso, no sentido económico, não quer dizer raro mas sim que se gasta. A cultura não se gasta, multiplica-se. Era essa a diferença que eu queria salientar. Se temos dez peixes e dez pessoas dá um peixe por pessoa. Se temos dez boas ideias e dez pessoas, podemos ter dez pessoas com dez boas ideias cada uma.

    E parece-me que está a confundir alguma coisa. Os custos da obra não justificam um pagamento proporcional ao número de leitores. Isso não faz sentido, porque não tem nada a ver com o custo nem com o valor cultural da obra, que pode ser pouco popular mas inspirar obras muito mais populares.

    Mas o ponto principal é a exclusividade. Eu vender o direito exclusivo de difundir este texto presume que, por ter escrito isto, posso proibir a toda a gente que se exprima desta forma. Isso é absurdo. É ilegítimo esse poder sobre a liberdade de expressão de quase sete mil milhões de pessoas.

    Este alegado direito é moralmente injustificável. É um privilégio legal que foi concedido inicialmente de uma forma muito mais modesta que a que toma hoje, e para resolver o problema prático de incentivar o comércio de livros. O problema já não é relevante e este privilégio está a ser sistematicamente abusado.

    Ser livre de se exprimir é um direito. Proibir os outros de o fazer não é. A justificação de "eu disse primeiro" é insuficiente.

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  14. O José Luis disse primeiro. :-)
    A cultura de qualidade é um bem escasso, e o mercado é um barómetro das qualidade. O segredo não é subsidiar a qualidade, nem massificar gratuitamente. É aumentar a capacidade de avaliação das massas, que aí sim vai haver um aumento na qualidade das escolhas. As culturas de massas como já disse não me interessam. Não quero D'ZRTs nem Toys nem artistas de feira a dominar a cultura. O copyright garante-me isso mesmo! Não é elitismo, que esses estão garantidos pois pagam a sua cultura à parte como sempre o fizeram ao longo dos séculos. É não ser nem elitista nem acéfalo. É o maio termo que se perde, e eu não estou disposto a isso.

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  15. Acho que estou a compreender o António: a banalização e a acessibilidade permite obras de qualidade, no mínimo, muito duvidosa. Por exemplo, agora qualquer nabo pode cantar com "sensual, sensual" e "são lágrimas, são lágrimas". Eu reparo isso no open source. Qualquer um pode fazer um jogo de computador ranhoso e colocar na Web, geralmente usando ideias sem ponta de originalidade, ou uma idiotice original. Eu próprio, no secudário, fiz um jogo parvo chamado Piloman que perdeu-se numa disquete que ficou pifada.
    Mas por outro lado, no meio de tanto lixo, surgem ideias brilhantes que são ignoradas no mercado e que seriam muito arriscadas. E a oportunidade de experimentar idiotices permite as pessoas aprenderem como autodidactas e amadores. Por exemplo, o site do jogo SuperTux mostra a evolução do seu desenvolvimento, tem uma documentação e um site de fãs que colaboram. Até mesmo é possível aceder ao código fonte (que tive o prazer de estudar) e livros com o "making of" dos jogos Doom e Quake.
    Apesar dos gestores de janelas e desktops do Windows X basearem-se muito no MS-Windows e Macintosh, existem excelentes ideias que não estão a ser muito usadas, como a possibilidade de juntar várias janelas numa única no gestor de janelas Flux Box. É algo que dá muito jeito.

    O YouTube e outros sites de partilha são muito importante nas investigações que faço para escrever e para dar alguns debates que participo. Sobre reciclagem e uso de ideias, reparem nos seguinte vídeos:
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    Sobre truques e "making of"s tenho a seguinte playlist no Youtube: http://www.youtube.com/view_play_list?p=D21F18B8D67FE7DB. São vídeos importantes para mim, como auto-didacta. Há ainda ideias que acho muito boas e divertidas como essas:
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    Essa acessibilidade é importante para o exercício democrático e para a liberdade. Os blogs e os vídeos podem servir como denúncia, e assim um governo (o primeiro-ministro em particular) ficou lixado. Fico a conhecer tanta idiotice e abusos no mundo graças a indivíduos que colocam as suas ideias e cópias de vídeos e imagens na Web, tal como sobre o Museu Criacionista e os Intocáveis na Índia.

    E, que eu saiba, no Renascimento não havia copyright, mas havia obras extraordinárias. Patronos pagavam por essas obras (algumas com um retrato numa representação de um santo), que muitas vezes eram mostradas ao público, especialmente em templos, e agora em museus. Muitos artistas copiavam ideias uns dos outros, e assim surgiam os estilos das épocas.

    Penso que os problemas da massificação têm mais a ver com o excesso de informação e variedade. É como os problemas com Sistemas Operativos baseados em Linux e BSD: são muitos, e há muitos maus, apesar de haver outros excelentes. Mas é uma oportunidade de haver uma evolução aplicada nas ideias, se não houvesse factores que não estivessem relacionados com a qualidade dos produtos (marketing, monopólios, etc.).

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  16. correcção:
    "se não houvesse factores que não estivessem relacionados ..."
    ->
    "se não houvessem factores que estivessem relacionados ..."

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  17. "Attenborough explicava que os marsupiais tinham surgido há 100 milhões de anos, num continente que se dividira dando origem à Antárctica, Austrália e América do Sul, onde hoje em dia ainda se encontram alguns marsupiais na floresta amazónica."

    Realmente Attembourough estava lá para ver todo esse processo e tirar as suas notas!!

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  18. «[...] when Creationists talk about God creating every individual species as a separate act, they always instance hummingbirds, or orchids, sunflowers and beautiful things. But I tend to think instead of a parasitic worm that is boring through the eye of a boy sitting on the bank of a river in West Africa, [a worm] that's going to make him blind. And [I ask them], 'Are you telling me that the God you believe in, who you also say is an all-merciful God, who cares for each one of us individually, are you saying that God created this worm that can live in no other way than in an innocent child's eyeball? Because that doesn't seem to me to coincide with a God who's full of mercy.» (2).

    O autor destas palavras ignora a mensagem da Bíblia. Esta afirma que com o pecado humano entrou a morte e o sofrimento no Cosmos, corrompendo toda a criação.

    É por isso que existem mutações, extinções, comportamentos predatórios, desastres naturais, cheias, secas, terramotos, etc.

    Nada disso fazia parte da criação original de Deus.

    No entanto, a Bíblia afirma claramente que o pecado tem consequências, não só neste mundo, mas para toda a eternidade.

    É por isso que Jesus Cristo, pagando o preço pelos nossos pecados, morreu e ressuscitou dos mortos.


    É também por isso que a Bíblia acaba, em Apocalipse, com a promessa de novos céus e nova terra, onde não haverá morte, sofrimento e maldição.

    Na Bíblia, o pecado contamina toda a criação, e a salvação extende-se a toda a criação.

    A Bíblia não afirma que a criação, tal como a vemos hoje, é perfeita.

    A Bíblia fala de um criação que, tendo sido perfeita, se encontra corrompida.

    Ela afirma que a criação tem uma doença que só o Criador pode curar.

    É isso que as palavras citadas ignoram totalmente.

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