Treta da semana: preço, valor e custo.
No site do MAPiNET, uma notícia alega que «O valor dos conteúdos piratas na Internet, em Espanha, alcançou, no primeiro semestre de 2010, os 5212 milhões de euros, quatro vezes mais do que os conteúdos legais»(1). O meu primo Miguel, a propósito da nossa conversa sobre o copyright, escreveu que o trabalho de criação artística «leva tempo, e, logo, tem um custo — tem valor» e que, por isso, o autor tem direito a uma contrapartida monetária (2). São dois exemplos de uma confusão entre conceitos diferentes e que, com ou sem intenção, cria a ilusão de um problema onde ele não existe.
O dinheiro que trocamos por algo não é o valor dessa coisa. É o preço, e é fácil ver que não pode ser igual ao valor. Se compro iogurte por um euro é porque o iogurte que comprei vale mais, para mim, do que o euro que paguei. Se valesse o mesmo não me dava ao trabalho de ir à loja comprá-lo. E se o merceeiro me vende o iogurte é porque, para ele, o euro que recebe vale mais. O próprio dinheiro tem um valor diferentes para pessoas diferentes. Um euro não vale o mesmo para ricos e pobres. Além disso, o preço só reflecte estas diferenças de valor numa transacção comercial. No restaurante pago pelo almoço, mas em casa de um amigo não saco da carteira no fim da refeição. Se quero retribuir convido-o a almoçar em minha casa ou levo a sobremesa.
Os tais «5212 milhões de euros» de «conteúdos piratas na Internet, em Espanha» são treta, mesmo ignorando a argolada da “Internet em Espanha”. Esse número não tem sentido porque é um preço atribuído a coisas que são partilhadas sem fins comerciais. Os valores envolvidos são o gozo de ver, ouvir e partilhar, e ninguém paga milhões de euros por ficheiros descarregados do Rapidshare ou partilhados em torrents.
O que eles querem dizer é que este poderia ser o preço se controlassem exclusivamente a cópia e se a procura permitisse um mercado cinco vezes maior. Ou seja, é pura ficção. Mas ilustra um problema com os preços. O preço é uma medida justa da transacção apenas se as partes interessadas negociarem em igualdade de circunstâncias. Nesse caso, o preço fica no equilíbrio dos diferentes valores que os intervenientes atribuem ao que se transacciona. Mas quanto mais vantagem tiver uma das partes mais injusto será o preço, pois ficará mais distante desse equilíbrio. Os camponeses que colhem o café na Colômbia ganham uma miséria, não porque dêem pouco valor ao dinheiro ou porque o seu café não preste mas porque não têm outra possibilidade senão a de aceitar um mau negócio.
É isto que querem o MAPiNET e companhia. O negócio com o merceeiro é entre iguais. Ele não me pode tirar o dinheiro nem eu posso roubar o iogurte, mas se compro o iogurte posso fazer mais iogurte em casa copiando-o as vezes que quiser. Basta leite morno, e quem quiser vender iogurte tem de competir com isto. O copyright, como o temos hoje, serve para desequilibrar a negociação, proibindo uma das partes de copiar, para que a outra possa ditar os preços como entender.
O que me traz à outra confusão. O meu primo Miguel defende que a cópia tem de ter um preço porque a obra tem um custo. Isto confunde custo com valor e preço. Não é por algo custar a fazer que tem automaticamente valor, e nem tudo o que tem valor tem de ser transaccionado por um preço. Pior ainda, confunde cópia com criação. A criação da obra pode ter custo e, conforme a obra, pode ter valor. Também pode não ter, pelo que, se algum preço tiver, será aquele que o criador negociar com os interessados em troca do seu trabalho de criar a obra. É uma forma justa de decidir se vale a pena pagar esse trabalho ao autor. Justa não só por não depender de proibições como também por se decidir antes do autor ter o trabalho.
Há quem, como o MAPiNET, que defende que a partilha de ficheiros é um problema económico, inventando milhões de euros onde nem cêntimos há. Há outros, como o meu primo, que alegam tratar-se de um problema moral, como se partilhar informação fosse algum pecado. E há aqueles que dizem ser um problema legal porque as proibições são demasiado fracas (3). Mas o “problema”, que nem problema é, é que a cópia deixou de ter custos ou valor, e só à força de proibições absurdas é que consegue ter preço. Isto só parece um problema porque o autor esteve tanto tempo na sombra do distribuidor que a maioria julga só se poder pagar pela cópia e não pela criação da obra. Mas esta é a única solução razoável. O autor decide quanto quer pelo seu trabalho, o público decide quanto quer pagar pela obra e entre eles que se entendam. O resto é treta.
