Equívocos, parte 11. A confusão da evolução.
O Alfredo Dinis considera que a incompatibilidade entre criação e evolução é um equívoco do ateísmo (1). No entanto, o equívoco é confundir a evolução com a teoria que a explica. O Alfredo começa por mencionar que a transferência genética na natureza não é unicamente vertical, de pais para filhos como Darwin propôs, mas também horizontal. Na verdade, de retrovírus e transposões à simbiose entre Bacteria e Archaea, há muitas complicações que Darwin desconhecia. Mas daqui afirma que vários autores ateus consideram que «Criação e evolução excluem-se reciprocamente» e que «O que podemos responder a esta tese é que a evolução se dá por um processo de interacção entre o acaso e a necessidade imposta pelas leis naturais». Isso não é uma resposta à tese. Isso é a tese.
A evolução é a variação que, ao longo das gerações, observamos na distribuição de características herdadas em populações. A hipótese de um criador omnipotente, que o Alfredo defende, é compatível com estes dados porque deuses omnipotentes dão para tudo e um par de botas. Sendo omnipotentes, tanto podem criar o mundo em seis dias como ir fazendo tudo em treze mil milhões de anos. Quaisquer que sejam os dados, a hipótese do Alfredo é compatível.
A incompatibilidade que existe é entre este relato do Alfredo e a teoria da evolução. Não os dados mas a explicação do processo. Estes relatos são incompatíveis entre si porque contam a história de forma contraditória. A biologia assume que não há inteligência nem objectivo na evolução porque só assim se pode deduzir a teoria da evolução que temos. Caso contrário, se assumirmos haver um plano e um deus omnipotente, nada se pode inferir porque um deus omnipotente pode fazer qualquer coisa.
O Alfredo assume que o ateu vê uma incompatibilidade entre os dados e a sua hipótese apenas por exigir que a criação divina seja um processo «unidireccional e contínuo, sem desvios nem recuos nem becos sem saída, e claramente racional e identificável pela ciência.» Refuta esta ideia contando como pode viajar, intencionalmente, de Braga a Lisboa, mas parando em Santarém para visitar um amigo e voltando a Fátima por se ter esquecido de uma coisa. Diz assim completar um percurso intencional guiado por «uma lógica não linear». Mas o problema não é esse.
Vamos imaginar que só sabemos que o Alfredo saiu de Braga, parou em Santarém, voltou a Fátima e acabou em Lisboa. Uma explicação possível é que o Alfredo queria ir a Lisboa mas lembrou-se de algo que tinha de fazer em Fátima depois de ter parado em Santarém. Outra hipótese é que estava apenas a passear, distraído e sem objectivo, e o percurso por Santarém, Fátima e Lisboa podia igualmente ter sido por Coimbra e Viseu. Apesar de ambas as hipóteses serem compatíveis com o percurso, são incompatíveis entre si. É contraditório defender que o Alfredo planeava ir a Lisboa e, ao mesmo tempo, que foi parar a Lisboa sem intenção prévia.
A evolução, o processo que observamos, é análoga ao percurso neste exemplo. São os dados. A hipótese do Alfredo é que um deus percorreu esse caminho de propósito. Pode ter tido mais ou menos aleatoriedade, mais ou menos intenção, mais ou menos revezes e becos sem saída, mas a hipótese do Alfredo é que quando a evolução começou esse deus já tinha em mente onde queria chegar. A teoria da evolução diz o contrário. Diz que não havia plano nem intenção, que a vida foi evoluindo ao sabor de cada momento, de cada mutação, de cada morte e cada nascimento.
A teoria da evolução dá uma margem apertada para o que, segundo ela, pode ter acontecido. E, até agora, tem acertado de forma notável. A hipótese do Alfredo é um fato de treino XXL, onde cabe qualquer coisa. Por isso, mesmo sendo ambas compatíveis com os dados que temos, justifica-se ter confiança na teoria da evolução mas não na hipótese do Alfredo porque esta seria compatível com quaisquer dados que surgissem. Mais importante ainda, estas explicações são mutuamente exclusivas, porque ou evoluímos de propósito ou não evoluímos de propósito. As duas coisas é que não pode ser.
No entanto, na boa tradição teológica, o Alfredo tenta escapar deste problema tornando a sua hipótese ainda mais vaga. O exemplo da viagem sugere um plano e propósito, mas o Alfredo explica a seguir como «compatibilizar criação e evolução por selecção natural» imaginando «uma infinidade de seres vivos [...] em milhares de milhões de planetas em todo o universo, e que em cada um desses planetas o processo evolutivo tenha conduzido a formas de vida inteiramente diversas». Ou seja, evolução sem plano nem propósito em cada planeta. Só que, diz o Alfredo, «Deus seria ainda a condição de possibilidade e de inteligibilidade de todos os processos produtivos que se actualizariam no espaço e no tempo.»
Faz pouco sentido. A teoria da evolução descreve um processo que é possível mesmo sem deuses. Assim, para ser condição de possibilidade, o deus do Alfredo nem sequer precisa existir. Mesmo com um deus meramente fictício, a evolução é sempre possível. Quanto à inteligibilidade, essa vem das explicações. E é das explicações que a biologia nos dá, porque estas da teologia têm muito pouco de inteligível.
1- Alfredo Dinis, Décimo primeiro equívoco: a incompatibilidade entre criação e evolução
Ludwig,
ResponderEliminarA hipótese de um criador omnipotente, que o Alfredo defende, é compatível com estes dados porque deuses omnipotentes dão para tudo e um par de botas.
Nem por isso, a incompatibilidade está no conceito que tens de omnipotência. Será o que vemos em Richard Swinburne, em Walter Kasper ou de onde tiras o conceito? Wikipedia?
Estes relatos são incompatíveis entre si porque contam a história de forma contraditória.
Qual contradição? O que dizes a seguir? ... Isto é, que ...
A biologia assume que não há inteligência nem objectivo na evolução porque só assim se pode deduzir a teoria da evolução que temos.
Isto em nada contradiz que aquilo que a biologia estuda seja fruto da Obra de um Criador, contudo, a biologia necessita de pressupôr a inteligibilidade daquilo que estuda para o estudar sequer. Ora, a questão coloca-se, sim, nestes termos e não nos que estás a colocar, isto é, porque será inteligível sequer o que a biologia estuda?
Apesar de ambas as hipóteses serem compatíveis com o percurso, são incompatíveis entre si. É contraditório defender que o Alfredo planeava ir a Lisboa e, ao mesmo tempo, que foi parar a Lisboa sem intenção prévia.
Lamento, mas o contraditório foi teres excluído o testemunho do Alfredo sobre o seu trajecto entre Braga e Lisboa. O testemunho é um dado que excluíste a priori.
a hipótese do Alfredo é que quando a evolução começou esse deus já tinha em mente onde queria chegar. A teoria da evolução diz o contrário. Diz que não havia plano nem intenção, que a vida foi evoluindo ao sabor de cada momento, de cada mutação, de cada morte e cada nascimento.
Curioso que recusas a intencionalidade na evolução, mas não especificas que intencionalidade é essa que recusas. Por outro lado, gostava de saber "como" é que a teoria da evolução "diz" que não havia plano, nem intenção ... (segredou-te ao ouvido?)
Mais importante ainda, estas explicações são mutuamente exclusivas, porque ou evoluímos de propósito ou não evoluímos de propósito. As duas coisas é que não pode ser.
Continuamente misturas as questões todas de modo a baralhar o leitor. As explicações só se excluiriam mutuamente se respondessem a questões da mesma natureza, o que não é o caso. O Alfredo não deduz Deus da biologia (como fez Antony Flew), nem a biologia a partir de Deus (como fazem os criacionistas). Por um lado, continuo a não perceber qual o "propósito" que negas. Por outro lado, a questão que coloco é, porque evolui sequer o mundo?
Por fim, existem duas razões claras para a incompatibilidade entre criação e evolução, nas quais és omisso, mas uma delas pressupões:
1) pressuposto filosófico do naturalismo científico;
2) literalismo bíblico.
Suponho que seja a primeira. Porém, para o leitor deste blog e comentários convinha saber que John Haught no seu livro "Cristianismo e Evolucionismo" (Gradiva) é claro sobre essa matéria, e no seu "Is nature enough?" (Cambridge University Press) mostra a insustentabilidade do naturalismo científico. Caríssimo, foi louvável a tentativa de criticar o post do Alfredo Dinis, mas - na minha opinião - fizeste-o de forma pouco convincente. Melhores tempos virão ...
Abraço
«Isto em nada contradiz que aquilo que a biologia estuda seja fruto da Obra de um Criador, contudo, a biologia necessita de pressupôr a inteligibilidade daquilo que estuda para o estudar sequer. Ora, a questão coloca-se, sim, nestes termos e não nos que estás a colocar, isto é, porque será inteligível sequer o que a biologia estuda?»
ResponderEliminarIsto é mudança de assunto deliberadamente colocada para não confrontar-se com os problemas colocados pelo post, Miguel. Não enganas ninguém.
No entanto, por seres um tipo simpático e tal, respondo-te a este teu raciocínio torpe. Dizes tu, que devemos a própria inteligibilidade a deus. Esta questiúncula encerra várias problemáticas lógicas. Primeiro, porque parece pressupor que não é possível inteligibilidade sem deus. É uma tese sem quaisquer evidências. Basta ao Miguel pressupor uma "Inteligência Superior Que Nos Fez A Todos" e depois perguntar "mas donde pensais que veio a inteligência que nos permite, sequer!, perguntar isto mesmo?". Totalmente circular.
Depois, como é óbvio, basta-me apresentar uma tese alternativa para negar absolutamente a tese de que "Sem Deus Não há inteligibilidade possível". Pois basta a possibilidade de outra maneira de criar inteligibilidade para pôr em terra essa sentença circular. Ela pode ser lida de várias maneiras. A primeira, lida pelos biólogos, é que este tipo de capacidades surgem naturalmente através do processo da evolução. Voar, Correr, Comer, Metabolismos, Respirar, Pensar. Tudo isto é explicável em termos naturalistas.
A segunda é em termos lógicos. Se colocarmos duas hipóteses, uma na qual qualquer coisa é inteligível, e na outra na qual essa mesma coisa é ininteligível, é perceptível imediatamente uma série de coisas. Primeiro que só na segunda hipótese é que se pode discutir o "porque é que esta coisa é inteligível", apesar de poder ser totalmente fruto do acaso, segundo, que basta *algo* ser inteligível, que mesmo que a maior parte das coisas serem ininteligíveis, que tudo o que é discutido no universo são as partes inteligíveis, por definição. Não segue que o universo seja inteligível na sua totalidade, pelo contrário segue-se apenas que os nossos "olhos mentais" apenas conseguem ver e analisar aquilo que é inteligível nesse universo, passando-lhe totalmente ao lado aquilo que "não é ininteligível".
O problema da epistemologia não se resolve dizendo como todos os criacionistas têm dito desde que conseguiram abrir a boca, "Goddidit".
Depois acaba dizendo que o Naturalismo é um disparate. Eu concordo. Porque o "Naturalismo" pressupõe que existe algo mais do que o "Natural". Eu não acho que exista algo "Natural" e depois algo "Sobrenatural". Acho que existe sim, o Universo. O nosso mundo. Tu é que indicas que existem duas realidades paralelas, sem quaisquer evidências deste facto, sem um pingo de vergonha, e depois vens para aqui com acusações de que não percebemos nada de epistemologia. Haja decoro!
Caro Ludwig,
ResponderEliminarComo deveria ser o processo evolutivo que conduziu à Humanidade para que o considerasses compatível com a existência de um Deus criador?
Saudações,
Alfredo Dinis
Por outro lado, a questão que coloco é, porque evolui sequer o mundo?
ResponderEliminarPressupõe-se que com isto signifique ou o mundo biológico, ou o próprio universo material.
Assi sendo, porque é que a matéria caminha na direcção da dissipação e da inexistência como tal
e a vida aparentemente desenvolve e complexifica estruturas (no longo prazo), com reduções e simplificações pontuais e acumulação de estruturas bioquímicas noutras
pois e porque um criador formaria dois processos tão antagónicos
sincheramente
Na verdade, de retrovírus e transposões isto já é bastante perturbador em termos de ????
agora inferir simbiose entre Bacteria e Archaea???
são entidades biológicas distintas tanto em termos da bioquímica parede celular como da estrutura ribossómica
simbiose (termo já de si bastante controverso, o Fernando Catarino antigo mestre do Jardim Botânico e o Francisco Carrapiço adepto Marguliano podiam dissertar sobre isto do proto-parasitismo em entidades híbridas fungi-algais para a dependência completa)
simbiose das Arqueobactérias como?
o termo é mal escolhido
hoje é só Sá Carneiro e tapar buracos do orçamento
ResponderEliminarem princípio isso será uma prova da existência do mal?
e o mal existe sem déficit de bem?
Caro Barba Rija,
ResponderEliminarSe quiseres fechar-te sobre o absolutismo da omnipotência da tua própria opinião sobre o assunto é uma opção tua, mas parece-me que ganharias mais, assim como a própria discussão, se tivesses um pensamento mais aberto ao pensamento dos outros.
Os problemas colocados pelo post não são novos e foram tratados já em diversas obras de estudo sobre ciência e religião, nomeadamente, pelo John Haught para dar um exemplo que citei no meu comentário. Ao recolocar as questões não se pretende enganar, mas animar um debate mais profundo do que a superficialidade daquele que o Ludwig aborda no post.
Afirmas que não tenho evidências para entender a inteligibilidade do mundo como fruto da Obra de um Criador e depois afirmas que basta pensar numa "Inteligência Superior" e questionar de onde veio essa inteligência, para entrar num ciclo ad infinitum.
Bom, eu penso que é bastante lógico pensar que se um Deus criou o mundo, esse deverá ser necessariamente inteligível, conhecível, mesmo tendo em conta que Ele é distinto dele e não é um ser entre outros seres, ou causa entre outras causas. Parece-me mais problemático conceber um universo com inteligibilidade sem Deus. Nesse caso, de onde vem a inteligibilidade pressuposta em toda a ciência?
Não chega o facto de tudo ser explicado de forma naturalista para justificar a inteligibilidade do mundo por si mesma, mas parece mais um aforismo filosófico.
Não percebi nada do teu segundo exemplo, pois, perante ele, as minhas questões são:
1) o que é ininteligível no universo?
2) como justificas que haja coisas inteligíveis e outras não?
3) porque existem coisas inteligíveis sequer?
O problema da epistemologia não se resolve dizendo como todos os criacionistas têm dito desde que conseguiram abrir a boca, "Goddidit".
Tens razão e sabes que não vou por aí, logo aqui estamos de acordo, embora pareça que me atribuis essa opinião e, se assim for, gostaria de perceber porquê.
Por fim, o que afirmei é que o naturalismo "científico" não tem sustentabilidade porque se auto-contradiz, mas nesse aspecto aconselho-te a adquirir o livro do John Haught. Por outro lado, porque razão o sobrenatural não pode fazer parte do universo? A única explicação é se reduzires o universo ao que é material, o que se denomina por reducionismo, mas não é necessariamente assim, pois o teu pressuposto filosófico é uma crença que deverias justificar.
Para mim (que fique claro), a realidade é uma só, com vários níveis de explicação. O problema epistemológico no teu pensamento são os dualismos, mas corrige-me e explica-me se estiver errado.
Alfredo (e Miguel Panão),
ResponderEliminar«Como deveria ser o processo evolutivo que conduziu à Humanidade para que o considerasses compatível com a existência de um Deus criador?»
A hipótese de existir um deus omnipotente é compatível com qualquer conjunto de dados. Tu próprio escreveste que o teu deus podia ter criado o universo em seis dias. É uma hipótese infalsificável. Logo, é compatível com tudo. Coelhos no pré-cambriano, Terra com dez mil anos, trechos da Torah escritos no ADN de cada organismo. Seja o que fosse que se observasse, a tua hipótese era compatível com isso. Precisamente por isso, é uma hipótese sem qualquer valor explicativo.
A teoria da evolução não é compatível com tudo. Na verdade, é compatível com muito pouco, porque exige condições específicas para se justificar as suas condições. Se assumes que surgem moléculas replicadoras num planeta e que nada está lá a interferir, então podes deduzir a teoria da evolução e instanciá-la em modelos das linhagens que lá surgem. Mas se incluis a premissa de um deus omnipotente não podes deduzir absolutamente nada.
Por isso, como já expliquei várias vezes (mas, aparentemente, não suficientemente bem para vos esclarecer a ambos), a incompatibilidade é entre duas tentativas alternativas de explicar a evolução que observamos.
A teoria da evolução explica-a porque, se assumirmos que não houve inteligência, propósito ou deuses omnipotentes, o que observamos ter ocorrido está dentro do que teria de ocorrer nessas condições. Se as condições forem outras, nomeadamente se existir um ser omnipotente, então não podemos dar esta explicação, porque nesse caso não se pode deduzir isso.
A hipótese da criação não explica nada, porque é infalsificável e não distingue entre o que pode ter acontecido e o que não poderia acontecer, mas é incompatível com a teoria da evolução porque postula um criador omnipotente, o que torna impossível deduzir o que quer que seja acerca de como o processo decorrerá.
Em suma, a tua hipótese é compatível com qualquer conjunto de dados, merecendo por isso muito pouca confiança. A teoria da evolução é muito exigente quanto às condições em que se aplica, sendo por isso relevante a sua concordância com os dados de que dispomos. E são incompatíveis entre si porque a existência de um ser omnipotente com planos para a evolução impede-nos de explicar a origem das espécies com a teoria da evolução que temos.
"Parece-me mais problemático conceber um universo com inteligibilidade sem Deus. Nesse caso, de onde vem a inteligibilidade pressuposta em toda a ciência?"
ResponderEliminarEste pessoal droga-se, mas tem piada.
Miguel Panão,
ResponderEliminarTentei esclarecer na resposta ao Alfredo algumas das tuas confusões acerca da testabilidade da vossa hipótese e daquilo que é incompatível. Este é só para algumas das outras confusões.
«a biologia necessita de pressupôr a inteligibilidade daquilo que estuda para o estudar sequer»
Não. Em primeiro lugar porque a inteligibilidade não está naquilo que se estuda mas, se estiver, estará nas explicações que criamos para o descrever. Uma pedra, uma explosão ou uma estrela não são inteligíveis nem deixam de ser. O que pode ser inteligível é uma explicação como “a explosão resulta de uma reacção em cadeia, pela qual a concentração de espécies reactivas vai crescendo exponencialmente, com cada molécula criando uma nova e libertando energia”, ou ininteligível se for “a explosão surge da transcendência imanente de um Criador que criou e continua a criar no espaço de possibilidades de um universo constantemente em abertura”.
