sexta-feira, novembro 04, 2011

O argumento moral.

A julgar pela opinião das poucas pessoas que ainda têm paciência para discutir copyright comigo, parece-me que a maioria se opõe à punição legal da partilha, para uso pessoal, de obras publicadas. Infelizmente, a lei que temos vem da pressão da minoria de negociantes e não da expressão da maioria dos eleitores. Quanto a isso, pouco mais posso fazer do que melgar*.

Mas, a par deste consenso acerca da lei, e baseando-me na mesma amostra reduzida, parece-me haver uma divergência importante acerca da moralidade do acesso gratuito. O Wyrm considera «que se um individuo procura o fruto do trabalho de terceiros e usufrui desse fruto, então fica moralmente "obrigado" a compensar o criador do tal fruto.»(1) As aspas confundem um pouco, mas vou arriscar e dizer que discordo.

Quem cria, produz, gere, vende ou aluga algo fá-lo por vários motivos. O poeta porque finge completamente sentir a dor que deveras sente, o músico porque quer dizer que ama, o actor para saber se há de ser ou não ser, e assim por diante. Mas um motivo comum é ganhar dinheiro. É um objectivo legítimo, e reconheço a todos o direito de tentar. Mas a primeira razão para discordar de que haja uma obrigação moral (com ou sem aspas) de dar dinheiro ao autor é que a sua tentativa de ganhar dinheiro não cria, por si só, qualquer obrigação moral em terceiros. O Wyrm acrescentou que o princípio que ele defende «é pacífico se estivermos a falar de bens [materiais]», só suscitando dúvidas pela natureza dos bens digitais. No entanto, nem aos bens materiais se aplica.

Vamos supor que eu monto um restaurante na praia e, para atrair mais gente àquela praia – potenciais clientes – contrato um nadador salvador, pago a limpeza regular da praia e monto chuveiros e casas de banho gratuitos. O tal princípio da obrigação moral implica que seria imoral trazer sandes de casa, passar o dia na praia limpa, sob a vigilância do nadador salvador, tomar duche de borla e ir embora sem me comprar nada. Mas eu proponho que não há imoralidade nenhuma nisso porque o meu investimento seria um exercício voluntário do meu direito de fazer negócio. Ninguém me deveria nada por eu tentar atrair clientes para obter mais lucro. Duvido que alguém se considere moralmente obrigado (ou “obrigado”, sequer) a comprar um champô só porque aproveitou as amostras gratuitas que estavam a oferecer no supermercado. Entre muitos outros exemplos. Aquilo que alguém faz para ganhar dinheiro não nos obriga a dar-lhe do nosso, mesmo que tiremos benefícios disso.

A outra razão é que descarregar e partilhar ficheiros mina apenas a parte do monopólio sobre a cópia para uso pessoal e não afecta o monopólio sobre a comercialização. Uma melhor analogia seria a de eu fazer um acordo com o município, ficando com o monopólio sobre a venda de bebida e comida na praia e, em contrapartida, comprometia-me a pagar o nadador salvador, os chuveiros e a limpeza da praia. Continuaria a ser uma decisão voluntária minha, que não obrigava ninguém a comprar-me o que fosse. Mas, além disso, as pessoas todas da praia já estariam a pagar o meu monopólio. Pagavam nos preços da comida na praia, muito mais altos do que seriam se eu tivesse concorrência na praia. Pagavam por perder o direito de vender comida naquela praia, um direito que seria só meu. E pagavam o sistema judicial que protegia o meu monopólio punindo quem tentasse vender ali sem a minha autorização.

É isto que se passa com os direitos patrimoniais do autor, e direitos conexos. Logo à partida, não é por alguém querer fazer dinheiro a vender as suas obras que eu fico moralmente obrigado a pagar-lhe seja o que for. Se o negócio lhe correr bem, parabéns, mas mesmo que eu beneficie pelo acesso a essas obras não fico a dever nada por isso. Além disso, mesmo sem obrigação moral já lhes estou a pagar o monopólio comercial que lhes concedem, pela distorção nos preços, pela proibição desse negócio a todos os outros e pelos custos do sistema judicial que protege esse monopólio.

Reconheço que um artista precisa de ganhar dinheiro para ser um profissional. E aceito que é boa ideia dar dinheiro a quem tem talento para podermos usufruir daquilo que essas pessoas criam. No entanto, essas decisões devem ser voluntárias de ambas as partes, e conforme os interesses de cada um. Não são obrigações morais. Quem partilha ficheiros de obras publicadas pode estar a violar uma lei injusta mas não está a faltar a qualquer obrigação moral de financiar os negócios dos outros. Porque, sem um compromisso prévio, nem o artista é moralmente obrigado a nos entreter com a sua arte nem nós somos moralmente obrigados a pagar-lhe por isso.

* E assinar o pedido de oficialização do Partido Pirata Português. A ver se trato disso também, para não ser só melgar...

1- Comentário em Venham mais vinte...

44 comentários:

  1. Se tratasses de manter uma praia limpa com sanitários higiénicos seja porque motivo for, davas razão aos energúmenos que acham que tu não és português porque não te chamas Costa nem Silva ;-)

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  2. Ludwig

    Não compreendo porque razão apenas contestas o direito de propriedade sobre certos bens nem qual o seu fundamento.

    Quando dizes que é imoral o direito de propriedade sobre bens que não implicam pelo seu uso a exclusão do uso de outrém estás, por um lado, apenas a enunciar o teu critério de delimitação dos direitos de propriedade (outros podem desejar ter ouros critérios - os comunistas, por exemplo, pensam que os meios de produção não devem ser objecto de propriedade) e, por outro, não consigo perceber onde se encontra o fundamento objectivo de uma tal moral.

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  3. Bom eu vou ali à feira da ladra e compro o novo filme do Tintim por 2,99 eurros se quiser esperar dois meses já está algures na net
    se quiser esperar um ano vendem um dvd legal por 9,99 eurros

    e daqui a uns 3 ano custa apenas 1 eurro ou 1,99 nos saldos= a 3450 dracmas ou 34,50 novos dracmas neodracmas

    logo puqué cus gajos continuam a gastar milhões com um filme quódespois via da crise ninguém bai ber

    exceptus krrippahl und crias para lhes mostrar o atheismo patente na obra de Hergé

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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  5. Ludwig,

    Em nenhum dos exemplos que dás justificas o porque de não achares moral a compensação. O facto de dizeres, nada foi acordado apenas diz que não és legalmente obrigado.

    O exemplo da praia é perfeito para ilustrar o que quero dizer. Se vais a uma praia, tens uma praia limpa, vigiada e com bom equipamento, e sabendo que é tudo financiado pelo restaurante X, nada te obriga a ires lá buscar uma cola ou almoçar.

    Mas se passas toda a época balnear a ir a essa praia específica devido precisamente ao que esse restaurante X disponiliza gratuitamente tu continuas a não ser obrigado a recompensar o restaurante mas se reconheceres que se não fosse essas vantagens não porias lá os péa então, no meu entender é moral compensar o restaurante pelo serviço que presta, porque quero que continue a prestar o serviço e porque gosto de usufruir dele.

    Também não és obrigado a agradecer a quem te segura a porta, ou quem não deixa o elevador fechar, mas agradeces e essa cortesia é a compensação por um gesto voluntário.

    Tu és de opinião de que não o tens que fazer mas apenas finges justificar. Claro que não combinaste nada, se tivesses contratado o serviço eras legalmente obrigado a pagar. É precisamente nos casos em que nada te é cobrado por opção ou por não ser possível cobrar que é moral retribuir de alguma forma sobretudo com dois objectivos:

    1 - Agradecer algo que teve um impacto positivo na nossa vida;

    2 - Encorajar ambos os comportamentos (dar e retribuir);

    Isto é uma coisa tão básica para uma melhor coexistência que me admira a tua discordancia.

    Sinceramente Ludwig, atrevo-me a afirmar que esta posição, visto que já ninguém te quer mandar para a cadeia, é apenas para justificares o facto de teres jogado centenas de jogos e assistido a centenas de filmes sem teres nunca em qualquer circunstância compensado aqueles que te proporcionaram esses momentos. Há pessoas que são incapazes de assumir as acções de carácter dubio que praticam sendo eximias a racionalizar o ocorrido da forma mais lisongeira para elas próprias. Parece ser o caso.

    De resto faz-me confusão tanta reticência a algo tão básico que até se ensina ás crianças: agradecer as coisas boas que nos fazem. Pode ser dizer um obrigado, comprar um livro, finalmente comprar um jogo da editora de one se sacaram os 10 anteriores ou qualquer coisa.

    Um outro aparte: o CEO do hedge fund que manda investir no mercado de cereais, aumentando o preço brutalmente e fazendo com que haja mais fome na Etiópia também alega não cometer nenhuma imoralidade pois está apenas a fazer o melhor para os seus clientes e o governo desse país é que devia tomar medidas para evitar a fome entre o seu povo. A lógica é de facto inatacável.

    (e não, não te estou a comparar ao CEO... isto seria ser a proxima Goodwins Law: à medida que a conversa avança aumentam as hipóteses de comparação de intervenientes a CEO de empresas financeiras :) )

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  6. Ludwig,

    A reflexão é boa, mas parece-me que o problema em torno da pirataria/partilha ilegal de conteúdos está noutro sítio, e que se pode resumir a algo muito simples: todos acabamos por obter um ou outro conteúdo de forma ilegal, e por isso tentamos, para que fiquemos de bem com a nossa consciência, legitimar as nossas acções. Eu também possuo alguns conteúdos ilegais, mas não é por isso que deixo de pensar que estou, de alguma forma, a impedir que um artista tenha o seu lucro, por reduzido que seja na exploração dos artistas pelas editoras (e claro que aqui podemos pensar que se calhar por sacar uma música, depois até compro o cd, ou que fiquei a conhecer um artista que desconhecia e que por isso até vou ao concerto). A verdade é que a pirataria priva os artistas das receitas do seu trabalho, e basta que te coloques na pele de um artista para compreender como isso é danoso. Um artista deve poder ser um profissional, e não é possível fazê-lo se daí não obtiver algumas receitas; penso que concordarás. A única coisa que permite este debate em torno da pirataria é o facto de livros/músicas/filmes/etc poderem ser convertidos em ficheiros digitais, e por isso distribuídos à margem das redes "habituais". Mas, no fundo, a verdade é que um livro é um bem tal como um iogurte, e não me parece que alguém possa defender que o roubo de um iogurte possa não ser punido por lei. Se tudo pudesse ser digitalizado - e já estivemos mais longe disso -, o que é que aconteceria? Pirateávamos tudo e depois esperávamos que as empresas continuassem a produzir e, miraculosamente, não falissem?

    Agora, há outra questão, que eu também defendo: não podemos lutar contra a pirataria; essa é uma luta que está desde já perdida, porque provavelmente nunca vai ser possível - e ainda bem - controlar os conteúdos que circulam nas redes a esse ponto. E apesar de ver na pirataria o efectivo roubo dos artistas, acho um perfeito disparate que se condenem e persigam pessoas quando estas usam os conteúdos para seu uso pessoal (se falarmos em revendedores, já me parece necessário que seja crime). Não tenho pena das editoras, que até são quem mais lucra com as vendas, muito mais do que os artistas, e parece-me que o necessário é que a indústria se repense ou, então, que se extinga e permita aos artistas encontrar novas e melhores formas de distribuir e lucrar com o seu trabalho, sem intermediários tão gulosos.

    Cumprimentos.

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  7. Wyrm,

    «Em nenhum dos exemplos que dás justificas o porque de não achares moral a compensação.»

    Eu acho que compensar é moral, no sentido de ser moralmente louvável. O que não acho é que seja moralmente obrigatório. Quando dizes “não achares moral” usas uma expressão demasiado vaga.

    «O facto de dizeres, nada foi acordado apenas diz que não és legalmente obrigado.»

    Não. Legalmente, sou obrigado. O que estou a dizer é que essa lei é moralmente errada e, moralmente, não sou obrigado a pagar por entretenimento pelo qual não prometi pagamento. Ver um quadro e apreciar a arte, por si só, não me obriga a pagar nada ao pintor.