1- MAPiNET, Conteúdos ilegais valem quatro vezes mais que os legais em Espanha
2- Luís Miguel Sequeira, A perversidade da eliminação da propriedade intelectual
3- «Lutámos e conseguimos alterar a Lei da Rádio […] chegou o momento de alargar esta questão à Internet», afirma o João Gil, mostrando que a solução é obrigar, pela força da lei, as pessoas a gramar o que lhes dá jeito a eles. Público, Artistas reuniram-se para debater pirataria e tentar alterar a lei, via o FriendFeed da Paula Simões
LUDWIG KRIPPAHL (LK), O INCAUTO CIDADÃO (IC), A AUSÊNCIA DE CULTO DE PERSONALIDADE NA CIÊNCIA E OS GRANDES "AVANÇOS" DESDE DARWIN!
ResponderEliminarLK: Sabes, estou convencido que os micróbios se transformaram em microbiologistas ao longo de milhões de anos e que os criacionistas fazem alegações infundadas acerca dos factos.
IC: A sério? Grandes afirmações exigem grandes evidências!! Quais são as tuas? Se forem realmente boas, convencerão certamente os criacionistas!
LK: É simples! Na ciência não temos papas nem culto de personalidade. Avançámos muito desde Darwin...
IC: Aparentemente, isso é impressionante! Venham de lá esses avanços! Mal podemos esperar!!
LK: Estes avanços vão esmagar os criacionistas. Cá vai:
1) moscas dão… moscas
2) morcegos dão… morcegos
3) gaivotas dão… gaivotas
4) bactérias dão… bactérias
5) escaravelhos dão… escaravelhos
6) tentilhões dão… tentilhões
7) celecantos dão… celecantos (mesmo durante supostos milhões de anos!)
8) guppies dão… guppies
9) lagartos dão… lagartos
10) pelicanos dão… pelicanos (mesmo durante supostos 30 milhões de anos!)
IC: Mas...espera lá! São esses os tais "avanços" na teoria da evolução? Lamento informar mas é isso que a Bíblia ensina, em Génesis 1, quando afirma, dez vezes, que os seres vivos se reproduzem de acordo com o seu género. Os teus "avanços" nada mais fazem do que confirmar a Bíblia!
LK: Sim, mas os órgãos perdem funções, total ou parcialmente, existem parasitas no corpo humano e muitos seres vivos morrem por não serem suficientemente aptos…
IC: Mas…espera lá! A perda total ou parcial de funções não é o que Génesis 3 ensina, quando afirma que a natureza foi amaldiçoada e está corrompida por causa do pecado humano? E não é isso que explica os parasitas no corpo humano ou a morte dos menos aptos? Todos esses "avanços" confirmam Génesis 3!
Afinal, os teus exemplos de "avanços" desde Darwin corroboram o que a Bíblia ensina!! São esses os teus melhores argumentos? Como queres que os criacionistas mudem de posição se os teus argumentos lhes dão razão?
Não consegues dar um único exemplo que demonstre realmente a verdade aquilo em que acreditas? Venha de lá mais um "avanço"!...
LK: …a chuva cria informação codificada…
IC: pois, pois… as gotas formam sequências com informação precisa que o guarda-chuva transcreve, traduz, copia e executa para criar máquinas para fabricar disparates no teu cérebro… cá para mim estás chumbado a pensamento crítico! Acho que tens um problema sério com esses teus "avanços"...
P.S. Todos os exemplos deste texto foram realmente usados pelo Ludwig para provar a evolução!! Serão estes os grandes "avanços" desde Darwin?
INFORMAÇÃO NO GENOMA: A CONFUSÃO DO LUDWIG E A AJUDA DO SEU DIRECTOR ESPIRITUAL RICHARD DAWKINS
ResponderEliminarOs criacionistas usam um raciocínio simples e irrefutável.
1) Um código e informação codificada têm sempre origem inteligente (nunca ninguém desmentiu isso com base numa observação)
2) A vida depende de um código e de informação codificada de extrema complexidade e densidade (nunca ninguém desmentiu isso com base numa observação)
3) Então, a única conclusão científica e racional é que a vida teve uma origem inteligente.
