quinta-feira, novembro 24, 2011

A crise, a causa e a greve.

Esta crise, que uns dizem ser de valores, outros de competitividade, e outros por “nós” termos vivido acima das nossas posses e agora não haver dinheiro, é, sobretudo, uma crise política. Por decisão política, uns poucos têm muito e muitos quase nada. Desta desigualdade nascem problemas sociais, económicos e até de saúde.


(obrigado ao xovan pelo link)

Mas se a fonte de tantos males é simplesmente uma redistribuição defeituosa, tem de haver algo que impeça a resolução do problema. Redistribuir melhor é simples, e nem é preciso eliminar todas as desigualdades. Afinal, não somos todos iguais. Há quem goste mais de campo, de ganhar muito dinheiro, de escrever em blogs, etc. E, pelo menos desde Rawls, é fácil perceber que a desigualdade só é justa enquanto beneficiar todos, especialmente os que ficam com menos. A possibilidade de vir a ser um dos ricos pode ser uma boa fonte de sonhos, ambição e motivação para trabalhar por algo. Mas quando a desigualdade é grande demais e se mostra inescapável, o efeito é o contrário. Quase todos perdemos com isso.

O problema é o quase. Os tais 1%, cuja influência na política é muito maior do que deveria ser.



(Este é comprido, mas vale a pena ver todo. Obrigado pelo email com o link)

Hoje muita gente fez greve, em protesto contra isto. Outros dizem não perceber porquê. «Nas presentes circunstâncias, com a greve geral, as reivindicações não são atendidas. O desemprego não diminui. A produção não aumenta. A legitimidade democrática das instituições não se altera. A crise não se resolve. Ninguém lucra absolutamente nada com ela, a começar pelos participantes.»(1) É verdade. Os movimentos de indignados, as manifestações e a greve geral não propõem soluções concretas. Não dizem como corrigir o problema. Não dão emprego, prosperidade, riqueza ou essas coisas. Mas o problema não é a falta de soluções concretas. O problema é não haver sistema que as implemente. Das PPP à austeridade, do BPN ao descartar de promessas eleitorais, do João Jardim ao sistema judicial, por todo o lado é evidente que não é desconhecer as soluções que impede a resolução destes problemas. Isto não se resolve simplesmente porque aqueles com poder para o fazer preferem manter as coisas como estão. A greve não é uma solução para este problema. É um aviso.

Outra crítica é que não é um aviso eficaz. Depende de o levarem a sério; se ninguém ligar, então a greve não serve para nada. Mas a greve mostra que há muita gente capaz de sacrificar, pelo menos, um dia de ordenado só para protestar. É um aviso que devia ser credível, e é preferível que comecem por estes avisos em vez dos outros, mais eficazes. Como na Líbia e no Egipto, por exemplo.

É pena que tanta gente tenha ido na conversa do Passos Coelho, quando era evidente que as promessas dele valiam menos que os títulos da dívida grega.

1- Vasco Graça Moura, Greve Geral

14 comentários:

  1. Concordo no geral com o que dizes. Mas seria um pouco mais "radical". Esta crise terá muitas causas e uma delas, em meu entender, é a mais importante: os políticos têm vivido muito acima das nossas possibilidades. Não podemos delegar neles (ou seja, não é do nosso interesse) nenhuma réstia de poder (voto?) que nos esteja reconhecido em qualquer parágrafo de um diploma (constitucional que seja, que a constituição é o quê?). A teoria de que (votando neles e) pagando o que eles querem podemos ficar descansados a fazer o nosso trabalho e a viver a nossa vida que eles tratam de representar-nos nas instâncias do Poder Legislativo é tanto mais ingénua quanto se confirma ser um logro completo dos eleitores (tanto dos que votam como dos que não votam, porque não lhes deixa alternativa). Eu nunca tive alternativa, ou seja, a alternativa era formar um partido. Mas isto não é alternativa. E nunca aceitei ou concordei pagar impostos para financiar partidos e governos para mandarem em nós mas que, ao mesmo tempo, não são mandados por nós. Não estou a questionar a democracia, porque o que eu questiono não é democracia. Chamem-lhe qualquer outra coisa, ou então assumam que a democracia não é o que dizem ser. A maioria não vota e não manda nada. Neste momento urge um contra golpe, porque o golpe já está dado "ufanamente". Não tenhamos medo das palavras. Os governantes não têm medo nenhum. Para resolver a crise não era preciso cometer as injustiças que estão a ser cometidas. Bastava recapitular quem são os corruptos e os responsáveis pelos desvios, sentar os responsáveis no banco dos réus...Nem era preciso um 25 de Abril, com nacionalizações e expropriações...

