sexta-feira, fevereiro 29, 2008

Propriedade estranha.

Apontaram-me hoje para dois artigos de opinião no LA Times que mostram alguns dos problemas da propriedade intelectual. Eu tenho um CD que já não quero e conheço alguém interessado em comprar-mo, mas como o preço que eu peço não lhe agrada, o meu comprador decide copiá-lo em vez de o comprar. A lei condena mas é difícil ver porquê. O raciocínio é tortuoso mesmo sem sair do ponto de partida.

A indústria discográfica diz que copiar é errado porque é roubar, o que é um disparate, como explica Jon Healey (1). A informação no CD é um bem inesgotável e pode ser distribuída sem roubar nada a ninguém. Então copiar deve ser errado porque priva alguém de uma venda. Também faz pouco sentido porque privar terceiros de uma venda oferecendo uma transacção mais atraente é a base da nossa economia. Por si só não pode ser errado. Então deve ser errado neste caso porque permite que alguém goze a música sem recompensar o criador. Mas isto implica ser errado emprestar o CD, tocá-lo ao pé dos amigos ou comprá-lo em segunda mão. Ah, mas isso é diferente. Nesses casos não se faz uma cópia do CD, mas neste caso é errado porque se fez uma cópia. Ficamos assim a saber que copiar o CD é errado porque é copiar o CD.

Apesar de circular e inútil, este argumento é persuasivo pela sensação que tem que haver algum mal em copiar. Mesmo quando não se sabe o quê. Mesmo quando a venda perdida é em segunda mão e o autor não receba um cêntimo de qualquer maneira. A sensação é que a música é propriedade do autor e isto viola os seus direitos de proprietário. Mas o mal aqui não está na cópia. Está nesta noção de ideias como propriedade.

Dallas Weaver escreve que esta estranha propriedade não tem custos nem paga taxas ou impostos (2). A lei diz que a minha casa é propriedade privada mas quem a protege somos principalmente nós que aqui vivemos. A manutenção, a porta trancada, não abrir a porta a estranhos e assim por diante. Os meus livros e o computador tambem estão protegidos pela lei mas, principalmente, estão protegidos por estar aqui em casa com a porta da rua fechada. Além disso pago impostos quando adquiro bens materiais e pago impostos pela casa e pelo carro.

A “propriedade” intelectual não tem custos. Não tem manutenção, não paga impostos e até o dever de a proteger recai sobre a sociedade em vez de sobre o “proprietário”. Se eu deixar os livros na rua e ficar sem eles a polícia não vai fazer muito para os reaver. Mas quem vende CDs ao público tem polícia anti-cópia paga pelos impostos dos outros.

O resultado é um espólio enorme de obras inacessíveis porque os gestores de direitos não lucram com a venda de cópias mas também não querem ceder “propriedade” ao domínio público para permitir a distribuição gratuita. Na investigação científica ficam muitos resultados enterrados em publicações suficientemente antigas para não terem sido disponibilizadas electronicamente mas ainda a décadas de ser legal digitalizá-las e torná-las acessíveis aos motores de pesquisa.

Weaver propõe resolver este problema com um imposto de copyright. Quem quiser manter direitos exclusivos sobre uma obra tem que pagar. A proposta tem o mérito de não mexer muito na legislação, sendo a curto prazo mais viável que uma restruturação profunda. E resolve o problema das obras atoladas porque assim que deixam de dar lucro há um incentivo para as colocar no domínio público. Mas é apenas um remendo porque o problema principal é a própria propriedade intelectual.

Antigamente a distribuição dependia do fabrico de cópias com custos significativos. A exclusividade de direitos incidia sobre esse bem escasso que são as formas materiais de transmitir a informação, como livros, discos, filme, etc. Hoje a distribuição é gratuita e por meio de descrições. Um ficheiro mp3 não é uma cópia da música mas uma descrição numérica de um processo que pode gerar a música. Estas descrições são abstractas, arbitrárias e abundantes. Não faz sentido licenciar o direito de descrever coisas nem há vantagem em ter monopólios de distribuição sobre algo que não tem custos. A solução a longo prazo é substituir o modelo dos donos das obras por um modelo de licenciamento comercial para poder incentivar a criatividade sem entupir a distribuição nem atrasar a inovação.