É claro que o Ludwig tentou desmentir 1) dizendo que a chuva cria códigos!
É uma afirmação demasiado estúpida para ser levada a sério.
Também tentou desmentir 2) dizendo que o código genético não é mais do que a descrição humana de reacções químicas.
Também é uma afirmação demasiado estúpida para ser levada a sério.
O código genético não é um conjunto de letras ou símbolos criados pelo ser humano para descrever reacções químicas.
Ele é o programa genético com as instruções para definir as reacções químicas necessárias à produção e reprodução de diferentes seres vivos altamente complexos.
O código genético não foi criado pelos cientistas. Ele existe no núcleo das células desses mesmos cientistas.
Não é o código genético que deve a sua existência aos cientistas.
São os cientistas que devem a sua existência ao código genético.
Esta é a grande confusão (eventualmente deliberada) do Ludwig.
Talvez Richard Dawkins, o director espiritual do Ludwig, possa explicar esta matéria ao seu inexperiente acólito.
A propósito do DNA muitos têm dito que as letras do código são as bases químicas ACGT, as palavras são os codões, as frases são os genes os s capítulos são os cromossomas.
Isto, para não falar da informação epigenética.
É por isto ser assim que Richard Dawkins reconhece que a genética se transformou num domínio da tecnologia da informação.
Richard Dawkins é claro quando afirma que o código genético é verdadeiramente digital exactamente como se passa com os códigos informáticos.
Para ele, isso não é uma analogia vaga, mas é literalmente assim.
Nas palavras de Richard Dawkins, o DNA transporta informação de forma semelhante aos computadores, sendo possível medir a capacidade do genoma em bits.
Para Richard Dawkins, o DNA não usa um código binário, como 0 e 1, sendo antes um código quaternário em que as unidades de informação são os nucleótidos ACGT.
Para sublinhar como a vida depende de informação codificada, Richard Dawkins, no seu último livro, “The Greatest Show On Earth; Evidence of Evolution”, New York, Free Press, 2009, p. 405, diz claramente que:
“a diferença entre vida e não vida não é uma questão de substância, mas de informação. Os seres vivos contêm quantidades prodigiosas de informação.
A maior parte dessa informação está digitalmente codificada no DNA, e existe ainda uma quantidade substancial codificada de outros modos”.
Ou seja, para Richard Dawkins, tal como para os criacionistas, a vida depende de informação codificada no genoma.
É exactamente isso que nós dizemos na afirmação 2).
Portanto, se 1) e 2) são verdadeiras, então 3) é a única conclusão racional.
Por isso dizemos que o ateísmo é errado e irracional.
O Ludwig é um triste professor de pensamento crítico que está encurralado pela ciência e pela lógica daquilo que, em tom de brincadeira, e para "picar" o Ludwig, designámos por "forquilha criacionista"..
Vejam como com ela grelhamos o Ludwig no espeto...
É o preço, e é fácil ver que não pode ser igual ao valor.
ResponderEliminarSe compro iogurte por um euro é porque o iogurte que comprei vale mais, para mim, do que o euro que paguei.
Se valesse o mesmo ....não comprava alimentos e passava fome
ainda se fosse o valor de um livro
custa 33euros 50% para o editor 10% para o autor 20%distribuidor
se tentasse vender esse livro num alfarrabista dar-lhe-iam 2,3 ou 0 euros por ele se por exemplo fosse aprenda windows vista
o exemplo de um bem alimentar foi uma má ideia
Jah Tah,
ResponderEliminar«o exemplo de um bem alimentar foi uma má ideia»
O exemplo do iogurte foi escolhido porque é trivial copiar um iogurte. É quase tão fácil como copiar um ficheiro de uma música. Apesar das empresas que os produzem terem imenso trabalho a isolar as estirpes de lactobacilos, nós podemos pegar naquilo, em leite morno e toca de fazer mais iogurte.
E um bem alimentar é ilustra perfeitamente como o valor de algo não é uma constante universal mas sim uma classificação volátil e subjectiva. Basta ver o valor da comida quando estamos cheios de fome ou depois de uma almoçarada.