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  2. Só falta escrever sobre quem fez greve. Estranho serem sempre os mesmos, não?

    http://tinyurl.com/6lw4sar

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  4. "É um aviso que devia ser credível, e é preferível que comecem por estes avisos em vez dos outros, mais eficazes. Como na Líbia e no Egipto, por exemplo"

    Eficazes em quê? Em provocar mortes e promover regimes ainda mais distantes da democracia que os vigentes?
    A manifestação em frente à Assembleia da Republica e a sua descrição televisiva foi uma coreografia infantil confrangedora, representada, ao que parece, até por actores convidados estrangeiros. Uns que viajam pelo mundo fora a atirar cocktails molotov a quem os sustenta. Há bocado encontrei ali na Paulista outros exemplares da mesma seita acampados. Tinham escrito: "os nossos sonhos não cabem nas vossas urnas". A desigualdade, a corrupção e a pobreza não se combatem com generalizações precipitadas demagogas. Muito menos sem democracia.

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  5. Nuno Gaspar,

    «Eficazes em quê?»

    Em causar efeitos.

    «Em provocar mortes e promover regimes ainda mais distantes da democracia que os vigentes?»

    Depende. Nem sempre uma revolta popular tem esses efeitos. E acho muito discutível que seja esse o caso no Egipto e na Líbia, porque mais longe do que estavam é difícil...

    « A desigualdade, a corrupção e a pobreza não se combatem com generalizações precipitadas demagogas.»

    Precisamente. Daí a importância de avisar os políticos e quem os compra de que o pessoal já está farto disso.

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  6. Carlos,

    «Bastava recapitular quem são os corruptos e os responsáveis pelos desvios, sentar os responsáveis no banco dos réus...»

    Mas quem tem poder para isso não o faz e as as leis, em grande parte, são escritas pelos mesmos advogados que depois safam os corruptos. É preciso pressioná-los a fazê-lo.

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  7. Concordo com o texto, mas o problema desta greve (e da maioria das que se fazem neste país a beira mar plantado) é que de credibilidade tem 0. E passo a explicar:

    1 - A maioria das pessoas que faz greve não sabe porque o faz a não ser porque alguém anunciou uma greve (e para provar isto basta ir-se ao terreno questionar as pessoas)

    2 - Quantas daquelas pessoas que se manifestaram foram votar nas últimas eleições? Pois com uma abstenção de 41.1% e 2.67% de votos em branco, sinceramente não sei do que se queixam só tem o que merecem (eu votei e não ajudei o caramelo do passos coelho a ganhar porque não votei nele) porque ao não votar, estão a votar no vencedor, por outro lado dos que votar quantos é que leram sequer o programa do partido em que votaram? A maioria votou em quem fala melhor depois lixam-se (eu votei de forma consciente e li todos os programas de todos os partidos antes de votar).

    3 - Todos dizem que os políticos são sempre os mesmos, mas se olhar-mos para os sindicatos (ainda por cima associados a partidos políticos) também são sempre os mesmos, com o mesmo discurso, que ontem na conferência de imprensa caíram no ridículo em algumas declarações e que ainda por cima tornaram a greve geral num evento anual quando devia ser uma arma de último recurso, aliás ano em que não haja uma greve geral é um mau ano para os sindicatos deste país.

    Posto isto concluo apenas que o governo é só um espelho do país pois da mesma forma que os portugueses não sabem escolher quem devem governar, também não sabem de governar a si próprios. Ou seja, não pondo em causa o direito a greve que deve sempre de existir, e no dia em que desaparecer fujo deste país, a maioria usa a greve para ter dias de folga em vez de a usar para o que deve (a mais formas de luta e greve sem ser parar).

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  8. Sem espinha, concordo e assino de cruz (salvo seja xD).

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  9. Ah, e roubei isto para distribuir. Depois eu compenso-te, mas para já um grande OBRIGADO!

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  10. André Rosa:

    Concordo com a frustração em relação à abstenção.
    Não concordo com a frustração face ao voto em branco, pois apesar de nunca ter usado esse recurso, parece-me uma forma legítima de protesto: assume pelo menos o trabalho de se deslocar às urnas para que a sua mensagem não se confunda com preguiça ou desinteresse. Para quem não tem capacidade de criar ou influenciar um partido existente, e não se identifica de todo com nenhum deles, ou está contra o próprio sistema de democracia representativa - por exemplo por acreditar que nele existe pouca participação popular - o voto em branco parece uma opção defensável. Repito que ainda nunca votei branco nem nulo (só me abstive uma vez, porque estava fora do país).

