terça-feira, agosto 21, 2007

Com o pé no velocímetro.

O João Vasco aproveitou a minha semana de férias para publicar uma série de posts defendendo o ordenado mínimo (1), que há tempos critiquei como uma forma ineficaz e desonesta de ajudar quem precisa (2). E comete o erro que os políticos aproveitam para nos espetar com estas coisas: confunde o velocímetro com o acelerador.

O preço indica o ponto de equilíbrio da negociação. O Manuel pede 20, o Chico oferece 10, acabam por concordar em 15. Negócio fechado. O António só atrapalha se vier dizer não não, tem que ser 18 ou não pode haver negócio. Atrapalha, e estraga a vida ao Manuel, que em vez de vender por 15 não vende nada. Imaginem que o estado decidia ajudar os produtores de batata impondo um preço mínimo de 2€ por quilo. Abaixo disso ninguém podia vender batatas. Ajudava? Claro que não. Uns poucos vendiam batatas especiais de corrida e o resto ia arrumar carros. O salário mínimo tem o mesmo efeito.

É uma ilusão pensar que se ajusta o preço e o resto vem atrás. Não se consegue acelerar o carro mexendo no ponteiro do velocímetro, e não basta ditar um valor para o ordenado mínimo. É sempre preciso alterar a relação entre quem negoceia, neste caso com multas, polícia, tribunais, e assim por diante. É isso que vai deslocar o preço, o valor do ordenado, que continua a ser um indicador da transacção e não algo que se possa ajustar directamente. Mas multas e proibições atravancam o mercado. Aumenta-se a média à custa de eliminar muitas transacções abaixo desse valor, o que reduz a economia e prejudica muita gente.

O problema é que o trabalhador pouco qualificado precisa muito mais do emprego que o empregador precisa do empregado. Com tão pouco poder de negociação o trabalhador fica prejudicado num mercado sem regulação. O ordenado mínimo tenta resolver isto proibindo as transacções mais desfavoráveis ao trabalhador, mas, tal como as batatas a 2€, só piora a situação. Aumenta o desemprego, o trabalho temporário e a tempo parcial, e obriga o trabalhador menos qualificado a competir directamente com trabalhadores mais qualificados que vão ganhar o mesmo. Disfarça, mas não resolve.

O objectivo é equilibrar melhor a negociação sem desencorajar a transacção. Em vez de investir recursos a proibir o melhor é atacar directamente o problema. O subsidio de desemprego, a assistência social, a assistência médica gratuita ou rendimento mínimo são alguns exemplos de medidas que não só aumentam directamente o rendimento real de quem mais precisa mas que também lhe dão mais poder de negociação ao reduzir a necessidade desesperada de aceitar qualquer emprego.

É verdade que é preciso pagar tudo isto, e não sai barato. Mas se o objectivo é que estas pessoas tenham dinheiro para viver há que lhes aumentar o rendimento, e o dinheiro tem que vir de algum lado. O ordenado mínimo atrapalha a economia e desencadeia uma rede confusa de efeitos secundários. Chega-se ao ponto de obrigar as empresas a pagar um ordenado mínimo e depois dar-lhes subsídios para que o possam fazer. Claramente, é muito mais racional e transparente dar logo esse dinheiro a quem precisa.

O erro é ver o preço como um botão ou acelerador que podemos ajustar para manipular a economia. Não é. É sempre preciso mexer noutro lado. Além dos efeitos nefastos e muitas vezes difíceis de prever, impor um preço por proibições legais tem dois grandes custos directos. O custo do aparato de fiscalização e punição de infractores, e o custo do entrave à economia. A única vantagem é política. Estes custos, apesar de maiores que os custos da alternativa, são muito menos óbvios.

1- João Vasco, 15 a 19-8-07, Salário Mínimo, de I, a IX.
2- 2-8-07, Dar sem gastar.