Apesar das empresas que os produzem terem imenso trabalho
ResponderEliminarnem por isso isso do casei imunitase é treta....
a isolar as estirpes (são variantes dentro da espécie, a variabilidade é tanta que ao fim de 24 horas os bioreactores já tresandam a 1500 estirpes novas)de lactobacillus bulgaricus ou Bifidobacterium B. lactis and L. acidophilus nós podemos pegar naquilo...no inóculo quer dizer
num necessita há esporos em todo o lado
o leite azeda rápido
com 37 anos deve haver uma yogurtera espanhola lá em casa no?
é mais rápido
em leite morno e toca de fazer mais iogurte
se tiver morno....demora mais o que é morno para um
é frio pró Streptococcus thermophilus
pus um nome específico em minúsculas ...um crime
Lactococcus tambien
Ludwig,
ResponderEliminar«Apesar das empresas que os produzem terem imenso trabalho a isolar as estirpes de lactobacilos, nós podemos pegar naquilo, em leite morno e toca de fazer mais iogurte.»
O que nos leva às patentes de OGM... Será que alguns argumentos contra a cópia a favor da remuneração do produtor defendem, implicitamente, o direito da Monsanto de patentear milho transgénico?
uma estirpe boa.....é só beber Dose - 200.000.000.000 por dia
ResponderEliminaracho que foi prá probiotics inc.
Decrease in flatulence and abdominal discomfort
Nobaek et al (Am J Gastroenterol 2000)
Lactobacillus plantarum D5M9843 (a D5M9837 também num é mala)
Route – drink (approx. 400 cc)agora os 4 decilitros já custam a descer
Randomized, double-blinded, placebo-controlled
60 subjects entered; 52 completed
Rome criteria; 4 weeks deviam ter posto 2 meses mas tempo is money
Bacteria recovered from the stool...yep
Ludwig,
ResponderEliminarSe toda a gente for livre de partilhar o que quer que seja e as vezes que quiser, basta que apenas uma pessoa compre, por exemplo, um dvd, e que partilhe pelos seus amigos sem cobrar por isso, podendo tais amigos fazer o mesmo aos amigos deles e por aí fora, tudo isto revertendo num único dvd vendido. Ainda não percebi ao certo, acha ou não que este cenário deva ser regulado?
Abraço
Rapaz, até que enfim uma aula de economia filosófica muito saudável.
ResponderEliminarNuno,
ResponderEliminar«Se toda a gente for livre de partilhar o que quer que seja e as vezes que quiser, basta que apenas uma pessoa compre, por exemplo, um dvd, e que partilhe pelos seus amigos sem cobrar por isso, podendo tais amigos fazer o mesmo aos amigos deles e por aí fora, tudo isto revertendo num único dvd vendido. Ainda não percebi ao certo, acha ou não que este cenário deva ser regulado?»
Não. Se copiar DVD é algo que qualquer pessoa pode fazer gratuitamente, não faz sentido nenhum proibi-lo só para que a cópia do DVD passe a ser um serviço pago. Se alguém quiser fazer dinheiro da cópia tem de competir em igualdade de circunstâncias com a cópia gratuita. Isso faz tanto sentido como proibir o uso dos teclados para garantir negócio aos dactilógrafos.
O que tem valor agora é a criação de obras. Mas essa não precisa ser regulada porque o artista pode pedir uma remuneração pelo seu trabalho e optar por não fazer o trabalho se não lhe prometerem pagamento. É aí, e não na cópia, que os incentivos à criatividade agora têm de operar. Ao contrário do que se passava há umas décadas, pois nessa altura não adiantava de nada ter bons escritores e compositores se não tivéssemos fábricas de livros e discos e lojas para os distribuir.
Francisco Burnay disse...
ResponderEliminarSerá que alguns argumentos contra a cópia a favor da remuneração do produtor defendem, implicitamente, o direito da Monsanto de patentear milho transgénico
o milho transgénico assim como os microorgs
gen. alterados para produzirem insulina
são um problema vital
os custos da investigação e da produção de sementes
não se compadecem com cópias piratas
ou com sementes ou pólen que escapam aos patenteadores
Quando escrevi, na frase que citas, que o trabalho de alguém «tem custo — tem valor» não escrevi que as coisas valem o que custam, mas sim que têm custo e que têm valor :)
ResponderEliminarNa tua cruzada para acabar com o direito aos artistas de poderem trabalhar como querem e de estabelecerem os contratos de utilização dos produtos do trabalho acho que perdes demasiado tempo em brincares com definições de palavras em vez de te concentrares no fundamental.