    «Mas se passas toda a época balnear a ir a essa praia específica devido precisamente ao que esse restaurante X disponiliza gratuitamente tu continuas a não ser obrigado a recompensar o restaurante mas se reconheceres que se não fosse essas vantagens não porias lá os péa então, no meu entender é moral compensar o restaurante pelo serviço que presta, porque quero que continue a prestar o serviço e porque gosto de usufruir dele.»

    Mais uma confusão. Se pagas ao restaurante em interesse próprio, porque queres que continue a fazer aquilo, isso não é moral nem imoral. É simplesmente uma interacção voluntária entre ti e o dono do restaurante. A minha posição é que tu tens o direito moral de decidir se pagas ou não, e não é imoral da tua parte decidir não pagar. Pode ser que depois o tipo feche as portas e te arrependas, e pode ser conveniente evitares isso, mas isso é uma questão diferente da questão da obrigação moral.

    «De resto faz-me confusão tanta reticência a algo tão básico que até se ensina ás crianças: agradecer as coisas boas que nos fazem.»

    Agradecer não é o mesmo que pagar, e é muito mais pessoal. Não me parece que descarregar uma música me imponha uma obrigação moral de agradecer ao músico.

    «o CEO do hedge fund que manda investir no mercado de cereais, aumentando o preço brutalmente e fazendo com que haja mais fome na Etiópia também alega não cometer nenhuma imoralidade pois está apenas a fazer o melhor para os seus clientes»

    Mas está enganado. Está apenas a cometer o mesmo erro que tu e confundir o interesse próprio com moralidade.

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  8. HPA,

    «A reflexão é boa, mas parece-me que o problema em torno da pirataria/partilha ilegal de conteúdos está noutro sítio, e que se pode resumir a algo muito simples: todos acabamos por obter um ou outro conteúdo de forma ilegal, e por isso tentamos, para que fiquemos de bem com a nossa consciência, legitimar as nossas acções.»

    Pelo contrário. Eu diria que o problema é que a lei é imoral enquanto que a partilha de informação é moralmente legítima, e até louvável, e é daí que vem a enorme discrepância entre o que a lei diz e o que nós todos fazemos. Nota que a legislação dos direitos de autor foi sendo criada sob pressão de alguns grupos de interesse, por via de tratados internacionais negociados à margem do processo democrático que legitima o resto da nossa legislação.

    «Eu também possuo alguns conteúdos ilegais, mas não é por isso que deixo de pensar que estou, de alguma forma, a impedir que um artista tenha o seu lucro»

    O meu ponto é que não temos obrigação moral nenhuma de garantir que alguém tenha lucro. Se eu faço bolos tiro lucro ao dono da pastelaria. Se levo comida de casa tiro lucro aos restaurantes onde trabalho. Se leio um livro emprestado tiro lucro à editora e ao autor. Tenho esse direito. O lucro deve resultar de uma transacção livre e voluntária. Não é um direito que uns possam reivindicar dos outros. E essa é mais uma razão pela qual a lei é imoral: é uma lei cujo propósito expresso é forçar o público a dar mais lucro aos vendedores pela concessão de monopólios.

    «A verdade é que a pirataria priva os artistas das receitas do seu trabalho»

    Não. Isso é falso. Nenhum artista que cobre pelo seu trabalho se vê privado pela pirataria. Pelo contrário, como se pode ver pelo aumento do volume de negócio nos concertos, por exemplo. Quando cobram pelo trabalho, a pirataria até ajuda pela divulgação. Só se vêem privados é de receitas cobradas pelo serviço de copiar obras já feitas, serviço esse cujo valor comercial se deve quase inteiramente aos monopólios legais, porque copiar é algo que qualquer um faz sem problemas. Ou seja, o problema é estritamente de usarem um modelo de negócio inadequado à tecnologia moderna.

    «E apesar de ver na pirataria o efectivo roubo dos artistas»

    Eu acho que a decisão de não comprar algo a um vendedor não é o mesmo que lhe roubar o stock. Por exemplo, não comprar um livro porque um amigo mo empresta é muito diferente de roubar um livro na livraria. Se tirar fotocópias do livro o efeito é o mesmo.

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  9. Antes de mais:

    moral
    (latim moralis, -e, relativo aos costumes)
    adj. 2 g.
    1. Relativo à moral.
    2. Que procede com justiça. = CORRECTO, DECENTE, HONESTO, ÍNTEGRO, JUSTO, PROBO ≠ DESONESTO, ERRADO, IMORAL, INDECENTE
    3. Não físico nem material (ex.: estado moral). = ESPIRITUAL
    5. Conforme às regras éticas e dos bons costumes.
    s. f.
    6. Conjunto dos princípios e valores morais de conduta do homem.
    7. Bons costumes.
    8. Conjunto de regras e princípios que regem determinado grupo.
    9. [Filosofia] Tratado sobre o bem e o mal.
    10. Susceptibilidade no sentir e no proceder.
    s. m.
    11. Estado do espírito. = ÂNIMO, DISPOSIÇÃO
    moral da história: lição ou ensinamento que se pode retirar de um acontecimento ou história narrados. = MORALIDADE

    Nada do que eu argumento vai contra qualquer definição de moral.

    E vejo-te a usar o termo "obrigado" quando não é disso que se trata. Uma "obrigação moral" não é o mesmo que uma "obrigação" logo para este debate nada de confundir as duas. Pode ser de propósito em nome da retórica mas vou assumir que não foi propositado.


    "Mais uma confusão. Se pagas ao restaurante em interesse próprio, porque queres que continue a fazer aquilo, isso não é moral nem imoral. "

    Treta. Algo pode ser moral e ser em nosso interesse próprio. Aliás, tudo o que tu fazes pode ser sempre alegado que é em interesse próprio. E essa acção é sempre moral ou imoral pois não há acções neutras (poupa o hair split aqui para não passarmos os proximos comments a debater se tal acção é neutra ou não).

    Em relação à praia ninguém te obriga a nada. Se decides não consumir nada naquele restaurante apesar de te aproveitares das condições que te oferece há 5 ou 6 épocas balneares o sinal que envias para todos os que te rodeiam é "nunca paguem nada que podem obter à borla", "quem oferece o que quer que seja voluntáriamente nunca merece qualquer retribuição" e "nunca confies que alguém vai valorizar algo que tu ofereces de graça."

    Mas se depois o dono do restaurante, se tivesse contactos para isso, tratarasse de fazer algum negócio com o município, fechando a praia, cobrando bilhetes de admissão e proibindo merendas (o que fique claro acho ainda mais imoral porque as praias são de todos) muita gente que antes se ria do otário passa a comprar o bilhete porque afinal é a unica praia com nadadores-salvadores decentes, equipamentos modernos e afins.


    "Agradecer não é o mesmo que pagar, e é muito mais pessoal."

    É exactamente o mesmo. É uma forma de retribuição por algo que adiciona valor á nossa vida. Agradeces a quem te deixa a porta aberta apesar de ser um estranho que perdeu algum do seu tempo para te facilitar a vida. Logo entre um "obrigado" ao gajo da porta ou um "quero duas colas, uma sandes de ovo e um pastel de bacalhau" ao gajo que limpa a praia e contrata o pessoal que vai salvar-te a ti ou à tua famila em caso de acidente não há grande diferença. É uma cortesia voluntária que é moral realizar.

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  10. Wyrm,

    «Nada do que eu argumento vai contra qualquer definição de moral.

    E vejo-te a usar o termo "obrigado" quando não é disso que se trata. Uma "obrigação moral" não é o mesmo que uma "obrigação"»


    E aqui está o problema principal desta conversa. Se, na expressão “obrigação moral”, “obrigação” não quer dizer obrigação e “moral” quer dizer qualquer coisa desde “Que procede com justiça” até “Estado do espírito”, a única coisa que te posso dizer é que não faço ideia do que queres dizer com essa expressão.

    Mas se a tua proposta é que ninguém é moralmente obrigado a pagar algo só porque usufruiu, copiou, partilhou, etc, então estamos de acordo.

    «Algo pode ser moral e ser em nosso interesse próprio.»

    Pode. E pode ser moral sem ser em nosso interesse próprio. E pode ser imoral e ser em nosso interesse próprio. O importante é perceber que ser no nosso interesse próprio não é uma justificação moral. Se for moral ou imoral será por outra razão qualquer, pois o interesse próprio não é nem condição necessária, nem suficiente, nem factor incompatível, para a moralidade do acto.

    «se depois o dono do restaurante, se tivesse contactos para isso, tratarasse de fazer algum negócio com o município, fechando a praia, cobrando bilhetes de admissão e proibindo merendas (o que fique claro acho ainda mais imoral porque as praias são de todos) muita gente que antes se ria do otário passa a comprar o bilhete porque afinal é a unica praia com nadadores-salvadores decentes, equipamentos modernos e afins.»

    Não me parece. Se ele fizesse isso, pelo menos eu protestaria porque a praia não é propriedade dele, é um bem de todos e não é decente que ele a feche e cobre bilhetes. E é mais ou menos isso que defendo com as músicas, filmes, e cultura em geral, com a agravante de considerar alguém proprietário de uma música publicada é ainda mais imoral do que considerar alguém proprietário de uma praia.

    «Agradeces a quem te deixa a porta aberta apesar de ser um estranho que perdeu algum do seu tempo para te facilitar a vida.»

    Mas não agradeço a quem fez a porta, a quem inventou as dobradiças, ou a metalurgia, ou formas de fazer fogo. Esse caso é análogo a ir a um blog onde alguém deixou o link para um ficheiro mp3 e escrever lá um comentário “Porreiro, obrigadão!” Se é isso que propões que se faça, e não defendes que seja obrigatório fazer, não vejo nada do qual discordar :)

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  11. "E aqui está o problema principal desta conversa. Se, na expressão “obrigação moral”, “obrigação” não quer dizer obrigação e “moral” quer dizer qualquer coisa desde “Que procede com justiça” até “Estado do espírito”, a única coisa que te posso dizer é que não faço ideia do que queres dizer com essa expressão."

    Eu uso o termo "obrigação moral" por oposição a "obrigação legal." Ninguém tem a obrigação legal de não dar peidos num elevador mas tem a obrigação moral de não o fazer.



    "O importante é perceber que ser no nosso interesse próprio não é uma justificação moral."

    Retribuir a quem nos fez bem, sobretudo se o fez de forma voluntária e sem qualquer obrigação é moral. E no nosso interesse próprio. É moral recompensar o esforço de terceiros que teve um impacto positivo na nossa vida ao passo que é imoral parasitar esse trabalho devido a um suposto entitlement que se sente sobre o esforço dos outros.



    "E é mais ou menos isso que defendo com as músicas, filmes, e cultura em geral, com a agravante de considerar alguém proprietário de uma música publicada é ainda mais imoral do que considerar alguém proprietário de uma praia."

    Acho que é o contrário. Acho que o autor tem mais direito a ser proprietário da sua criação que outra pessoa ser proprietário de uma praia. A menos que seja deus! Esse sim, é dono da praia. :D



    "Mas não agradeço a quem fez a porta, a quem inventou as dobradiças, ou a metalurgia, ou formas de fazer fogo."

    Ludgiwg, quem criou as dobradiças já foi largamente compensado tanto que a patente já expirou, creio. Quem fez a porta também foi compensado pelo seu trabalho. Mas estamos a falar de bens intangíveis e tu não podes continuar, isto se quiseres ser minimamente honesto e coerente, a defender que uns conceitos evoluam com a tecnologia e não outros. Para ti o conceito de comercialização tem de evoluir para a era digital mas queres que o conceito de roubo fique na "analógica."

    Já agora, podes vender-me dois quilos de conhecimento? Porque tentas que vendedores de conceitos abstratos sejam remunerados como vendedores de peras? Não é o mesmo e a forma de comercialização não é a mesma.