18 comentários:

  1. Ludwig,

    Concordo com o que dizes dos efeitos, mas, discordo da utilidade. :-)
    Se há salário minimo e para isso é preciso atingir um nível de produtividade e eficiência tal que coloca os menos qualificados a concorrer directamente com outros melhores (muito melhores) é bom! É uma forma de "obrigar" os menos qualificados a mexer o tutu, e obter qualificações. Actualmente conheço uma moça com o segundo ano de Fisica e alguns cursos tecnicos de laboratório que trabalha num call center, e tem colegas que nem o 10 ano terminaram, e que são os primeiros a sofrer. É forma de os motivar, para que a mensagem passe, que ser um bandalho preguiçoso que acha que a formação é para tótós dá bronca no futuro. Mais uma em que discordamos. :-)
    Já para não falar do rendimento minimo garantir a distorção do mercado de trabalho como aconteceu em comunidades onde alguém com 3 filhos recebia mais por não fazer nada do que quem trabalhava. Resultado, deixaram de trabalhar para ir pedir o rendimento minimo.
    E as coisas gratuitas... São treta! :-) Depois tu queres ser tratado e não podes porque há reformados que "vivem" nos centros médicos, e ocupam as consultas todas! Alguns reformados só com 55 ou menos anos... Estamos tão longe da utopia da saude gratuita! :-)

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  2. Oi António,

    Não tenho opinião formada quanto ao bandalho preciçoso. Mas o operário de 45 anos com três filhos menores que se vê no desemprego porque a fábrica não é alguém de quem seja razoável exigir que tire um curso para arranjar um emprego de jeito.

    Quanto ao receber mais por não trabalhar, é questão de fazer melhor as contas. Por exemplo: dar a quem tem dependentes e um rendimento inferior a mil euros metade da diferença entre o seu rendimento e os mil euros. Um desempregado recebia 500, alguém com um ordenado de 500 recebia 250 extra, com um ordenado de 900 recebia 50 extra, etc... compensava sempre ganhar mais de ordenado, mas ninguém ficava a zero. Mas isso são detalhes de implementação.

    Penso que o fundamental, assumindo que a sociedade decide ajudar um certo grupo, é que se ajude de uma forma clara e directa, e não com proibições, polícia, e essas tretas que só dão chatice e acabam por beneficiar as pessoas erradas, prejudicar quem deviam ajudar, e custar muito mais caro a todos nós.

    Como a treta do copyright :)

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  3. Ludwig,

    O exemplo mais directo não é o de 45 anos. Isso de achar que o desemprego aos 45 anos é a morte é que levou a que houvesse reformas aos 50 para alguns, e no caso da PT que pague mais por pré reformas que por salários. É treta! Um desempregado é uma lástima, é verdade, mas, tratar os desempregados como atrasados mentais é que não adianta nada. Se está desempregado aos 45, e trabalhava numa fábrica a receber o salário minimo pode ir trabalhar para uma loja pelo mesmo preço, e escusavamos de aturar brasileiros "chatos" em todo o comercio.
    Os de 45 anos que me preocupam são alguns que trabalhavam comigo que recebiam 1500 euros mês, em trabalho administrativo e comercial, que não estavam a trabalhar no terreno. Esses é que construiram uma vida à volta dos 1500 e de repente a perspectiva é 750. Parece-te muito, mas, quem constroi uma vida à volta dos 1500, criou encargos que os 750 não cobrem! Esses sim preocupam-me com o desemprego aos 45.
    O desemprego de 403 aos 45 só é grave em terras que não tenham alternativa de riqueza, pois não havendo fábrica, não há dinheiro para o comercio, e com tal não há empregos de 403 para ninguém. Nas cidades grandes os desempregados de 403 euros são orgulho e nariz empinado a mais. Ainda hoje ví 2 ofertas de emprego dessas em lojas/cafés/restaurantes onde passei, e ontem ví outra. Por isso os desempregados de 403 em Lisboa são treta, mas, se for numa terra do interior dependente de uma unica fábrica, que fecha, esses sim preocupam-me, mas, a solução não é dar-lhes dinheiro. A solução era ter investido em formação e diversificações de negócios, em vez de auto-estradas... Para agora aparecerem hipocritamente a dizer que temos de viver com o dinheiro que recebemos da UE... Esse senhor que o esbanjou quando era primeiro-ministro devia de pagar caro por ter a lata de dizer o que disse, tendo feito o que fez, mas, a memória é curta, e ainda o vão re-eleger.