Em segundo lugar, a biologia não tem de pressupor a capacidade de criar explicações inteligíveis, tal como eu, se for pescar, não tenho de pressupor que vou apanhar peixe. Basta estar disposto a tentar. É isso que a ciência faz. Tenta explicar. Ao contrário da fé, não se tem de partir de nenhuma certeza firme de algum sucesso.
E, finalmente, muitos casos há em que não se consegue uma explicação inteligível. Por exemplo, não conseguimos explicar de forma inteligível porque é que aquele átomo de urânio decaiu precisamente naquele instante em vez de um segundo antes ou depois.
«Lamento, mas o contraditório foi teres excluído o testemunho do Alfredo sobre o seu trajecto entre Braga e Lisboa. O testemunho é um dado que excluíste a priori.»
O testemunho é um dado importante na viagem. Porque o temos. Se o Alfredo diz “quero ir para Lisboa”, isso é relevante. E se um deus, há quatro mil milhões de anos atrás, disse “quero criar seres humanos”, isso é um dado relevante. Mas se foi esse o caso então a teoria da evolução é uma explicação errada para o que se seguiu, tal como é errado dizer que o Alfredo foi parar a Lisboa por acaso se temos o seu testemunho da intenção de lá ir.
«Curioso que recusas a intencionalidade na evolução, mas não especificas que intencionalidade é essa que recusas.»
Isso só parece curioso depois de retorcer muito as palavras. A teoria da evolução é uma consequência lógica de um conjunto específico de condições, como replicadores, hereditariedade, competição por recursos limitados e sucesso reprodutivo correlacionado com características herdadas. Se acrescentas às premissas coisas como a engenharia genética, magia, deuses omnipotentes ou o que quer que seja que tenha impacto na dedução, deixas de poder derivar a teoria da evolução.
É como a teoria das probabilidades. Se o dado cai ao acaso podes calcular as probabilidades. Se há alguém que o manipule intencionalmente, deixas de poder dizer seja o que for, independentemente do tipo de intencionalidade que seja.
«As explicações só se excluiriam mutuamente se respondessem a questões da mesma natureza, o que não é o caso.»
É o caso sim. Ou a evolução da vida na Terra decorreu sem plano inteligente ou com plano inteligente. É exactamente da mesma natureza.
Para terminar, assumir que não há deus omnipotente com um plano não é um mero pressuposto naturalistico filosófico. É uma condição necessária para derivar a teoria da evolução. Porque se admites que haja um deus omnipotente com algo planeado não podes dizer nada acerca do que vai acontecer às populações. É o que esse deus quiser, literalmente.
Ludwig,
ResponderEliminarA teoria da evolução explica-a porque, se assumirmos que não houve inteligência, propósito ou deuses omnipotentes, o que observamos ter ocorrido está dentro do que teria de ocorrer nessas condições.
Estás a pressupor que se eu assumir que há um Criador, a teoria da evolução muda. Eu creio que as implicações filosóficas e teológicas dessa teoria, certamente!, mas a teoria não tem de pressupor nada senão a inteligibilidade do mundo.
A hipótese da criação não explica nada, porque é infalsificável e não distingue entre o que pode ter acontecido e o que não poderia acontecer, mas é incompatível com a teoria da evolução porque postula um criador omnipotente, o que torna impossível deduzir o que quer que seja acerca de como o processo decorrerá.
Lamento, mas é falsificável, caso contrário não haveria teologia da criação sequer, pois nem todos pensam o mesmo teologicamente. Contudo, neste caso, é apenas incompatível com a tua visão do mundo, não com a teoria da evolução. Basta referir, de novo, John Haught ou o livro do Alfredo Dinis com o João Paiva.
E são incompatíveis entre si porque a existência de um ser omnipotente com planos para a evolução impede-nos de explicar a origem das espécies com a teoria da evolução que temos.
Não li ainda qualquer evidência que justifique como chegas a esta conclusão sem estares ao mesmo nível dos criacionistas.
Não. Em primeiro lugar porque a inteligibilidade não está naquilo que se estuda mas, se estiver, estará nas explicações que criamos para o descrever.
Então pergunto, como descreves o que quer que seja, sem pressupôr inteligibilidade naquilo que procuras descrever? É um paradoxo, Ludwig.
a biologia não tem de pressupor a capacidade de criar explicações inteligíveis, tal como eu, se for pescar, não tenho de pressupor que vou apanhar peixe.
Sim, mas se vais pescar ... é porque pressupões que existem peixes que poderás apanhar. Ou seja, pressupões essa "inteligibilidade".
Por exemplo, não conseguimos explicar de forma inteligível porque é que aquele átomo de urânio decaiu precisamente naquele instante em vez de um segundo antes ou depois.
E se um dia conseguirmos explicar? (Eu acredito que sim, whatever that means) ... não pressuposeste inteligibilidade nessa procura?
se um deus, há quatro mil milhões de anos atrás, disse “quero criar seres humanos”, isso é um dado relevante. Mas se foi esse o caso então a teoria da evolução é uma explicação errada para o que se seguiu, tal como é errado dizer que o Alfredo foi parar a Lisboa por acaso se temos o seu testemunho da intenção de lá ir.
Acho que tens uma visão muito redutora da acção de Deus, ou daquilo que Deus é em si mesmo, pelo que apenas chegas às conclusões que chegas por via da superficialidade intelectiva destas matérias. Desafio-te, vai mais a fundo ... será assim tão difícil?
Sabes, acho que não destorci qualquer palavra, muito pelo contrário. Quando referes as condições para ocorrer a evolução, que se podem sintetizar em variabilidade, selecção natural e uma grande quantidade de tempo, não vejo porque um Deus não poderia ter intencionado precisamente assim, embora permanece a questão de porquê assim. Quando um dado cai e calculas a probabilidade de sair um resultado, sabes ao menos que sairá um resultado(!), caso contrário não lançarias o dado sequer, ou seja, pressupões "inteligibilidade".
É o caso sim. Ou a evolução da vida na Terra decorreu sem plano inteligente ou com plano inteligente. É exactamente da mesma natureza.
Ok. Colaste-te à linha dos criacionistas, ou do design inteligente. Só aí as questões possuem a mesma natureza. O plano inteligente do cosmos que fala Bento XVI é um plano de amor, ou seja, algo que está a um nível de explicação da realidade una diverso da material, embora com repercussões nela.
assumir que não há deus omnipotente com um plano não é um mero pressuposto naturalistico filosófico. É uma condição necessária para derivar a teoria da evolução.
ResponderEliminarIsto só é verdade numa visão muito limitada da realidade, literalmente ... queres ir por aí? Que pena ...
Miguel Panão,
ResponderEliminar«Estás a pressupor que se eu assumir que há um Criador, a teoria da evolução muda»
Não muda. Deixa de se aplicar.
«Lamento, mas é falsificável, caso contrário não haveria teologia da criação sequer, pois nem todos pensam o mesmo teologicamente.»
Discordam acerca de hipóteses impossíveis de testar. O facto de discordarem não as torna possíveis de testar. Acontece apenas que, por serem impossíveis de testar, não há forma objectiva de decidirem quem tem razão. Acaba tudo nos testemunhos, na fé e na interpretação de tretas vagas.
«Então pergunto, como descreves o que quer que seja, sem pressupôr inteligibilidade naquilo que procuras descrever? É um paradoxo, Ludwig.»
Respondo novamente da mesma forma. Podes tentar fazer algo sem pressupor que o consegues. Pressupor sucesso não é condição necessária para a tentativa. Por isso podes tentar descrever algo sem pressupor que vais encontrar uma descrição inteligível. Além disso, é a descrição que pode ser ou não inteligível. São os modelos conceptuais que podem ser compreendidos, e não as coisas em si, porque a compreensão é um processo mental. Quando queres compreender uma pedra ou uma tempestade não as enfias no cérebro. Crias ideias acerca dessas coisas e compreendes as ideias que criaste. Se pressupões inteligibilidade nas coisas em si não me admira que depois obtenhas descrições como as que às vezes aqui apresentas, pois com tal confusão entre as várias categorias a probabilidade de inteligibilidade é naturalmente baixa.
«Sim, mas se vais pescar ... é porque pressupões que existem peixes que poderás apanhar.»
Não. Posso ir pescar para um sítio onde não sei se há peixes. Posso construir um acelerador de partículas para tentar obter a energia necessária para observar uma partícula hipotética que não sei se existe ou não, apenas para ver o que dá.
Lembra-te de que essa necessidade de assumir o resultado logo à partida é fruto apenas da insegurança da fé. Não é um requisito epistémico.
«Acho que tens uma visão muito redutora da acção de Deus»
Pelo contrário. Reconheço o âmbito infinito da acção do vosso deus hipotético. É uma das razões para rejeitar a hipótese. O que é muito restrito é o âmbito de aplicação da teoria da evolução. Essa explica apenas a variação de populações de replicadores na ausência de qualquer ser omnipotente que tenha planeado o resultado. Se existir tal coisa, então a teoria não se aplica.
São vocês que têm uma visão demasiado frouxa dos requisitos necessários para que se possa deduzir as equações da genética de populações. Se metes lá um deus omnipotente estragas tudo.
Ludwig,
ResponderEliminar«Sendo omnipotentes, tanto podem criar o mundo em seis dias como ir fazendo tudo em treze mil milhões de anos.»
Aliás, Deus não precisa de criar nada, nem de esperar, nem de se submeter a leis, ou determinismos e, numa perspectiva de eternidade, o próprio tempo não faz sentido. Quem compreende os porquês, e os para quês?, sem ser numa perspectiva humana imediata? Inteligibilidade? Pela inteligência alvitramos que a inteligibilidade, à partida, é finita.
Na perspectiva dos horizontes humanos, a inteligência é uma realidade e é inegável que reconhecemos em tudo um papel e uma função numa dada economia. Tudo se mostra pré-ordenado a uma realização imediata que podemos reconhecer. Frequentemente, essa realização imediata fica pelo caminho e há outras "insondáveis", pelo menos por enquanto, que são atingidas.
Ser ateu ou cristão não depende de nenhuma teoria em particular. As teorias, sempre as houve. Porquê? Porque desconhecemos os fenómenos. Uma teoria é a melhor demonstração do desconhecimento. O que conhecemos hoje não nos permite todo o tipo de generalizações. Por outro lado, as teorias são construções que se vão aglomerando umas sobre as outras e adquirem sentido dentro do paradigma em que são engendradas e nada mais do que isso. E mesmo dentro do paradigma, todas juntas não formam um todo. Não atingem a unidade.
A evolução, o que quer que seja, não está certa nem errada. O mesmo não se dirá da(s) teoria(s) da evolução. E, por maioria de razão, das interpretações que são feitas dessas teorias.
Caro Ludwig,
ResponderEliminarCreio que te admiras por que razão nem todas as pessoas interpretam como tu o processo evolutivo que conduziu ao aparecimento da vida, especialmente da vida humana. Como sabes, os dados que são objecto de estudo das várias ciências devem ser interpretados no contexto de modelos, hipóteses, teorias. Mas nem sempre há uma única interpretação possível, nem sempre os dados disponíveis são suficientes para uma interpretação definitiva. Isto sucede em muitos domínios, desde a astrofísica à mecânica quântica. Actualmente há um debate sobre se as constantes físicas têm variado ao longo do espaço e do tempo ou não. Os mesmos dados empíricos são interpretados de formas diversas por cientistas igualmente respeitáveis.
Tu olhas para os dados da moderna biologia e concluis que eles excluem sem margem para qualquer dúvida e definitivamente a hipótese de um Deus criador. Há muito de interpretação na tua posição, mas sei que não o admites. Há ainda alguns outros equívocos nessa posição. Um deles consiste em colocar em concorrência explicativa a hipótese da evolução e a hipótese da criação. Mas a hipótese da evolução é um a hipótese científica, enquanto que a hipótese da criação não o é. Por outro lado, o teu conceito de interferência de Deus no processo evolutivo parece ser o de Deus estar constantemente a guiar e a intervir em todos e cada um dos momentos deste processo, de tal modo que se uma determinada transferência genética fosse dar a um beco sem saída, Deus deveria intervir para impedir essa transferência ou ‘guiá-la’ de tal forma que não fosse dar a um beco sem saída. E esta concepção é por ti estendida até mesmo à vida social. Se alguém pega numa pistola para matar outra pessoa, Deus deveria intervir para evitar esse mal. Aliás, Deus deveria conhecer de antemão todos os pormenores do universo em evolução, antever que algumas pessoas iriam ter comportamentos anti-sociais e, por se omnipotente, impedir o nascimento dessas pessoas. Bem, este deus marioneteiro poderia existir, teoricamente, mas por que razão deveria ser o único possível? Ele não é certamente o Deus cristão, mas tu não admites outro deus que não seja o que está na tua hipótese. Fazes-me lembrar D. Afonso XI de Espanha, chamado o rei sábio, a quem se atribui a seguinte afirmação: “Se Deus antes de criar o mundo me tivesse consultado, teria recebido alguns bons conselhos”. Provavelmente todos nós subscreveríamos esta afirmação. Deus deveria ter criado – de facto, para os crentes, está a criar - universo e a vida da forma que nós achamos que deveria ser. Como pretensão parece-me bem discutível.
(continua)
Ludwig,
ResponderEliminarJá vi que não aceitas o paralelismo que estabeleci entre a interpretação do processo evolutivo e a interpretação de uma viagem de Braga a Lisboa, quanto à questão da intencionalidade. Mas vou repeti-lo, desenvolvendo-o um pouco.
Considera várias hipóteses igualmente observáveis.
1. Saio de carro de Braga pela auto-estrada A! E sem parar chego a Lisboa.
2. Saio de carro de Braga pela auto-estrada A1, faço um desvio para Santarém, regresso à A1, faço inversão de marcha para Coimbra, regresso de novo à A1 e sigo para Lisboa.
3. Saio de carro de Braga pela auto-estrada A1, faço um desvio para Santarém, regresso à A1, faço inversão de marcha para Coimbra, regresso de novo à A1 e regresso a Braga
4. Saio de carro de Braga pela auto-estrada A1, faço um desvio para Santarém, regresso à A1, faço inversão de marcha para Coimbra, regresso de novo à A1, sigo na direcção de Lisboa mas desvio-me para Évora. No dia seguinte sigo para Lisboa.
Com estes dados observáveis, podes fazer as interpretações que quiseres. Em nenhum dos casos tens elementos suficientes para decidires se há aqui alguma intencionalidade. Em algum dos casos seu saí de Braga com a intenção de chegar a Lisboa? Mesmo no primeiro caso, não tens dados suficientes para detectar se houve ou não alguma intencionalidade. Poderás fazer as interpretações que quiseres, como no caso da evolução das espécies, e dos processos aleatórios, que aconteceram ou acontecem de uma forma não determinada, porque poderiam ter acontecido de outra forma, sem que seja possível detectar a ‘interferência’ de alguém, uma espécie de ‘mão invisível’ como se acreditou até agora que existia na economia. Pergunto-me se não estás do lado dos defensores do ‘desígnio inteligente’: deveria haver algum indício objectivo da interferência de Deus: o olho, o flagelo da bactéria, etc. Como já te colocaste objectivamente do lado dos criacionistas ao não aceitar a interpretação sapiencial do Génesis.
E continuo sem perceber por que razão tantos biólogos que sobre evolução sabem pelo menos tanto como tu não concordam com a tua tese de que a evolução é incompatível com a criação. A resposta que oiço por vezes – ‘cada um a acredita no que quiser’ – não me convence.
Um abraço,
Alfredo
Alfredo,
ResponderEliminar«Com estes dados observáveis, podes fazer as interpretações que quiseres.»
É verdade, e nisso estamos de acordo. Concordo que, sejam quais forem os dados, podemos sempre dizer que foi um deus todo poderoso que quis que as coisas assim fossem. A tua hipótese, sendo infalsificável, é compatível com tudo o que se possa observar.
No entanto, apesar de poderes explicar os dados de várias maneiras, é inconsistente defender que todas essas explicações estão igualmente correctas, ao mesmo tempo. Por exemplo, se eu deixo cair um papel podes explicar esse acto como estando deliberadamente a deitá-lo ou chão ou como tendo sido sem querer que o deixei cair. Ambas as hipóteses são consistentes com a observação.
Mas são inconsistentes entre si. É esse o problema.
A evolução ocorre algures na natureza, da maneira que ocorrer, e nós observamos aspectos desse processo. Para explicar o que observamos podemos recorrer à teoria da evolução, que deduz várias relações assumindo que não há lá inteligência ou propósito. Ou podemos dizer que aquilo está tudo a correr de acordo com o plano de um deus omnipotente. Ambas estão de acordo com os dados que temos. Mas estão em desacordo entre si. Não podem estar ambas correctas porque são contraditórias.
«E continuo sem perceber por que razão tantos biólogos que sobre evolução sabem pelo menos tanto como tu não concordam com a tua tese de que a evolução é incompatível com a criação.»
Em primeiro lugar, a evolução é compatível com a criação. Ou seja, o que observamos das alterações nas características de populações é compatível com o plano de um deus omnipotente. A incompatibilidade está entre a teoria da evolução e a hipótese da criação, porque a primeira depende da premissa de não haver deuses omnipotentes com objectivos traçados para se poder deduzir aquelas relações matemáticas e de probabilidades.
E a razão porque tantos biólogos acreditam que algum criacionismo é compatível com a teoria da evolução é porque eram crentes nesse criacionismo já de infância, e só se tornaram biólogos mais tarde, compartimentando as diferentes crenças que tinham de gerir.
Por exemplo, há muitos juízes que acreditam que Jesus nasceu de uma virgem só por estar escrito num livro, mas que nunca aceitariam tal alegação como factual em tribunal só por alguma testemunha o afirmar.
Ludwig,
ResponderEliminarquando se acabarem estes equívocos, pode tentar inspirar-se na entrevista do Pe. João Seabra: http://www.tvi.iol.pt/mediacenter.html?load=3&gal_id=65338
O Joel foi a pé de Lisboa a Sintra, depois de Sintra à Amadora, depois da Amadora a Setúbal, e depois de Setúbal a Almada, depois de Almada a Sintra, e por fim de Sintra a Lisboa.
ResponderEliminarA teoria A1 diz que o Joel tem uma lista com 6 cidades:
1- Lisboa
2- Sintra
3- Amadora
4- Setúbal
5- Almada
6- Oeiras
Então o que acontece é que ele lança um dado, e escolhe o seu destino. Então vai a pé para esse destino.