    E depois uma coisa que tentas sempre escamotear é a grande diferença entre a ideia e a forma que essa ideia é realizada. Se te interessasse apenas a ideia, então bastar-te-ia, por exemplo, a 9 sinfonia interpretada pela banda da Colectividade Recreativa de Cabeceiras de Baixo gravada com um telemovel que até foi colocado no youtube. Toda a ideia, as notas e afins estão lá. Mas o que tu queres é a 9 sinfonia da Deutsche Gramophone que pagou a uma orquestra de excelência, a um maestro e pagou por um bom estudio e bons tecnicos para a gravar.

    Isto é apenas querer almoços grátis e não assegurar qualquer tipo de liberdade.

    Mas acrescento que sei que tu lutarás até á ultima gota de sangue teórico para justificar o usufruto sem qualquer tipo de retribuição. Estás demasiamente investido no assunto.

    Até a Cracked explica: http://www.cracked.com/article_19468_5-logical-fallacies-that-make-you-wrong-more-than-you-think.html

    :)

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  12. Wyrm,

    Recapitulando, do que percebi dos teus argumentos, temos a obrigação moral de pagar ao autor porque é imoral usufruir de algo sem compensar o seu criador, excepto se for algo emprestado, comprado em segunda mão, ou se esse algo for como uma jogada de xadrez, um teorema, uma equação, uma especulação filosófica, um modelo científico, uma combinação de roupas, uma receita, uma anedota ou, basicamente, tudo o que não for músicas, filmes e livros.

    Isto, sobretudo, porque temos de respeitar a vontade do criador, a menos quando a vontade dele é de não ser criticado, gozado ou ignorado, e excepto quando o criador é um matemático, filósofo, desportista, jogador de xadrez, cientista, cozinheiro ou, basicamente, não cria músicas, filmes ou livros.

    Mas esta obrigação moral não é uma obrigação, e também não tem nada que ver com moral porque se justifica apenas pelo nosso próprio interesse, e não é preciso agradecer sequer a quem já tenha sido amplamente recompensado, daí que o nosso obrigado seja a quem nos segura a porta e não a quem fez a porta, que presumimos ter tido ampla recompensa pelo seu trabalho. O que deixa em aberto a possibilidade de considerar, por omissão, que qualquer realizador, músico ou escritor de algo que eu descarregue da net já foi amplamente recompensado, na medida em que o mereça, pelo que eu já não lhe devo nada.

    «Estás demasiamente investido no assunto.»

    Pode ser. Também pode ser que a tua posição seja tão incoerente que nem sequer tu sabes o que é que vem de onde...

    «Porque tentas que vendedores de conceitos abstratos sejam remunerados como vendedores de peras?»

    Pelo contrário. Eu sou um vendedor e criador de conceitos abstractos. É a minha profissão. Mas não ganho à cópia. Não me pagam pelo usufruto. Não me devem um “obrigado” cada vez que correrem os meus programas, lerem os meus artigos ou descarregarem os slides das minhas aulas. Isso é que é uma parvoíce. Quem me deve o ordenado é quem me contratou, porque temos um contrato, e pagam-me pelo meu trabalho. É isso que faz sentido. E, hoje em dia, é muito fácil um artista trabalhar, com contrato, para milhares de fãs ao mesmo tempo. É isso que eu proponho que façam e se deixem deste disparate de vender arte como se fosse pêras ou batatas, à peça ou ao quilo.

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  13. A minha posição só é incoerente para alguém que prefere fingir que não percebe o que lhe dizem para poder argumentar ad eternum.


    Comparas laranjas com alhos dizendo que não são diferentes um do outro pois são ambos vegetais, e quem discorda é incoerente.

    Se um aluno te tocar na face gentilmente e outro te der um soco és incoerente se disseres que há diferenças pois tratam-se ambos de toques no rosto.

    Todos as excepções que enumeras já foram comentadas e desmontadas ao longo de vários e cansativos posts.

    Há uma diferença entre o matemático que é pago para desenvolver investigação e cujas descobertas são propriedade do empregador mas que, por cortesia, lhe permite dar o seu nome ao teorema e um fulano que escreve um livro e o publica na ingénua, devido á existência de pessoas como tu, ideia que quem gostar de o ler se calhar até lhe compra um livrinho.

    Há uma diferença entre um gajo querer censurar opiniões e pretender, coitado, que quem gosta da musica dele adquira uma musica para o gajo poder comer.


    "É a minha profissão. Mas não ganho à cópia. Não me pagam pelo usufruto. Não me devem um “obrigado” cada vez que correrem os meus programas, lerem os meus artigos ou descarregarem os slides das minhas aulas."

    É a tua escolha. És um professor que tem o seu ordenado coisa que um músico, por exemplo, não tem e não tens o direito de lhe impor que trabalhe como tu. De resto tu não ganhas à cópia porque o mundo todo exceptuando o director do curso e os teus alunos está-se completamente nas tintas para as tuas aulas, programas e slides.


    "E, hoje em dia, é muito fácil um artista trabalhar, com contrato, para milhares de fãs ao mesmo tempo. É isso que eu proponho que façam e se deixem deste disparate de vender arte como se fosse pêras ou batatas, à peça ou ao quilo. "

    Isto é uma estupidez... Há milhares de musicos que tentam ganhar a vida assim e não conseguem. E os que conseguem são aqueles nos quais houve um investimento brutal em promoção.

    Mas isso é desviar do meu ponto fulcral. Que é a obrigação moral de compensar quem quer que tenha um impacto positivo na nossa vida. Isto vale para quem nos abre a porta, compõe uma musica que gostamos, canta á janela enquanto estende a roupa. Com um "obrigado", a compra de um exemplar, uma moeda no chapeu, uma gorjeta, é apenas moral.

    Enfim, é o teu estilo de argumentação. Eu até podia pensar que o problema aqui é meu mas quando consegues irritar até o João Vasco, então fico na certeza que por muito que os meus argumentos sejam "incoerentes de acordo com a retórica do Ludwig" há qualquer coisa aí que te impede sequer de tentar encontrar pontes de entendimento.
    Discutir contigo assume contornos caricatos. É como utilizasses o paradoxo de zenão para teimares que Aquiles nunca alcançará a tartaruga. Ou como um criaccionista que de X em X palavras lembra que morcegos dão morcegos.

    Tudo bem, queres ser o alpha male da argumentação sobretudo, perdoa a inferência, porque já ensinaste aos teus filhos que em termos de download é fartar vilanagem e mesmo que tu concordasses comigo tu nunca o admitirias perante eles.

    Mas já podias era ser minimamente honesto e pelo menos assumires que há um ponto fulcral em que discordamos e ficamos por aí ao invés de usares todos os truques retóricos do livro para saires por cima.

    Não sais. A partir do momento em que usas as comparações disparatas que costumas usar fingindo-te de desentendido de modo a provares que não é moral uma retribuição, por mais pequena que seja, a quem nos fez bem apenas mostras que o que queres é musica "à pala."

    Porreiro. Burros como eu continuarão a pagar para Espertos como tu se continuem a aproveitar e ainda por cima a dizer que não devem rigorosamente nada a ninguém.

    AH! e continuo à espera do teu preço por leitura. É que eu julgo que o facto de te dar importãncia já é retribuição suficiente mas se pretendes mais é favor de me dizeres.

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  14. Já agora criaste o quê exactamente?
    É que já alegaste que hoje em dia já não se cria nada sendo tudo obras derivadas sem qualquer originalidade.

    Mas é claro que tu deves ser diferente. Claro.

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  15. Wyrm,

    «Comparas laranjas com alhos dizendo que não são diferentes »

    O problema é a justificação para a alegação de que há uma diferença. Por exemplo, se eu disser que as laranjas são mais doces que os alhos porque as laranjas são vegetais é razoável que questiones essa justificação, visto os alhos também serem vegetais.

    É esse o problema com os teus argumentos. Eu sei um CD emprestado e um CD copiado são coisas diferentes. Mas quando tu dizes que copiar o CD é imoral, mas pedir emprestado não é, porque é imoral usufruir da criação de outrem sem o recompensar estás a dizer um disparate. Essa condição aplica-se a ambos os casos. O mesmo para a justificação de que devemos respeitar a vontade do autor. E assim por diante.

    Não digo que não haja diferença. Mas nada do que tu apresentaste justifica concluir que haja uma diferença moral porque tudo o que tu propões como regras gerais são, além de dúbias em si, incapazes de distinguir entre os casos que tu aceitas como moralmente legítimo (o direito de criticar, satirizar, emprestar, etc) e como moralmente ilegítimo (sacar da net, copiar, etc, sem pagar).

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  16. «Todos as excepções que enumeras já foram comentadas e desmontadas ao longo de vários e cansativos posts.»

    Eu não proponho excepções. Eu proponho regras gerais que são consensuais. Que, no comércio livre, só deves dinheiro a quem o prometeste, seja pela limpeza dos vidros do carro seja pela música que ouves. Que tens direitos de propriedade sobre os teus bens materiais, e não te podem proibir arbitrariamente de fazer algo só porque lhes estraga o negócio. Seja fazer bolos no teu forno seja copiar CDs no PC. Que tens direito à tua privacidade mas que abdicas desse direito se decides publicar algo. Seja a anedota que escreveste no teu diário ou que contaste em público, seja um poema ou canção.

    Eu sou contra as excepções que se fazem a uma fatia minúscula da criatividade humana. Aquela que se vende em CD, livros e DVD. Sou contra a concessão de monopólios sobre o direito de cópia a quem cria essas coisas. Precisamente porque não vejo justificação para essa excepção. Se o CD é meu eu posso emprestar a quem quiser ou vender em segunda mão e o músico não tem nada com isso. Se o PC é meu eu posso copiar ficheiros e se isso estraga o negócio de alguém, azar o dele.

    Tu é que propões as excepções. Tu é que dizes que eu tenho direitos de propriedade sobre as minhas coisas excepto o direito de copiar alguns ficheiros no meu PC. Ou que tenho o direito de pedir coisas emprestadas, copiá-las se forem equações, jogadas de xadrez, receitas, etc, mas não se for uma sequência de números a descrever o “nós pimba”.

    E são essas excepções que tu não consegues justificar porque mesmo as regras que inventas para tentar fazê-lo não levam a lado nenhum. A regra do usufruto, da vontade do autor, do dever de agradecer, etc, isso aplica-se na mesma ao que se pede emprestado e ao que se copia.

    «Já agora criaste o quê exactamente?
    É que já alegaste que hoje em dia já não se cria nada sendo tudo obras derivadas sem qualquer originalidade.»


    Eu não aleguei que não se cria nada. Eu aleguei que ninguém é o autor, no singular, mas sim um de muitos autores porque todas as criações humanas resultam do contributo de muita gente.

    Por exemplo, aqui tens o meu repositório no github. Na minha página tens também links para o material que preparo para as aulas. Pela lei, e pelo que tu defendes, eu sou o criador, individual e único, destas coisas. Como se as tivesse criado do nada por milagre. Mas isso é treta. Eu uso compiladores, ambientes de programação, programas de edição de slides e video, computadores, internet, algoritmos, técnicas de programação e uma carrada de outras coisas que outros criaram. E, por sua vez, esses criaram essas coisas com base noutras anteriores. Há alguma criatividade em acrescentar uma peça ao puzzle. Mas a ideia de que “O Autor” é o criador único de alguma coisa é apenas uma imbecilidade inventada para disfarçar mais uns buracos na justificação dos monopólios.

    Na música isso é bastante claro. Antes dos gira-discos e da venda de gravações era tradição usar explicitamente trechos de outros autores. Da música clássica ao blues, toda a gente aproveitava pedaços uns dos outros em citações, homenagens, transformações, remixes, etc. Com o monopólio comercial sobre as gravações foi preciso inventar coutadas e agora é a hipocrisia que se vê. Apesar das músicas virem em fornadas de coisas praticamente iguais, um sampling de um ou dois segundos é violação de “direitos de autor”.

    Mais uma vez, é o problema de achar que aqueles produtos da criatividade humana que calha poder vender-se em rodelas de plástico são uma excepção, e funcionam de forma diferente da restante criatividade humana. Que é sempre uma actividade social, e não individual.