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  4. Ludwig

    Discordo de quase tudo o que dizes, não porque possas não ter razão em teoria, mas porque na prática não funciona nada assim!

    Quando dizes:

    "O subsidio de desemprego (...) são alguns exemplos de medidas que não só aumentam directamente o rendimento real de quem mais precisa mas que também lhe dão mais poder de negociação ao reduzir a necessidade desesperada de aceitar qualquer emprego. "

    ... mas quem é que tem necessidade de aceitar qualquer emprego???? Acreditas se te disser que em duas semanas ouvi duas pessoas dizer que preferiam estar no desemprego? Sabes porque é que não acreditas? Possivelmente porque és boa pessoa. Sabes que mais? Há muitas más pessoas. Mais do que aquelas que eu suporto pensar, pelo que tento não pensar nisso. Mas é inevitável, porque algumas passeiam-se peala minha vida e estou a tentar enxotá-las aos poucos.

    As negociações de salários mínimos e reivindicações várias (e as greves, senhores, as greves) podem ser boas para os trabalhadores... mas regra geral são maneira de fazer currículo a sindicalistas! Não haja ilusões.

    E depois, aceitar qualquer emprego é relativo: formação superior (tanto de empregador como de colaborador) não são garantia de nada. Antes fosse! Não posso é contar alguns casos que conheço porque são muito delicados e facilmente identificáveis se lidos pela pessoa certa (a Abobrinha é para não ser identificada mesmo).

    Dito isto, é preciso acreditar que (em média, sendo que a Estatística é cruel) a coisa vai andando! E que os excessos se corrigem. Mas é preciso que sejam a tempo!

    As pessoas não precisam de ser ajudadas: têm é que ser educadas para a dignidade do trabalho e para o seu papel na sociedade. Isto demora gerações ou exige um grande esforço na educação. Atendendo ao estado da educação e à falta de formação dos professores (científica e cívica)... é melhor esperar pela renovação de gerações! E que estas que não estejam a renovar sejam as das más pessoas. Mas eu sou uma pessoa de fé...

    ... e cheia de sono... já não sei bem o que digo...

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  5. Abobrinha,

    «Discordo de quase tudo o que dizes»

    Boa! :)

    «mas quem é que tem necessidade de aceitar qualquer emprego???? Acreditas se te disser que em duas semanas ouvi duas pessoas dizer que preferiam estar no desemprego? »

    Acredito. Mas nota que é mesmo isso que estou a dizer. Imagina que o sistema de saude era privado e não havia subsidio de desemprego nem nada disso. Quem não trabalhava morria à fome, e ninguém entrava no hospital sem pagar. Nesse caso extremo de mercado desregulado o trabalhador menos qualificado estava tramado com F grande. Na prática, isto era escravatura.

    Não acontece isso cá por causa dessas medidas. É o subsidio de desemprego, o sistema público de saúde e essas coisas que ajudam estas pessoas. Não é o ordenado mínimo.

    Já agora, também para o António. Parece-me que vocês estão a misturar o objectivo e a implementação.

    O objectivo, a meu ver, é permitir que mesmo que quem não trabalha tenha um sitio onde morar, comida, e assistência médica. Eu sei que vai haver sempre uns pregiçosos que se vão aproveitar mas isso é um mal menor. Muito menor que a alternativa, que é ficarem pessoas na miséria ao sabor das flutuações incontroláveis da economia. Especialmente quando têm filhos -- mesmo os filhos dos preguiçosos têm direitos.

