quinta-feira, maio 26, 2011

Competitividade.

Este é outro termo na moda, ocorrendo 9 vezes no memorando, 25 no programa eleitoral do PS (1) e mais de 100 no do PSD (2). O que não admira; os programas deste partidos são, fundamentalmente, o memorando da troika resumido no triplo das páginas. E, como ser competitivo faz ganhar e ganhar é bom, muita gente aplaude a competitividade. Infelizmente, é mais um termo ao serviço do embarretamento do eleitorado.

Na economia, a competitividade até é um conceito bastante abrangente. No entanto, no contexto das políticas de direita destas eleições, a competitividade nacional parece reduzir-se a um só factor: salários baixos. Por exemplo, o programa eleitoral do PSD fala em “desvalorização fiscal”, que consiste em baixar os impostos das empresas e compensar com o aumento do IVA. Ou seja, reduzir os ordenados, porque as empresas pagam menos e os trabalhadores descontam mais. Isto aumenta a competitividade das empresas em algumas condições mas, infelizmente, não nas condições que nos poderiam ajudar.

Baixar os salários permite à empresa baixar os preços, assumindo que os trabalhadores não se vão embora. Se o mercado for dominado pela procura então baixar os preços permite tirar clientes à concorrência. Mais competitividade. É o que faz a China, onde os trabalhadores nem sindicatos podem ter, e que produz tanta tralha quanto o resto do mundo queira comprar, empurrando qualquer outro produtor de coisas rascas para fora do mercado do muito e barato.

Mas noutras condições o resultado é diferente. Por exemplo, com bens de maior valor. Estes tendem a ser limitados pela oferta, porque exigem mão-de-obra com qualificações especiais enquanto a procura raramente é problema. Além disso, os trabalhadores qualificados têm mais mobilidade. Se lhes cortam regalias e ordenados num sítio vão trabalhar para outro lugar. Neste contexto, a “desvalorização fiscal” é um tiro no pé. No mercado de bens com maior valor acrescentado, a competitividade consegue-se atraindo a mão-de-obra mais qualificada e não cortando nos ordenados para baixar os preços.

Portugal já há anos que sofre com este problema, tendo uma grande taxa de emigração de pessoas com formação superior. Que já não não são os emigrantes de há poucas décadas, que partiam para mandar dinheiro para a família e juntar algum para voltar. Os emigrantes qualificados dos últimos anos vão para viver onde o seu trabalho seja mais apreciado e melhor recompensado. Este é um dos grandes problemas na nossa competitividade, e este problema só se irá agravar se tornarem o trabalho em Portugal ainda menos atractivo.

O plano das troikas é de competir com os chineses, o que me parece pouco viável. Por muito que espremam os trabalhadores portugueses, não iremos vingar no mercado saturado das luzes de Natal e dos sucedâneos de Tupperware. O que vamos ganhar com estas medidas de “competitividade”, além de menos dinheiro pelo nosso trabalho, será um país cada vez mais sangrado de talento e qualificações. Que não será mais competitivo, obviamente, mas talvez assim continue receptivo a esta liderança que tanto tem lucrado enquanto nos afunda.

1- Programa-Eleitoral-PS-2011-2015.pdf
2- Cujo PDF tirei daqui porque a versão que está no site do PSD é uma treta para ler.

9 comentários:

  1. A solução para aumentar a competitividade passa por eliminar a subsidiodependência estatal das empresas portuguesas. A desmama como solução. Pode até ser que as empreass portuguesas, passado o primeiro choque, cresçam, se tornem adultas, possam ser levadas a sério. As que forem abaixo se calhar também não são assim muito vitais para a economia. Mas esta ideia baixar os encargos às empresas e atirá-los para cima do consumidor mostra bem que nada vai mudar. Viva a emigração.

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  2. Ludwig:

    Como é que propoes que diminuir o IRC e subir o IVA seja exemplo de descer salários?

    Achas mesmo que a China so produz serpentinas e Fátimas que brilham no escuro? Acho que estas a ver mal a coisa... Eles só precisam de criar marcas. DE resto o know-how foi-lhes dado de mão beijada.

    De resto também sou contra a descida do IRC para tirar no IVA. A não ser que desçam apenas nas PME e novas empresas e ponham no IVA de produtos de luxo.

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  3. PS: Se achares que as minhas ideias politicas são uma grande salada tens razão. Passam por vários sectores classicamente opostos. Os de esquerda dizem que sou de direita e os de direita dizem que sou de esquerda.