    Já agora, lê isto.

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  17. "Eu sei um CD emprestado e um CD copiado são coisas diferentes. Mas quando tu dizes que copiar o CD é imoral, mas pedir emprestado não é, porque é imoral usufruir da criação de outrem sem o recompensar estás a dizer um disparate. Essa condição aplica-se a ambos os casos. O mesmo para a justificação de que devemos respeitar a vontade do autor. E assim por diante."

    Sim, aplica-se. Houve uma compra que depois serviu para o agregado familiar. Emprestar o livro a um amigo é apenas uma extensão desse agregado. Mas se esse amigo lê toda a obra do autor a partir do que tu lhe emprestas e recusa-se terminantemente a comprar nem que seja um pin, então esse tal amigo está a cometer uma imoralidade. Usufrui do trabalho e do esforço de terceiros que não foi dado voluntariamente e foi publicado para o autor assegurar a sua própria subsistência. Alguém extremista podia alegar que a tua mulher e os teus filhos tambem têm de compensar o autor pelo usufruto. Mas aqui já houve uma aquisiçào e seria um disparate um agregado familiar comprar mais de uma cópia do que quer que seja. Há uma diferença que só o bom senso poderá resolver. Aliás, esta é uma das razões pelas quais não acredito em leis que proibam a pirataria e o file sharing.

    Em todo o caso penso ser hipócrita defender o crowdfunding enquanto se pratica o freeriding. O que é engraçado.

    "Mas nada do que tu apresentaste justifica concluir que haja uma diferença moral porque tudo o que tu propões como regras gerais são, além de dúbias em si, incapazes de distinguir entre os casos que tu aceitas como moralmente legítimo (o direito de criticar, satirizar, emprestar, etc) e como moralmente ilegítimo (sacar da net, copiar, etc, sem pagar). "

    Sim, requer um pouco de bom senso, claro. Não se pode criar um princípio geral e depois aplicá-lo cegamente ou um robot servia para aplicar as penas. Há um juíz porque é impossivel criar leis que regulem todo e qualquer comportamento de forma inequivoca. A menos que sejas contra todas as leis cuja aplicação não possa ser cega. Boa sorte.

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  18. "Que, no comércio livre, só deves dinheiro a quem o prometeste, seja pela limpeza dos vidros do carro seja pela música que ouves."

    Repara que para um autor, toca as suas musicas, ou encenar as suas peças na rua não é bem o mesmo que gravar um cd ou editar um brd com a peça. No primeiro o teu "usufruto" é involuntário. Mas no segundo há uma componente activa: tu procuras a obra tal para sacar e recusas-te a compensar o criador alegando que "ah e tal, já lá estava."

    "Mais uma vez, é o problema de achar que aqueles produtos da criatividade humana que calha poder vender-se em rodelas de plástico são uma excepção, e funcionam de forma diferente da restante criatividade humana."

    Não, isso é treta tua. O cientista ou o professor escolhem desenvolver a sua actividade dessa maneira. Os musicos e artistas de outra pois é bem mais fácil para os primeiros terem o seu emprego e serem pagos para investigar. Depois publicam as suas descobertas e se fizerem sentido impulsionarão o tal professor para outros voos.

    Nos criadores artisticos a coisa é diferente. O seu income depende da quantidade de albuns vendidos ou se preferires, da quantidade de pessoas que acharam por bem financiar o seu album. Para mim é igual se o album foi editado ou não. E, além do mais, a compensação pode não implicar a compra da "rodela de plástico" mas uma ida a um concerto a aquisição de uma peça de merchandising ou apenas uma doacção.

    Eu não defendo a criação de leis e tu por vezes respondes como se fosse isso que eu defendesse. Acredito sim na retribuição a quem adiciona valor à minha vida. Acredito que a sociedade em geral torna-se melhor se guiada por um princípio de retribuição a quem nos faz bem e/ou sentir bem. E acredito no bom senso. Por vezes falha é claro mas não falha tanto como legislação e criminalização da partilha de ficheiros.

    Mas enfim, podes continuar a justificar não dares um centimo a quem produz filmes, musica e jogos que tu e a tua familia gostam com a evolução do saber humano, da ciência e afins. Disfarças mal o desprezo pela criação artistica pois deve te chocar imenso que más cantoras sejam mais reconhecidas que excelentes cientistas. Mas na tua cruzada pela liberdade do conhecimento e almoços grátis cilindras uma data criadores (sim, há milhares senão milhões de musicos que não têm contratos com nenhuma das empresas que integra a RIAA) que se não fosse a expectativa de lucro nunca encontrariam financiadores para os seus trabalhos.

    É a tua escolha e defendo que não haja leis que o impeçam. Mas na minha opinião o que fazes é o mesmo que dar peidos no elevador.

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  19. Há muito que ando para deixar um vestígio de qualquer coisa na caixa de comentários de um post (um qualquer) alusivo ao copyright e temáticas adjacentes. Mas depois começo a ler os comentários dos outros leitores e sou assombrado pela preguiça (e alguma falta de paciência, devo confessar). Peço desculpa se com isto não estou a contribuir em nada para a discussão, mas, honestamente, não sinto que tenha essa "obrigação moral"... Se eu fosse rico, contudo, pagava ao Ludwig Krippahl para continuar a escrever este blog. Porque me dá jeito ter alguém que pensa como eu, mas que se expressa tremendamente melhor (nós, os artistas, não temos jeito nenhum para estas coisas, por isso é que muito facilmente nos fodem...). E é por isso que vou partilhando estes posts (sinto ser essa a minha obrigação moral de fã), por achar que mais pessoas os devem ler, ao mesmo tempo que me vou apropriando deles como fundamentação teórica e crítica para alguns dos meus trabalhos. Vou então seguir a tão apregoada "moral" e agradecer ao autor por me ter aberto esta porta que ele próprio fabricou (dobradiças e fechadura incluídas).

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  20. E acho que fazes muito bem. Se o Ludwig escrevesse mal ou não suscitasse discussões interessantes eu também não leria e comentaria no blog dele.

    Mas se este fosse o ganha-pão do Ludwig e ele tivesse ali no canto um botão para donativos e assim, seria moral "agradecer" de outra maneira.

    Mas se não quiser agradecer então seja. Como já disse muitas vezes não defendo que isso seja crime ou ilicito ou afins. Como arrotar. :)

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  21. Wyrm,

    Continuas a insistir no mesmo problema. Partes de uma premissa que já sabes que eu não aceito, que é essa de usufruir do trabalho dos outros obrigar moralmente a uma compensação. Num diálogo racional, compete-te justificar porque defendes essa posição, visto que como ponto de partida não é consensual. O que me parece difícil. A história da ética é um hobby meu já há uns anos e não me ocorre qualquer sistema ético, de Aristóteles aos utilitaristas, do qual se possa inferir uma regra dessas, de que quem beneficia de algo fica em dívida só por isso.

    Além disso, nem tu aceitas essa regra como regra geral. Se contares as coisas das quais usufruis sem compensar ninguém por isso, da linguagem às descobertas científicas, das anedotas aos jogos de cartas, verás que a tua regra tem mais excepções do que norma. E esse problema é evidente na forma como invocas uma vaga noção de “senso comum” para as inúmeras excepções que tens de invocar.

    Por exemplo, o meu senso comum diz-me que a moralidade de ler um livro emprestado não tem nada que ver com o meu grau de parentesco com quem me emprestou o livro. No entanto, a tua posição exige que seja moralmente aceitável ler o livro emprestado sem pagar ao autor se o livro me for emprestado por um membro do meu agregado familiar mas moralmente obrigatório da minha parte dar dinheiro ao autor se o livro foi emprestado por um vizinho. Isto nem é senso comum nem tem justificação alguma.

    Quanto à distinção que fazes entre os cientistas, que escolhem trabalhar de uma forma, e os artistas, que escolhem outra, é irrelevante para justificar a tua posição de que há uma obrigação moral de compensar alguém pelo simples facto de usufruirmos de algo que essa pessoa fez. A menos que isto seja outra das tais excepções que magicamente saem do chapéu do “bom senso”.

    «Em todo o caso penso ser hipócrita defender o crowdfunding enquanto se pratica o freeriding. O que é engraçado.»

    Vou aproveitar isto para ilustrar o que me parece que tu devias num diálogo racional. Para justificar a minha posição vou começar por uma premissa que julgo ser consensual: um requisito do mercado livre é que a participação em qualquer transacção seja voluntária. Não será livre um mercado no qual se compre ou venda sob coação ou por obrigação. Porque presumo que concordas com isto, proponho-o como premissa.

    Agora apresento duas inferências a partir deste princípio, sem invocar excepções nem apelar para premissas escondidas num “senso comum”. Uma é que, sendo a participação livre, é legítimo que um grupo de pessoas voluntariamente decida fazer uma vaquinha para pagar algo em conjunto. A outra é que, sendo a participação livre, é legítimo que algumas pessoas não participem na vaquinha e fiquem à espera de beneficiar de borla. Não há aqui hipocrisia nem contradição. Ambas são consequência do princípio fundamental de que num mercado livre só compra e vende quem quer.

    É verdade que, por vezes, o problema do free riding é tão grave que é preciso fazer alguma coisa para o resolver. Mas essa solução sai do mercado livre. Chamamos-lhe impostos e o princípio aí é de cobrar a cada um de acordo com o que tem para dividir equitativamente por todos o esforço e os benefícios. Também não é inconsistente da minha parte ser a favor de usar dinheiro de impostos para financiar escolas de música, bolsas para artistas, exposições, museus e arte em geral. Mas isso é um sistema diferente do mercado livre.

    Seja como for, pode haver vantagens num esforço colectivo para promover algo do qual todos beneficiem, como a criatividade artística, mas isto não implica que eu tenha alguma obrigação moral de dar dinheiro ao músico só porque ouvi a música e gostei.

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  22. Ludwig,

    "Partes de uma premissa que já sabes que eu não aceito, que é essa de usufruir do trabalho dos outros obrigar moralmente a uma compensação."

    Eu simplesmente acho que quando usufruimos de algo criado por terceiros e esse algo nos enriquece a vida, temos a obrigação moral de, quando exequível, compensar o criador sobretudo se esse algo é o meio de subsistência desse criador.

    Eu acho moral porque retribuir dessa maneira:

    1) permite que o criador se sinta valorizado e tenha mais incentivo para criar.

    2) encoraja outros a disponibilizar o seu trabalho porque sabem que serão valorizados.

    3) encorajamos um comportamento que nos beneficiará a todos e fomenta a confiança.

    4) retribuir o bem que nos fazem é um comportamento que quando praticado é bom para nós e para terceiros pois traduz um menor egoismo nas relações humanas.


    "Além disso, nem tu aceitas essa regra como regra geral."

    E há alguma regra que seja geral? Poupando os jogos com a conhecida expressão é esta precisamente a razão pelo qual eu digo obrigação moral ao invés de obrigação legal. Há milhares de hipotéticas excepções e é por isso que eu refiro o "bom senso."

    Também podemos debater se é moral ou imoral arrotar no escritório ou soltar gazes em público. E para lá do obvio também encontraremos excepções. E passando a coisas mais sérias, também é imoral matar um ser humano. Mas há excepções como por exemplo se um ser humano estivesse a por os nossos filhos em perigo de vida. Há sempre excepções e desafio-te a encontrar uma regra, legal ou moral, que possa sempre ser aplicada de forma cega para o qual não há excepções.

    Para mim é muito simples, tu tens comprado os volumes do Malazan Book of the Fallen e tens gostado muito de ler. Vais emprestando os livros ao teu vizinho que também gosta. O teu vizinho lê tudo sem pagar um tostão. O que digo é que se o teu vizinho, ao ter vivido uma saga épica ao longo de 5 canhanhos de 800-1000 paginas cada um, de ter viajado, sonhado, imaginado, usufruido de todo o esforço que o autor colocou na sua obra, talvez devesse comprar o próximo livro do autor se isso lhe interessar. É uma forma de dizer ao autor que ele pode perder mais tempo a escrever cenas que ele gostará de ler.