    Parece-me que nisto, em geral, concordamos. Vocês não propõem acabar de vez com todo o sistema de segurança social e apoio a estas pessoas. O problema é na implementação.

    E é aqui que eu digo que medidas de fixação de preços são uma grande treta. Fundamentam-se na ilusão que podemos manipular o preço sem custos, e falham por completo o alvo que. Só fazem sentido quando o objectivo é mesmo eliminar o mercado. Não queremos comércio livre de antibióticos ou armas pesadas, e nesse caso faz todo o sentido restringir as transacções. Mas no mercado de trabalho restringir transações é contraproducente.

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  6. Ludwig

    "Eu sei que vai haver sempre uns pregiçosos que se vão aproveitar mas isso é um mal menor."

    Desta vez vou ser boazinha e dizer (mesmo porque é verdade) que gostaria de concordar contigo na frase acima. Mas não posso. De novo, pela prática vs teoria: não é um mal menor! Há muitos preguiçosos e profissionais da mesma.

    Os rendimentos sociais de inserção (aka rendimento mínimo) são em teoria uma boa ideia. Na prática deram dignidade a algumas pessoas... e sugaram o dinheiro necessário a outras.

    Aqui sei do que falo porque ia arrancando a cabeça a uma assistente social de que precisaria (como oposto a precisei, porque não foi opção) para uma prima minha numa situação delicadíssima. A sorte foi que havia dinheiro e uma grande família (que ainda não foi preciso chamar porque ainda há dinheiro e deve chegar). Ia arrancando a cabeça à senhora porque se há casos de solidariedade social era aquele! E a solidariedade (e a competência) foram ZERO!!!

    Mas quem tem amigos (no caso família) raramente morre na cadeia e a coisa resolveu-se. Não pela segurança social, para a qual desconto com desagrado porque serve para pagar a parasitas e não a pessoas na situação da minha prima. Com a agravante que os da ADSE são pagos pelos outros e têm privilégios diferentes! Superiores, muito superiores. E porque me disseram (mas estou a vender ao mesmo preço, porque não sei se é assim) que os bancários têm um sistema de segurança social à parte e não contribuem para o mesmo "bolo" de solidariedade.

    Ou seja, "o povo é quem mais ordena" foi só um slogan giríssimo e romântico e datado da altura em que nasci (revolucionária, não sei se estás a ver)... mas de resto a prática é que são os do costume quem se lixa.

    Isto afastou-se um bocadinho do salário mínimo (e daí não, no sentido do "ajudar"), mas voltarei ao assunto em concreto mais tarde.

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  7. Abobrinha,

    «Desta vez vou ser boazinha e dizer (mesmo porque é verdade) que gostaria de concordar contigo na frase acima. Mas não posso. De novo, pela prática vs teoria: não é um mal menor! Há muitos preguiçosos e profissionais da mesma.»

    Não queria dizer que o mal é menor no sentido de ser pouca gente, mas no sentido de um preguiçoso viver às custas de outros é um mal muito menor que alguém morrer à fome, viver na rua, ou não ter assistência médica. Mesmo que essa pessoa seja preguiçosa.

    Há situações em que não me parece aceitável estar a considerar se a pessoa merece ou não. Por exemplo, se entra nas urgências uma pessoa com os ossos partidos deve ser tratada quer tenha sofrido um acidente quer seja estupida e tenha andado a jogar à bola no telhado.

    As condições básicas de vida, aquilo que a sociedade conseguir dar sem grande esforço, acho que devemos dar a todos independentemente de acharmos se merecem ou não. Dos três mil euros do meu ordenado bruto, mil vão-se em impostos. Dava-me jeito ficar com eles, mas tenho que admitir que não iam ter um impacto significativo na minha qualidade de vida. Esperar mais uns meses para comprar o televisor de plasma para a sala não é uma grande desgraça. Parece-me que mesmo com todo o parasitismo e ineficiência do estado, esse dinheiro faz mais falta noutro lado.