A teoria B, pelo contrário, diz que ele tinha como plano ir a pé de Lisboa a Sintra, depois de Sintra à Amadora, depois da Amadora a Setúbal, e depois de Setúbal a Almada, depois de Almada a Sintra, e por fim de Sintra a Lisboa. E assim fez.
A teoria A2 diz que o Joel tem no telemóvel um gerador de números aleatórios, que selecciona um número de um a seis, e faz equivaler cada número um destino de acordo com a lista:
1- Lisboa
2- Sintra
3- Amadora
4- Setúbal
5- Almada
6- Oeiras
Ele usa o gerador e parte para esse destino a pé.
Por fim, existe a teoria A0 que diz que, não importa como, o Joel tem acesso a um número aleatório entre 1 e 6. Usando a mencionada lista ele escolhe um destino e vai para lá a pé.
É um facto que as teorias A1, B e A2 são incompatíveis entre si, mesmo que a incompatibilidade entre A1 e A2 seja num detalhe sem grande importância. Mas a questão fundamental é que tanto as teorias A1 como A2 são compatíveis com a teoria A0.
Para ser mais claro sobre a mensagem anterior, aquilo que eu digo é que é possível a um católico ter uma teoria que vai desde B a A1. O Ludwig acreditar em A2, que é incompatível com qualquer teoria católica.
ResponderEliminarMas a teoria da evolução actual limita-se ao A0, pelo que tanto a teoria do Ludwig como algumas das teorias católicas podem ser compatíveis.
Miguel Panão:
ResponderEliminar"Nem por isso, a incompatibilidade está no conceito que tens de omnipotência"
Ja sabemos que voces chamam omniponte a algo que seja bastante poderoso e não mais. E depois? A evolução não tem sinais de intencionalidade.
(cont)
ResponderEliminar"Isto só é verdade numa visão muito limitada da realidade, literalmente ... queres ir por aí? Que pena ..."
Não é limitada da realidade. É limitada PELA realidade. FAntasia não conta mas é o que tu lamentas não ser aceite. Lamentas não poder introdozir milagres à la carte como se isso fosse motivo de orgulho. É triste. E é estupido.
O modelo evolutivo explica de um modo consistente muito mais que a crença religiosa de atribuir a criação a um deus, mesmo admitindo os catolicos a evolução como um facto ( e sobretudo admitinfo a evolução como um facto). Permite compreender muito masi coisas. Permite fazer muito mais progectos de estudo como tem sido visto. Porque permite fazer previsões extremamente especificas. E diz claramente que coisas complexas podem vir de mais simples. Quer o produto final seja sempre mais evoluido.
A teoria diz que a evolução aconteceu de uma maneira. Que tu negas porque queres la injectar o teu deus.
Para la da questão do naturalismo permitir chegar ao modelo evolutivo, muito mais importante é o igualmente relevante argumento no sentido contrário. É o modelo evolutivo ser tão bem sucedido que suporta o naturalismo como abordagem da realidade.
Ao fim e ao cabo os crentes sempre quiseram dizer: "a partir daqui é tudo milagre" e os naturalistas sempre responderam "como é que sabes? Se isso aconteceria do mesmo modo sem milagres como podes dizer que la estão? Não podes!"
É só ver quem está a avançar conhecimento nos ultimos seculos e quem se tem tido de retractar. Sempre apos discuções como esta. É defacto triste.
Ludwig,
ResponderEliminarcompreendo as tuas respostas porque reduzes a realidade à tua opinião sobre ela, mas enfim ... continuo a não perceber porque se deixa de aplicar a teoria da evolução por haver um Criador, quais as evidências disso mesmo e a que tipo de Criador te referes...
Uma hipótese teológica é possível de ser testada. Se não o sabes, é natural porque não és teólogo (nem eu), mas estou certo que a impossibilidade atribuis ao facto de não ser aplicado um teste científico-natural, o que é coerente com o teu naturalismo científico. O problema é como justificas que apenas esse permite aferir o que é real.
Pressupor sucesso não é condição necessária para a tentativa.
Mas pressupor sucesso não é pressupor inteligibilidade, mas sim condição necessária para pressupor a possibilidade de tentativa. Para tu pressupores algo é condição necessária que seja possível pressupô-lo, tomando a inteligibilidade como essa garantia. Para conceberes modelos conceptuais é condição necessária que seja intelectivo pressupô-los. Para criares ideias acerca do que quer que seja, é condição necessária a acessibilidade cognitiva que as permite formular. A confusão não me parece estar na forma como coloco as coisas, mas na limitação que te impões a ti mesmo de sistematicamente fechares o teu pensamento na omnipotência da interpretação que esse encerra. Ou seja, continua a não proporcionar argumento convincentes sobre a necessidade da ciência pressupor inteligibilidade para se desenvolver sequer.
Não. Posso ir pescar para um sítio onde não sei se há peixes.
Então, porque vais pescar sequer? Não será mais correcto dizeres, vou lançar para um lago um linha de nylon com um anzol na ponta em vez de dizeres que vais pescar? Mas ainda aí, o que levaria a fazê-lo?
Posso construir um acelerador de partículas para tentar obter a energia necessária para observar uma partícula hipotética que não sei se existe ou não, apenas para ver o que dá.
Contudo, é condição necessária pressupôr a inteligibilidade subjacente à construção de um acelerador de partículas para se observar partículas hipotéticas, caso contrário, ninguém financiaria esse projecto.
Lembra-te de que essa necessidade de assumir o resultado logo à partida é fruto apenas da insegurança da fé. Não é um requisito epistémico.
Não estou a assumir nenhum resultado ao reconhecer a inteligibilidade do mundo como pressuposto de toda a ciência, pois se é pressuposto, não é resultado. Ou seja, eu não sei qual a forma dessa inteligibilidade, mas apenas que o mundo pode ser conhecido como tal. É essa a falha de interpretação em que cais sistematicamente.
Lamento, mas quanto à visão que tens do Deus que recusas, faço minhas as palavras do Alfredo. Continuas a falar de um deus designer pouco convincente para qualquer Cristão.
João Vasco,
ResponderEliminarHá um problema na compatibilidade. As hipóteses:
A - um número aleatório obtido por um meio que não sabemos especificar
B – um número aleatório obtido pelo lançamento de um dado.
Podem ser compatíveis no sentido de se aplicar ambas ao caso do lançamento do dado, mas não no sentido de poderes defender ambas como correctas ao mesmo tempo. E é este último aspecto que estamos a discutir quando consideramos se é consistente defender, ao mesmo tempo, a teoria da evolução e a hipótese de uma criação intencional e planeada.
Além disso, se bem que a teoria da evolução não especifique qual a origem da aleatoriedade, é bastante específica quanto às condições em que se aplica. E estas excluem a execução de um plano por parte de um ser omnipotente. Se quiseres testar esta alegação, pensa como podes derivar as equações da genética populacional numa população sujeita ao plano de um deus omnipotente. Se sabes qual o plano em detalhe, não precisas de equações. É aquilo e pronto. E se não sabes não vais poder concluir nada.
«Mas a teoria da evolução actual limita-se ao A0, pelo que tanto a teoria do Ludwig como algumas das teorias católicas podem ser compatíveis.»
Não encontrei nenhuma até agora. O Alfredo Dinis sugeriu duas hipóteses (não é muito correcto chamar teoria ao que os católicos propõem, porque uma teoria é algo muito mais abrangente, rigoroso e fundamental do que uns bitates ad hoc :) Uma é que o seu deus omnipotente terá planeado a evolução como o Alfredo planeia uma viagem de Braga a Lisboa. Essa premissa nega todo o fundamento da teoria da evolução.
A outra hipótese é que o seu deus omnipotente não faz nada em particular, mas é a condição de possibilidade para a evolução. Esta também é contraditória com a teoria da evolução porque esta teoria descreve a evolução como um processo inevitável na ausência de deuses, pelo que não é preciso haver lá deuses para a tornar possível.
Pode ser que o Alfredo defenda uma posição deísta, de um deus indetectável que dá o chuto inicial e se vai embora. Nesse caso está bem porque esse deus não interfere na origem das espécies. Mas nesse caso é errado dizer que somos a sua criação. Somos apenas um dos muitos efeitos do pontapé de partida.
Caro Ludwig,
ResponderEliminarVejo que não consegues explicar-me o que contaria para ti como intervenção de Deus no processo evolutivo.
Vejo também que não crês que haja lugar para a interpretação na análise do processo evolutivo. Só os crentes interpretam.
Afirmas – com que fundamento? - que os biólogos crentes que não encontram incompatibilidade entre evolução e criação já eram crentes antes de serem biólogos. É a velha tese – completamente falsificada pela realidade dos factos - de que as pessoas que são educadas numa religião nunca se conseguem libertar dela nem das suas crenças. Francis Collins foi ateu até aos 27 anos, e tornou-se cristão quando já tinha formação superior em química, biologia e medicina.
Saudações,
Alfredo
Miguel Panão,
ResponderEliminar«continuo a não perceber porque se deixa de aplicar a teoria da evolução por haver um Criador»
Não é difícil, se bem que já comece a ficar um pouco cansado de explicar isto.
Um berlinde parte de um lado de uma mesa, a uma velocidade de 20cm por segundo, paralelo aos lados mais compridos da mesa e na direcção do outro lado, a 2m de distância. Calcula quanto tempo demora a chegar ao outro lado assumindo que:
1- Não há atrito
2- Não há atrito, mas eu posso mexer o berlinde como quiser e tenho já um plano traçado para onde quero que o berlinde vá, onde ele deve parar e quanto tempo quero que ele demore a chegar ao outro lado.
Penso que se tentares fazer este exercício hás de reparar que a equação t=d/v é bastante útil no primeiro caso mas não serve para nada no segundo.
Dizer, à luz das provas disponíveis, que o mundo natural é como é porque um deus o quis, é como dizer que uma vítima da roleta russa quis dar um tiro na cabeça. Ela de facto quis arriscar jogar o jogo, mas não se pode dizer que quisesse morrer. Ela não decidiu o seu destino. Não faz muito sentido dizê-lo e creio que essa é a incompatibilidade insanável que o Ludwig aponta: é errado dizer que jogar roleta russa é o mesmo que disparar uma arma na cabeça sabendo que está uma bala da câmara.
ResponderEliminarE por muito que essa pessoa quisesse de facto dar um tiro na cabeça, e se predispusesse a jogar roleta russa por causa disso, ainda assim não é legítimo dizer que ela morreu porque quis quando os únicos dados de que dispomos são o de que uma pessoa morreu a jogar roleta russa.
Ou seja, um detective que entre em cena dizendo que se tratou de um suicídio não está a ser honesto e a sua teoria não colhe, mesmo que, logicamente, as diferentes teorias não sejam incompatível em rigor. Mas esse rigor de compatiblidade é enganador e permite tudo. É uma espécie de brincadeira do tipo "o ar é de todos"...
A compatibilidade que interessa é a compatibilidade com os dados observáveis. E o propósito da Evolução não é de todo evidente... Dizer-se que este propósito é evidente com base na não-incompatiblidade entre a Teoria da Evolução e uma espécie de Criacionismo idêntico à teoria excepto em não-observáveis é, de facto, uma forma de incompatibilidade entre evidência e não-evidência. Dizer-se que se crê em algo com base em especulações arbitrárias é incompatível com querer-se validar uma tese por meio de dados inequívocos.
Alfredo Dinis,
ResponderEliminar«Vejo que não consegues explicar-me o que contaria para ti como intervenção de Deus no processo evolutivo.»
Isso é simples. É tudo aquilo que faça com que o processo evolutivo decorra de forma diferente do que decorreria se esse deus não existisse.
Mas nota que o problema aqui não é o teu deus ter intervido ou não. É a tua hipótese de que há um deus que pode intervir. Basta isso para inviabilizar a teoria da evolução.
Vê o exemplo que dei ao Miguel Panão. Se assumes que o berlinde se desloca sem qualquer intervenção externa, então tens justificação para usar as teorias da física para prever a sua trajectória. Mas se dizes que alguém pode mexer, intencionalmente, no berlinde, deslocando-o como quer, deixas de poder aplicar essas equações. Mesmo que não saibas se a pessoa vai mexer no berlinde ou não, terás de dizer “é este o cálculo da trajectória assumindo que ninguém mexe no berlinde”.
«É a velha tese – completamente falsificada pela realidade dos factos - de que as pessoas que são educadas numa religião nunca se conseguem libertar dela»
Não. A tua questão foi acerca de «tantos biólogos que sobre evolução sabem pelo menos tanto como tu não concordam com a tua tese». Querias que explicasse porque há tantos, e essa é a minha proposta. Porque, em muitos casos, as pessoas são crentes desde criança.
Admito que haja outras explicações, que variem de caso para caso. Mas esses já não devem ser assim tantos. Explicar, caso a caso, porque é que cada um deles acha justificado aplicar as equações da genética de populações mesmo assumindo haver um deus omnipotente com um plano para a evolução é algo que, confesso, está para além das minhas capacidades.
porque há tantos, e essa é a minha proposta. Porque, em muitos casos, as pessoas são crentes desde criança.
ResponderEliminarReducionista
porque há muitas visões do mundo biológico
e muitas alternativas possíveis
idem para a física e astrofísica
e....
Ludwig:
ResponderEliminarA incompatibilidade que eu disse não existir não é entre o "não sabemos como" vs "sabemos que usa um dado" mas sim entre "não importa como tem acesso a um número entre 1 e 6 [continuação do mecanismo] vs "usando um dado tem acesso a um número entre 1 e 6 [continuação do mecanismo]".
Aliás, podes confirmar:
«Por fim, existe a teoria A0 que diz que, não importa como, o Joel tem acesso a um número aleatório entre 1 e 6. »
Este pequeno engano fere de morte o teu argumento.
Caro Ludwig,
ResponderEliminarO exemplo do berlinde confirma a ideia que eu tinha da tua concepção de intervenção divina: um deus marioneteiro que intervém no processo evolutivo como qualquer um de nós poderia intervir no movimento de um berlinde. Estás 'desculpado' por não acreditar nesse deus nem nessa criação. Eu também não acredito.
Saudações,
Alfredo
Não sei se é da falta de sono
ResponderEliminarou os argumentos andarem cada vez mais surrealistas
defenitivamente um candidato a string theorist
Caro Miguel, não tenho nenhuma necessidade de me vires pregar a "abertura de espírito". O espírito é meu, e é suficientemente aberto para ver ideias novas, e suficientemente fechado para que a chuva do ruído não entre facilmente.
ResponderEliminarSei bem que os problemas "não são novos", mas tal como não são novos, também não são novas as suas refutações e as questões irresolúveis.
«Bom, eu penso que é bastante lógico pensar que se um Deus criou o mundo, esse deverá ser necessariamente inteligível, conhecível, mesmo tendo em conta que Ele é distinto dele e não é um ser entre outros seres, ou causa entre outras causas.»
Não, não é nada "lógico" que assim o seja. Deus poderia ter criado um universo ininteligível ao homo sapiens e não vejo nada na "lógica" que o impeça. Pode-te parecer "mais problemático" um universo inteligível sem deus, mas isso é irrelevante. O que é importante é se é possível e se é lógico. Dei explicações razoáveis para a sua emergência. O facto de que somos seres do universo, compostos por partes que "obedecem" às mesmas regras que o universo, não vejo nenhuma "incompatibilidade" entre a nossa consciência e o universo.
«1) o que é ininteligível no universo?
2) como justificas que haja coisas inteligíveis e outras não?
3) porque existem coisas inteligíveis sequer?»
Repara, a primeira pergunta deves ponderar umas boas horas nela. Tu estás a perguntar-me exactamente o que é que é "ininteligível" neste universo. É uma pergunta paradoxal, pois se eu te respondesse com uma resposta objectiva (é aquela coisa X), estaria a refutar-me. Por definição, algo que é ininteligível é algo que não é sequer discernível. Não conseguimos sequer vê-la, nem imaginá-la. O nosso intelecto não passa por ela.
Agora pensa um pouco nisto. Se dissermos a frase "tudo é inteligível", estamos a negligenciar o facto lógico descrito no parágrafo anterior. Porque se existirem coisas "ininteligíveis", nem sequer passarão no nosso radar mental. Por isso nunca poderemos dizer que "tudo" é inteligível. Será melhor ficarmo-nos pela tautologia: "Tudo o que é discernível por nós é inteligível".
Percebes agora a questiúncula?
Depois perguntas-me como é possível entendermos o universo. Eu diria várias coisas, a começar por "porque não?". O que nos impede de conhecermos o universo? Ou por outras palavras, o que tem assim tão de especial? Porque uma ave é capaz de voar? Um macaco olha para um galho e percebe se ele o aguenta ou não. Isto é não só uma capacidade vital explicável pela selecção natural, como também é intelectual. Primordial, mas mesmo assim.
«Por fim, o que afirmei é que o naturalismo "científico" não tem sustentabilidade porque se auto-contradiz»
Infelizmente, não lerei Haught, por isso não saberei do que falas em concreto, embora já tenha lido várias "versões" do assunto, e não me convencem. Normalmente, criam um espantalho, o "Reducionismo", o "Naturalismo", etc., esquecem-se do fundamental da questão epistemológica empírica, e depois atacam coisas que não são assim tão fundamentais. O Reducionismo só é importante enquanto metodologia científica particular.
Fico contente em saber que para ti só há um universo, o que me parece estranho para um teísta (onde se encontra então o inferno, o paraíso, enfim?), os dualismos enterro-os com os tais problemas epistemológicos (os teus problemas só existem num universo dualista, mas isto é difícil de demonstrar num parágrafo).
João Vasco,
ResponderEliminarNão percebo qual argumento é que esse engano "fere de morte". Nota que o que importa aqui é se a evolução tem um objectivo ou não, não qual dos vários sentidos de aleatoriedade usamos...
Alfredo,
ResponderEliminar«O exemplo do berlinde confirma a ideia que eu tinha da tua concepção de intervenção divina: um deus marioneteiro que intervém no processo evolutivo»
Não exijo nem assumo que seja marioneteiro. A questão é mais fundamental. Considera estas duas hipóteses mutuamente exclusivas.
A primeira é que o teu deus não faz qualquer diferença e tudo se processa exactamente como se esse teu deus não existisse. Nesse caso podemos deduzir a teoria da evolução, as equações da genética de populações, aplicá-las para tentar modelar a evolução das espécies e assim por diante.