1- Jon Healey, 18-2-08, File ‘sharing’ or ‘stealing’?
2- Dallas Weaver, 20-2-08, Copyright this

13 comentários:

  1. Caro Ludi

    Acabo de responder ao teu pensamento sobre estas coisas dos direitos de autor. Sempre que leio os teus posts sobre este tema fico saudavelmente irritado, mas desta vez não resisti e decidi mesmo implicar contigo. :-)

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  2. Desidério,

    Fizeste bem :)

    Infelizmente, tenho uma treta da semana para acabar, mas nos próximos dias lá voltarei a isto.

    Mas posso dizer já que a tua posição não é muito boa. Defendes proibir toda a gente de partilhar certa informação, incluindo monitorizar comunicações, dedicar recursos legais, policia etc a fiscalizar isto, e isso tudo com a justificação:

    «O que está em causa é apenas isto mesmo: a sustentabilidade económica dos criadores.»

    Para já devo salientar que ficam de fora deste modelo os criadores de modelos científicos, de receitas culinárias, de algorítmos, de fórmulas matemáticas, de jogadas de xadrez, de tácticas de futebol e muitos outros que mantém sustentabilidade económica sem proibir terceiros.

    Além disso, parece-me fraca a justificação. Mesmo que fosse verdade que sem o copyright um músico ou um pintor tivesse que fazer o mesmo que um filósofo ou um matemático para ganhar a vida, parece-me isso bem menos mau que criminalizar a troca de sequências de números, a partilha de músicas, e, essencialmente, uma geração inteira.

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  4. Penso que a ideia de tratar a propriedade intelectual como qualquer outro tipo de propriedade tem o grande mérito de pôr a descoberto as incoerências de quem defende este tipo de protecção.

    Se eu sou proprietário de um lote urbano, sou obrigado a pagar taxas elevadas sobre essa propriedade.

    Caso esteja a fazer especulação imobiliária (manter o terreno por construir à espera que ele valorize) vou ser penalizado ao nível fiscal, até ao ponto de ser mais rentável construir ou vender do que esperar.

    Seria lógico e natural que a propriedade intelectual fosse tratada como as outras propriedades, ou seja, que fosse taxada de modo a incentivar o seu correcto uso.

    Um livro que já não vende o suficiente para justificar a sua propriedade devería ser disponibilizado, e o mecanismo de exigir uma taxa anual sobre o seu proprietário (independentemente de ser vendável ou não) concerteza forçaria o proprietário a dispensar do seu direito.

    Embora não simpatize muito com a ideia de termos mais impostos e taxas, a proposta de taxar a propriedade intelectual tem o mérito de forçar os seus defensores a explicarem as contradições emergentes de quererem uma propriedade nos direitos mas não nos deveres, e por essa via pôr a descoberto a fragilidade e incoerências dos seus argumentos.

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  5. Essa proposta de taxar a propriedade intelecual parece razoável.

    Assim sem mais, fico convencido que seria melhor que a situação actual.

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  6. Ah!
    Mas o Desidério também argumenta bem.
    Vamos ver o que é que vai saír daqui :)

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  7. Olá, Miguel

    Estás a falar de outra coisa completamente diferente: saber quando devem os direitos de propriedade cair no domínio público. Isso é outra discussão. O que está em causa é saber o seguinte: é legítimo ou não que eu faça uma música ou escreva um livro e depois as pessoas copiem isso na Internet e usem sem o meu consentimento e sem me pagar nada?

    E o meu argumento é simples. Estou-me nas tintas para as analogias com lotes de terreno e com o Xadrez e com a ideia das fadas. O que está em causa é ter um sistema quer permita que os criadores possam ganhar dinheiro com as suas criações. Tudo o resto é perfeitamente lateral ao que está em causa e muitas vezes sofístico e até de má-fé.

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  8. Desidério,

    Tens que te decidir acerca do que está em causa...

    Se for:

    «O que está em causa é saber o seguinte: é legítimo ou não que eu faça uma música ou escreva um livro e depois as pessoas copiem isso na Internet e usem sem o meu consentimento e sem me pagar nada?»

    Então tens que considerar se é legítimo:

    Que eu demonstre um teorema, publique a demonstração e as pessoas a usem sem o meu consentimento e sem me pagar nada.

    Que eu crie uma receita, publique-a e as pessoas a usem sem o meu consentimento e sem me pagar nada.

    Que eu descubra a massa do bosão de Higges, publique-a e as pessoas a usem sem o meu consentimento e sem me pagar nada.

    E assim por diante. Porque se o que está em causa é usar o trabalho dos outros sem lhes pagar nada tens que justificar porque é isso é válido para quase toda a criatividade humana excepto para a música e os livros.