    Chateia-me é que o usem da forma errada, em coisas como leis de copyright, de ordenado minimo, de limites para as rendas e coisas dessas que só servem os políticos ou a não quem precisa.

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  8. Concordo com quase todo. Menos com o rendimento mínimo. Nenhuma prestação social deste género devia ser entregue sem contrapartida de trabalho.
    E isto não são detalhes de implementação. Isto tem um efeito real na economia e na produção.
    Acaba por dar-se o mesmo efeito que o Ludwig enunciou em relação ao OM mas por outra forma. Muitos postos de trabalho não chegam a existir porque o rendimento mínimo distorce o encontro entre oferta e procura ao nível do mercado de emprego.
    Nenhuma prestação social do tipo rendimento mínimo devia ser suficientemente atraente para desincentivar o trabalho. E é.

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  9. NCD,

    Eu acho que o problema é em dar um rendimento mínimo que é retirado quando se trabalha. Por exemplo, supõe que o estado dava 500€ por mês a todas as pessoas com mais de 18 anos, sem excepção. Alguns poderiam viver sem trabalhar, mas em todos os casos ganhar um ordenado seria sempre receber mais, e seria sempre melhor que só ter estes 500€

    A ideia aqui não é dar a quem merece, ou só a quem precisa mais. O objectivo é subir o nível de base, para que a pior situação em que alguém se encontre não seja tão má. O serviço nacional de saude é um bom exemplo disso. É praticamente gratuito para todos, ricos ou pobres.

    Penso que é assim que o estado deveria funcionar. Nos impostos cobrar mais a quem tem mais porque a esses custa menos pagar. E nos serviços dar igual a toda a gente para não causar distorções, fomentar aldrabices e coisas dessas. Todos deviam ter a mesma reforma, o mesmo rendimento garantido, a mesma assistência médica, o mesmo acesso à educação pública, e assim por diante.

    Mas em algumas destas coisas a visão do estado como um fornecedor de serviços ou como uma caridade impede que se implemente isto da forma mais eficiente.

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  10. Ludwig:

    Aquilo que escreve neste artigo corresponde precisamente às objecções que descrevi no primeiro artigo desta série.

    Depois escrevi oito artigos a responder a essas objecções, e estes é que eu não vi refutados.

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  11. Oi João,

    O problema maior é sempre o mesmo. Falas do preço como uma coisa que se ajusta sem problema, quando é o mais difícil de ajustar e nem sequer é o que queremos resolver.

    O relevante não é quanto uma pessoa que trabalha recebe à hora. O que importa é poder dar de comer aos filhos, ter assistência médica e um sítio para morar. O resto pode bem ser o mercado a decidir.

    Quanto aos detalhes dos teus textos, deixei num comentário um dos problemas mais relevantes. O total que os trabalhadores recebem o preço por hora vezes o numero de horas vendidas. É a àrea do rectângulo, e não dos triangulos. E essa àrea diminui bastante com o aumento de preço porque o declive das curvas é pouco acentuado. Especialmente quando consideramos os trabalhadores menos qualificados, a procura e oferta são muito sensíveis ao preço porque estão a competir com outros mais qualificados e com as máquinas que podem automatizar aquilo que eles fazem.

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  12. Ludwig,

    A questão que tu não estás a colocar é que a inactividade é também uma utilidade. E uma utilidade avaliável económicamente.
    Ou seja, entre receber 500 sem fazer nada ou 250 estando a trabalhar, a primeira pode ser mais apetecível do que a segunda. Já se aqueles 500 implicassem uma contrapartida de trabalho enquanto os 250 não a situação seria diferente. Se, além disso, aqueles 500 fossem apenas em bens pré-determinados, com o consumo definido em periodicidades mais curtas que o mês, estragávamos o negócio a muita taberna e talvez fizéssemos chegar a comida à boca das crias que queremos defender e alimentar.
    Insisto: estes aspectos não são detalhes nem pormenores de execução. Sem estes pormenores o sistema é pura e simplesmente preverso: encoraja a não trabalhar e financia hábitos de dependência sem melhorar as condições dos seus destinatários.