Nada tenho contra discutir definições e palavreado, mas quando o último argumento em favor de uma ideologia é discutir o que é que as palavras querem dizer, o argumento está de certeza mal fundamentado. Velhas regras de oratória... ;)
Miguel (LMS),
ResponderEliminar«Na tua cruzada para acabar com o direito aos artistas de poderem trabalhar como querem»
Eu não tenho nada contra os artistas trabalharem como quiserem, desde que as pessoas para quem eles trabalham também o queiram, obviamente. O trabalho é uma transacção que se quer voluntária de ambas as partes; tal como nenhuma coisa tem valor por si, mas apenas pelo valor que, subjectivamente, cada pessoa lhe dá, também ninguém tem o direito de trabalhar “como quer”, independentemente dos direitos de quem paga por esse trabalho.
O que oponho é que os artistas tenham o direito de proibir coisas como partilhar informação e copiar ficheiros só para que possam obrigar as pessoas a pagar por aquilo que se pode copiar e distribuir de graça. Isso é como alguém fazer uma estátua na rua e reivindicar o direito de exigir dinheiro a quem olhar para a estátua. Não é um direito do artista. É um abuso dos direitos dos outros.
Portanto, se um artista quer ser um profissional da sua arte deve, primeiros, demonstrar que merece ser pago. Outros profissionais passam anos em formação, não vejo porque o artista tenha o direito de estar isento de primeiro mostrar o que vale. E, depois, se houver quem lhe dá valor, então que ofereça o seu trabalho contra remuneração. Como todos os profissionais fazem. Dá o orçamento, e se os clientes quiserem então pagam.
Essa coisa de fazer a musiquinha e com isso proibir toda a gente de copiar esses bytes é um disparate, não é direito nenhum.
Ludi,
ResponderEliminarNão podes dizer numa frase "eu não tenho nada contra os artistas trabalharem como quiserem" e depois na frase seguinte dizeres "oponho é que os artistas tenham o direito de proibir coisas"! Num contrato de trabalho, define-se o que se faz e o que não se pode fazer; cabe a ambas as partes decidir se o aceitam ou não.
Porque é que não és intelectualmente honesto e dizes logo desde o início que tens, de facto, imensa coisas contra os artistas trabalharem como quiserem, e que queres — não, insistes — que eles trabalhem apenas e exclusivamente de acordo com uma lista pré-definida de regras criadas por ti?
"Não é um direito do artista. É um abuso dos direitos dos outros." Pelo menos em estados de direito como o nosso, que se regem por uma ideologia democrática, com um mercado livre e reconhecendo o direito à remuneração pelo trabalho, assim como garantindo a liberdade de contratualização de serviços: o artista tem todo o direito de trabalhar como muito bem entende e como muito bem quiser, depois cabe é ao consumidor exercer a liberdade de aceitar ou não os termos e condições do mesmo (desde que a tarefa contratualizada não seja, por si só, ilegal, ou que viole direitos dos consumidores). Como em todos os contratos. Ninguém "obriga" aos consumidores a aceitarem esses termos e condições. Se não gostarem do que o artista "exige", não lhe comprem o serviço. Quanto menos pessoas estiverem disponíveis para comprar o serviço nos termos "exigidos", menor será o interesse do artista em "exigir" esses termos. E, pelo contrário, havendo liberdade de escolha, os consumidores utilizarão os serviços prestados por artistas que apresentem termos e condições mais aceitáveis. Os "outros" não têm qualquer "direito" a exigir que as pessoas trabalhem de acordo com os seus interesses — têm, sim, o direito de estabelecerem um contrato com quem quiserem e adquirirem bens e serviços de acordo com esse contrato, desde que ambas as partes concordem com os termos do contrato. E têm, obviamente, o direito a recusar os termos do contrato e a não adquirir o bem ou serviço, se não concordarem com os termos. Agora não têm é o direito de dizer às outras pessoas como é que elas "devem" fazer contratos! E mesmo que o tivessem, seria pelo menos honesto dar-lhes a liberdade de poderem dizer o que pensam dessas ideias...
Por isso concordo com o que dizes no 3º parágrafo: "E, depois, se houver quem lhe dá valor, então que ofereça o seu trabalho contra remuneração. Como todos os profissionais fazem. Dá o orçamento, e se os clientes quiserem então pagam." Nem mais. Se os consumidores não quiserem o trabalho do artista nos termos e no orçamento apresentado, não pagam. Azar do artista.