A segunda é que a existência do teu deus faz diferença. Não presumo saber que diferença faça, e já desisti de tentar obter de ti alguma resposta a isso, porque fazes sempre por evitar essa pergunta. Mas basta que possa fazer diferença. Porque, se pode, então não conseguimos deduzir a teoria da evolução. Se esse deus pode ter algum impacto no processo, então não posso dizer que o processo é exactamente o que seria sem deus nenhum.
Alfredo Dinis,
ResponderEliminarNo exemplo que o Ludwig deu sobre o berlinde, como é que Deus (e não deus) pode ser incluído no exemplo? A resposta ao exemplo é usar t = d / v como resposta porque Deus é não marioneteiro? Mas sendo omnipotente, terá o poder de deitar por terra qualquer equação se assim o desejasse, ou não? Ou é assumir que a equação é correcta porque temos fé que Deus tem mais com que se preocupar do que desviar a trajectória de berlindes rolantes?
Eu peço desculpa por, tal como o Ludwig, ter a ideia de que "intervir" significa "intervir", e por isso, de forma genuína, gostaria que o Alfredo dissesse como é que Deus se enquadra no exemplo do berlide (e assim passar do exemplo àquilo que realmente interessa, que é esclarecer se de facto a teoria da evolução é ou não incompatível com um Deus omnipotente)
Caro Pedro,
ResponderEliminarQuer que eu lhe explique de que forma Deus actua no universo? Para isso é evidente que eu teria que saber tanto como ele, e não tenho essa pretensão.
Mas olhando para o que se passa na nossa vida de seres humanos politicamente organizados, facilmente se vê que há diversos significados para o termo 'intervir'. Os governos intervêm nas decisões mais importantes, como a de construir ou não um aeroporto, uma ponte, etc. No interior dos governos há as intervenções políticas, as intervenções de carácter económico, legal, etc. Uma vez realizadas estas intervenções muito diversas, há que realizar concursos para adjudicação das obras, e aí há outras formas de intervenção. Uma vez adjudicadas as obras, há a fase dos projectos aos diversos níveis da construção. A construção propriamente dita representa outro nível de intervenção. O que acontece a partir do momento em que se inicia a construção pode ser ainda objecto de diversas intervenções, como a de modificar o plano inicial, para a obra, etc. Mesmo que se conclua a obra, há ainda a intervenção dos inspectores que irão licenciar a obra, etc., etc.
Intervir no movimento de um berlinde, não é certamente o único sentido do termo 'intervenção'.
Saudações,
Alfredo Dinis
Tanto palavreado para dizer coisa nenhuma.... o que não é assim tão mau como isso. É uma tendência inevitável a cada momento que se lhes colocam questões mais específicas, complexas, desenvolvidas, pois as possibilidades de entrarem em contradição ora com eles próprios ora com as evidências empíricas se tornam monstruosas e insuportáveis. No fundo, existe uma espécie de assímptota, na qual toda esta gente parece convergir conforme a sua inteligência, mas aparentemente nunca lá chegando. A linha assimptótica é, claro, a conclusão de Wittgenstein, de que as coisas das quais não podemos saber, não se devem falar.
ResponderEliminarMas isso seria o fim da religião, e há demasiado investimento pessoal para admitir tamanha correcção na filosofia...
Atão... ele interveio possibilitando que num futuro incerto para nós, mas já careca de ser conhecido por ele, um berlinde se tornasse o centro da discussão. Vcs não percebem mesmo nada disto... miséria.
ResponderEliminarO lobo tb disse que se n foi o cordeiro, foi o pai dele.
Na religião é a mesma coisa, não é aqui, foi mais atrás ou ao lado.
Visto de fora é cada dançarino.
A intervenção divina é até das danças mais animadas.
Cada gesto, cada inspiradela, cada pensamento só acontece porque deus permite, logo ele intervém em cada instante.
Mas alto lá, a intervenção só conta prás coisas boas, tipo pensar, ajudar uma velhinha a atravessar a estrada, pq se te der na telha enfiar um machado na cabeça de alguém aí já é o lado humano, 100% desgraçado e vil.
Há intervenção de deus no machado em ti e no futuro morto, nos musculos, ar, chão e tudo o que fizer parte da cena, menos na tua vontade de decisão de desferir o golpe.
Isto é um nível de intervenção digna de génio! Ter um pai assim n é fácil, mas lá está... esta podridão é necessária, a consciência foi a cereja. Com ela deus potenciou a existência de psicanalistas.
E isto é o que já sabemos... o futuro só deus o sabe (espertalhão!)
Alfredo,
ResponderEliminarDesde já obrigado pela resposta à minha pergunta. Pelo que percebi do seu comentário, e voltando ao exemplo do berlinde, Deus 'intervém' mas não sabemos como, pois para isso teríamos de saber tanto como Ele (segundo a sua primeira frase). E pus intervém entre aspas pois essa intervenção, a avaliar pela última frase do seu comentário, não tem o sentido usual de intervenção.
E aqui começo a ficar confuso, pois cá estamos nós novamente no intervém sem intervir ou, quanto muito, numa versão mais rebuscada desta intervenção sem intervir. Mas mesmo assim arrisco continuar.
O que o leva a ter a certeza de que Ele intervém sequer? Você não sabe como (pois para isso teria de saber tanto como Ele), mas sabe que intervém. Como é que sabe isso?
E se sabe isso, se sabe que Ele intervém, apesar de não saber como nem conhecer o sentindo da intervenção com que Ele intervenciona no movimento do berlinde, como é que convive com a resposta t = d / v? Aceita a resposta como verdadeira enquanto a intervenção que Ele exerce no berlinde não se manifestar sob a forma de alterar a resposta "t = d / v"? Uma espécie de "t = d / v graças a Deus e enquanto Ele quiser", pois há a hipótese de, dada a omnipotência de Deus, dessa 'intervenção' passar a manifestar-se sob a forma de alterar t = d / v?
E acho que chegámos ao ponto fulcral deste post (o Ludwig que me corrija, caso eu esteja enganado): há uma diferença clara entre "t = d / v" e "t = d / v porque Deus 'intervém' ou enquanto Deus quiser". A segunda hipótese entra necessariamente em contradição com a primeira. Como é óbvio, não importa para já saber qual das duas está correcta, mas há contradição entre as duas.
No meu campo, a estatística e as probabilidades, seria a mesma coisa que eu dizer "a função distribuição é uma Poisson" e comparar com "a função distribuição é uma Poisson condicional à ocorrência de um determinado evento". São duas soluções distintas e apenas uma poderá ser verdadeira (ou mais próxima da verdade): se a distribuição é condicional, então já não pode ser uma distribuição incondicional.
Ora o que me dá a perceber pelos comentários que fui, com bastante interesse, lendo por aqui, é que o Alfredo defende uma evolução condicional à vontade de Deus (ou à sua 'intervenção' no mundo), enquanto a teoria da evolução é incondicional a qualquer outro evento excepto a própria axiomática que está na sua base. E se é condicional, então já não é incondicional.
Porque tal como nas probabilidades, se sabemos que há algo que condiciona a nossa função distribuição, passamos a interiorizar essa condicionalidade na própria teoria e abandonamos de imediato a distribuição incondicional e passamos a trabalhar com a condicional.
Aqui parece-me que os criacionistas são mais coerentes: dizem que a primeira está errada e abraçam a segunda. Apesar de não terem fundamento algum para o fazerem a não ser o seu wishful thinking, percebem que uma coisa não pode ser condicional e incondicional em simultâneo.
"A linha assimptótica é, claro, a conclusão de Wittgenstein, de que as coisas das quais não podemos saber, não se devem falar.
ResponderEliminarMas isso seria o fim da religião"
Não é o fim da religião, Barba, mas sim o seu princípio.
Uma das boas razões para os rituais serem celebrados em línguas mortas.
«Não é o fim da religião, Barba, mas sim o seu princípio.
ResponderEliminarUma das boas razões para os rituais serem celebrados em línguas mortas.»
Isto é contraditório, mas resisto à tentação de fazer uma piadola. O que é de salientar é que a Igreja faz todo o tipo de asserções, desde o dogmatismo da fé em cristo e tudo o que lhe rodeia, passando pela ritualização dominada por machos, e por tudo aquilo que o homem deve ou não deve fazer porque o homem lá em cima disse ou não disse X ou Y.
Claramente, Wittgenstein não é compatível com a Igreja Católica. Mas há sempre quem não se importe com estes pormenores e se sinta bem com ideias ligadas de uma maneira absurda.
Caro Pedro.
ResponderEliminarA vontade de Deus não deve ser arbitrária. Se criou o universo com as suas leis e a Humanidade com a sua liberdade, a sua intervenção, qualquer que seja a sua modalidade, não deveria ser arbitrária.
A minha crença de que Deus tem algum género de relação com o universo e a Humanidade - e com todas as Humanidades que existirem por esse cosmos fora - deriva de uma crença mais fundamental, a crença na sua existência e a crença nele como criador. Há quem admita que Deus poderia ter criado o universo e ter-lhe voltado as costas. Mas neste caso, fica por explicar a razão pela qual ele se teria dado ao trabalho de criar um universo, e, porque não, até milhões de outros universos. Estaria Deus aborrecido sem nada que fazer e decidiu distrair-se um pouco? Irritou-se com alguma coisa e decidiu abandonar o que criou? Bem, isto já me parece antropomorfização a mais.
Saudações,
Alfredo Dinis
Alfredo,
ResponderEliminarSupõe, nem que seja apenas por hipótese, que o deus cuja existência defendes é apenas um personagem fictício. Se assim fosse, que diferença esperarias ter havido na evolução da vida na Terra nos últimos três mil milhões de anos?
Caro Ludwig,
ResponderEliminarSe o Deus em quem acredito fosse fictício não haveria universo nem evolução da vida.
Saudações,
Alfredo
«Se o Deus em quem acredito fosse fictício não haveria universo nem evolução da vida.»
ResponderEliminarIsto é negar sequer a possibilidade de deus não existir. E depois os dogmáticos são os ateus!
Alfredo,
ResponderEliminar«Se o Deus em quem acredito fosse fictício não haveria universo nem evolução da vida.»
Então estás a negar toda a ciência. Porque, segundo a ciência moderna, o universo, a evolução e a vida são perfeitamente possíveis mesmo que o teu deus seja fictício.
Ou estás a dizer que a ciência exige o teu deus e que, por isso, o ateísmo é incompatível com a ciência?
Penso que devias explicar melhor...
ateísmo é incompatível, depende do ateismo
ResponderEliminarAlfredo,
ResponderEliminarEu fiz perguntas muito directas e, julgo, claras. Perguntas como "o que o leva a ter a certeza que Ele intervém sequer?", "como é que convive com a resposta t = d / v [no exemplo do berlinde]?", "Aceita a resposta como verdadeira enquanto a intervenção que Ele exerce no berlinde não se manifestar sob a forma de alterar a resposta "t = d / v"?", etc.
E a resposta que obtive foi tudo menos a resposta a uma pergunta que seja. Mais: nem uma palavra sobre o exemplo do berlinde, quando todas as perguntas faziam parte desse exemplo, pois acho importante explorar primeiro um exemplo simples para podermos dar posteriormente o salto para algo mais complexo como a teoria da evolução. Ou seja, em vez de respostas houve foi uma fuga de um exemplo bem concreto.
Consigo, a muito custo, deduzir do seu último comentário que acredita que Deus 'intervém', pois acreditar que Ele fez o mundo e depois voltou as costas é antropomorfizar demasiado o conceito de Deus.
Fiquemos então pela primeira pergunta que fiz atrás: o que o leva a ter a certeza que Ele 'intervém' na trajectória do berlinde sobre a mesa?
PS: Repare que coloquei intervenção entre aspas para estar afinado pelo mesmo diapasão que o Alfredo e usar o seu conceito, apesar de não entender ainda o que é que o Alfredo quer dizer com 'intervém'. Mas se 'intervém', como é que sabe isso?
«Mas se 'intervém', como é que sabe isso?»
ResponderEliminarRevelação. Que se traduz por "Eu sei e prontos"
Caro Ludwig,
ResponderEliminar"segundo a ciência moderna, o universo, a evolução e a vida são perfeitamente possíveis mesmo que o teu deus seja fictício"
Penso que devias explicar melhor. O Steven Hawking afirmou no seu livro recente que o universo se criou a si mesmo, entre outras coisas. Ainda não encontrei ninguém que se tenha entusiasmado com esta afirmação. A ciência, enquanto ciência, nada tem a dizer sobre a existência ou não existência de Deus. Refiro-me à maior parte dos grandes cientistas. Hawking, Dawkins e outros, embora grandes cientistas,não são representativos da opinião da maioria dos cientistas neste aspecto. O facto de muitos cientistas norte-americanos não acreditarem em Deus, segundo as sondagens, não significa necessariamente que se fundamentem na ciência para negar a existência de Deus. Mais uma vez, convém não confundir correlação com causação.
Saudações,
Alfredo Dinis
Alfredo Dinis,
ResponderEliminar«Penso que devias explicar melhor.»
A ciência diz-nos que algumas coisas são impossíveis. Por exemplo, acelerar um tomate a uma velocidade superior à da luz no vácuo. Diz-nos outras coisas que são forçosamente verdade. Por exemplo, que uma partícula com massa distorce o espaço-tempo.
O resto é possível. E nesse resto inclui-se este universo sem o teu deus. A ciência admite a possibilidade do teu deus ser meramente fictício.
Portanto, se dizes que é impossível o teu deus ser fictício estás a contradizer a ciência. Segundo a ciência que temos hoje, este universo sem o teu deus é perfeitamente possível.
Podes tu agora explicar que evidências tens para concluir que é impossível haver um universo destes sem que exista um deus como o teu? Parece-me que para chegar a uma conclusão tão forte seria preciso bastante mais conhecimento do que aquele que qualquer um de nós tem...
Caro Ludwig,
ResponderEliminarpelo exemplo do berlinde apenas mostras o mesmo que eu, que um deus determinista, manipulador dos acontecimentos do mundo não existe. (escrevi isto antes de ler o comentário do Alfredo Dinis... curioso). O teu ateísmo vale o que vale o conceito de Deus que nega.
Abraço
----------o-----------
Caro Barba,
continuo a não perceber como justificas um universo inteligível sem Deus.
Continuo a não perceber como me falaste de coisas ininteligíveis e não és capaz de me dar um exemplo sequer. Pois o que me dizes é que tudo no mundo conhecível justifica que é inteligível e como no conceito de experimento de Deus, esse só poderia ter criado um mundo se esse fosse inteligível, não vejo como é possível - segundo o teu raciocínio - conceber um mundo inteligível sem Deus.
Afirmas, de alguma forma, que o que é ininteligível não é discernível, mas és omisso se aquilo que não é discernível é real.
Por outro lado, afirmas que "tudo o que discernível é inteligível", mas és omisso se tudo aquilo que não for discernível também o é, ou não, futuramente.
A questão de fundo é que os espantalhos do "reducionismo" ao "naturalismo científico" parecem impregnar o teu pensamento, fechando-o em tentativas infundadas de procurar justificar a oposição entre criação e evolução, inteligibilidade sem Deus, etc ...
É o meu comentário.
Abraço
Miguel Panão,
ResponderEliminarO exemplo do berlinde não tem nada que ver com demonstrar que o teu deus existe ou não existe. Era para demonstrar apenas que só podes aplicar as descrições da física se assumires que ninguém pode mexer no berlinde. Se assumires que há alguém que pode alterar o rumo do berlinde então deixas de poder aplicar a equação.
Caro Pedro Ferreira,
ResponderEliminarQuer uma resposta simples e imediata - nem sempre garantia de ser a melhor. Mas aqui vai. Deus não intervém no movimento do berlinde, deixando que as leis da natureza se encarreguem de determinar esse movimento.
Saudações,
Alfredo Dinis
Caro Ludwig,
ResponderEliminar"Segundo a ciência que temos hoje, este universo sem o teu deus é perfeitamente possível."
Insisto em dizer que o cientista, enquanto cientista, não tem que fazer afirmações que têm a ver com a possível existência de um Deus. Se tivesses razão, teríamos finalmente encontrado o 'santo graal' dos ateus: uma prova incontornável da não existência de Deus, algo que poucos têm a coragem de afirmar.
No que se refere à minha crença de que Deus explica o universo, ela baseia-se na crença de que Deus existe e criou o universo. As provas são de natureza testemunhal, como já disse noutras ocasiões. Há aqui uma questão de coerência, que não pretendo fundamentar em provas empíricas do género científico.
Saudações,
Alfredo
Caro Miguel, a incompreensão é mútua. Também não compreendo como justificas que um universo inteligível tem necessariamente de ser explicado pela existência de um deus. Eu não necessito de explicar todos os passos tintim por tintim, exactamente como é que a "inteligibilidade" (que não existe nas "coisas" mas sim nos conceitos, atenção) surge ou não neste universo, para ter esta questão. Eu não preciso, por exemplo, de saber como é que funciona um relâmpago para refutar uma teoria pré-histórica segundo a qual "Sem Deus não explicamos o relâmpago", pois é esta frase que carece totalmente de evidências.
ResponderEliminarIsto é uma questão lógica muito básica. A não ser que consigas demonstrar absolutamente em como a inteligibilidade é impossível sem deus, a possibilidade existe e existindo a probabilidade não é trivial, já que ambas as hipóteses carecem também de uma explicação detalhada, mas a tua tem mais um elemento ad hoc que a minha.
«Continuo a não perceber como me falaste de coisas ininteligíveis e não és capaz de me dar um exemplo sequer.»
Meu caro Miguel, atenta à questão. Estás a perguntar-me por um exemplo, um caso inteligível, de algo ininteligível. Perguntares-me isto ou pedires-me para fazer a quadratura do círculo, não sei qual será mais fácil. Por favor, segue as palavras, elas são muito precisas: não é possível ter exemplos inteligíveis de coisas ininteligíveis, por definição própria.
« Pois o que me dizes é que tudo no mundo conhecível justifica que é inteligível e como no conceito de experimento de Deus, esse só poderia ter criado um mundo se esse fosse inteligível, não vejo como é possível - segundo o teu raciocínio - conceber um mundo inteligível sem Deus.»
Lá porque o universo é inteligível e tu tens uma teoria segundo a qual deus só construiria um universo inteligível, não segue que o universo tenha sido construído por deus. Tu és inteligente, penso que sabes compreender isto.
«Afirmas, de alguma forma, que o que é ininteligível não é discernível, mas és omisso se aquilo que não é discernível é real.»