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  13. NCD,

    «Ou seja, entre receber 500 sem fazer nada ou 250 estando a trabalhar, a primeira pode ser mais apetecível do que a segunda.»

    Que seja. Gostos não se discutem. E talvez fosse uma boa forma de incentivar a criatividade artística, o desporto, a preservação de actividades culturais, etc. Também melhorava as condições das crianças, que podiam ter um ou ambos os pais em casa. Ter pessoas sem trabalhar, se a sociedade pode comportá-lo sem grande esforço, não é necessariamente mau.

    Acima de tudo, é melhor uma sociedade em que o trabalho é algo que se faz por opção própria que algo a que se é obrigado a sujeitar para sobreviver. Se não temos outro remédio que obrigar as pessoas a trabalhar, pois lá terá que ser. Mas nunca deve ser esse o objectivo.

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  14. Ludwig

    "Há situações em que não me parece aceitável estar a considerar se a pessoa merece ou não."

    Em saúde e educação estamos conversados: não é negociável estar a discutir quem merece e quem não. Incluí a minha prima.

    "As condições básicas de vida, aquilo que a sociedade conseguir dar sem grande esforço, acho que devemos dar a todos independentemente de acharmos se merecem ou não."

    Não! Não concordo! Em país nenhum se deixa andar esta situação de encostanço a quem trabalha! Neste, em que o chico-espertismo é modalidade olímpica muito menos! Atenção que este chico-espertismo também dá coisas boas, mas dá muitas más!

    Nunca ouviste falar de dar uma cana de pesca em vez de um peixe?

    Dito isto, vivemos em meios inteiramente diferentes: eu vivo num meio meio rural meio urbano. Aliás, parte do motivo pelo qual assino Abobrinha é mesmo esse: as paredes têm ouvidos e tudo o que se diz pode e será usado contra nós. Aqui sabe-se “de quem é” a pessoa! Aqui alguém vem pedir e sabemos se precisa ou não: se é por necessidade, por bebedice, por malandrice ou mesmo porque “virou da ideiinha”. Digo eu (posso estar a ser injusta) que vives num mundo mais “asséptico”, em que podes teorizar e sonhar que meia dúzia de pessoas a parasitar não fazem diferença. Com uma agravante: aqui são mais que muito mal vistas!

    Esta situação (real!) de desemprego, que tem atingido a minha zona tem dois efeitos: pessoas trabalhadoras enrascadas com dívidas e... chicos espertos que se queixam de não haver emprego!

    A realidade é que o dinheiro que temos não permite desperdícios de dar a quem não merece, dado que tira a quem precisa. E mesmo que pudéssemos desperdiçar, seria pecado. Aqui como em qualquer sítio!

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  15. Ludwig:

    Não é a área dos rectângulos que importa, pois a recta da oferta está definida precisamente por forma a que assim não seja.

    Isso seria simples contradição.
    Podia no entanto dizer que a curva da oferta é praticamente uma linha horizontal perto da origem, e assim as áreas a que me refiro seriam "quase" os rectângulos de que falas.

    Mas mesmo nesse caso, não tens razão. É que com osalário mínimo também se pode aumentar a tal área do rectângulo, tal como respondi no comentário em que colocaste essa objecção.

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  16. E talvez fosse uma boa forma de incentivar a criatividade artística, o desporto, a preservação de actividades culturais, etc.

    Ou o alcoolismo, a toxicodependência, a conflitualidade, a criminalidade, a violência doméstica...