    Se «O que está em causa é ter um sistema quer permita que os criadores possam ganhar dinheiro com as suas criações.» podemos bem ter um sistema em que os criadores ganham dinheiro pelo trabalho de criar, entrando previamente num contrato voluntário com quem lhes paga, e, depois de criado oproduto e o trabalho feito e remunerado todos possam usufruir dessas criações sem pagar mais nada.

    E mais uma vez tens que considerar que em 99.9%+ dos casos é exactamente isso que acontece. Na física, na matemática, na filosofia, no ensino, etc. Paga-se às pessoas pelo trabalho, depois usa-se o que elas criaram sem ter que pagar mais nada.

    Parece-me mais má vontade alegar que a música tem que ser excepção sem explicar porquê...

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  9. Desculpem a intromissão, mas...

    Caro ludwig krippahl:

    "Que eu demonstre um teorema, publique a demonstração e as pessoas a usem sem o meu consentimento e sem me pagar nada."

    "Que eu crie uma receita, publique-a e as pessoas a usem sem o meu consentimento e sem me pagar nada."

    A comparação correcta seriá você escrever e publicar um livro sobre um teorema ou uma receita e as pessoas poderem ler o seu livro sen lhe pagar nada.
    Ninguém o proíbe de tocar uma música em casa ou escrever numa parede de sua casa 20 páginas de um livro já publicado. Se você pantentear a receita ou o teorema, ninguém poderá usá-los sem o seu consentimento.


    "Que eu descubra a massa do bosão de Higges, publique-a e as pessoas a usem sem o meu consentimento e sem me pagar nada."

    Duas coisas:
    1. Boa sorte para o Nobel.
    2. Você não criou a massa do bosão de Higgs. A massa do bosão de Higgs não é sua da mesma maneira que as notas e os acordes, as letras e as palavras não são de ninguém.


    "Porque se o que está em causa é usar o trabalho dos outros sem lhes pagar nada..."

    Não. O que está em causa é a propriedade dos outros.

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  10. Olá, Ludi

    A tua analogia não colhe. E eu já te expliquei porquê. Tu queres o seguinte: um sistema arrumadinho, matemático, certinho, em que tudo fique a brilhar como na física. Mas as coisas não são assim nas instituições humanas. É um misto de coisas sistemáticas e de remendos para as coisas funcionarem. Por que razão os matemáticos publicam um teorema e não são pagos por isso? Ou um cozinheiro uma receita? E por que não fazer o mesmo com a música?

    Como eu já te disse, se queremos que as coisas sejam assim todas arrumadinhas, sim, será difícil explicar isso. Mas é um disparate pensar assim. Não há grandes princípios envolvidos. Há apenas uma questão simples: remunerar os criadores para eles poderem criar. Nada mais. Tudo o resto é sofisma. Todas essas conversas sobre a informação e os números e os memes -- é só treta.

    Ora, como eu já expliquei no meu post do DRN, o problema do teu modelo é que é soviético. Obriga todos os músicos, escritores, poetas, a serem funcionários públicos como tu e eu. E isto é mau para a diversidade. É bom que um músico possa viver sem ter de dar aulas. É bom que um autor de livros de ciência possa viver sem ter de dar aulas (como é o caso do excelente Simon Singh). Nada disto é possível no teu modelo. O teu modelo é idiota porque só funciona se um músico dá aulas para viver ou se for tão popularucho que tem milhões de fãs — e então pode fazer como os NIN, pondo a música de borla na internet e quem quiser paga. Isto funciona porque se sabe que 1% das pessoas são suckers e pagam. E é porque elas pagam que os outros podem usufruir disso aparentemente de borla. Este sistema é parasitário em relação ao existente e só subsistem em artistas que atinjam milhões de pessoas. Ninguém jamais conseguirá viver da venda de livros de divulgação científica, por exemeplo, se só 1% das pessoas que os lerem pagarem.

    Agora vejamos o teu caso (e o meu). Os teus alunos pagam à universidade, que com isso paga apenas o sabonete. Sem o dinheiro do resto dos contribuintes, tu comias areia porque a universidade não teria dinheiro para te pagar e tu não conseguirias ter alunos em número suficiente para te pagar a vida. Assim, o resto da malta paga, quer queiram quer não, através dos impostos, a tua vida. Que este modelo tenha de ser aplicado em certos casos, aceito. Mas querer estendê-lo a tudo para ficar tudo afinadinho como na física não é um sonho comunista. É um pesadelo orwelliano.

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  11. Desidério,

    «Como eu já te disse, se queremos que as coisas sejam assim todas arrumadinhas, sim, será difícil explicar isso. Mas é um disparate pensar assim.»