    Eu digo senso comum porque é claro que há milhares de excepções em que não se justifica essaa retribuiçào ou ela não faz sentido. Basicamente é como o outro que não sabia definir pornografia mas que quando a visse sabia que o era.

    Se calhar o problema é "obrigação moral." Para mim o termo significa algo que tu deves fazer mas que se não fizeres também não é assim tão grave. Ë tipo uma oposição ao "obrigação legal."


    "Ambas são consequência do princípio fundamental de que num mercado livre só compra e vende quem quer."

    Mas aqui metemos duas coisas ao barulho. Se tu não queres não compras mas então porque procuras tu usufruir de algo que não queres comprar? Porque de facto estás tu a por um preço na obra do criador e, por uma coincidência esse preço é sempre 0. Nesse caso qual o valor de uma obra para ti? Porque se um dia for impossibilitada a partilha de ficheiros via internet e tu perderes esse acesso (coisa que eu não defendo de maneira nenhuma) subitamente coisas que tu colocavas um preço 0 passam a ter valor, porque continuarás a adquirir o que gostas.
    Sendo assim porque é que o valor que estás disposto a trocar pelo trabalho de alguém varia com a disponibilidade à borla?

    Repito, é moral retribuir o bem que nos fizeram. E isto vale para tudo, porque incentiva os outros a fazerem o mesmo e sinaliza ao pessoal que pode ter mais confiança uns nos outros.

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  23. Wyrm,

    «Eu acho moral porque retribuir dessa maneira:

    1) permite que o criador se sinta valorizado e tenha mais incentivo para criar.»


    Se o retorno esperado desse teu investimento é positivo, então é racional incentivares o autor. Caso contrário, o melhor será não lhe dar nada. Seja como for, essa decisão não é moralmente relevante. Trata-se apenas de escolheres como queres investir o teu dinheiro, se naquele criador se noutra coisa qualquer.

    «2) encoraja outros a disponibilizar o seu trabalho porque sabem que serão valorizados.»

    Idem. Se achas que isso te beneficia, força. Se não, então não invistas nisso. Seja como for, não tens qualquer obrigação moral de optar por uma em vez da outra.

    «3) encorajamos um comportamento que nos beneficiará a todos e fomenta a confiança.

    4) retribuir o bem que nos fazem é um comportamento que quando praticado é bom para nós e para terceiros pois traduz um menor egoismo nas relações humanas.»


    Em primeiro lugar, encorajar toda a gente a partilhar livremente as suas criações também nos beneficia a todos, traduz um menor egoísmo e melhora as relações humanas. Mas, mais importante do que isso, o benefício de encorajar essas coisas, por si só, não implica uma obrigação moral de o fazer.

    Penso que estás a ignorar a diferença entre um acto moralmente obrigatório e um acto moralmente louvável mas opcional. Em ambos os casos podemos apontar um valor moral nesses actos, mas só no último caso é que é legítimo alguém invocar o direito moral de não agir dessa forma.

    Dedicar a vida à medicina para salvar vidas é moralmente louvável, mas não podes dizer que é moralmente obrigatório porque a pessoa em causa pode decidir não se dedicar à medicina invocando um direito legítimo de optar por uma alternativa. Se é legítimo dizer “eu tenho o direito moral de não fazer X”, então X não é moralmente obrigatório. É nessa categoria que se insere estas coisas que tu recomendas. Incentivar o artista, etc, pode ser moralmente louvável se tiver estes benefícios todos para terceiros, mas continua a ser verdade que temos o direito moral de não incentivar um artista se não quisermos fazê-lo.

    Para aceitar a tua tese da obrigação moral de incentivar o artista preciso que me expliques porque é que não é moralmente legítimo decidir não incentivar um artista.

    «Se tu não queres não compras mas então porque procuras tu usufruir de algo que não queres comprar?»

    Porque posso obtê-lo de outra forma, mais barata. Por exemplo, posso comprar o almoço no restaurante, posso comprar os ingredientes e cozinhar ou posso ir almoçar a casa da minha mãe. Moralmente, não vejo que esteja obrigado a optar por uma destas em detrimento das restantes só para não usufruir sem comprar.

    No caso da música posso comprar o CD, pedir emprestado, gravar da rádio ou sacar da net. Moralmente, a situação é equivalente.

    «Repito, é moral retribuir o bem que nos fizeram»

    E eu também repito: “é moral” omite a distinção fulcral entre moralmente obrigatório (não tens o direito moral de agir de outra forma) ou moralmente louvável mas opcional (é bom fazer isso, mas tens todo o direito de recusar).

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  24. "Se o retorno esperado desse teu investimento é positivo, então é racional incentivares o autor. Caso contrário, o melhor será não lhe dar nada. Seja como for, essa decisão não é moralmente relevante."

    Novamente introduzes nova semântica para baralhar os termos e saires por cima. A decisão é moralmente relevante pois ao valorizar o autor estou a retribuir o bem que ele me fez e a garantir que ele continuará a fazer coisas boas. E eu, como toda a gente, gosto de coisas boas. Se eu optar por não o compensar porque não gostei da obra que puxei também não direi que o gesto é imoral. Mas se usufruo repetidamente e gosto acho que retribuir da maneira que posso para que ele se sinta valorizado é o mínimo exequível.


    "Idem. Se achas que isso te beneficia, força. Se não, então não invistas nisso. Seja como for, não tens qualquer obrigação moral de optar por uma em vez da outra."

    Idem. Isto não parte da situação em que escolho investir neste ou naquele. Parte de ter usufruido obras de um autor as quais adicionaram valor á minha vida e pretender retribuir. O que não é moral ou imoral é a decisão de investimento mas não é disso que estou a falar.


    "Em primeiro lugar, encorajar toda a gente a partilhar livremente as suas criações também nos beneficia a todos, traduz um menor egoísmo e melhora as relações humanas."

    Sim, claro, tens razão. Há muita gente que escreve e compõe como um hobby. Outros não. Por exemplo, tu também podias passar a dar aulas como um hobby e deixavas de ser pago pela tua universidade. Também ias fomentar mais a partilha de conhecimento. E se calhar sentir-te-ias compensado pelo "obrigado stor" dos teus alunos. Apenas digo que entre contribuir no crowdfunding á periori ou adquirir uma obra que gostamos (ou fazer uma doacção ao autor que gostamos) não te compete a ti decidir como é que alguém irá vender o seu trabalho. Aproveitares-te da tecnologia para usufruires de almoços gratís é imoral e não tens o direito de exigir que toda a gente negoceie o seu trabalho da forma que achas que deve ser feito.

    "Por exemplo, posso comprar o almoço no restaurante, posso comprar os ingredientes e cozinhar ou posso ir almoçar a casa da minha mãe."

    É por isto que eu falo em bom senso. Coisa que tu finges não ter preferindo dedicares-te ao nitpicking semântico do que debater as questões. Explica-me lá o que isto tem a ver com o que debatiamos?



    "No caso da música posso comprar o CD, pedir emprestado, gravar da rádio ou sacar da net. Moralmente, a situação é equivalente."

    Basicamente ao comprar o CD seria a unica opção que é a moral. A questão é se as outras são imorais. Para mim é muito simples, se usufruis de algo pelo qual pagarias se não te fosse disponibilizado á pala então o teu comportamento é imoral. O que sinalizas neste caso é que por muito que gostes do trabalho de alguém não o compensas se a obra dele estiver disponivel de forma gratuita.

    Isto é imoral porque aproveitas-te do esforço e, muitas vezes, da boa vontade de alguém sem o compensares minimamente pelo seu trabalho. Acho que está mal e admira-me que sejam precisos tantos comments e tanto nitpicking da tua parte para combater essa noção.

    Sugiro que escrevas um post acerca da moralidade de dar peidos no elevador para defenderes que dar um peido no elevador não é moral nem imoral. :)

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  25. Wyrm,

    «Novamente introduzes nova semântica para baralhar os termos e saires por cima.»

    A semântica, do meu lado, foi sempre a mesma. Se eu comprar bolos ao pasteleiro isso beneficia-o. Portanto, há valor moral em comprar bolos ao pasteleiro. No entanto:

    1- Se bem que comprar bolos, beneficiando o pasteleiro, seja moralmente louvável não é moralmente obrigatório, porque tenho o direito moral de não comprar bolos se não quiser.
    2- Os valores morais em 1 não têm nada que ver com eu gostar de bolos ou não gostar de bolos. Continua a ser moralmente louvável comprar bolos ao pasteleiro mesmo que eu odeie bolos, e continua a ser um direito moral meu não lhe comprar nada mesmo que eu adore bolos.
    3- Se me delicio todos os dias com o cheiro da pastelaria, e passo várias vezes à porta só para cheirar, não é por isso que incorro numa obrigação moral de gastar dinheiro em bolos.

    Se concordas com isto, por consistência, deves rever a tua posição.

    «Para mim é muito simples, se usufruis de algo pelo qual pagarias se não te fosse disponibilizado á pala então o teu comportamento é imoral.»

    Para mim também é muito simples. Se usufruis gratuitamente de algo que outra pessoa fez, e voluntariamente colocou de forma acessível, sem que tivesse razão para crer que lhe pagarias o teu comportamento não é imoral porque tens o direito moral de o fazer. Isto inclui usufruíres do cheiro a bolos, de ver as belas flores que o vizinho plantou, de lavar as mãos porque alguém te informou que há microorganismos patogénicos, de levar um guarda-chuva porque ouviste na televisão que ia chover, e do mp3 que sacaste do Rapidshare. Se usufruis algo que foi criado e publicado sem contar com o teu pagamento, não tens obrigação moral de pagar por isso.

    Num mercado livre, só és moralmente obrigado a pagar por aquilo que prometeste pagar. Ao contrário de ti, eu não preciso de invocar carradas de excepções para coisas como livros emprestados por irmãos ou o cheiro das rosas. É esta a regra que defendo, e a que sigo. Por exemplo, não me deves nada por este blog ou por este comentário.

    Se há um valor moral tal que se tenha de obrigar pessoas a pagar, então cobra-se impostos e pronto. Mas a obrigação moral de pagar impostos não vem do usufruto da coisa que se paga, mas sim do valor moral de partilhar o sacrifício equitativamente.

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  26. "1- Se bem que comprar bolos, beneficiando o pasteleiro, seja moralmente louvável não é moralmente obrigatório, porque tenho o direito moral de não comprar bolos se não quiser.
    2- Os valores morais em 1 não têm nada que ver com eu gostar de bolos ou não gostar de bolos. Continua a ser moralmente louvável comprar bolos ao pasteleiro mesmo que eu odeie bolos, e continua a ser um direito moral meu não lhe comprar nada mesmo que eu adore bolos.
    3- Se me delicio todos os dias com o cheiro da pastelaria, e passo várias vezes à porta só para cheirar, não é por isso que incorro numa obrigação moral de gastar dinheiro em bolos."

    Que estupidez, Ludwig. Ninguém te obriga a comprar os bolos e também ninguém te obriga a comprar a obra. A comparação não tem cabimento, como sempre. A tua semantica não é bem a mesma pois tu vais mudando subtilmente a natureza dos exemplos que dás de modo a fazer a minha posição parecer absurda. Mas qualquer pessoa nota que estás a comparar negócios diferentes. Porque não sugeres que o pasteleiro primeiro crie uma conta no Kickstarter para financiar a próxima fornada de bolos?

    Continuas a insistir que a comercialização de obras que podem ser representadas por bits evolua com a tecnologia mas depois sem qualquer lógica recusas que o conceito de roubo evolua também. Os termos evoluem e se tanta coisa tem que evoluir a partir do momento em que um disco ou livro deixa de poder ser comercializado como era tradicionalmente então porque motivoe a noção de roubo não há-de igualmente evoluir e adaptar-se aos tempos que correm? É que apesar de eu ser contra isso, pelo menos tento não ter dois pesos e duas medidas dependendo do argumento. E "eu acho que é melhor assim" não é argumento nenhum.