Isso já são questões totalmente metafísicas. Admito que seriam "Reais" no sentido metafísico do termo, não no único sentido que lhe reconheço autoridade discursiva, que é no sentido empírico do termo. Por outras palavras, não me meto em metafísicas, sigo o conselho de Wittgenstein nesses assuntos, e diria que o ininteligível é totalmente indistinto do "Inexistente", mesmo que nalguma mente qualitativamente superior à minha o seja distinto (mas para tal mente, não será ininteligível).
«Por outro lado, afirmas que "tudo o que discernível é inteligível", mas és omisso se tudo aquilo que não for discernível também o é, ou não, futuramente.»
Calma. A cada momento a sua análise específica, não coloques o carro à frente dos bois. A possibilidade de encontrarmos novos conceitos e modelos do universo é muito grande, mas tais coisas são totalmente ininteligíveis até ao momento em que são discernidas. No entanto, tudo aquilo que é indistinto significa que é ininteligível. A cada dado momento. Vivemos no presente, e nisso não temos grande escolha...
«A questão de fundo é que os espantalhos do "reducionismo" ao "naturalismo científico" parecem impregnar o teu pensamento, fechando-o em tentativas infundadas de procurar justificar a oposição entre criação e evolução, inteligibilidade sem Deus, etc ...»
Tudo é possível e até é possível que eu esteja profundamente enganado. Não me ajuda muito que apontes apenas uma possibilidade que eu já conheço muito bem, como se não estivesse a par dela, ou como se fosse algum argumento válido....
Saudações
Caro Alfredo Dinis,
ResponderEliminarA sua afirmação «Deus não intervém no movimento do berlinde, deixando que as leis da natureza se encarreguem de determinar esse movimento.» implica um conhecimento específico do que Deus sabe. Como é que sabe isso com esse pormenor?
Caro Mário,
ResponderEliminarMesmo que não acreditasse em Deus, acharia contraditório que Deus tivesse criado as leis da natureza para depois não as deixar funcionar.
Saudações,
Alfredo Dinis
Caro Alfredo Dinis,
ResponderEliminarNão querendo ofende-lo, nesse caso quando afirma que «Deus não intervém no movimento do berlinde, deixando que as leis da natureza se encarreguem de determinar esse movimento.» está apenas a dar um palpite sem fundamento, pois efectivamente não sabe se o que afirma é ou não verdade.
Ludwig,
ResponderEliminarrecusas um Deus intervencionista, também eu. Mas recusas também a perceber outros conceitos de Deus que não esse. Já percebi que tens muita dificuldade em abrires a tua visão do mundo a essa possibilidade. Aconselho a ler o livro do Michael Ruse "Pode um darwinista ser Cristão?". Aí tens um exemplo de um agnóstico que não se fecha sobre o seu conceito de Deus, e que não vê qualquer incompatibilidade entre criação e evolução.
Caro Barba,
ResponderEliminarnão compreendo como justificas que um universo inteligível tem necessariamente de ser explicado pela existência de um deus.
Não invertas o processo cognitivo. Não vou do mundo para Deus, mas da existência de Deus para a existência de inteligibilidade no mundo. O Deus dos Cristãos não é o mundo, ou o Deus de Aristóteles. Muito pelo contrário, pelo facto de ser distinto do mundo, embora nele imanente, ou seja, presente nele, quanto mais e melhor ciência, maior também a descoberta do conceito de Deus em Jesus Cristo.
Mas voltando à inteligibilidade, tu afirmaste no primeiro comentário que me fizeste que «Se colocarmos duas hipóteses, uma na qual qualquer coisa é inteligível, e na outra na qual essa mesma coisa é ininteligível, é perceptível imediatamente uma série de coisas». Logo, ao colocares como hipótese que uma coisa ("essa mesma") seja ininteligível, e com isso percebes "uma série de coisas", eu só estou a tentar perceber o que estavas a tentar dizer. Agora afirmas que tal ininteligibilidade não é possivel. Queres esclarecer-me?
É que não vejo qualquer justificação da tua parte em como acreditar no Deus de Jesus Cristo abre a possibilidade de haver sequer um mundo ininteligível. Repara, não estou a deduzir Deus da ciência, expressão parcial da inteligibilidade do mundo, mas sim que essa é o que se esperaria se um Deus, distinto do mundo, o tivesse criado livremente e por amor (creatio ex nihilo amoris). Basta colocares-te na pele do crente para o entender, mas com isso não estou a dizer que "obrigatoriamente" te tornas um crente. Até porque és crente na inteligibilidade de um mundo sem Deus. Ora, é isso que eu gostava de perceber, ou seja, se o mundo é inteligível e Deus não existe, o que deu existência a essa inteligibilidade?
Bom, «o ininteligível é totalmente indistinto do "Inexistente"», mas quanto ao não discernível?
A possibilidade de encontrarmos novos conceitos e modelos do universo é muito grande, mas tais coisas são totalmente ininteligíveis até ao momento em que são discernidas. No entanto, tudo aquilo que é indistinto significa que é ininteligível. A cada dado momento. Vivemos no presente, e nisso não temos grande escolha...
Um conceito de Deus não poderá ser uma dessas ininteligibilidades até ao momento em que é discernida?
Abraço
Alfredo,
ResponderEliminar«Insisto em dizer que o cientista, enquanto cientista, não tem que fazer afirmações que têm a ver com a possível existência de um Deus.»
Tens, de facto, insistido nisso, mas sempre sem uma justificação satisfatória. Afinal, as hipóteses de existir o teu deus, ou o do Mats, ou o do Ali Khamenei, são hipóteses como quaisquer outras, passíveis de apreciação considerando se há evidências em seu favor ou contra.
Pior ainda, o que estás a dizer é que os cientistas não têm que fazer afirmações acerca das condições de possibilidade para a existência do universo, para a aplicabilidade das leis da física ou da teoria da evolução. Compreendo que não te dê jeito que se aplique o rigor e a exigência científica às tuas crenças, e admito que não és obrigado a fazê-lo se não quiseres, mas querer proibir os cientistas de determinar sequer se o universo é possível parece-me exigir demais.
«Se tivesses razão, teríamos finalmente encontrado o 'santo graal' dos ateus: uma prova incontornável da não existência de Deus, algo que poucos têm a coragem de afirmar.»
Já não são tão poucos como isso, e são cada vez mais, para grande desconforto da religião profissional. E não é uma prova “incontornável”. É um teste conclusivo, ainda que todas as conclusões sejam provisórias. Quem acredita num deus que é necessário para o universo ser possível está tão enganado como quem acredita num deus que criou a Terra em seis dias. Essas conclusões são ambas bem fundamentadas pela ciência moderna.
«No que se refere à minha crença de que Deus explica o universo, ela baseia-se na crença de que Deus existe e criou o universo.»
Eu sei. O problema é que basear uma crença noutra crença não serve para a justificar. Se a minha crença que o teu deus não existe fosse baseada apenas na minha crença na inexistência de deuses ou no testemunho dos ateus, concordarias certamente que não era um fundamento satisfatório.
«Há aqui uma questão de coerência, que não pretendo fundamentar em provas empíricas do género científico.»
A consistência entre proposições não garante que essas proposições correspondam à realidade. O livro do Senhor dos Aneis tem menos contradições que a Bíblia. Ainda assim é incorrecto concluir que é tudo verdade.
Alfredo,
ResponderEliminar«Mesmo que não acreditasse em Deus, acharia contraditório que Deus tivesse criado as leis da natureza para depois não as deixar funcionar.»
Se esse deus tem livre arbítrio, não vejo nada de contraditório em assumir que pode mudar de ideias, abrir excepções, fazer milagres ou o que lhe apetecer. O arbítrio é precisamente a capacidade de agir fora das restrições de regras impostas.
Miguel Panão,
ResponderEliminarrecusas um Deus intervencionista, também eu.»
Queres dizer então que se Deus existir e intervir, tu tornas-te ateu?
Seja como for, o que eu rejeito são as hipóteses. E se quero calcular a trajectória de um berlinde tenho de assumir que nenhum deus vai mexer no berlinde. Porque se não assumir nada acerca dos deuses fico impossibilitado de calcular seja o que for.
Por isso, sempre que aplicas a ciência a qualquer coisa tens de assumir, nem que seja implicitamente, que nenhum deus pode intervir ali. Não é apenas ter uma fezada que não intervenha. E certamente não pode ser, como defende o Alfredo, absteres-te enquanto cientista de assumir seja o que for acerca dos deuses. Tens mesmo de assumir que não pode haver intervenção divina porque senão deixas de poder aplicar as regras.
O vosso deus não é condição necessária para o universo existir, mas assumir que o vosso deus não tem qualquer efeito é condição necessária para aplicar a ciência. Sem essa premissa fica tudo em aberto e não podemos concluir nada.
O LUDWIG VÊ BEM A QUESTÃO, MAS PERDE O DEBATE
ResponderEliminarO Ludwig tem toda a razão quando diz que a criação (racional) é incompatível com a evolução (irracional).
Os cristãos têm uma visão racional do mundo, porque aceitam que um Deus racional criou o mundo de forma racional, com uma estrutura racional, para ser compreendido por seres humanos racionais.
É isso que a Bíblia ensina.
Os evolucionistas têm uma visão irracional do mundo, porque aceitam que tudo veio do nada irracionalmente e se desenvolveu de forma irracional, sem qualquer estrutura racional, incluindo o cérebro humano que não passa de processos químicos aleatórios.
Alguns cristãos, por desprezarem o que a Bíblia ensina e não conhecerem a filosofia naturalista e o evolucionismo que nela se apoia, pensam que o mais racional é tentar um compromisso entre Deus (que é Razão) e a evolução (que é pura irracionalidade).
O Ludwig tem razão quando diz que o compromisso é impossível.
Mas se o compromisso é impossível, então a verdadeira discussão é entre a teoria da evolução (irracional) e a doutrina da criação (racional).
A presença de códigos e de informação codificada nos genomas, evidência por excelência de racionalidade, resolve a discussão a favor da doutrina da criação.
É que todos os códigos e toda a informação codificada têm sempre origem inteligente.
O QUE O LUDWIG DIZ:
ResponderEliminar"Na verdade, de retrovírus e transposões à simbiose entre Bacteria e Archaea, há muitas complicações que Darwin desconhecia."
Os retroviros e os transposções são apenas mecanismos de degradação de informação genética pré-existente ou de sua transferência horizontal.
A simbiose entre Bactéria e Archea provam apenas a existência de simbiose e não a evolução de uma espécie menos complexa para outra diferente e mais complexa...
O QUE O LUDWIG DIZ COMPARADO COM O QUE DAWKINS DIZ
ResponderEliminarLudwig:
"A evolução, o processo que observamos, é análoga ao percurso neste exemplo."
Dawkins:
"A evolução foi vista. Apenas não foi vista enquanto acontecia"
O QUE O LUDWIG DIZ:
ResponderEliminar"A teoria da evolução descreve um processo que é possível mesmo sem deuses."
Pena é que nunca ninguém tenha visto a vida surgir por acaso...
Pena é que nunca ninguém tenha visto uma espécie menos complexa a evoluir para outra diferente e mais complexa...
Pena é que a vida dependa de informação codificada e de que não exista qualquer processo físico, lei natural ou sequência de eventos que, sem uma inteligência, crie códigos e informação codificada...
Pena é que as mutações sejam a principal causa de doenças...
Pena é que a selecção natural conduza à morte...
Caro Ludwig,
ResponderEliminarNão identifico livre arbítrio com arbitrariedade, embora as palavras sejam da mesma família. O conceito de livre arbítrio tem diversas versões. A minha não inclui a arbitrariedade.
Saudações,
Alfredo
Caro Mário,
ResponderEliminarEstou a dar um palpite, sim. Se é sem fundamento, dependerá do fundamento a que se refere. Já anteriormente afirmei que não tenho a pretensão de conhecer o modo como Deus criou e continua a criar o universo nem do exacto modo como com ele se relaciona. Mas também não necessito de saber tudo isto, dado que para viver com sabedoria e felicidade.
Saudações,
Alfredo
Caro Ludwig,
ResponderEliminarGostaria que me indicasses alguns cientistas que pensam que se devem pronunciar sobre Deus, enquanto cientistas. Conheço alguns: os que publicam mais livros em grandes editoras e são mais mediáticos, elementos que é preciso 'descontar' quando queremos chegar a posições objectivas. Recordo-me de uma entrevista dada por António Damásio. Quando lhe perguntaram se se podia aceitar as suas teorias sobre o cérebro e acreditar em Deus, ele respondeu: "Sim. claro, a minha investigação não tem a ver com a existência de Deus nem com a sua inexistência". Kristoph Koch, outro cientista de renome, que publicou diversos estudos com Francis Crick, afirma na sua obra Quest for Consciousness que a recusa de uma alma imortal não implica nem a recusa da imortalidade nem a recusa da crença na existência de Deus. Tu poderás evidentemente citar Crick, Stenger, Harris, Dawkins, Hitchens, etc. Não sei se vamos longe por aqui.
Saudações,
Alfredo
Alfredo,
ResponderEliminar«Gostaria que me indicasses alguns cientistas que pensam que se devem pronunciar sobre Deus, enquanto cientistas.»
Eu preferia, em vez disso, tentar discutir as hipóteses e os seus fundamentos entre nós sem ser em função do que esses outros pensam. Parece-me que resolver tudo por inquérito ao voto da maioria é um sub-aproveitamento das nossas capacidades intelectuais.
Por isso proponho que tentes esclarecer a tua posição. Pelo que percebi até agora, tu defendes que o teu deus é uma condição necessária para que este universo seja possível, mas a ciência não pode avaliar hipóteses acerca desse teu deus. Logo, defendes que a ciência não pode avaliar hipóteses acerca das condições de possibilidade deste universo, ou sequer formar uma opinião cientificamente válida para dizer que este universo é possível, visto que isso, segundo a tua tese, exigiria que a ciência se pronunciasse acerca desse deus. Se percebi mal, por favor esclarece-me. E nota que o que me interessa é a tua opinião, não a da maioria dos não sei quantos que façam não sei o quê.
Outro problema acerca do qual queria que me esclarecesses são as condições de aplicabilidade dos modelos científicos. As equações para a trajectória de uma partícula só se aplicam se assumirmos que nenhum ser inteligente a pode manipular. Caso contrário, se admitirmos que a partícula pode ser manipulada por um ser inteligente, não podemos prever a sua trajectória com as equações da física. Pode ser aquela trajectória, mas pode ser qualquer outra que esse ser queira.
Pelo que percebo, tu defendes que o teu deus, se quisesse, podia manipular qualquer partícula, e só não o faz porque não quer. No entanto, defendes também que essa não é uma opinião que se possa justificar cientificamente. Acreditas que é assim, mas a ciência não pode encontrar bases para concluir que o teu deus não vai mexer na partícula.
O problema que vejo nisto é que, se a ciência não pode concluir que o teu deus não vai mexer na partícula, então a ciência também não pode concluir que aquelas equações se aplicam à trajectória da partícula, pois só se aplicam se o teu deus não for lá mexer.
Em conclusão, parece-me que a tua tese é de que a ciência nunca pode saber quando deve aplicar os seus modelos e não se pode pronunciar acerca do que é possível ou impossível neste universo. E parece-me difícil alguma crença ser mais incompatível com a ciência do que isto que tu defendes...
RESPOSTA AO ÚLTIMO COMENTÁRIO DO LUDWIG ACIMA
ResponderEliminarConcordo que o debate entre criação e evolução não se resolve por apelo à maioria. A maioria dos cientistas acredita na evolução apenas porque a maioria dos cientistas acredita na evolução.
Se a ciência não pode avaliar hipóteses baseadas na existência de Deus, isso significa que também não pode avaliar hipóteses baseadas na sua ausência.
Se a ciência pode corroborar que Deus não existe, também pode corroborar que Ele existe.
Se a ciência pode ser usada para corroborar uma afirmação, também pode ser usada para a descorrobortar.
A ciência diz-nos que a matéria e a energia não surgem do nada, mantendo-se constante a energia existente no Universo.
A ciência demonstra que a vida não surge da não vida por acaso.
O facto de existirem leis naturais no Universo, susceptíveis de representação matemática, longe de ser um argumento contra a existência de Deus, corrobora a Sua existência e racionalidade.
No entanto, se existe um Deus criador das leis naturais, então é lógico que Ele esteja acima das leis que Ele próprio criou.
Os criacionistas não negam nenhuma observação científica ou lei natural...
A capacidade de Deus manipular as partículas está bem patente nos milagres de Jesus, quando transformou a água em vinho, acalmou tempestades, multiplicou os pães e os peixes, curou doentes e ressuscitou dos mortos.
Desses eventos existem relatos históricos fortíssimos, que alteraram o curso da história da humanidade.
Diferentemente, nunca ninguém viu a vida a surgir por acaso, nem uma espécie a transformar-se noutra diferente e mais complexa…
Disso não temos qualquer evidência histórica ou científica.
Temos apenas as especulações dos ateus…
Caro Miguel,
ResponderEliminar«Não invertas o processo cognitivo.»
Eu compreendo que tu não o faças, mas é minha prerrogativa fazê-lo. Sei bem que não gostas de "partir do mundo para deus", mas eu não tenho outro método para o fazer. Tenho sempre de partir do que se passa comigo neste mundo (Quer sejam conversas, experiências, etc.) para seja o que fôr que queiras discutir comigo. É uma limitação minha, admito, mas também te aviso, não reconheço validade noutros métodos.
«Agora afirmas que tal ininteligibilidade não é possivel. Queres esclarecer-me?»
Eu não disse nada disso, aliás, avisei-te para teres atenção que fui muito preciso. O que eu quero dizer é que, "sendo possível" a ininteligibilidade, ela nunca será reconhecível, precisamente porque é ininteligível. Se existe algo no mundo que é ininteligível, nunca poderemos sabê-lo nem quantificá-lo nem nada, pois tal já seria ter algo de inteligível sobre essa coisa, o que é contraditório.
Portanto, não estou aqui a impedir a existência de coisas que nunca perceberemos. O que eu digo é que, se não percebemos, não conseguiremos falar delas.
«É que não vejo qualquer justificação da tua parte em como acreditar no Deus de Jesus Cristo abre a possibilidade de haver sequer um mundo ininteligível.»
Não abre, no contexto actual. Um mundo em que podemos dizer que JC existiu, viveu 33 anos, etc., já não é algo possível num "universo ininteligível", pois pelo menos temos acesso a um conhecimento específico. Podemos intuir facilmente que um universo ininteligível seria um universo totalmente caótico, impossível de prever, sem qualquer modo de lidarmos com ele. Tal universo seria incompatível com a nossa existência, ou até, com a existência de qualquer vida.