    Posto isto, acredito que as pessoas estão enganadas em relação à forma como se praticam greves neste país.
    As pessoas perdem o salário correspondente a esse dia - não é como se ganhassem um dia de férias impunemente - e ao contrário da ideia geral, a segunda e sexta não são dias mais comuns que os outros para a convocação de greves gerais (o dia mais comum é terça feira). Mas, mais importante, o número de greves tem diminuído significativamente em toda a Europa, e em Portugal em particular. Fazem-se muito menos greves do que se faziam há algumas décadas (menos de metade), e os sindicatos têm muito menos força (também por isso são mais radicais e incapazes de compromisso - o trabalhador «moderado» já não está sindicalizado). Em consequência, apesar da produtividade ter quase duplicado nas últimas décadas, o poder de compra da generalidade da população está quase igual:

    http://esquerda-republicana.blogspot.com/2011/09/diferenca-entre-roosevelt-e-reagan.html

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  11. Aliás, este link é melhor que o anterior:

    http://www.nytimes.com/imagepages/2011/09/04/opinion/04reich-graphic.html?ref=sunday

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  12. O problema:

    2008
    http://ipsnews.net/news.asp?idnews=40715

    2009
    http://finance.yahoo.com/banking-budgeting/article/107980/countries-with-the-biggest-gaps-between-rich-and-poor

    2010
    www.telegraph.co.uk/news/uknews/8127481/Gap-opens-up-between-rich-and-poor-in-Britain.html

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  13. Mário Miguel,
    no segundo link que envias, percebe-se também pelos números apresentados, que na posição que ocupamos no ranking, 5º lugar, ainda invertemos de forma significativa uma tendência que se verifica de forma geral no ranking, que é a 'distância' entre os 10% mais ricos e os 10% mais pobres que vai decrescendo.

    A conclusão é que, dentro da desigualdade, quando se caminha para os extremos, o nosso caso é ainda mais extremado que os outros, comparativamente. Ser rico por cá é mesmo ser rico a sério.

    E não deixa de ser paradigmático que nem um governo dito socialista tenha invertido a tendência.

    É pena que a maior parte das pessoas não tenha uma ideia de como nos classificamos internacionalmente nesta área. Podia ser que começassem a olhar para a austeridade que nos propõem sob outro prisma.

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  14. uma prenda que não tem que ver com este post:

    "deve considerar‑se que a medida inibitória que ordena a instalação do sistema de filtragem controvertido não respeita a exigência de assegurar um justo equilíbrio entre, por um lado, a protecção do direito de propriedade intelectual, de que gozam os titulares de direitos de autor e, por outro, a da liberdade de empresa de que beneficiam os operadores como os FAI.

    50      Acresce que os efeitos da referida medida inibitória não se limitariam ao FAI em causa, sendo o sistema de filtragem controvertido também susceptível de violar os direitos fundamentais dos clientes desse FAI, a saber, o seu direito à protecção dos dados pessoais, bem como a sua liberdade de receber ou de enviar informações, direitos que são protegidos pelos artigos 8.° e 11.° da Carta.

    51      Com efeito, é dado assente, por um lado, que a medida inibitória que ordena a instalação do sistema de filtragem controvertido implicaria uma análise sistemática de todos os conteúdos e a recolha e identificação dos endereços IP dos utilizadores que estão na origem do envio de conteúdos ilícitos na rede, sendo esses endereços dados pessoais protegidos, uma vez que permitem a identificação precisa dos referidos utilizadores.

    52      Por outro lado, a referida medida inibitória correria o risco de violar a liberdade de informação, dado que esse sistema poderia não distinguir suficientemente um conteúdo ilícito de um lícito, de modo que o seu accionamento poderia provocar o bloqueio de comunicações de conteúdo lícito. Com efeito, é pacífico que a resposta à questão da licitude de uma transmissão depende também da aplicação de excepções legais aos direitos de autor que variam de um Estado‑Membro para outro. Além disso, em certos Estados‑Membros, determinadas obras podem pertencer ao domínio público ou os autores em causa podem colocá‑las gratuitamente à disposição do público na Internet.

    53      Consequentemente, há que declarar que, ao adoptar a medida inibitória que obriga o FAI a instalar o sistema de filtragem controvertido, o órgão jurisdicional nacional não respeitaria a exigência de assegurar um justo equilíbrio entre o direito de propriedade intelectual, por um lado, e a liberdade de empresa, o direito à protecção dos dados pessoais e a liberdade de receber ou de enviar informações, por outro.

    54      Face ao que antecede, deve responder‑se às questões submetidas que as Directivas 2000/31, 2001/29, 2004/48, 95/46 e 2002/58, lidas conjuntamente e interpretadas à luz das exigências resultantes da protecção dos direitos fundamentais aplicáveis, devem ser interpretadas no sentido de que se opõem a uma medida inibitória que ordena a um FAI a instalação do sistema de filtragem controvertido.

    http://curia.europa.eu/

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