quarta-feira, maio 05, 2010

Petição «Cidadãos pela Laicidade»

Devia ter posto isto ontem mas, infelizmente, calhou mesmo no dia em que dou aulas até mais tarde e na véspera do dia em que as começo mais cedo. Não sei se o Joseph terá metido uma cunha com o chefe dele...

Senhor Presidente da República Portuguesa,

Nós, cidadãs e cidadãos da República Portuguesa, motivados pelos valores da liberdade, da igualdade, da justiça e da laicidade, manifestamos, através da presente carta, o nosso veemente protesto contra as condições – oficialmente anunciadas – de que se revestirá a viagem a Portugal de Joseph Ratzinger, Papa da Igreja Católica.

Embora reconhecendo que o Estado português mantém relações diplomáticas com o Vaticano e que a religião católica é a mais expressiva entre a população nacional, não podemos deixar de sublinhar que ao receber Joseph Ratzinger com honras de chefe de Estado ao mesmo tempo que como dirigente religioso, o Presidente da República Portuguesa fomenta a confusão entre a legítima existência de uma comunidade religiosa organizada, e o discutível reconhecimento oficial a essa confissão religiosa de prerrogativas estatais, confusão que é por princípio contrária à laicidade.

Importa ter presente que o Vaticano é um regime teocrático arcaico que visa a defesa, propaganda e extensão dos privilégios temporais de uma religião, e que não reúne, de resto, os requisitos habituais de população própria e território para ser reconhecido como um Estado, e que a Santa Sé, governo da Igreja Católica e do «Estado» do Vaticano, não ratificou a Declaração Universal dos Direitos do Homem – não podendo portanto ser um membro de pleno direito da ONU – e não aceita nem a jurisdição do Tribunal Penal Internacional nem do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, antes utilizando o seu estatuto de Observador Permanente na ONU para alinhar, frequentemente, ao lado de ditaduras e regimes fundamentalistas.

Desejamos deixar claro que, se em Portugal há católicos dos quais uma fracção, mais ou menos importante, se regozijará com a visita de Joseph Ratzinger, há também católicos e não católicos para quem o carácter oficial da visita papal, o seu financiamento público e a tolerância de ponto concedida pelo Governo, são agressões perpetradas contra os princípios de laicidade do poder político que a própria Constituição da República Portuguesa institui.

Esta infracção da laicidade a que estão constitucionalmente vinculadas as autoridades republicanas torna-se ainda mais gritante e deletéria quando consideramos que se celebra este ano o Centenário da Implantação da República, de cujo legado faz parte o princípio de clara separação entre Estado e Igreja, contra o qual atentará qualquer confusão entre homenagens a um chefe de Estado e participação oficial dos titulares de órgãos de soberania em cerimoniais religiosos.
Declaramos também o nosso repúdio pelas posições veiculadas pelo Papa em matéria de liberdade de consciência, igualdade entre homens e mulheres, auto-determinação sexual de adultos, e outras matérias políticas.

Porque nos contamos entre esses cidadãos que entendem que a laicidade da política é condição fundamental das liberdades e direitos democráticos em cuja defesa e extensão estão apostados, aqui deixamos o nosso protesto e declaramos a Vossa Excelência o nosso propósito de o mantermos e alargarmos através de todos os meios de expressão e acção ao nosso alcance enquanto cidadãos activos da República Portuguesa.

Subscritores:
Alexandre Andrade, Andrea Peniche, António Serzedelo, Carlos Esperança, Eugénio de Oliveira, Francisco Carromeu, João Pedro Cachopo, João Tunes, Joana Amaral Dias, Joana Lopes, José Rebelo, Ludwig Krippahl, Luís Grave Rodrigues, Luís Mateus, Luis Sousa, Maria Augusta Babo, Miguel Cardina, Miguel Duarte, Miguel Madeira, Miguel Serras Pereira, Onofre Varela, Palmira Silva, Pedro Viana, Porfírio Silva, Ricardo Gaio Alves, Rui Tavares, J. Xavier de Basto.

Para assinar a petição http://www.peticaopublica.com/?pi=CPL2010

10 comentários:

  1. "Cidadãos pela Laicidade" ou "Cidadãos pelo Laicismo"? Cuidado com a imposição de ideologias ...

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  2. Miguel Panão,

    Eu não defendo uma medida do Estado que feche as igrejas por dia e meio. Infelizmente, alguém defendeu uma que me fechou a faculdade e me atravancou as aulas...

    Já para não falar no que nos vai custar levar agentes agentes da PSPS no C-130 da Força Aérea para ir buscar os carros do Papa.

    «Cuidado com a imposição de ideologias»

    Esta brincadeira do Ratzinge vir cá fingir que transubstancia vai custar um dia de ordenado a quem tem de cuidar dos filhos porque as escolas fecharam, vai custar uma data de dinheiro do erário e vai atravancar o trânsito em Lisboa e Porto. E depois quem assina uma petição para que se decidam se o homem é chefe de estado ou sacerdote é que está a "impor".

    É isso e os preservativos propagarem o HIV...

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  3. ... «há também católicos e não católicos para quem o carácter oficial da visita papal, o seu financiamento público e a tolerância de ponto concedida pelo Governo, são agressões perpetradas contra os princípios de laicidade do poder político que a própria Constituição da República Portuguesa institui.»

    Acho importante mostrar que nem todos os cristãos concordam com outros cristãos que criam uma visão distorcida de quem não concorda com eles. Em Portugal cerca de 90% dos portugueses são católicos, mas entre eles mais de 50% não concorda com as políticas e ideais da Igreja.