«Até porque és crente na inteligibilidade de um mundo sem Deus. Ora, é isso que eu gostava de perceber, ou seja, se o mundo é inteligível e Deus não existe, o que deu existência a essa inteligibilidade?»
A "inteligibilidade" é um conceito um pouco mau. No sentido de pouco rigoroso. As coisas não são "inteligíveis", no sentido de podermos saber "a sua verdade" ou assim. As verdades são sempre proposições sobre matérias de facto, ou seja, são proposições conceptuais de realidades empíricas, e não "Verdades Objectivas". São proposições que se adaptam à realidade e tentam descrever modelos que possam simplificar e prever o comportamento dessa mesma realidade.
Portanto a tua pergunta pode ser reduzida a: "Como é possível prevermos o futuro?", mas aqui repara que todo o animal o consegue fazer, é algo trivial. Todo o animal precisa de prever o que se vai passar dali a alguns segundos para poder caminhar, correr, voar, comer, etc. Este tipo de capacidades são apenas mais evoluídas no ser humano, alcançando um patamar único devido à sua capacidade única de comunicar e criar toda uma "cultura" de linguagem e pensamento que ultrapassa extraordinariamente a capacidade de um único cérebro solitário.
Se a tua pergunta é mais do tipo "Como é possível existir Consciência?", então a "inteligibilidade" não é tanto o teu problema. Isso seriam outras histórias.
«Bom, «o ininteligível é totalmente indistinto do "Inexistente"», mas quanto ao não discernível?»
ResponderEliminarMetafisicamente falando, o ininteligível "pode" ser inexistente, embora nunca o saibamos em concreto. O ininteligível caracteriza-se, entre outras coisas, por ser "não discernível". Se algo é "não discernível", tenho dificuldades em caracterizá-lo noutra coisa que não "Ininteligível".
«Um conceito de Deus não poderá ser uma dessas ininteligibilidades até ao momento em que é discernida?»
Isso e uma infinidade de coisas. Claro que sim. Invocas, parece-me, a questão da "Revelação". Tudo bem, considero isso possível, não porque não se possam colocar questões lógicas apropriadas (como sabes que discernes deus e não outra coisa, como por exemplo o efeito de narcóticos que te colocaram no café da manhã?), e David Hume teria algo a dizer sobre isto, mas porque mesmo este tipo de argumentos são sempre incompletos. O problema é, obviamente, que não tens nem método de te assegurar que de facto estás perante uma revelação, e, pior que isso, qualquer réstia de método para averiguares que outra pessoa teve essa revelação específica, já que estás preso à tua própria subjectividade (e qualquer relação comunicacional que tenhas com ela é sempre baseada no empírico, e não em metafísicas)
tenhas com ela (com a evolução) é sempre baseada no empírico, e não em metafísicas)
ResponderEliminarpois só que a evolução e os vossos argumentos são tão subjectivozinhos
e a teoria neutralista e a seleccionista sugerem diferenças substanciais
Kimura’s derivation of the neutral theory
• noticed variation too high and change too rapid to be explained by natural selection
- based on amino acid sequence data (hemoglobin & cytochrome c) Kimura calculated an
average of 1 aa per 28 my in a 100 aa protein
- this is too high for natural selection based on Haldane’s concept of ‘the cost of selection’
- if only individuals with high fitnesses for a number of diff traits survive, only a
very small fraction of the population will remain
e.g. moth melanism - 50% mortality due to bird predation
- if simultaneous effects at 10 loci 1 / 210 (1 out of 1,024) survivors - population likely to go
extinct before all 10 alleles fixed
- Haldane calculated that a 1 new allele per 300 generations can be substituted
- Kimura noted that in fact substitutions at the molecular level occurring much more rapidly
1 - 1 sub per 28my per 100 aa
2 - mammalian genome size 4 x 109 bp
3 - 100 aa = 300 bp and 20% nucleotide subs synonymous thus 1 aa sub ≈ 1.2 bp sub
4 - time it would take for nucleotide substitution to occur in the genome is:
(28 x 106) / (4 x 109/300) / 1.2 = 1.8 years
- this is a much higher rate of substitution than 1 every 300 generations
Cada uma delas tem pontos fortes e os seus fracos
ResponderEliminar1ºThe proposal that an evolution was particularly
rapid at its early stages is based on errors of geologic
dating, and in any case, perturbations of rate do
not vitiate the molecular evolutionary clock
3º The third proposed piece of evidence against the neutral
theory is conservation of helical regions in mRNA
molecules.
This is an example of a constraint that
slows the substitution rate.
Caro Ludwig,
ResponderEliminarQueres dizer então que se Deus existir e intervir, tu tornas-te ateu?
Não quer dizer que o conceito que recusa, recuso-o também.
Por isso, sempre que aplicas a ciência a qualquer coisa tens de assumir, nem que seja implicitamente, que nenhum deus pode intervir ali.
Mas se eu acredito que Ele é criador, qualquer descoberta da ciência apenas explica o como do resultado do acto criador de Deus (do nada - creatio ex nihilo, e continuamente - creatio continua), porque o pensamento criativo de Deus precede o acto cognitivo de desenvolvimento de conhecimento humano.
O vosso deus não é condição necessária para o universo existir, mas assumir que o vosso deus não tem qualquer efeito é condição necessária para aplicar a ciência. Sem essa premissa fica tudo em aberto e não podemos concluir nada.
Isto apenas tem sentido numa visão do naturalismo científico.
Abraço
Caro Barba,
ResponderEliminarnão estou aqui a impedir a existência de coisas que nunca perceberemos. O que eu digo é que, se não percebemos, não conseguiremos falar delas.
E se eu te avançar duas hipóteses: 1) "não conseguiremos falar delas" directamente, mas apenas indirectamente; 2) são ininteligíveis agora, mas um dia no futuro não o serão. O que te parece?
A "inteligibilidade" é um conceito um pouco mau. No sentido de pouco rigoroso.
Isto só faz sentido numa visão empirista ... mas é uma e questionável ...
Lamento, mas a minha pergunta não é redutível senão na "tua" visão do mundo e por isso mantém, infelizmente, sem resposta ... talvez porque não a saibas ...
Metafisicamente falando, o ininteligível "pode" ser inexistente, embora nunca o saibamos em concreto.
Esclarece-me ...
Quanto ao restante, acho que foste intelectualmente honesto e agradeço.
como sabes que discernes deus e não outra coisa, como por exemplo o efeito de narcóticos que te colocaram no café da manhã?
Porque não o faço sozinho, mas em relação como ser relacional que ontologicamente me considero. Aliás, não conheço o pensamento de Hume, mas suspeito que a incompletude seja devido precisamente a isto, i.e. negligência da categoria da relação como chave hermenêutica.
Quanto ao método de aferir a Revelação, não há um, mas muitos: exegese, hermenêutica, história, etc ...
Caro Ludwig,
ResponderEliminar“defendes que a ciência não pode avaliar hipóteses acerca das condições de possibilidade deste universo, ou sequer formar uma opinião cientificamente válida para dizer que este universo é possível, visto que isso, segundo a tua tese, exigiria que a ciência se pronunciasse acerca desse deus. Se percebi mal, por favor esclarece-me. E nota que o que me interessa é a tua opinião, não a da maioria dos não sei quantos que façam não sei o quê.”
A ciência pode avaliar hipóteses científicas acerca das condições de possibilidade deste universo e formar uma opinião cientificamente válida para dizer que este universo é possível. Sem dúvida. Há algumas hipóteses sobre a origem do universo a partir de uma explosão inicial, de uma flutuação quântica, de uma saída do nada (Hawking). Mas para se pronunciarem sobre estas hipóteses ao nível científico, a ciência não tem nem é capaz de se pronunciar sobre a existência ou não de um Deus criador. E o facto de haver cientistas crentes interessa-nos não pelas estatísticas, para ver quem ganha ou perde, mas para verificar que é possível fazer boa ciência sem que, a este nível, se tenha que tomar uma decisão sobre se Deus existe ou não.
“As equações para a trajectória de uma partícula só se aplicam se assumirmos que nenhum ser inteligente a pode manipular. Caso contrário, se admitirmos que a partícula pode ser manipulada por um ser inteligente, não podemos prever a sua trajectória com as equações da física. Pode ser aquela trajectória, mas pode ser qualquer outra que esse ser queira.”
Como já afirmei, não me parece legítimo conceber um Deus que cria um mundo com determinadas leis naturais e depois se diverte a modificá-las e a baralhar os cientistas. O facto de Deus poder intervir não significa que o faça. E, sendo assim, não entendo por que razão as leis da natureza não poderão funcionar normalmente, nem os cientistas continuar a fazer ciência. As constantes físicas universais estão provavelmente a mudar no espaço e no tempo, por influências diversas, não creio que isso aconteça por um Deus que se diverte e quer afirmar o seu poder. Mas também não é por isso que os cientistas vão pensar que não vale a pela tomar a sério os actuais valores das constantes universais e continuar a fazer boa ciência.
“E parece-me difícil alguma crença ser mais incompatível com a ciência do que isto que tu defendes...”
Tal não me parece. Aliás, é a primeira vez que leio esta tua tese. Teria interesse em ouvir outras opiniões sobre este assunto.
Alfredo
Miguel,
ResponderEliminar«Não quer dizer que o conceito que recusa, recuso-o também.»
Eu não "recuso" (rejeito?) conceitos. Eu rejeito apenas que a hipótese de existir um deus omnipotente criador do universo e transubstanciador de hóstias seja verdade.
«Isto apenas tem sentido numa visão do naturalismo científico.»
A ciência usa o naturalismo por duas razões. Primeiro porque é o que permite criar melhores modelos da realidade. E, em segundo lugar, porque o sobrenaturalismo de hoje está reduzido a tretas sem sentido, e não diz nada de concreto.
Seja como for, o facto é que se a ciência não pode concluir nada acerca da intervenção divina, então fica impossibilitada de saber se pode ou não aplicar os seus modelos para descrever qualquer fenómeno.
Ludwig,
ResponderEliminarrejeito apenas que a hipótese de existir um deus omnipotente criador do universo e transubstanciador de hóstias seja verdade.
Rejeitas com base em quê?
A ciência usa o naturalismo por duas razões.
Inverteste. A ciência não usa o naturalismo, mas o naturalismo que usa a ciência, da mesma forma que uma teologia da natureza usa a ciência, isto é, como método descritivo da realidade material, mas que não esgota aquilo que a Realidade é em si mesmo e que se pode saber acerca dela. Excluir outras fontes de saber, sim, já faz parte do reducionismo epistemológico inerente ao naturalismo científico.
o facto é que se a ciência não pode concluir nada acerca da intervenção divina, então fica impossibilitada de saber se pode ou não aplicar os seus modelos para descrever qualquer fenómeno.
E achas que estás a dizer uma novidade para um crente? Não é propósito da ciência inferir sobre realidades que transcendem a matéria, o que implica a limitação do próprio método (naturalmemte, dir-se-ia) e, consequentemente, da visão do mundo nesse assente exclusivamente.
Abraço
Ludwig,
ResponderEliminar«A ciência usa o naturalismo por duas razões. Primeiro porque é o que permite criar melhores modelos da realidade. E, em segundo lugar, porque o sobrenaturalismo de hoje está reduzido a tretas sem sentido, e não diz nada de concreto.»
Compenetre-se do que está a dizer. Reflicta. Controle a ansiedade. Não gosta da palavra controle? Substitua-a por domine. Também não gosta desta? Tente: não se deixe dominar pelas primeiras ideias que lhe ocorrem.
Vejamos, por que razão o Ludwig se ocupa de questões relacionadas com religião, fé e Deus, em vez de se ocupar com a sua ciência?
Mas continue à vontade que, quanto mais "fala", mais nos esclarece.
Alfredo,
ResponderEliminar«A ciência pode avaliar hipóteses científicas acerca das condições de possibilidade deste universo e formar uma opinião cientificamente válida para dizer que este universo é possível.»
Nesse caso, se a ciência concluir que este universo é possível dado um conjunto de condições suficientes, e nesse conjunto não constar o teu deus, então a ciência demonstra que a tua crença é incorrecta, porque o que tu acreditas é que o teu deus, sendo condição necessária, tem de estar em todos os conjuntos de condições suficientes para este universo surgir. A tua crença é, por isso, cientificamente testável. E, neste momento, cientificamente justifica-se rejeitá-la.
«Como já afirmei, não me parece legítimo conceber um Deus que cria um mundo com determinadas leis naturais e depois se diverte a modificá-las e a baralhar os cientistas.»
Infelizmente, a ciência não se pode basear em algo só porque parece legítimo ao Alfredo Dinis. A infalibilidade não é um dogma cientifico, e em ciência tem-de se exigir evidências concretas.
Portanto, o problema na ciência é que, se há um deus omnipotente acerca do qual não se possa testar qualquer hipótese, então a ciência também não pode obter evidências que justifiquem assumir, para cada caso, que esse deus não vai afectar os resultados. A opinião do Alfredo Dinis não basta para resolver este problema.
E se a ciência não pode justificar, cientificamente, para um certo caso dizer “nenhum deus vai mexer nisto”, então a ciência não pode justificar, cientificamente, a adequação dos seus modelos para prever o que vai acontecer.
A conclusão que tiro daqui é a mesma que já tinha mencionado à muito tempo. A ciência pode, e deve, rejeitar como falsas todas as afirmações que não estejam devidamente fundamentadas. Por isso a ciência pode considerar falsa a hipótese de um deus mexericar no sistema que está a prever, e isto por razões científicas. E as mesmas razões levam a ciência a rejeitar a existência desse deus.
Eu compreendo que isto não dê jeito a muita gente e que, por isso, é difícil para muitos aceitar. Mas esta incompatibilidade é evidente quando se tenta criar uma visão consistente da realidade, e a mera repetição da afirmação “isso a ciência não pode fazer”, ou a justificação com base no “eu não acredito que seja”, não resolvem este problema.
Mas pode ser que tenhas solução. Por isso, deixo a pergunta: como é que a ciência pode concluir, cientificamente, que o teu deus não vai interferir numa experiência, para assim poder julgar que os modelos científicos se aplicam nesse caso? É que telefonar para ti e perguntar, Alfredo, achas que o teu deus me vai estragar a experiência, é metodologicamente insatisfactório.
Miguel,
ResponderEliminar«Rejeitas com base em quê?»
Rejeito a alegação de que existe um deus criador omnipotente porque não há evidências que favoreçam mais essa hipótese do que a sua negação. Tudo o que sei é igualmente compatível com a existência e com a inexistência de tal deus.
E se assumirmos que esse deus é benevolente e nos ama a todos, então as evidências contra acumulam-se rapidamente.
Portanto, tal como rejeito a existência de tijolos invisíveis voadores ou veneno mortal na água da minha torneira, ou a hipótese da gravidade desaparecer hoje às 14:00, também rejeito essas tuas especulações infundadas acerca da criação do universo.
« A ciência não usa o naturalismo, mas o naturalismo que usa a ciência,»
Isso é falso. A ciência já se baseou em muitas hipóteses acerca de entidades sobrenaturais. A mesma ciência depois rejeitou-as e substitui-as por outras, acerca de elementos naturais, porque estas funcionavam melhor. Mas o método – a ciência – continuou o mesmo. Vê por exemplo o progresso científico que levou do criacionismo à teoria da evolução, ou as hipóteses de Newton acerca do papel do seu deus na gravitação universal.
«E achas que estás a dizer uma novidade para um crente? Não é propósito da ciência inferir sobre realidades que transcendem a matéria, o que implica a limitação do próprio método (naturalmemte, dir-se-ia) e, consequentemente, da visão do mundo nesse assente exclusivamente.»
Não tem nada que ver com a matéria (e espaço-tempo não é matéria, e as teorias das cordas e teorias M não são acerca de matéria).
É propósito da ciência criar modelos e aferir quando é adequado aplicá-los. No caso do berlinde, por exemplo, é adequado aplicar as equações relacionando velocidade inicial e distância percorrida na condição de que nenhum ser inteligente mexa no berlinde.
Portanto, está no âmbito da ciência concluir se algum ser inteligente vai ou não mexer no berlinde.
Se tu postulas que há um ser inteligente que pode (tem capacidade para) mexer no berlinde e, ao mesmo tempo, insistes (sem justificar) que a ciência não pode formar opinião acerca desse ser, tu estás a dizer que a ciência não pode formar opinião acerca de quando os seus modelos se aplicam. E isto é contrário ao propósito da ciência.
Carlos,
ResponderEliminarO seu comentário era para dizer alguma coisa, ou foi só para treinar dactilografia?
Caro Ludwig,
ResponderEliminar“se a ciência concluir” – é como concluir que Chopin não foi um músico de qualidade a partir da análise dos instrumentos que tocou.
“E se a ciência não pode justificar, cientificamente, para um certo caso dizer “nenhum deus vai mexer nisto”, então a ciência não pode justificar, cientificamente, a adequação dos seus modelos para prever o que vai acontecer.”
A conclusão não segue das premissas, por mais que o desejes. Pura lógica.
“Eu compreendo que isto não dê jeito a muita gente e que, por isso, é difícil para muitos aceitar.”
Isto aplica-se a toda a gente, incluindo aos cientistas, como mostra a história da ciência. Basta ler A Estrutura das Revoluções Científicas, de Thomas Kuhn. Como já disse anteriormente, tu tens – aparentemente - nas mãos o ‘santo graal’ do ateísmo, a prova mais convincente possível de que ciência e religião são incompatíveis e que sendo a ciência possível e fundamentada, a existência de Deus não é possível nem fundamentada. Só não entendo por que razão se continua ainda a discutir a existência de Deus, sobretudo da parte de cientistas. Creio que ainda não chegaram ‘lá’. Afinal, tudo é tão claro e evidente!
Saudações,
Alfredo
Alfredo,
ResponderEliminar«“se a ciência concluir” – é como concluir que Chopin não foi um músico de qualidade a partir da análise dos instrumentos que tocou.»
Não, porque ser "de qualidade" não é um atributo de Chopin, mas sim uma classificação subjectiva que alguém pode (ou não, conforme o critério) aplicar a Chopin. Isso é fundamentalmente diferente de descobrir as condições nas quais este universo é possível.
«A conclusão não segue das premissas, por mais que o desejes. Pura lógica.»
Vou explicitar a dedução, passo a passo, e tu vais-me dizer qual o passo em que a dedução falha.
As premissas:
P1- A ciência não pode avaliar hipóteses acerca de um deus omnipotente.
P2- Os modelos científicos só se aplicam aos casos em que um deus omnipotente não decide interferir com os processos naturais.