    Das coisas serem desarrumadas não se pode inferir que o copyright é necessário ou sequer benéfico. Tens que apresentar um argumento melhor.

    «, o problema do teu modelo é que é soviético. Obriga todos os músicos, escritores, poetas, a serem funcionários públicos como tu e eu.»

    Isso é falso. O modelo do ArtistShare não é soviético. O modelo dos músicos ganharem dinheiro a dar concertos não é soviético e é tal e qual o modelo que temos agora só que sem copyright. Um modelo em que os músicos são subsidiados pelo estado, como os agricultores, não nos condena a ser como a Russia comunista. Etc.

    «Assim, o resto da malta paga, quer queiram quer não, através dos impostos, a tua vida.»

    É essa a solução mais comum para o problema do free ride. Se for preciso, não vejo porque não recorrer a ela. Funciona para a ciência fundamental, para a educação, para a medicina, para a democracia e as leis, para a segurança, ...

    Nada disso que tu dizes contribui para a tua conclusão que querer arte sem copyright é um disparate.

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  12. Caro Ludi

    “Das coisas serem desarrumadas não se pode inferir que o copyright é necessário ou sequer benéfico. Tens que apresentar um argumento melhor.”
    O argumento é económico. Se as pessoas não forem pagas, não podem fazer música, software, etc. O teu modelo económico não funciona bem. No teu modelo económico, só pode haver dois tipos de criadores: os que atingem milhões de fãs, e os empregados do estado. O que eu defendi logo desde a primeira hora é que a diversidade e a independência é uma coisa boa. O teu modelo impede isso.
    “O modelo dos músicos ganharem dinheiro a dar concertos não é soviético e é tal e qual o modelo que temos agora só que sem copyright.”
    E como é que faz um compositor, que não dá concertos, só escreve partituras? E se um músico não gostar de dar concertos? E se as pessoas quiserem assistir sem pagar aos concertos, por que razão não poderão fazer isso? Não seria muito melhor toda a gente ir ver a chicha da Madonna sem ter de pagar 80 euros? E que tal deixar toda a gente entrar no espectáculo e pôr uma caixa de esmolas à porta para quem quiser deixar um donativo?
    Pareces confundir sistematicamente duas coisas. Uma, é que não é possível controlar as cópias ilegais. Outra é que é porreiro copiar sem pagar. Pareces pensar que a segunda se segue da primeira. Não se segue.
    Além disso, pareces estar convencido que se as cópias forem livres, será um Eldorado. Isto é economicamente falso, empiricamente falso. Repara o que acontece com o software. A razão pela qual não podemos ter mais engenheiros de software independentes a fazer bom software é que toda a gente copia sem pagar o trabalho deles — eles já nem tentam impedir tal coisa e metem o software como freeware. Mas isto significa o quê? Que não podem dedicar-se às suas criações — têm de trabalhar noutra coisa qualquer, ou numa grande empresa. Portanto, não tens vários criadores de software independentes suficientemente bons para competir seriamente com as grandes empresas. Os grandes talentos ou trabalham numa empresa grande, ou num restaurante; mas não conseguem viver directamente do software que criam.
    É isto que há de absolutamente ridículo em aplaudir a cópia livre como se isso fosse bom: é que se não houvesse tal coisa, seria realmente muito melhor. Haveria diversidade, muitos pequenos criadores que poderiam viver das suas criações, competir até com as grandes empresas. Com um sistema de cópia livre entra-se no modelo do negócio da borla, como o Yahoo ou o Google: dás de borla várias coisas, para atingires milhões de pessoas, e fazer lucro com 1% delas. Mas isto significa que em vez de diversidade e qualidade temos monolitismo e populismo.
    Quanto à analogia com a ciência, também já argumentei contra isso: a diversidade é saudável. É importante que haja diferentes maneiras de criar. Umas pessoas dão aulas no conservatório, outras são músicas a tempo inteiro. Uns são músicos para grandes multidões; outros, são músicos com apenas 20 mil fãs. A diversidade é muito importante. Ao longo da história da filosofia, da ciência e das artes, grande parte das inovações não vieram dos universitários. As instituições tendem a repetir padrões. Precisamos dos criadores independentes. O teu modelo impede isso. Mais uma vez: isto é irónico, pois faz parte da tua retórica a ideia de que estás a defender os pequenos criadores independentes, contra a força das grandes empresas. Isto é completamente falso. Se queres defender os pequenos criadores, pensa em maneiras de o trabalho deles ser pago por toda a gente que usufrui dele. Ou pelo menos lamenta que tal coisa não seja possível. Mas aplaudir isso como se fosse a melhor coisa do mundo é um absurdo.
    Finalmente: estás sempre a fazer analogias na tua argumentação, e essas analogias são sempre falaciosas. Copiamos receitas de bacalhau de borla, logo vamos copiar o software de borla; os matemáticos não ganham dinheiro com teoremas, logo os músicos também não devem ganhar dinheiro com a música. Este tipo de argumentação é sofística porque passa ao lado do importante. E o importante é explicar como raio vão as pessoas poder viver se o produto do seu trabalho for copiado de borla por milhares ou milhões de pessoas. A tua resposta para isto é sempre absurda. Ou é o modelo soviético. Ou é o modelo da generosidade, que sabemos que não funciona empiricamente sem que tenhas uma carteira de fãs gigantesca, para que seja economicamente viável que apenas 1% pague.
    Tu fazes da história do copyright uma espécie de cavalo de batalha ideológico. É quase como se fosse uma palavra feia. Eu nunca usei sequer essa palavra excepto agora, precisamente por isso. Não me interessa nada se é copyright ou copyleft. O que me interessa é saber como raio vão os criadores ser financiados. E é quando se pensa nisto que se vê que o que tu aplaudes como maravilhoso, a cópia indiscriminada sem pagar aos autores, é na verdade um duro golpe, talvez até fatal, para a sustentabilidade dos pequenos criadores independentes.

