Lá se vão as férias..
Pelo menos consegui meter aqui uns do criacionismo antes de voltar ao aborto. Shyznogud, no Womenage A Trois, apresentou uns cálculos (1) que foram reproduzidos em vários blogs: mulheres responsáveis que usem sempre contraceptivos em todas as relações sexuais terão em média 1,5 gravidezes não desejadas. As contas estão mal feitas. Assumiu uma taxa de falha do contraceptivo de 0.5% por acto sexual, mas a taxa de falha da pílula combinada ronda os 0.3% por ano, e não por acto sexual. Corrigindo, 30 anos de actividade sexual com contracepção cuidadosa dá uma média de 0.09 gravidezes não desejadas, e não 1,5.
Mas isto é um pormenor. Mais importante é a implicação que a mulher não é responsável pela gravidez porque o método de prevenção é falível. Isto não faz sentido. Há sempre possibilidade de acidentes em tudo o que fazemos, e não deixamos de ter responsabilidades por isso. E é revelador que ninguém propõe o mesmo para o homem: como a contracepção é falível, se ela engravida ele não tem que “assumir este azar”. Treta. Se ela tiver o filho a lei obriga-o a ajudar a sustentar a criança, e todos concordamos que é assim que deve ser, azar ou não.
Mas o que me fez interromper estas férias sem aborto é que este exemplo, e outros do mesmo género, são apresentados como apoiando o voto “Sim”. Isso é uma forma errada (ouso dizer falaciosa...) de pensar no problema. Se a proposta a referendo fosse uma pena mínima que punisse sempre o aborto quaisquer que fossem as circunstâncias, então exemplos como este seriam relevantes para opor esta legislação. Eu também votaria contra uma lei que obrigasse a punir todas as mulheres que abortam porque reconheço que há casos em que isso não se justifica.
Mas a proposta é nunca punir quem esteja envolvido em abortos até às 10 semanas. O relevante é a possibilidade de situações merecerem punição. Por exemplo, com técnicas modernas de diagnóstico pré-natal (e.g. análise de fluído celómico) é possível determinar várias características antes das 10 semanas. Penso que a lei deve intervir se uma clinica oferece um pacote de diagnóstico e aborto para os pais terem os filhos do sexo ou cor dos olhos que preferem. E mesmo assumindo que o sexo responsável isenta o praticante de qualquer responsabilidade, é preciso considerar também os que não são responsáveis e abusam desta técnica. Cerca de 7% das mulheres que abortam nos EUA já abortaram quatro ou mais vezes antes. Parece mais irresponsabilidade que azar.
Exemplos em que a punição não se justifica são irrelevantes pois a lei já os contempla, não impondo uma pena mínima para este crime. A questão neste referendo é nunca penalizar o aborto, e para isso o que temos que considerar é se há alguma situação em que deva ser penalizado.
1- Shyznogud, 30-11-06,Um exercício fútil e idiota mas às vezes dá vontade de o ser...
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