P1 implica que:
P3- A ciência não pode avaliar hipóteses acerca da interferência de um deus omnipotente em processos naturais.
P3 implica que:
P4- Não existe nenhum processo natural para o qual a ciência possa concluir que um deus omnipotente não vai interferir.
P2 e P4, em conjunto, implicam que:
P4- Não existe nenhum processo natural para o qual a ciência possa concluir que os seus modelos se aplicam.
Ou seja, se a ciência não pode avaliar hipóteses acerca de um deus omnipotente, a ciência nunca pode saber se pode usar os seus modelos ou não.
Eu proponho que o argumento é válido mas não é sólido porque a primeira premissa (P1) é falsa. A ciência pode avaliar qualquer hipótese; se for testável testa-a, se não for testável rejeita-a logo à partida. Mas se tu achas que este argumento não é válido, por favor aponta o passo de inferência que está incorrecto.
Caro Ludwig,
ResponderEliminarNão falei em argumentos válidos ou inválidos, uma questão largamente formal. A tua proposição
"se a ciência não pode avaliar hipóteses acerca de um deus omnipotente, a ciência nunca pode saber se pode usar os seus modelos ou não." equivale a esta outra:
"se a ciência não pode avaliar hipóteses como a de sermos apenas cérebros numa cuba ligados a um computador que gera em nós virtualmente todas as experiências que tomamos como reais, então a ciência nunca pode saber se pode usar os seus modelos ou não."
Não se tira daqui a tua conclusão de que qualquer uma das proposições inviabiliza a ciência.
Saudações,
Alfredo
Alfredo,
ResponderEliminarMas a ciência tem uma metodologia para avaliar hipóteses não-falsificáveis. Considera-as sem qualquer valor, e rejeita-as. É por isso que a ciência consegue lidar com essa possibilidade de sermos cérebros em frascos. Põe essa hipótese de parte, assume que é falsa, e vê o que se pode fazer a partir daí.
Se a hipótese do teu deus existir estiver ao mesmo nível da hipótese de sermos cérebros em frascos e tudo isto ser ilusão, não há problema para a ciência. Assume a hipótese falsa (porque a ciência assume tudo sempre provisoriamente, enquanto não há evidências em contrário) e segue em frente.
É precisamente por isso que sou ateu e não acredito no teu deus. Pela mesma razão que não acredito que sou só um cérebro num frasco a viver uma ilusão.
Caro Ludwig,
ResponderEliminarSe formos cérebros num frasco. manipulados virtualmente por um génio mau que assim se diverte, não adianta partires do pressuposto de que a hipótese é falsa, porque tudo se passa exactamente como se a hipótese não fosse falsa e nós vivêssemos num mundo real.
No caso da existência de Deus, podemos dizer de forma talvez menos complicada que ele interage no universo através das leis da natureza. É por isso que cientistas crentes e cientistas ateus se entendem e empenham igualmente no estudo científico da natureza. Já sei que vais voltar a dizer que nesse caso Deus sobra e não é necessário. Como já te disse também, considero que Deus é a condição de possibilidade da existência de qualquer ser e que dá sentido a toda a existência. Também já adivinho que me vais responder que a ciência te dá todo o sentido de que necessitas para seres feliz. Tens todo o direito de assumires essa posição. Eu, e muitos outros, como pessoas necessitamos de um ser pessoal que dê sentido à nossa existência. Nem um planeta, nem uma estrela, uma galáxia ou um buraco negro, as equações de Einstein ou outras quaisquer, por serem impessoais conseguem dar sentido à minha existência pessoal. Considero que a pessoa é um ser constitutivamente dialogante, e não consigo dialogar com nenhum dos elementos do universo nem com o universo no seu conjunto. Esta exigência que muitas pessoas sentem de um diálogo profundo com um ser que dá sentido ao universo e à vida, particularmente à vida humana através da possibilidade de um diálogo incondicional está na origem de todas as religiões, e inclui também as primeiras tentativas de explicar os fenómenos naturais através de intervenções extraordinárias dos deuses. Se a ciência fosse a única fonte de sentido, os biliões de pessoas que já existiram, existem e existirão e que nunca ouviram falar de ciência teriam vivido uma vida sem sentido. Se tudo isto te parece normalíssimo e consideras que quem procura o sentido para a sua existência para além da ciência anda fundamentalmente equivocado, tens todo o direito a ter esta posição. E dizeres que respeitas as ilusões religiosas de cada um, desde que cada um as guarde para si e as viva na sua subjectividade fechada e secreta não me parece suficientemente respeitadora da pessoa humana. É a minha posição, que certamente respeitarás como eu respeito a tua, embora discordando dela completamente.
Um abraço,
Alfredo
Caro Alfredo:
ResponderEliminarPelo que li da última mensagem, está a misturar dois assuntos diferentes. A saber:
-Como é que o mundo é.
-Como é que o mundo teria de ser para que o Alfredo e outros como Alfredo pudessem dar um sentido que os fizesse feliz.
Eu acho que são coisas separadas. Uma coisa é saber se Deus existe ou não. Outra coisa é saber se a Fé é benéfica para o Homem (ou para que homens); e saber se a Religião organizada é benéfica para o Homem.
Se fosse verdade que o Alfredo e outros como o Alfredo precisam de acreditar em Deus para darem um sentido que os preencha, isso em nada tornaria a existência de Deus mais provável.
E em nada alteraria o âmbito da ciência, de estudar ou não esse assunto.
«Considero que a pessoa é um ser constitutivamente dialogante, e não consigo dialogar com nenhum dos elementos do universo nem com o universo no seu conjunto.»
Isto é algo que o Ludwig já tem escrito em alguns dos seus textos - como o nosso cérebro está modelizado para as relações sociais, o homem tenta dialogar com a natureza da mesma forma que o faz com os seus semelhantes. Tenta pagar aos poderosos para ter bom tempo fortuna e prosperidade, seja na vaca sacrificada ao Faraó, seja na velinha queimada em Fátima.
A selecção natural explica bem a diversidade de religiões que existem e aquilo que existe de comum entre elas. Em parte é essa vontade de pagar para controlar aquilo que sentem escapar ao seu controlo - desde as cheias e a trovoada até ao medo da morte.
« Se tudo isto te parece normalíssimo e consideras que quem procura o sentido para a sua existência para além da ciência anda fundamentalmente equivocado, tens todo o direito a ter esta posição.»
Sim.
E acreditar que a religião é perniciosa? Que prejudica a sociedade? É uma opinião legítima?
Caro João Vasco,
ResponderEliminarSe Deus existisse mas tivesse nos tivesse voltado as costas, eu não teria qualquer interesse em discutir o assunto da sua existência. A sua existência e o desejo que muitas pessoas têm dele são dois aspectos de uma única questão. Distinguir não é separar. Ou Deus é um ser relacional e se interessa por nós e responde ao desejo que há em muito de um sentido absoluto e de uma relação fundamental e incondicional, ou então não adianta discutir a existência de Deus.
Mais uma vez, o João prefere escolher de entre as manifestações religiosas as que são menos significativas e estão até em vias de desaparecer: o desejo de controlar Deus, de o trazer para o lado dos interesses de cada um. Os adeptos do Sporting rezam provavelmente a pedir uma vitória sobre o Benfica, e os adeptos deste clube fazem o mesmo, mutatis mutandis. E o João vem dar-me exemplos deste género para definir o essencial da religião?
Do mesmo modo, o João prefere olhar para o que há de negativo na história das religiões, ignorando o positivo. Em qualquer realidade humana, seja ela a política, a ciência ou a economia, há aspectos de que não nos orgulhamos. Mas não lhe parece que temos que olhar o conjunto da História Humana para termos uma visão equilibrada da realidade? Se se seguir a metodologia muito em voga entre os não crentes, de seleccionar determinados aspectos da religião esquecendo outros, acredito que isso possa dar aos não crentes uma sensação de vitória e de possuírem a verdade, mas pode crer que não beliscam a religião, precisamente porque recusam ver a realidade - toda a realidade, não apenas a metade que convém.
Saudações,
Alfredo
Caro Alfredo:
ResponderEliminarQuero esclarecer três confusões.
1- Eu não falei num Deus que existe e voltou as costas ao que quer que fosse. Sei bem que muitos crentes acreditam que Deus está atento aos seus destinos.
Mas eu falei no oposto. A necessidade que alguém tenha de acreditar em X não torna X mais plausível. Portanto quando se discute a existência de X um dos argumentos mais fracos que pode ser apresentado é esta necessidade.
2- Não falei desses exemplos para "definir o essencial da religião" mas sim para mostrar como aquilo que existe em comum nas diferentes religiões está de facto relacionado com essa "propensão dialogante" no ser humano a que se referiu, com as suas dificuldades em não personificar a natureza morta. Neste sentido estava ao mesmo tempo a concordar com o Alfredo, e ao mesmo tempo a lembrar que a selecção natural explica adequadamente essa tal "propensão dialogante".
3- As acusações que faz são injustas, até porque eu não referi nem aspectos positivos nem negativos na religião. Carece portanto de qualquer fundamento a acusação de que ignoro os primeiros e apenas penso nos segundos.
Na verdade, eu limitei-me a fazer uma pergunta que ficou sem resposta. É legítimo considerar que a religião é perniciosa?
Na verdade, sou da opinião que um católico deveria compreender com facilidade qualquer ateu que considerasse a religião perniciosa, com mais facilidade do que compreenderia um ateu que considerasse a religião benéfica. E porque é que digo isto?
Porque um católico alegadamente atribuiu um valor absoluto, absolutamente positivo, à Verdade ("eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida", certo?).
Deve portanto concordar que qualquer instituição que baseie a sua existência num equívoco, numa crença que é falsa, é uma instituição perniciosa.
Como um católico sabe que o ateu acredita que é este o caso das diferentes Igrejas, deveria compreender com facilidade que este as considerasse perniciosas.
Curiosamente, eu encaro a possibilidade (embora tenha boas razões para a rejeitar) de existirem Igrejas que não tenham um impacto pernicioso, ou até o tenham benéfico. Mas um Católico deveria compreender que eu rejeitasse tal possibilidade imediatamente - na Verdade está o Bem, certo?
Mas mesmo que discorde deste raciocínio, será ou não uma opinião legítima e defensável, a de que a religião tem um impacto negativo na sociedade?
Alfredo,
ResponderEliminarSe vivemos numa ilusão manipulada por um génio mau não fica tudo na mesma. Os dados são os mesmos, mas as explicações correctas serão diferentes das que temos agora. Por isso, a hipótese de vivermos numa ilusão manipulada por um génio mau é incompatível com a ciência moderna. Penso que nisto estamos de acordo (?)
A ciência, enquanto método, tem forma de lidar com estas hipóteses. Rejeita-as por não serem produtivas. Uma hipótese que não se pode testar não permite desvendar dados novos nem corrigir erros. A hipótese de vivermos numa ilusão não é uma hipótese acerca da qual a ciência fique silenciosa. É uma hipótese que a ciência descarta como falsa para que possa progredir. Se um dia houver evidências de ser verdadeira, então muda-se de opinião. A ciência não depende de qualquer premissa de infalibilidade.
O teu deus está na mesma situação. Não é apenas uma hipótese impossível de testar. É, além disso, uma hipótese incompatível com as explicações da ciência moderna, que não reconhecem a existência de uma pessoa omnipotente como uma condição necessária para a existência do universo. Essa hipótese a ciência rejeita, bem como a hipótese de um ser omnipotente com a capacidade de mexericar em tudo. A tua crença religiosa é incompatível com a ciência moderna da mesma forma, e pelas mesmas razões, que a hipótese disto tudo ser ilusão é incompatível com a ciência moderna. Ambas as hipóteses prevêem as mesmas observações, mas as explicações são fundamentalmente diferentes.
A ciência não é a única fonte de sentido. A ficção, a banda desenhada, as anedotas, há muita coisa onde podemos encontrar sentido para a nossa vida. E se a hipótese de existir tal deus te ajuda a encontrar sentido nas coisas, isso é contigo. Mas, objectivamente, isso não contribui nada para justificar a conclusão de que é verdadeira.
E não há aqui qualquer questão de respeito pela hipótese. Isso nem faz sentido. Uma hipótese não é algo que se respeite ou desrespeite. O respeito que tenho é por ti. Se queres acreditar que isto tudo é uma ilusão ou que existe uma pessoa omnipotente, respeito o teu direito de acreditar no que quiseres. Mas não faz sentido dizer que respeito uma ideia abstracta, ainda por cima se me parece não corresponder à realidade.
Caro Ludwig,
ResponderEliminarNo caso de sermso cérebros num bilha, não há maneira de testar esta hipótese, uma vez que tudo se passa como se não estivéssemos lá. Não vejo como poderíamos testar a hipótese.
Como já disse anteriormente, a tradição cristã sempre entendeu que a interacção de Deus com o universo físico se faz através das leis da natureza. A sua intervenção em relação aos seres inteligentes e livres - deste planeta e de outros - faz-se, penso eu, respeitando dialogicamente essa inteligência e essa liberdade. Por conseguinte, o funcionamento das leis da natureza e a intervenção de Deus são uma e a mesma coisa.Por conseguinte, não pode haver incompatibilidade entre a existência de Deus e a ciência.
Duvido seriamente que uma pessoa que queira encontrar sentido para a sua vida o encontro nas modalidades que sugeres: banda desenhada, anedotas, etc. Hipóteses há muitas, mas há que olhar para a realidade e para as pessoas reais, só assim compreendemos que as anedotas e a banda desenhada, tal como a ciência, não servem - pelo menos para muitas pessoas.
Saudações,
Alfredo
"A ciência, enquanto método, tem forma de lidar com estas hipóteses. Rejeita-as por não serem produtivas. Uma hipótese que não se pode testar não permite desvendar dados novos nem corrigir erros. A hipótese de vivermos numa ilusão não é uma hipótese acerca da qual a ciência fique silenciosa. É uma hipótese que a ciência descarta como falsa para que possa progredir
ResponderEliminar... ... ...
O teu deus está na mesma situação. Não é apenas uma hipótese impossível de testar. É, além disso, uma hipótese incompatível com as explicações da ciência moderna, que não reconhecem a existência de uma pessoa omnipotente como uma condição necessária para a existência do universo. Essa hipótese a ciência rejeita, bem como a hipótese de um ser omnipotente com a capacidade de mexericar em tudo. A tua crença religiosa é incompatível com a ciência moderna da mesma forma, e pelas mesmas razões, que a hipótese disto tudo ser ilusão é incompatível com a ciência moderna. Ambas as hipóteses prevêem as mesmas observações, mas as explicações são fundamentalmente diferentes"
Ludwig,
penso que são afirmações como essas que fazes acima que te definem como um ateu radical. Eu, como ateu, não me revejo nessas posições.
Não há uma posição definida dos cientistas a descartar essas hipóteses como sendo falsas e muito menos a ciência é uma pessoa da qual tu tenhas procuração.
O que tu tens é a heurística - navalha de Occam que te diz para não usares premissas para além do mínimo necessário às explicações. Ora isto é completamente diferente de "a ciência" poder afirmar a sua falsidade. Aliás, é exactamente por este o motivo que a ciência rejeita estas hipóteses: porque não são falsificáveis. Não ser falsificável é diferente de ser falso (duhhh :)
Por vezes parece-me que o teu deslumbramento com a ciência é tal que tendes a aplicar o método cientifico a tudo e, quando encontras hipóteses não falsificáveis que não te agradam, ficas tão desconfortável que dás o salto proibido de classificá-las como falsas. Serão improváveis, é certo, mas da probabilidade 0,000001 à probabilidade 0 vai um infinito contínuo.
Já te vi aqui a assumir posições mais razoáveis, inclusivamente referiste várias vezes que muitos problemas começam por ser problemas filosóficos e só quando atingem um nível de definição que podem ser confrontados com o método experimental é que passam a ser problemas científicos!
Gostes ou não gostes os católicos fizeram um bom trabalho para tornar o seu deus não falsificável. Não o atinges pela ciência.
Paulo Sustelo:
ResponderEliminarDiscordo que o Deus dos católicos seja infalsificável.
E explico porquê.
A história é uma ciência, certo?
É uma ciência que se pronuncia sobre os factos que ocorreram ou não no passado.
Saber se o Rei Artur existiu, é uma questão histórica. Quem terá dado origem a essas lendas?
Saber se o Rei Artur derrotou algum Dragão, como algumas das lendas Arturianas relatam, também é uma questão histórica. Simplesmente é uma questão que a história rejeita com facilidade. Como as ciências não são estanques, um historiador pode, tendo em conta tudo o que se sabe sobre a evolução dos seres vivos, rejeitar com facilidade a hipótese de que o Rei Artur - a ter existido - derrotou um Dragão, por ser muito menos provável que a hipótese alternativa de que o texto que descreve essa luta representa uma mentira, um exagero ou um equívoco.
Imagino que até aqui estamos de acordo.
Aquilo que afirmo é que não existe nenhuma diferença epistemológica fundamental em relação à rejeição da ressurreição de Jesus Cristo. Perante duas hipóteses alternativas - a ressurreição e o equívoco nos textos que a descrevem - o historiador deveria imediatamente optar pela segunda.
Na verdade, é precisamente isso que um historiador faz caso se depare com um documento histórico que relate a ressurreição de D. Afonso Henriques, ou William Shakespeare. Não vai assumir que a ciência não pode dar uma resposta, se terá havido um milagre ou não. Vai imediatamente assumir que o texto relata um equívoco, uma mentira, ou algo do tipo.
Obviamente a popularidade da crença católica não deveria alterar o procedimento do historiador. Por isso, um historiador deveria realmente assumir que Jesus Cristo não ressuscitou, e considerar essa conclusão como científica.
O caso é mais complicado no que diz respeito à existência de um Deus não falsificável. Mas não creio que o Deus dos católicos esteja nessa categoria.
Caro Alfredo,
ResponderEliminarLamento que não tenha respondido à pergunta que fiz:
«Defender que a religião tem uma influência perniciosa sobre a sociedade é defender uma opinião legítima?»
Com a qual se pode discordar, mas em relação à qual podemos discutir civilizadamente, sem assumir que quem a defende é um radical. Sem assumir que quem a defende é intolerante?
Caro João Vasco,
ResponderEliminarA questão da ressurreição de Jesus é recorrente neste e em outros blogues e é em geral negada. Gostaria de saber o que se está exactamente a negar.
Quanto a saber se a religião tem uma influência perniciosa sobre a sociedade é uma opinião legítima, entendo que cada um tem o direito de defender a opinião que entender ser legítima. Para mim, claramente e sem margem para quaisquer ambiguidades, a religião não tem uma influência perniciosa sobre a sociedade. Como a ciência, a tecnologia, etc., embora nem tudo o que os cientistas e os técnicos fazem seja de louvar.