    E tambem ja te disse que me oponho a descer salários. Isso só deve acontecer se não houver maneira de os pagar, por isso não é essa a minha questão. Não estou mesmo a perceber o que estas a propor concretamente.

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  4. João,

    É a tal “fiscal devaluation”. Imagina que uma empresa te paga 100 a ti e paga 20 de impostos, por te ter como trabalhador (TSU, não IRC, no nosso caso). Agora imagina que te aumentamos a carga fiscal 10, em IVA, e reduzimos a contribuição da empresa de 20 para 10. Tu agora tens menos 10 de rendimento disponível e a empresa gasta menos 10 contigo. Exactamente o que aconteceria se te tivesse reduzido o ordenado. Lê o programa do PSD e verás que é esse o propósito de baixar a TSU e compensar com o IVA.

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  5. João,
    acho que o IRC não tem nada a ver com isto. O IRC só existe se a empresa tiver lucros. O que está em causa é o custo do trabalho: salário bruto (que engloba aquilo que o trabalhador leva para casa + 11% para SS + retenção na fonte para IRS) + 23,75% para SS (pago pela empresa) + 1% para seguro. Basicamente, de todo o custo que um trabalhador tem para uma empresa, este leva apenas algo acima de 50% para casa. O que o PSD propõe é que se desçam as contribuições das empresas para a SS, compensando com o IVA.

    Isto levanta vários problemas a meu ver: 1) na realidade estamos a 'baixar' os salários já que o custo de vida (preços dos bens) aumentam por via do IVA, penalizando sempre os que não podem deixar de comprar o que precisam para viver. 2) Subfinanciamento da SS, pois as contribuições das empresas iam directamente para esta e o IVA não vai, pois não é um imposto consignado, com um fim próprio. Esta última é até mais grave, pois certamente daqui a uns tempos vão vender-nos a ideia que, não sendo sustentável, o melhor é privatizar a SS. Vindo do PSD não me admira nada.

    Por outro lado, o custo do trabalho é provavelmente muito alto para a economia que temos, infelizmente. Eu apostaria em descer o IRC em determinadas condições, mas isto também não resolve o problema das empresas que estão à rasca neste momento, por isso provavelmente terá de haver mesmo uma descida dos custos dos trabalhadores resultando em menos contribuições para a SS. Assim sendo, e porque não concordo com o aumento do IVA de forma cega, só vejo uma solução: aumentar o IRS, nomeadamente nos escalões médios e cimeiros e transferir estes valores para a SS.

    Já agora, os escalões do IRS são também anedóticos. Parecem feitos à medida de quem tem poder para influenciar a sua determinação, mas isso é outra estória e não cabe num comentário.

    Em relação ao teu problema da esquerda e da direita, acontece-me exactamente o mesmo: os meus amigos de esquerda (a maior parte deles) diz que tenho cenas de um perfeito liberal fascista, os de direita (muito menos infelizmente pois gostava de ver mais contraditório) dizem que sou pior que os comunas.

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  6. numa economia subsidio dependente do estado

    tirar do estado e funcionalismos associados para tapar buracos vários

    derivados de clientelas políticas que eram reduzidas em 74

    mas que por via da taxa de reprodução política

    se tornaram bastos cardumes

    competitividade?

    é mais da esfera da sobriedade

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  7. Ludwig: Já percebi. Estou de acordo.


    Xovan: Sim, IRC é outra coisa. My bad. Estou de acordo com o que dizes em linhas gerais.

    Quanto aos rotulos, eu tenho tido mais sorte nas gentilezas, mas acho que é por evitar até hoje esse tipo de discussão - que já sei vai estar cheia de arbitrariedades, alegações de factos dificeis de comprovar e outros mesmo impossíveis, interpretações radicais, raciocinios altamente especulativos como sendo de lógica linear, etc...

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  8. não vou a Faro aos comícios que já sei vai estar cheia de arbitrariedades, alegações de factos dificeis de comprovar e outros mesmo impossíveis, interpretações radicais, raciocinios altamente especulativos

    competitividade partidária na realidade há pouca

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  9. competitividade se um trabalha 6 horas num dia e não faz nada no resto do mês contando com 80 horas de trabalho mensal

    e outro descansa a pernola e nem 6 horas faz mas finge que trabalha 120 horas mensais

    qual é o mais competitivo?

    Tautologies are just true *regardless* of anyone.

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