    "Se usufruis gratuitamente de algo que outra pessoa fez, e voluntariamente colocou de forma acessível, sem que tivesse razão para crer que lhe pagarias o teu comportamento não é imoral porque tens o direito moral de o fazer."

    Tu não tens "direito" nenhum sobre o esforço de outrem. O autor muitas vezes coloca a sua obra num estabelecimento para ser vendida. Isto é diferente de alguém a colocar na net porque ripou o cd ou scanou o livro. Podes ter mais razão se falares em autores que colocam todo o seu trabalho na net pedindo apenas uma doação a quem gostar. Mas mesmo nesses, se a obra nos enriquece, se adiciona valor à nossa vida, se é algo que nos preenche então é perfeitamente imoral, ou se preferires moralmente condenável, não retribuires.

    Isto nõa é um gajo que planta flores na varanda, nem o pasteleiro, nem o pasteur nem outra comparação idiota que gostas de atirar. É um gajo que cria algo e esse algo ou nos dá prazer, valor ou não. Se não, by all means, fica quieto, não lhe dês nada. Mas se pelo contrário a obra enriqueceu a tua vida e se sabes que o autor em questão produz obras para poder comer qual é a grande diferença entre teres visto num mês o Kickstart dele a pedir fundos para a obra ou dali a dois a obra publicada?


    "Ao contrário de ti, eu não preciso de invocar carradas de excepções para coisas como livros emprestados por irmãos ou o cheiro das rosas."

    Todas as leis, regras, normas têm excepções. Não somos máquinas. Tu já invocas uma grande excepção: todos têm direito ao fruto do seu trabalho e à liberdade de o comercializarem da forma que quiserem menos os artistas que tentam viver da musica. Esses só têm direito a fazer negócio da forma que te permite parasitar. Eu percebo, quando alguém se habitua a almoços gratis e prega a moralidade e sugere aos criadores que vão vender canecas é sinal que não dás grande valor ao que fazem.


    "Por exemplo, não me deves nada por este blog ou por este comentário."

    Muito obrigado, mas tu não vives do blog, nem dos comentários e nem sequer pedes donativos ou afins. Mas ainda assim eu já te compenso largamente pela tua escrita dando-te aquilo que mais gostas: atenção.

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  27. "Se há um valor moral tal que se tenha de obrigar pessoas a pagar"

    Não pá. Novamente a moral não é digital, é analogica. Há imoralidades cuja repercussão na sociedade é baixa e que não é justifica a criação de leis que acabem com aquelas. E outras vezes as consequências da legislação para certos casos seria pior do que a ausência de legislação. Por exemplo as drogas em que julgo que as consequências de haver leis proibicionistas são piores que as consequências da legalização.

    Neste caso concreto há um criador que produz obras com o intuito de vender cópias para ganhar a vida. Ele pode criar um projecto no Kickstarter para fazer a obra mas também é legitimo que encontre financiamento e com esse dinheiro crie a sua obra com boas condições e coloca a sua obra à venda para poder comer. Se tu adquires a sua obra e ela te enriquece a tua vida de uma forma um pouco mais profunda que o cheiro a bolos ou a visão das flores então é uma obrigação moral tua compensares o artista. Uma forma de retribuição. Da mesma forma que eu retribuo dando-te conversa. E neste caso estou a dar-te parte do meu tempo. E tempo é dinheiro.

    De todas as maneiras há uma coisa que me dá imenso gozo. São as tuas justificações para o free riding que são um case study do nosso chico-espertismo que neste momento é completamente destrutivo para a criação artistica. Só não tenho pânico porque o dano que oportunistas como tu causam vai sendo compensado pela evolução tecnológica e tenho esperança que daqui a 20 anos a tecnoloogia tenha evoluído tanto que putos curiosos em casa consigam fazer filmes em CGI que hojem em dia custam milhoes de dolares para produzir.

    E mesmo nesses se a obra é de facto excelente e nos enriquece há uma obrigação moral de o compensar. Ou se preferires é moralmente condenável não o fazer. Repara que a compensação não é por teres passado por uma televisão, ou por um amigo teu te ter emprestado o cd ou teres sacado da net e visto uma vez ou duas ou três. É quando essa obra representa algo maior que os simples bytes que foram descodificados quando tem um impacto francamente positivo na tua vida. Tipo, se dizes que tal obra é a tua preferida e/ou que aprendeste imenso com ela, não retribuires é imoral.

    Tu prentendes partir disto e criares uma lei geral e como nenhuma lei pode ser geral e aplicada cegamente alegas que é razão para rejeitar. Por essa ordem de ideias poucas leis sobravam no código penal. :)

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  28. Não tenho acompanhado a discussão a 100%, mas parece-me também que o exemplo do pasteleiro conforme exposto pelo Ludwig é uma péssima analogia, e uma que ele vai repetindo.

    Uma analogia adequada e justa, com a qual o Ludwig dificilmente poderia discordar, seria esta:

    Um cozinheiro tem uma página de internet com uma área pública e uma área reservada.
    Na área pública ele diz que quem quiser ter acesso às suas receitas que estão na área reservada deve pagar 5 moedas e comprometer-se a não as divulgar.
    Podemos imaginar que, ao contrário do que se sucede, a lei protegeria este modelo de negócio, considerando ilegal a divulgação de receitas por parte daqueles que se tinham comprometido a não as divulgar (e assim ganho acesso às receitas).
    E podemos imaginar que, em consequência dessa lei, existiam pessoas que tinham como profissão experimentar receitas não para as cozinhar em massa, mas para vender a receita em si. O nosso cozinheiro - melhor dizendo é um inventor de receitas - seria uma delas.

    Parece-me que o Ludwig e o Wrym estão de acordo que tal lei é ilegítima. Continuemos.

    O José paga para aceder às receitas, compromete-se a não as divulgar, mas rejeita a lei que o obriga a cumprir tal promessa.
    Por isso, a coberto do anonimato, cria um site, nesse site existe uma parte onde se esclarece que estão lá as receitas do cozinheiro, e existem vários PDFs com cada uma dessas receitas.

    O Alberto vai ao site do José e saca um desses PDFs.

    O que ele fez é imoral?

    Perante esta analogia - mais justa - o wrym diria que sim, e o Ludwig diria que não.

    Intuitivamente parece que o wrym tem razão. Afinal, o Alberto está a usufruir do trabalho do cozinheiro à custa dos outros que respeitaram as regras estabelecidas para financiar esse trabalho, violando a vontade do criador.
    O Ludwig rapidamente fará notar que há situações em que é legítimo violar a vontade do criador. Sem dúvida.
    Mas se a ética corresponde à procura da forma ideal de conciliar vontades, não podemos desqualificar sem mais essa questão. Saber se é determinante vai depender do caso concreto.
    Se a atitude do Alberto tenderá a resultar em injustiças - estão outros involuntariamente a pagar pelo seu usufruto das receitas - parece ter uma moralidade algo questionável.

    Ainda assim, viver num mundo onde pessoas que tenham como profissão exclusiva ser criadores de receitas (sem cozinhar em massa essas receitas) não conseguem encontrar formas de ser financiadas parece ser menos problemático do que essa situação em relação aos filmes de cinema e músicas - aí não é impossível que existam alguns profissionais, mas que existam obras que satisfaçam tão bem os diferentes gostos.
    O que acentua um pouco a possível imoralidade do acto do Alberto.

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  29. Wyrm,

    «Tu não tens "direito" nenhum sobre o esforço de outrem.»

    Concordo. Mas se o outro decide fazer esse esforço livremente, sem eu lhe prometer nada, e acontece que esse esforço me beneficia (e.g. ele decidiu escrever um post no blog e eu gostei de ler), esse outro também não tem direito nenhum sobre o esforço que eu faço para lhe pagar. Nota bem que se dizes que eu tenho o dever moral de te dar dinheiro estás a dizer que tu tens um direito moral sobre esse meu dinheiro.

    Se assumirmos – correctamente, na minha opinião – que só temos direito sobre o esforço de outrem quando há um compromisso nesse sentido da parte dessa pessoa, então temos de concluir que nem eu tenho o direito de exigir que o músico cante nem o músico, se decidiu cantar, gravar e publicar a gravação, tem direito de me exigir pagamento só porque eu ouvi, gostei, copiei, etc.

    Nota que a minha objecção não é à ideia de que somos bonzinhos se dermos dinheiro aos autores que apreciamos. A minha objecção é à alegação de haver uma obrigação moral de pagar, porque uma obrigação moral implica um direito moral da outra parte. Neste caso, implica um direito moral da parte do autor sobre o esforço que eu fiz para ganhar o dinheiro que tu dizes que eu lhe devo.

    «Muito obrigado, mas tu não vives do blog»

    Boa. Temos então o caso arrumado, porque é garantido que nenhum autor poderá viver do dinheiro que não lhe dou. Se isso implica que não lhe devo nada, fica o assunto resolvido :)

    «Novamente a moral não é digital, é analogica.»

    Tens uma obrigação moral quando o valor moral de agir de certa forma é superior ao valor moral da liberdade de agir de outra (e vice-versa). Por exemplo, tens a obrigação moral de salvar a criança que se está afogar no charco à tua frente porque o valor moral desse acto é superior ao valor moral da tua liberdade de virar costas e ir embora. Os valores são analógicos, mas a obrigação só surge quando um é maior do que o outro.

    E eu defendo que não tenho a obrigação moral de pagar a um músico pelo mp3 que descarreguei (ou pelo CD que pedi emprestado, ou pelo que gravei do rádio) porque a liberdade de não pagar algo que não prometi pagar tem um valor moral superior ao valor moral do músico receber dinheiro de alguém que não tem qualquer obrigação contractual com ele.

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  30. "Concordo. Mas se o outro decide fazer esse esforço livremente, sem eu lhe prometer nada, e acontece que esse esforço me beneficia (e.g. ele decidiu escrever um post no blog e eu gostei de ler), esse outro também não tem direito nenhum sobre o esforço que eu faço para lhe pagar."

    Um perfeito manifesto em favor do Free Riding. O que o outro vez de livre vontade foi colocar a obra à venda. Ou de livre vontade disponibilizou a obra e pediu a quem gostar uma contribuição para a poder fazer a próxima.

    No primeiro caso ele não disponibilizou a obra: colocou-a à venda. No segundo caso pediu apenas para se gostarem da obra e se quiserem mais então que contribuam com alguma coisa. Se o autor não diz: tomem aproveitem e eu não quero nada em troca, aí sim, podes falar da liberdade do autor. De contrário és tu que abusas da boa vontade dele.


    "nem eu tenho o direito de exigir que o músico cante nem o músico, se decidiu cantar, gravar e publicar a gravação, tem direito de me exigir pagamento só porque eu ouvi, gostei, copiei, etc."

    Desculpa mas eu não tenho mesmo outra palavra para isto senão: idiotice. Não tens o direito de exigir que o musica cante assim como ele não tem direito a exigir que o oiças e gostes. A dicotomia que apresentas é falsa. Se usufruis do trabalho de alguém e se isso te adiciona valor tens a obrigação moral de o compensar. Normalmente é com dinheiro.

    Eu compenso-te com conversa, e pelos vistos agrada-te pois ela continua. :)


    "exigir pagamento só porque eu ouvi, gostei, copiei, etc"

    Se for esperto não exige. É engraçado quando eu coloco a conversa no plano moral mas tu respondes sempre como se a conversa fosse num plano legal. Se calhar tenho de encontrar outro termo, mas eu já expliquei que obrigação moral é aquela á qual não és de facto obrigado ou coagido a agir mas sim aquela em que seria ético e/ou civilizado agires dessa maneira.

    Eu acho que é ético retribuirmos o bem que nos fazem. No caso particular de alguém que usa do seu talento para criar algo que adiciona valor ao mundo então quem usufrui desse talento devia sentir-se moralmente obrigado a compensar o autor da forma que entender. Mas se ele vende o produto do seu trabalho disponibilizando obras em formatos que podem ser copiados ele não devia ser explorado por esse factor. Devia sim ser compensado por todos aqueles que gostam e usufruem e ainda mais por aqueles que outra maneira pagariam para ter acesso a essa obra.