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  13. Desidério,

    «Se as pessoas não forem pagas, não podem fazer música,»

    Então se as pessoas querem música têm que pagar para que a façam. O que me parece que ainda não compreendeste é que os músicos têm, e sempre tiveram, este bem escasso para vender: o seu trabalho.

    Os impressores e fabricantes de CDs e discos tinham também um bem escasso para vender, a cópia, e exigiram protecção do seu investimento como pagamento. O copyright. Mas agora já não têm um bem escasso para vender. São esses que estão tramados e não os músicos.

    «E como é que faz um compositor, que não dá concertos, só escreve partituras?»

    Ou convence as pessoas a pagar-lhe pelo seu trabalho ou, se não conseguir, lá terá que fazer como os matemáticos, os filósofos, ou alguém que tenha imenso jeito para inventar receitas mas não se ajeite a cozinhar.

    Mas nota que não compete à sociedade restringir os direitos de cópia só para o safar. Ele que se desenrasque sem monoopólios. Se for muito bom compositor vai ganhar dinheiro de certeza. Se não sabe tocar nem cantar nem é grande espingarda a compor então é melhor escolher outra profissão.

    «Copiamos receitas de bacalhau de borla, logo vamos copiar o software de borla; os matemáticos não ganham dinheiro com teoremas, logo os músicos também não devem ganhar dinheiro com a música. Este tipo de argumentação é sofística porque passa ao lado do importante. E o importante é explicar como raio vão as pessoas poder viver se o produto do seu trabalho for copiado de borla por milhares ou milhões de pessoas.»

    Sinceramente, não percebo essa objecção. Essas pessoas vão viver da forma como vivem as outras pessoas de cujo trabalho o produto também é copiado à borla. A analogia não é falaciosa porque visa exactamente a questão que tu pões. Como é que se vive de um trabalho cujo produto é copiado à borla? Simples. Recebe-se um ordenado pelo trabalho que se faz em vez de receber pela cópia do produto.

    É uma regra elementar do mercado. Não consegues viver da venda de algo que se obtém à borla. Por isso se és matemático, filósofo, músico ou jogador de xadrez tens que vender algo que não se copie à borla. O teu trabalho, o teu tempo, a tua capacidade de inovar.

    «O que me interessa é saber como raio vão os criadores ser financiados.»

    Mas parece-me que o interesse é pouco. Já te mostrei várias alternativas mas continuas a dizer que não. Isto já parece a conversa do criacionismo :)

    Eu proponho que o que a Maria Schneider ganhou ganhava à mesma sem que fosse ilegal partilhar ficheiros na internet. Os da Dave Matthews Band sempre encorajaram os fãs a partilhar as músicas gratuitamente, e fazem um dinheirão em concertos. Os músicos mais bem pagos, como os Rolling Stones e os U2 fazem bateladas de dinheiro em concertos e quase nenhum músico faz dinheiro com os CDs.

    Se estás interessado em saber só te posso dar um conselho: informa-te. Ou isso era só truque de retórica? ;)

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