ResponderEliminar"Essa coisa de fazer a musiquinha e com isso proibir toda a gente de copiar esses bytes é um disparate, não é direito nenhum." É um disparate para ti que não tens o azar de teres nascido artista numa sociedade que devia já ter reparado que até o Fidel Castro admite em público que se calhar o comunismo em Cuba não foi lá das melhores ideias que apareceram no século XX...
Seja como for, para a tua grande felicidade, à custa de tanto lixar a vida aos artistas, eles já acabaram por desistir dessa fonte de receitas... já falei com alguns agentes (portugueses; não sei o que pensam lá fora) que actualmente se preocupam pouco com a venda de CDs, e procuram é apenas angariar espectáculos para os seus clientes. Do ponto de vista tanto dos agentes como dos artistas agenciados, é inútil lutar contra a pirataria — mais vale concentrar esforços em fazer concertos onde ainda se consegue fazer algum dinheiro. Só as distribuidoras e os lojistas é que estão agora preocupados com a sua sobrevivência; mais uns anitos, e deixaremos de ter FNACs e Wortens e Bertrands a venderem livros e CDs ou a promoverem artistas e autores nas suas lojas e espaços. Felizmente para a sociedade em geral, a arte não vai morrer, até alguém começar a criar um novo movimento anti-artista obrigando a que todos os concertos públicos sejam gratuitos e a inventar novas definições para as palavras "valor", "custo", e "trabalho" para tentar "provar" que um artista em palco não está verdadeiramente a "trabalhar" e que portanto não devia ter "o direito" de exigir dinheiro pelos bilhetes para as pessoas assistirem ao seu espectáculo.
Se calhar irão argumentar que a transmissão de ondas sonoras mecanicamente através de um meio que está no domínio público (o ar) e cobrar dinheiro por isso é um "abuso dos direitos dos outros" e que como tal devia ser condenado — o ar é livre, porque é que deveríamos ser "obrigados" a pagar pelo "direito" de estar num ambiente com ar (gratuito) permeado de ondas sonoras? E argumentar-se-á que quando uma pessoa está a assobiar na rua é um "disparate" pensar que pode cobrar aos outros pelo direito de estarem a ouvir esses assobios, e que, como tal, a diferença entre estar a "assobiar na rua" ou "cantar ao ar livre" é nula, logo, não faz sentido "conceder o direito" aos artistas de cobrarem dinheiro por isso...
Vais dizer que nunca afirmaste nada disso. Pois não. Mas dá-lhe tempo. Alguém há-de chegar a essa argumentação mais cedo ou mais tarde.
Miguel (LMS)
ResponderEliminarUm contrato é um acordo voluntário que as partes celebram, informadamente. Pode ser um contrato padrão, como o de venda, que é sempre igual e concede sempre os mesmos direitos (o vendedor tem o direito de receber o valor indicado no preço, o comprador fica com o objecto comprado e pode emprestá-lo, vendê-lo, desmontá-lo, usá-lo numa escultura, o que quiser). Ou então pode ser um contrato mais elaborado que só é válido se assinado ou algo equivalente, indicando que ambas as partes o leram. Mas mesmo esse tem restrições impostas por lei. Não se pode prescindir do direito a férias ou prometer conduzir o autocarro 40h seguidas, por exemplo.
O problema de ver o copyright como um contrato é que o contrato tem de ser celebrado voluntariamente. Se tu escreves um poema na casa de banho e a lei proíbe milhões de pessoas de partilhar qualquer representação numérica dessa sequência de caracteres, isso não é um contrato. E é esse problema que eu aponto (a proibição, não o escreveres poemas na casa de banho que, desde que seja na tua e não haja mais ninguém aflito em casa, está bem :)
E o direito de “trabalhar como se quer” só faz sentido se for o direito de negociar os contratos e de os aceitar ou não conforme se queira. Direito esse que abrange todas as partes envolvidas em qualquer contrato, não apenas os artistas. Por isso é injusto um sistema em que o artista cria algo e a lei automaticamente lhe concede um monopólio sobre todas as representações dessa obra. Justo é um sistema em que o artista é livre de negociar com os compradores se há de criar a obra ou não. Sistema esse que não sobrevive à concessão de monopólios.
Mas mais sobre isso no post sobre o teu post e a política académica.