    Depende. Depende daquilo que a pessoa faz com o seu tempo livre, não é?

    Como a situação não é hipotética, talvez se pudesse saber quantos daqueles que recebem o rendimento mínimo frequentam ou promovem actividades culturais, quantos são artistas ou praticam desporto por contraposição aos que são dependentes do alcool ou da droga ou delinquentes...


    Também melhorava as condições das crianças, que podiam ter um ou ambos os pais em casa.

    A maior parte destas crianças já tem um dos pais em casa pelo menos, embora nem sempre isso melhore as suas condições. Pelo contrário, os meus filhos não têm nenhum dos pais em casa.


    "Ter pessoas sem trabalhar, se a sociedade pode comportá-lo sem grande esforço, não é necessariamente mau."

    Aqui discordamos: ou há razões (idade, doença, apoio a menores) para as pessoas não poderem trabalhar, e nesse caso a solidariedade social deve apoiar a pessoa, não a situação, ou, se não há razões a pessoa deve suportar a sua própria inactividade. Porque essa inactividade só é suportável pelo esforço dos demais.

    Acima de tudo, é melhor uma sociedade em que o trabalho é algo que se faz por opção própria que algo a que se é obrigado a sujeitar para sobreviver. Se não temos outro remédio que obrigar as pessoas a trabalhar, pois lá terá que ser. Mas nunca deve ser esse o objectivo.

    Todos nós trabalhamos por opção. Podemos não trabalhar se não quisermos.

    Não podemos é esperar que os outros trabalhem para nós e ainda ponham uma máquina fiscal ou para-fiscal a trabalhar para estorquir aos que trabalham o dinheiro para sustentar os ociosos.

    Quanto ao objectivo, também não concordamos. Em termos de sociedade temos que nos perguntar o que é que nos convém. É ficarmos todos sem trabalhar ou que toda a gente contribua com a sua parte? Provavelmente deve haver um ponto de equilíbrio entre ambos, onde se trabalhe o suficiente para proporcionar condições de bem estar para todos. Só que isso exige a contribuição... de todos! Excepcionadas as situações que o justificam é interesse da sociedade que todos trabalhemos para o bem comum e para o bem estar individual de cada um.

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  17. NCD,

    Esses problemas devem mais à miséria que ao tempo livre. Senão em Agosto estava tudo tramado...

    Mas penso que onde discordamos principalmente é na visão do trabalho. Tu achas que é sempre uma obrigação. Eu acho que devemos tentar que seja uma opção.

    Antigamente quase todos tinham que esgravetar a terra para ter comida. Hoje um tipo com um tractor pode produzir comida para centenas de pessoas. Aquilo a que chamamos trabalho hoje em dia é, na sua maioria, completamente supérfluo para a sobrevivência. Advogados, professores, músicos, cabeleireiros, motoristas. Tirando os agricultura, pouco mais há que seja mesmo necessário.

    E pela mesma razão que não deixamos morrer de doença alguém só porque não tem dinheiro para medicamentos, ou num fogo por não poder pagar aos bombeiros, ou viver na ignorância por não ter como pagar um professor, também não devemos deixar ninguém morrer à fome, viver ao relento ou sem saneamento básico, roupa, e algum conforto.

    Cada vez mais temos máquinas para fazer o que é preciso e tempo para nos dedicarmos ao que gostamos. É um bom objectivo, que nunca se vai atingir por completo mas que é bem melhor progredir nessa direcção que ficar preso ao dogma de trabalhar para sobreviver.

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  18. Ludwig,
    estás enganado quanto ao que eu penso. eu concordo que o trabalho seja uma opção. O que não percebo é que os impostos sejam uma obrigação.
    A solidariedade com quem precisa eu percebo que seja coerciva. A solidariedade com quem opta não trabalhar é uma violência: uma violência com quem trabalha mais do que recebe e uma violência com quem toma a opção do ócio e não a querem deixar viver essa opção até ao fim.

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