    "Temos então o caso arrumado, porque é garantido que nenhum autor poderá viver do dinheiro que não lhe dou."

    Tu escreves um blog porque gostas de escrever e ganhar debates. É aqui que te sentes um alpha male. Posso estar completamente errado mas do meu ponto de vista é uma das razões pelas quais continuas a escrever e quase sempre sobre assuntos que vão causar polémica. Um autor publica o seu trabalho para ganhar dinheiro. Novamente a dicotomia é falsa. Tu não lhe pediste para criar, ele não te pediu para ouvir. Mas ele, na sua ingenuidade e confiança, editou as coisas dizendo quem quiser isto por favor dê-me x pelo meu esforço ou, como muitos, quem gostar contribua com alguma coisa. Já há uma condição para aceder ao seu trabalho. Podes ignorar essa condição mas não venhas a dizer que é moral fazê-lo.


    "porque a liberdade de não pagar algo que não prometi pagar tem um valor moral superior"

    Apenas e só se o usufruto te foi imposto. Se não foi, tens a obrigação de compensar o seu criador pelas razões atrás descritas.

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  31. João Vasco,

    «Mas se a ética corresponde à procura da forma ideal de conciliar vontades, não podemos desqualificar sem mais essa questão.»

    É precisamente essa a questão. Eu não estou a desqualificar sem mais, mas sim a chegar à minha posição por considerar os vários valores morais em causa. Vou começar pelo teu exemplo.

    «Na área pública ele diz que quem quiser ter acesso às suas receitas que estão na área reservada deve pagar 5 moedas e comprometer-se a não as divulgar.»

    Vamos considerar o problema ético de o cozinheiro ter o site configurado de forma a que só depois da transacção estar confirmada e ele ter as 5 moedas na sua conta é que o utilizador recebe uma password para aceder à receita. Neste caso temos por um lado o valor moral da liberdade do cozinheiro configurar assim o site e, por outro, o valor moral do visitante ter acesso gratuito à receita. Neste caso, penso que o primeiro é claramente superior, e eu seria contra privar o cozinheiro da liberdade de ter assim o site só para favorecer quem quer receitas à borla.

    Mas com a parte “comprometer-se a” o caso é mais complexo. Imagina que eu ponho um link no meu site e escrevo “quem seguir este link compromete-se a saltar à corda meia hora por dia durante os próximos vinte anos”. O valor moral de eu ter a minha pretensão atendida por qualquer pessoa que siga o link é claramente inferior ao valor moral do direito de um visitante pensar “vai-te mas é lixar” e seguir o link sem se comprometer a nada. Portanto se o cozinheiro tiver apenas uma coisa escrita “compromete-se a não divulgar” e um botão “OK para continuar”, eu diria ser moralmente aceitável (i.e. um direito moral do visitante) carregar no botão sem que isso o comprometa a coisa nenhuma.

    Isto é importante porque, de acordo o princípio de considerar os valores morais dos vários interesses, o dever moral de não divulgar, de pagar 5 moedas, etc, não é algo que surja sem mais nem menos. Tem de resultar de um compromisso livre e explícito. Por exemplo, mandar fazer a transferência com o cartão de crédito, assinar um contrato, encomendar um serviço etc.

    Nota também que deve haver proporcionalidade para que o contrato seja moralmente válido. Neste teu exemplo, não me parece moralmente aceitável considerar que a pessoa que descarrega a música abdicou irremediavelmente, para toda a vida, do seu direito de mudar de ideias. Por isso não me parece que um contrato de “nunca mais divulgar” seja moralmente válido.

    Com isto é fácil decidir sobre o que fez o Alberto. O Alberto não se comprometeu a coisa nenhuma com o cozinheiro. Se o contrato pelo qual o José se comprometeu a não divulgar a receita para o resto da vida já é moralmente questionável, e se não basta o cozinheiro escrever “quem aqui vem está obrigado a fazer o que eu quero” para criar no visitante uma obrigação moral, parece-me claro que o Alberto não tem qualquer obrigação moral para com o cozinheiro. Isso exigiria uma inversão total dos valores que estamos a considerar nos outros casos.

    «em relação aos filmes de cinema e músicas - aí não é impossível que existam alguns profissionais, mas que existam obras que satisfaçam tão bem os diferentes gostos.
    O que acentua um pouco a possível imoralidade do acto do Alberto.»


    Só se o valor moral de haver quem faça receitas e essas outras obras for suficientemente alto para justificar obrigar os Albertos todos a pagar por isso mesmo que não se tenham comprometido. Não excluo essa hipótese, e até a considero realista. Mas, nesse caso, o que temos são impostos, e a solução moralmente mais recomendável é que cada um pague de acordo com o dinheiro que tem e não pelas receitas que usa.

    Por isso sou a favor de impostos para subsidiar a criação artística mas sou contra leis que obriguem as pessoas a pagar porque ouviram uma música e gostaram dela.

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  32. Wyrm,

    «Um perfeito manifesto em favor do Free Riding.»

    Considera o que o João Vasco escreveu:

    «Se a atitude do Alberto tenderá a resultar em injustiças - estão outros involuntariamente a pagar pelo seu usufruto das receitas - parece ter uma moralidade algo questionável.»

    O free riding só é um problema moral (e, em rigor, só é free riding) se o free rider estiver a prejudicar os outros. Por exemplo, quem foge ao fisco mas usa as estradas, serviços de saúde e afins está a consumir recursos de todos sem pagar a sua parte. Se os vizinhos organizam uma sardinhada e fazem uma vaquinha para pagar as sardinhas e eu vou lá comer à borla, sou um free rider, cometendo a injustiça de estar a deixar menos sardinhas para quem as pagou.

    Mas se os vizinhos montam um árvore de natal na rua e eu passo horas deliciado a ver a árvore da minha janela isso é free riding no sentido lato, porque estou a usufruir de algo pelo qual outros pagaram, mas não no sentido económico do termo (ou no sentido moralmente relevante) porque é indiferente para os se eu fico deliciado a olhar ou se me mete nojo as decorações e fecho as persianas.

    E este é que é o ponto crucial. Até tu admites que se eu descarrego uma música, oiço e detesto então não tenho a obrigação de pagar. O ponto que tens de considerar é que eu gostar da música não faz diferença absolutamente nenhuma para mais ninguém. Por isso, não é moralmente relevante e não me obriga a coisa nenhuma. Tenho tanta obrigação moral de pagar pela música que descarrego para ouvir e detesto como tenho de pagar pela música que descarrego e adoro, porque qualquer obrigação moral de pagar viria apenas do prejuízo que esse descarregar causasse a terceiros.

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  33. «Mas com a parte “comprometer-se a” o caso é mais complexo. »

    Sim, mas é essa complexidade que não pareces reconhecer.


    «Imagina que eu ponho um link no meu site e escrevo “quem seguir este link compromete-se a saltar à corda meia hora por dia durante os próximos vinte anos”. O valor moral de eu ter a minha pretensão atendida por qualquer pessoa que siga o link é claramente inferior ao valor moral do direito de um visitante pensar “vai-te mas é lixar” e seguir o link sem se comprometer a nada. Portanto se o cozinheiro tiver apenas uma coisa escrita “compromete-se a não divulgar” e um botão “OK para continuar”, eu diria ser moralmente aceitável (i.e. um direito moral do visitante) carregar no botão sem que isso o comprometa a coisa nenhuma.»

    Exacto!

    Mas repara: existem vários contratos em relação aos quais não dirias isso. Se a pessoa os aceitou tem obrigação moral de os respeitar, mesmo que posteriormente tenha mudado de ideias.

    E a fronteira entre uns e outros não é clara e inequívoca, de forma que a possa explicitar numa ou duas frases escritas num blogue.

    É fácil dares exemplos de contratos que estão de um lado da fronteira - é imoral desrespeitá-los - e é fácil dares exemplos de contratos que estão do outro lado, como esse do saltar à corda.

    Se o José porventura tem anúncios no seu site e ganha dinheiro com isso, intuitivamente é muito claro para muitos que o seu desrespeito pelo contrato estabelecido é imoral - mesmo que a lei que protege o cumprimento desse contrato seja vista como injusta.
    Claro que esta intuição pode estar errada, mas falta explicar porquê.

    Quanto ao Alberto, quem considerar a atitude do José imoral, facilmente identifica o Alberto como a outra face desse mesmo acto.
    Como quem compra um telemóvel roubado, sabendo que o telemóvel foi roubado (não estou a dizer que copiar a música é igual a roubar, estou a focar apenas a semelhança na forma como uma imoralidade implica que a outra também seja imoral).
    Se o que o José fez foi imoral é difícil defender que aquilo que o Alberto fez não foi.

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  34. "O ponto que tens de considerar é que eu gostar da música não faz diferença absolutamente nenhuma para mais ninguém."

    A diferença neste ponto é que por algum motivo que eu não consigo descortinar sinalizas que não compensa criar com o intuito de ganhar a vida pois ninguém dará valor ao esforço.

    Nos exemplos que dás, há um dano directo e legislado. É por isso que quem não paga impostos, e se não for rico ou politico, é multado ou preso.

    Mas no caso do free riding que falamos o dano é mais difuso, razão pela qual sou absolutamente contra qualquer legislação que ilegalize a partilha de ficheiros.

    Mas acredito que se sinalizares á sociedade que valorizas o esforço de outros e o compensas quando esse é do teu agrado incentivarás a produção artistica e não só pois os criadores saberão que quem gosta irá, pelo menos, ao concerto, comprar uma caneca, um pin, um dvd, um cd, enfim, qualquer coisa que permita ao criador continuar viver do seu trabalho e continuar a criar de forma livre.

    Eu quando teço considerações acerca da tua motivação não são tentativas de ad hominem mas porque não concebo a razão pela qual consideras moralmente neutro aproveitares-te da obra de alguém, essa obra enriquecer-te e achares que não tens qualquer obrigação moral de compensar essa pessoa. Porque se não lhe pediste nada, também ninguém te pediu para copiares a obra que um qualquer espero resolveu "partilhar."

    Já agora:

    "O valor moral de eu ter a minha pretensão atendida por qualquer pessoa que siga o link é claramente inferior ao valor moral do direito de um visitante pensar “vai-te mas é lixar” e seguir o link sem se comprometer a nada."

    Porquê? Quer isso dizer que ninguém tem o direito de pedir o preço que quer pelo seu trabalho? Alguém obriga alguém a clicar o link? E porquê saltar à corda? Se é para o reduction ad absurdum porque não partir logo para "quem seguir o link tornar-se-á meu escravo e terá de me oferecer o filho primogénito em sacrificio?" Os exemplos são uma merdinha de argumento, passe a expressão. Tu dás um, eu dou outro, o joão dá outro.

    O que interessa é o seguinte: tu simplesmente achas que trabalho artistico que seja editado, "azar do otário que editou, tivesse pedido o dinheiro antes." Isto para mim é imoral porque, já dizia o Variações, "dar e receber devia ser a nossa forma de viver."

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  35. João Vasco,

    «Mas repara: existem vários contratos em relação aos quais não dirias isso. Se a pessoa os aceitou tem obrigação moral de os respeitar, mesmo que posteriormente tenha mudado de ideias.»

    Sim. Mas o meu ponto é que não só se exige um contrato para que haja obrigação moral, como tem de ser um contrato ao nível da obrigação moral na qual se incorre. Por exemplo, um contrato segundo o qual ficas obrigado durante vinte anos a não distribuir um ficheiro não é coisa para um click. É algo mais sério.

    E mesmo que não possamos decidir com rigor onde fica a linha, isto demonstra claramente uma coisa: alguém que não se comprometeu em contrato nenhum não pode ter a obrigação moral de respeitar estas restrições. É esse o meu ponto. Se eu não celebrei qualquer contrato com o cozinheiro e encontro material que ele vendeu a terceiros, eu não tenho obrigação moral de lhe dar dinheiro, de guardar confidencialidade, etc.