Alfredo
Caro Alfredo,
ResponderEliminarNem eu imaginaria que o Alfredo considerasse que o efeito da religião na sociedade fosse pernicioso.
Agradeço então a resposta, bem clara, à pergunta que fiz.
A pergunta veio a propósito destas suas palavras dirigidas ao Ludwig:
«consideras que quem procura o sentido para a sua existência para além da ciência anda fundamentalmente equivocado, tens todo o direito a ter esta posição. E dizeres que respeitas as ilusões religiosas de cada um, desde que cada um as guarde para si e as viva na sua subjectividade fechada e secreta não me parece suficientemente respeitadora da pessoa humana.»
Pareceu-me que assumia que o Ludwig apenas respeita as "ilusões individuais", mas não as colectivas, a partir das palavras dele considerando a religião perniciosa.
Assim, gostaria de pedir ao Alfredo esclarecimento em relação a esta questão. O Alfredo não alega que considerar a religião como perniciosa seja uma "falta de respeito" por quem adere a uma religião (comunitária, naturalmente), certo?
Nesse caso, o que o leva a concluir que o Ludwig "não tem respeito" pela opção de aderir a uma religião. Não faço a pergunta para discordar dessa conclusão, mas para compreender que linha é que se atravessa para que o Alfredo considere que existe "falta de respeito".
Acrescento esta pergunta outra mais séria do que parece: terá Eça de Queirós atravessado essa linha?
Respondendo à questão que me colocou: «Gostaria de saber o que se está exactamente a negar [ao dizer que não existiu ressurreição].»
Para responder à sua pergunta peço emprestadas as palavras da wikipedia em inglês, que traduzem aquilo que entendo pela "ressurreição de Jesus":
«In Christianity the resurrection of Jesus refers to the return to bodily life of Jesus three days after his death by crucifixion. It is a key element of Christian faith and theology. The resurrection of Jesus is not to be confused with the Ascension of Jesus into heaven forty days after the resurrection»
que traduzo:
«No Cristianismo, a ressurreição de Jesus refere-se ao retorno à vida (corporal) de Jesus três dias após a sua morte por crucificação. É um elemento fundamental da fé e da teologia cristãs. A ressurreição de Jesus não deve ser confundida com a Ascensão de Jesus ao céu, quarenta dias depois da ressurreição»
João Vasco disse...
ResponderEliminarCaro Alfredo
Caro ou pela 2ª pessoa do singular
o tratamento também se ritualiza entre seres virtuais
Barba Rija disse...
Uma das boas razões para os rituais serem celebrados em línguas mortas.»
desde 1963 por 2000 e tal votos a favor e meia-dúzia contra que os rituais da igreja católica romana deixaram de ser em latim
e o árabe e os dialectos hindus são línguas vivas
Isto é contraditório, mas resisto à tentação de fazer uma piadola.
O que é de salientar é que a Igreja (pressupõe-se de ortodoxa fé, catho's) faz todo o tipo de asserções, passando pela ritualização dominada por machos, calhou assi as sociedades predominantemente dominadas por fêmeas são pouquinhas
e mesmo os casos de sacerdócio feminino ou de ponte humano-poder superior mediado por gadjas é limitado resum~e-se a casos de guardiãs
(vestais9 ou oráculos/profetas/feiticeiras/bruxas (pitonisas, piton's e similares mais as prostituições sagradas que nã sei se se encaixa religiosamente no sacerdócio
e como é qu'isto acaba sempre do mesmo modo seja o tema al finetes
ResponderEliminarou al môadas será essa a vontade de DEUS e estareis Vós a participar activamente no plano divino?
fazei greve ó Criaturas de Deus
Caro João,
ResponderEliminarO Ludwig condescende que as pessoas com fé a tenham. Considera que estão a viver uma ilusão mas... vá lá, seja! Não me parece que a posição da pessoa seja tomada a sério, apenas tolerada por alguém que sabe que é uma ilusão mas não quer acordar ninguém dessa ilusão.
Como sabe a Wikipédia tem alguns aspectos interessantes, mas não é de fiar 100%. Confunde-se ressurreição com reanimação. Por isso se aplica o termo 'ressurreição' a Lázaro e ao filho da viúva de Naim, personagens e episódios do Novo Testamento. Mas em ambos os casos tratou-se de uma reanimação, Essas pessoas voltaram à vida que tinham anteriormente e morreram de novo. A ressurreição em sentido bíblico não é a reanimação do corpo, não é o regresso à vida anterior à morte. Na ressurreição o corpo de Cristo transformou-se, adquiriu uma forma que rasgou as fronteiras do espaço e do tempo, podia manifestar-se a diversas pessoas simultaneamente em locais diferentes. Mas nada disto é uma questão científica. Não seria possível tirar fotografias a Jesus Ressuscitado, nem arrancar-lhe um cabelo para analisar no laboratório. Tudo isto pode parecer muito estranho, e realmente, os primeiros discípulos levaram algum tempo até entenderem o que se tinha passado. E isso mudou-lhes radicalmente a vida, a deles e a de milhões de outras pessoas ao longo dos séculos.
Alfredo
Caro João,
ResponderEliminar“A necessidade que alguém tenha de acreditar em X não torna X mais plausível. Portanto quando se discute a existência de X um dos argumentos mais fracos que pode ser apresentado é esta necessidade.”
Realmente este não é propriamente um argumento que tenda a mostrar que Deus existe. Verdade é, porém, que muitas das necessidades que sentimos, por exemplo a de amarmos e sermos amados, não são sempre ilusões.
A selecção natural explica a ‘propensão dialogante’. A selecção natural explica também a vantagem da vida em grupo para a maior parte dos animais. A selecção natural dificilmente explica muitas características da cultura, algumas das quais vão em sentido contrário ao da selecção natural, como a protecção dos mais fracos. E a cultura acaba por conduzir a selecção natural em muitos aspectos, incluindo o carácter intrinsecamente dialógico dos seres humanos.
Alfredo
Caro Alfredo Dinis,
ResponderEliminar«Não me parece que a posição da pessoa seja tomada a sério, apenas tolerada por alguém que sabe que é uma ilusão mas não quer acordar ninguém dessa ilusão.»
Folgo então em saber que considera que a posição do Ludwig é tolerante. Eu concordo.
Mas para lhe parecer que o Ludwig toma a posição da pessoa a sério seria necessário que ele não considerasse que a pessoa em questão estivesse iludida, ou bastaria - caso considerasse - ter vontade de acordar a pessoa dessa ilusão?
Parece-me uma pergunta importante.
Quanto à ressurreição, acabei por não compreender se aceita a definição de ressurreição que citei, mesmo não obstando às distinções que estabeleceu entre reanimação e ressurreição.
Mas se não aceita a definição em questão, sugiro que o Alfredo proponha uma.
Aí responder-lhe-ei de imediato se acredito que o raciocínio que descrevi ao Paulo Sustelo se aplica ou não.
Tanto quanto sei, creio que é necessário cometer heresia para propor uma definição de ressurreição sem qualquer componente sobrenatural. Desta forma creio que o raciocínio exposto se mantém.
Paulo Sustelo,
ResponderEliminar(muito rapidamente porque me pifou a fonte de alimentação do PC, e agora estou a desenrascar com o portátil, e já com pouca cabeça para o que quer que seja :)
Acho que estás a depender demais do falsificacionismo.
Imagina que eu ponho a hipótese de pesar apenas 50Kg. Ponho-me na balança, e a balança indica 100Kg. Não falsifiquei a hipótese, porque pode ser que a balança esteja estragada. Peso-me noutra e dá outra vez 100Kg. Pode estar mal também. E assim por diante.
Na prática a falsificação é apenas o encontrar de uma alternativa mais plausível. É mais plausível que pese 100Kg do que 50Kg, porque a primeira explica os dados melhor que a segunda.
Quando temos uma hipótese do tipo "existe X" tal que não se possa testar, então, como não se pode testar, essa hipótese não explica dados nenhuns. E como o conjunto de afirmações do tipo "existe X" é infinitamente maior que o conjunto dos X que de facto existem, o mais plausível é que não exista.
Se reparares isto aplica-se universalmente, e tu próprio o aplicas. Aplicas ao veneno indetectável na água da tua torneira, aos tijolos invisíveis voadores à porta de casa, aos tigres ninja que se escondem nos teus armários e assim por diante. Todas estas hipótese acerca da eixistência de coisas para as quais não temos quaisquer indícios são rejeitadas. Nem sequer ficas na dúvida, porque se tivesses dúvidas acerca do veneno na água não a bebias com certeza.
Isto é o que a ciência faz com a astrologia, os videntes que dizem falar com os mortos e assim por diante. Em rigor, não consegues falsificar nada disto porque pode-se sempre invocar hipóteses auxiliares para explicar as discrepâncias. Mas isso torna-se num programa degenerativo e acabam por ser rejeitadas como falsas.
O deus do Alfredo é assim. Se postulares que existe um deus omnipotente acerca do qual a ciência não pode tirar quaisquer conclusões ficas numa situação análoga à de postulares que tens tigres invisíveis em casa. Não podes fazer nada. E não há justificação nenhuma para postular essas coisas.
«Serão improváveis, é certo, mas da probabilidade 0,000001 à probabilidade 0 vai um infinito contínuo.»
As hipóteses não são improváveis, porque a sua verdade não é uma variável aleatória. Não há algures um dado lançado cada vez que alguém diz “Deus existe” de forma a que uma vez em cada milhão seja verdade.
O que são é implausíveis. E o que a ciência faz com hipóteses implausíveis é precisamente considerá-las falsas. Até porque a ciência nunca pode provar conclusivamente, para além de qualquer possibilidade de revisão, que uma hipótese é falsa (ou verdadeira).
Por isso, quando calculas a órbita de um satélite, não consideras a probabilidade de Deus fazer-lhe milagres, de extraterrestres o roubarem, do professor Bambo ter mesmo poderes e transformar o satélite numa couve e assim por diante, integrando a probabilidade infinitésima de cada uma de infinitas hipóteses disparatadas. Simplesmente são tão pouco plausíveis que as consideras falsas.
Caro João Vasco,
ResponderEliminarA questão está em considerar que a pessoa está iludida, quando não tem a certeza absoluta de que assim seja.
A definição de ressurreição de Jesus dada na wikipedia não corresponde certamente à concepção da Igreja Católica. Os primeiros cristãos tiveram a experiência do encontro com Jesus ressuscitado, mas não tiveram nenhuma curiosidade em que Jesus lhes explicasse como tinha acontecido o fenómeno da sua ressurreição ao minuto. Para os primeiros cristãos, como para todas as gerações posteriores, as explicações do género filosófico ou científico são muito menos significativas - para além de inatingíveis - do que a experiência de vida de encontro com Jesus ressuscitado. Há quem se interesse pelo sudário de Turim e até quem procure mesmo inferir dali como se teria dado a ressurreição de Jesus. Mesmo que isso fosse alguma vez possível de realizar, permaneceria sempre uma curiosidade dispensável.
O João esperaria talvez que eu lhe demonstrasse que Jesus ressuscitou e como foi que isso aconteceu. Não sei. Como já tenho dito noutras ocasiões o que me faz feliz como ser humano e como cristão é mais o saber viver do que o saber explicar. Estes dois aspectos da existência humana não se contradizem, é certo, mas eu baseio a minha vida naquilo que é mais urgente, o saber viver. O saber explicar científico também é importante, e eu procuro estar sempre actualizado em áreas como a física, a astrofísica, a biologia e as neurociências. Mas a minha felicidade, como a de muitas outras pessoas, devo confessá-lo, não depende das constantes descobertas científicas.
Saudações,
Alfredo
Alfredo,
ResponderEliminarAmanhã respondo melhor, mas agora só queria dizer que levo a tua posição a sério. É por isso que te respondo e troco estes comentários contigo.
O que se passa é que, pelo meu treino e pela minha maneira de ser, não consigo ter respeito por hipóteses. Para mim, hipóteses acerca dos factos são apenas coisas para determinar se são verdade ou não. A tua hipótese de ser necessário uma pessoa omnipotente para que o universo seja possível não tem fundamento, e é o tipo de hipótese que exige um fundamento sólido para que não seja descartada como falsa.
Alfredo,
ResponderEliminar«A questão está em considerar que a pessoa está iludida, quando não tem a certeza absoluta de que assim seja.»
Tu achas que as conversas que a Alexandra Solnado diz ter com Jesus são mesmo como ela relata?
Tens a certeza absoluta?
Eu acho que é perfeitamente razoável concluir que uma pessoa está iludida sem que para isso se exija primeiro uma certeza absoluta. Até porque a certeza absoluta nem faz sentido.
Eu tenho uma certeza relativa de que tu estás iludido quanto a estas coisas do teu deus e afins. A razão é que, com os dados que tenho, a hipótese de isso ser apenas histórias inventadas por humanos é muito mais plausível do que a hipótese de haver uma pessoa omnipotente que criou o universo, sem a qual o universo não existiria, acerca da qual a ciência não pode avaliar qualquer hipótese, que transubstancia hóstias, que engravidou Maria por milagre e assim por diante.
É claro que não tenho uma certeza absoluta, mas a conjunção dessas proposições é tão pouco plausível que até deixam a Alexandra Solnado para trás...
Caro Alfredo,
ResponderEliminarConsidera que quem acredita na Astrologia está iludido?
Note que eu não estou a afirmar que a religião e a astrologia têm a mesma natureza ou estão na mesma categoria. Eu quero apenas saber se o Alfredo considera que quem acredita na Astrologia está, ou não, iludido.
«A definição de ressurreição de Jesus dada na wikipedia não corresponde certamente à concepção da Igreja Católica. »
Devo confessar que isto me causa algum espanto.
A que parte de «No Cristianismo, a ressurreição de Jesus refere-se ao retorno à vida (corporal) de Jesus três dias após a sua morte por crucificação. É um elemento fundamental da fé e da teologia cristãs» é que a Igreja Católica Apostólica Romana obsta?
Gostaria mesmo de saber.
«O João esperaria talvez que eu lhe demonstrasse que Jesus ressuscitou e como foi que isso aconteceu.»
Não esperaria tal coisa. Nem sei porque é que o Alfredo assumiu isso a meu respeito.
Mas esperaria que, obstando à definição que apresentei, seguisse a minha sugestão de apresentar a definição que lhe parece correcta.
Ou seja, que respondesse à exacta pergunta que me fez: o que entende por ressurreição?
Satão foi lançado ao poço sem fundo durante mil anos, Cristo ressuscitará e reinará com os mártires cristãos ressuscitados, Satão, Gog e Magog perderão a batalha com Cristo e os homens bons
ResponderEliminaretc etc erguer-se-ão e viverão com Jesus
essencialmente a vida pressupõe carne
montes de células vivas
do espírito imaterial (
Caro João,
ResponderEliminarNão acredito na astrologia, mas não tenho nada a opor a que os astrólogos se reúnam para discutir as suas ideias e apareçam na praça pública. As sociedades deverão estar culturalmente preparadas para mostrar a falta de fundamento da astrologia, mas não para proibir as suas manifestações e associações públicas.O mesmo se aplica aos benfiquistas, filatelistas, raptados por extra-terrestres, etc.
No que se refere à ressurreição de Jesus, deixo aqui duas passagens do 'Catecismo da Igreja Católica', promulgado por João Paulo II nos anos 90:
§646: A ressurreição de Cristo não foi um regresso à vida terrena, como no caso das ressurreições que Ele tinha realizado antes da Páscoa: a filha de Jairo, o jovem de Naim e Lázaro. Esses factos eram acontecimentos milagrosos, mas as pessoas miraculadas reencontravam, pelo poder de Jesus, uma vida terrena «normal»: em dado momento, voltariam a morrer. A ressurreição de Cristo é essencialmente diferente. No seu corpo ressuscitado, Ele passa do estado de morte a uma outra vida, para além do tempo e do espaço.
§ 647: ninguém foi testemunha ocular do acontecimento da ressurreição propriamente dita e nenhum evangelista o descreve. Ninguém pôde dizer como ela se deu, fisicamente. Ainda menos a sua essência mais íntima, a passagem a uma outra vida, foi perceptível aos sentidos. Acontecimento histórico comprovado pelo sinal do túmulo vazio e pela realidade dos encontros dos Apóstolos com Cristo Ressuscitado, nem por isso a ressurreição deixa de estar, naquilo em que transcende e ultrapassa a história, no próprio centro do mistério da fé.
Saudações,
Alfredo Dinis,sj
Caro Alfredo,
ResponderEliminarO Alfredo afirmou duas coisas que eu já imaginava:
-o Alfredo não acredita na Astrologia
-o Alfredo não acredita que as manifestações e associações públicas relacionadas com a Astrologia deveriam ser proibidas (não vejo como é que qualquer democrata razoável possa acreditar no contrário)
Mas o Alfredo não respondeu à pergunta que lhe tinha feito - se considera que quem acredita na Astrologia está iludido.
Sobre a ressurreição, subentendo que aquilo que o Alfredo tem a obstar à definição que tinha apresentado é a palavra "corporal". O Alfredo afirma que o catolicismo discorda que o retorno à vida de Jesus tenha sido corporal.
É isto? A expressão "return to bodily life of Jesus" está em contradição com aquilo que os católicos acreditam?
É que se não é isto, então creio que a pergunta que fiz permanece sem resposta.
Tanto o indivíduo virtual que acredita que a informação é codificada
ResponderEliminarcomo a outra virtualidade que permanece sem resposta
laboram no mesmo erro
nenhuma informação tem realmente qualquer significado
é o programa animal que dá significado à informação recebida
poder-se-ia dizer o mesmo dos tactismos dos organismos sem células neuronais
ou seja de um modo mais simplificado
ResponderEliminarcada organismo indivídual (ou colectivo) dá o seu
significado particular à informação recebida
pelo que...
Caro João,
ResponderEliminarSim, considero que os astrólogos estão iludidos.
Creio que as passagens do Catecismo sobre a ressurreição de Jesus responde à tua questão sobre o que é a ressurreição:
"A ressurreição de Cristo é essencialmente diferente. No seu corpo ressuscitado, Ele passa do estado de morte a uma outra vida, para além do tempo e do espaço."
A ressurreição de Jesus é a passagem de um estado físico a um outro estado que não está limitado às fronteiras do espaço e do tempo, e que mantém a capacidade de se manifestar em relações inter-pessoais, não limitadas ao espaço e ao tempo".
Saudações,
Alfredo