    «Quanto ao Alberto, quem considerar a atitude do José imoral, facilmente identifica o Alberto como a outra face desse mesmo acto.»

    Não vejo porquê. Nota que a única razão para julgar a atitude do José imoral é ele desrespeitar um contrato que celebrou voluntariamente com o cozinheiro. Não é por beneficiar, usufruir, gostar, ou outra coisa qualquer. É apenas, somente, porque celebrou um contrato e depois quebrou-o. Assim sendo, não há razão nenhuma para culpar o Alberto seja do que for. É como o Wyrm combinar contigo ir limpar-te a casa, tu pagares-lhe, ele não aparecer e eu ser também culpado porque também não te limpei a casa. Não sou, porque não tenho nada que ver com o que vocês combinaram.

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  36. Há imoralidade em comprar um objecto roubado sabendo que foi roubado?

    Sim, porque se promove um acto imoral: o roubo.
    Nota que o comprador não rouba nada, ele não tem culpa que o vendedor tenha roubado. Mas visto que o acto do comprador incentiva o roubo, ele também é visto como imoral, caso o comprador esteja consciente da origem dos bens que pretende comprar - e bem, a meu ver.

    Nesse sentido, a acção do Alfredo é análoga à do comprador. Ele incentiva o comportamento (imoral?) do José.

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  37. Wyrm,

    «A diferença neste ponto é que por algum motivo que eu não consigo descortinar sinalizas que não compensa criar com o intuito de ganhar a vida pois ninguém dará valor ao esforço.»

    As tuas razões para considerar algo de imoral estão cada vez mais estranhas. Mas pronto, siga.

    Eu proponho que isso não é imoral.

    Imagina que eu escrevo no blog que não compensa criar com o intuito de ganhar a vida pois ninguém dará valor ao esforço. Faço T-shirts com “não compensa criar com o intuito de ganhar a vida pois ninguém dará valor ao esforço”. Faço bandeiras com “não compensa criar com o intuito de ganhar a vida pois ninguém dará valor ao esforço” e aceno-as pela rua, e distribuo-as a quem passar. Organizo uma manifestação para divulgar que “não compensa criar com o intuito de ganhar a vida pois ninguém dará valor ao esforço”. Nada disso é imoral. Faz parte da minha liberdade de expressão. Por outras palavras, o valor moral da minha liberdade de “sinalizar” isto é superior ao valor moral de alguém “criar com o intuito de ganhar a vida” e ser pago por isso.

    Portanto, parece-me evidente que o facto de eu não pagar sinalizar que “não compensa criar com o intuito de ganhar a vida pois ninguém dará valor ao esforço” não pode tornar esse acto imoral. Até porque se eu não gostar da canção sinalizo precisamente a mesma coisa, e isso, pelo que percebo, tu consideras moralmente aceitável...

    «Mas no caso do free riding que falamos o dano é mais difuso»

    Não é difuso. É zero. Considera estes dois cenários:

    A- eu descarrego uma música, oiço, odeio, não pago.
    B- eu descarrego uma música, oiço, adoro, não pago.

    O dano que torna B imoral sendo A moralmente aceitável é a diferença entre B e A. E essa diferença, para o autor, para a sociedade, para o negócio, para a música, etc, é zero.

    É claro que podes dizer que se ninguém que adore a música pagar, o cantor tem de arranjar outro emprego mesmo que muitos adorem a música. Pode ser. Mas eu não sou moralmente responsável por isso. Esse problema não resulta de uma imoralidade minha.

    « Quer isso dizer que ninguém tem o direito de pedir o preço que quer pelo seu trabalho?»

    Não. Quer dizer que o simples facto de pedir não obriga ninguém a dar.

    Imagina que no cabeçalho de cada post eu escrevia que quem ler esse post fica a dever-me 100€. Isso, por si só, não cria qualquer obrigação moral em ninguém de me pagar. Mesmo que leiam os meus posts. Porque qualquer pessoa tem o direito de ler essa mensagem, recusar a minha exigência, e continuar a ler.

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  38. Wyrm,

    «Há imoralidade em comprar um objecto roubado sabendo que foi roubado?»

    Sim.

    «Sim, porque se promove um acto imoral: o roubo.»

    Não. É imoral comprares um objecto roubado sabendo que foi roubado porque estás deliberadamente a apropriar-te de um objecto contra a vontade do seu proprietário. Ou seja, estás a roubar.

    «Nota que o comprador não rouba nada»

    Legalmente pode haver distinção mas, moralmente, não vejo que seja relevante se o teu acto deliberado de ficar com propriedade alheia contra vontade do proprietário envolveu intermediários ou não.

    «Nesse sentido, a acção do Alfredo é análoga à do comprador. Ele incentiva o comportamento (imoral?) do José.»

    Mesmo que fosse automaticamente imoral “incentivar” ou “promover” comportamentos imorais – e nesse caso seria automaticamente imoral questionar qualquer valor moral estabelecido, pelo que rejeito essa premissa, estando apenas a considerá-la só para explorar o resto do teu argumento – não é claro que o Alfredo, pelo simples acto de descarregar um ficheiro, esteja a incentivar o José. Se pagar ao José para angariar receitas, ainda vá. Mas se tudo o que fez foi ligar o bittorrent e esperar, nem isso podes alegar...

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  39. «Não. É imoral comprares um objecto roubado sabendo que foi roubado porque estás deliberadamente a apropriar-te de um objecto contra a vontade do seu proprietário. Ou seja, estás a roubar.»

    Isso parece-me um disparate, visto que o proprietário já foi privado do objecto em causa.

    Quem privou o proprietário do objecto foi aquele que efectivamente roubou.

    O mal do comportamento do comprador , se consciente, é efectivamente estar a contribuir para que outros roubem.

    «Mesmo que fosse automaticamente imoral “incentivar” ou “promover” comportamentos imorais – e nesse caso seria automaticamente imoral questionar qualquer valor moral estabelecido, pelo que rejeito essa premissa, estando apenas a considerá-la só para explorar o resto do teu argumento»

    o teu mal está no «automaticamente», palavra que nunca usei.

    Parece claro que - à partida - ter um comportamento que incentiva comportamentos imorais é em si imoral. Isto é consequencialismo - se o comportamento A é imoral por causa das suas consequências, e o comportamento B incentiva o comportamento A, então o comportamento B terá consequências nefastas (as de A), e será portanto imoral.

    A questão é que um comportamento pode ter várias consequências, umas positivas e outras negativas.
    É precisamente esse o caso de questionar um valor moral estabelecido: facilmente encontras consequências positivas nesse questionamento, e certamente consideras que podem superar as negativas.

    Já no caso de comprar furtado, ou sacar no site do José, é mais problemático justificar esse balanço...

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  40. João Vasco,

    O roubo não é um acto instantâneo. É contínuo. Se eu roubo o teu carro e me arrependo cinco minutos depois, devolvendo-o logo, cometo um acto muito menos grave do que se to roubar e nunca mais voltar.

    Se o Wyrm comprar o carro roubado, ele está a continuar esse acto de roubo pelo qual tu continuas a ser privado do carro. Por outro lado, se ele decidir pagar-me para ficar com o carro e to restituir, ele até faz um acto moralmente louvável. Não é o facto de me incentivar a pagar que torna o acto dele condenável. É o facto de ficar com o carro que é legitimamente teu.

    «Parece claro que - à partida - ter um comportamento que incentiva comportamentos imorais é em si imoral.»

    Depende do que queres dizer por “imoral”. Se por “imoral” queres dizer que não é a opção moralmente ideal, então talvez tenhas razão. Mas digo talvez apenas porque não me ocorre um contra-exemplo. E talvez seja por cansaço.

    Mas se por “imoral” queres dizer que o acto tem um valor negativo de magnitude superior ao valor positivo da liberdade de agir dessa forma, então discordo. Por exemplo, manifestar-se a favor da discriminação sexual pode incentivar essa discriminação, que é imoral, mas a liberdade de expressão tem um valor moral suficiente para compensar o valor negativo desse incentivo, pelo que não podemos dizer que é imoral usufruir dessa liberdade.

    «É precisamente esse o caso de questionar um valor moral estabelecido: facilmente encontras consequências positivas nesse questionamento, e certamente consideras que podem superar as negativas.»

    Não é só por isso. A liberdade de agir de certa forma tem, por si só, um valor moral positivo além de quaisquer consequências, e pode ser suficiente para compensar o valor moral negativo de algumas consequências. Por exemplo, mesmo que desejar que outros morram por vezes leve a consequências nefastas e nunca tenha consequências boas, o valor moral da liberdade de desejar algo é suficiente para dizer que as pessoas devem ser livres de desejar que outros morram.

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  42. Ludwig,

    Se admites que há dois pratos na balança e só é imoral quando um prato pesa mais que o outro, e que a tua percepção é que este pesa muito e o outro pesa pouco, é fácil discordar, basta ter a percepção de que aquele que dizes pesar pouco pesa bastante mais.

    Ao menos aí fica clara a divergência, fica clara a razão pela qual ela não é resolvida, e deixas de representar mal a posição oposta...

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  43. "Faço T-shirts com “não compensa criar com o intuito de ganhar a vida pois ninguém dará valor ao esforço”. Faço bandeiras com “não compensa criar com o intuito de ganhar a vida pois ninguém dará valor ao esforço” e aceno-as pela rua, e distribuo-as a quem passar. Organizo uma manifestação para divulgar que “não compensa criar com o intuito de ganhar a vida pois ninguém dará valor ao esforço”. Nada disso é imoral. Faz parte da minha liberdade de expressão. Por outras palavras, o valor moral da minha liberdade de “sinalizar” isto é superior ao valor moral de alguém “criar com o intuito de ganhar a vida” e ser pago por isso."

    Quando fazes isto, não te aproveitas do trabalho de ninguém. Logo estás á vontade. Por outro lado, estás a usar a minha frase que achaste fascinante e promoves-te com isso. Pelo menos envia-me uma das t-shirts como forma de me compensar pela minha criatividade. É o mínimo. :)



    "As tuas razões para considerar algo de imoral estão cada vez mais estranhas."

    Por outro lado dar exemplos inválidos e falsas dicotomias não é nada estranho...... *rolls eyes*

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  44. "o valor moral da liberdade de desejar algo é suficiente para dizer que as pessoas devem ser livres de desejar que outros morram"

    De acordo. Mas não deixa de ser imoral que o desejem. De todas as maneiras tu pareces conotar moralidade com obrigatoriedade de se agir de certa maneira.

    No meu entender há o plano moral e há o plano legal. Quando algo é inequivocamente imoral: roubar, violar, matar sem ser em legítima defesa (olha!!! uma excepção à lei, hmmmmm) são de uma imoralidade e consequências tais que criaram-se leis para impedir esses actos.

    Há, porém, actos cuja imoralidade tem um impacto insignificante ou mesmo inexistente pelo que não justifica a criação de leis ou então actos que por muitas consequências nefastas que tenham seria ainda pior reprimir.

    Em relação à cópia estamos de acordo que seria um fabuloso tiro no pé proibir e criar os meios para fiscalizar a partilha. Mas isso não quer dizer que considere moral o usufruto de obras que foram editadas com o objectivo de serem comercializadas. Tu não tens obrigação nenhuma de adquirir, é certo, mas na minha optica é moralmente louvavel que recompenses o criador se gostaste ou é moralmente condenável se gostaste mas decidiste não compensar o autor de alguma forma ou ainda é moralmente obrigatório recompensar o criador por algo que adicionou valor á nossa vida.

    Tu achas o contrário. É a tua opinião e pelo que foi dito acima considero que deves ser livre de agir imoralmente neste caso. Mas nas tuas respostas parece sempre que respondes como se a minha posição fosse proibir ou obrigar.

    Não é. Apenas te considero, neste ponto, um chico-esperto e dúvido que percas 1 segundo por isso. Eu vou continuar a tentar compensar na medida do possivel os artistas que gosto e a incentivar outros a fazerem o mesmo. E tu continuas a fazer o oposto. Portanto, viva a liberdade.

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