    Parece-me que existem mais católicos que concordam mais com muitos ateus que chamam de laicistas. Colunistas católicos também dão a sua opinião nos jornais, que curiosamente partilham da opinião dos que assinaram a petição. É importante saber que quem também dá essas opiniões são católicos, porque pode ser um meio de mostrar que há injustiça quando qualificam ateus de vários adjectivos que têm a mesma opinião.

    Não me parece que para outros católicos seja um exemplo de diversidade legítima entre cristãos e católicos, considerando os detractores de imbecis e dizendo que não são católicos de verdade - se assim é, que sejam descontados das estatísticas. Pelos vistos o que vai ser descontado é salários no dia 11... Cuidado com a imposição de ideologias!

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  4. Ludwig,

    O IST não irá fechar e há quem faça tolerância de ponto por muito menos.

    Já para não falar no que nos vai custar levar agentes agentes da PSPS no C-130 da Força Aérea para ir buscar os carros do Papa.

    Também pago a médicos para realizar paradoxalmente abortos e custa-me muito mais do que isto.

    Esta brincadeira do Ratzinge vir cá fingir que transubstancia vai custar um dia de ordenado a quem tem de cuidar dos filhos porque as escolas fecharam, vai custar uma data de dinheiro do erário e vai atravancar o trânsito em Lisboa e Porto.

    Lamento, mas quando se faz uma greve, há muito não participam nas manifestações e, em vez disso, por exemplo, vão à praia, logo, não achas que custa um dia de ordenado por muito menos? Eu acho. Fora outros exemplos como tolerâncias de ponto por causa do Carnaval.

    A petição que procuras defender promove o Laicismo do Estado e não a Laicidade. Este tipo de manifestações parecem-me típicas de quem está contra a religião, são pouco tolerantes e infundadas. Reflectem um ateísmo zangado e perplexo por ver um Cristianismo vivo e não morto como pensava. Nesse sentido compreendo iniciativas do género, mas se não te imponho que acredites na Transubstanciação, também não aceito que me imponhas uma visão Laicista do Estado. A religião não interfere com a política, mas com o político. Que eu saiba, o Primeiro-Ministro não me parece ser uma pessoa crente, mas certamente é uma pessoa sensível à sociedade que é maioritariamente Católica, mostrando um respeito exemplar.

    Se fosse a ti, iria dar aulas. Se a Faculdade fecha, sê criativo (uma Bilioteca, jardim...) e respeitador de quem é crente de modo a não dar matéria nova. Aliás, algo que não é novo, pois, quando há testes de outra disciplina, os alunos faltam às aulas para estudar, ou seja, faltam por muito menos e, muito sinceramente, se fosse a ti, perdia menos tempo com iniciativas como esta. Mas, lá está, é uma proposta, não uma imposição.

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  5. «A petição que procuras defender promove o Laicismo do Estado e não a Laicidade».

    Porquê?

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  6. «Consultas e cirurgias adiadas e serviços de saúde a meio gás serão consequências da tolerância de ponto concedido nos dias 11, 13 e 14 de Maio devido à visita do papa e que os utentes criticam. | A tolerância de ponto foi decretada pelo Governo» ... «Uma das consequências desta concessão sentir-se-á nos serviços de saúde pública. Hospitais e centros de saúde do Serviço Nacional de Saúde não vão funcionar como se fosse feriado ou fim-de-semana. | Por esta razão, as consultas e as cirurgias programadas irão realizar nestas instituições. | A medida não agrada ao Movimento dos Utentes dos Serviços de Saúde, com o seu presidente, Manuel Vilas Boas, a lembrar que Portugal tem "um regime republicano e laico" e, por isso, "não tem de obedecer às regras religiosas".» ... «O Sindicato dos Enfermeiros Portugueses (SEP) acusa o Governo de ser "incoerente" ao conceder tolerância de ponto para a visita do Papa, o que deverá deixar os serviços de saúde como se existisse uma greve no sector.»
    - Global, 6 de Maio de 2010

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  7. «É verdade que somos um País maioritariamente católico (inclui-me nos 88% da população que o assume), mas o nosso Estado é laico. É verdade que a vista de um Papa a Portugal acontece poucas vezes, mas o mesmo acontece com outros chefes de Estado. É verdade que as missas papais mobilizam milhares de fiéis com os respectivos condicionantes de trânsito, mas isso também acontece quando há mega-manifestações, e os exemplos são recentes, ou um um europeu de futebol. Tudo isto para concluir que apesar de considerar que Bento XVI deve ser devidamente recebido e que a sua visita deve mobilizar todos os meios humanos e técnicos considerados indispensáveis, apesar de pensar que Cavaco Silva faz bem em acompanhar os momentos públicos de Joseph Ratzinger no nosso País e até aceitar que o Papa deve ser tratado de forma especial, acho que as medidas enunciadas pelo Governo são exageradas. Quais são as razões para as escolas fecharem dia 13, por exemplo? Isso significa que muitos pais faltarão ao trabalho para ficar com elas. E porque foi decretada tolerância de ponto para Lisboa e Porto nas tardes dos dias 11 e 14? Só se for para um hospital ter argumentos para me desmarcar uma consulta nesse dia... às nove da manhã. Um dia de paragem de produtividade no País tem custos. E estes, fazem sentido?»
    - Filomena Martins, directora adjunta do Diário de Notícias

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  8. Os católicos que fazem as mesmas críticas estão é a defender o Laicismo. São contra as religiões e reflectem um ateísmo zangado. Existem tantas outras situações erradas, por isso deviam estar caladinhos. Uau!

    O Mats já tinha mencionado a falácia da associação por culpa e parece que alguns gostam de dar exemplos dessa falácia, misturados com ataques pessoais, com especulações em forma de análises psiquiátricas, como forma de argumento.

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  9. Conforme apontado n´O Cachimbo de Magritte,pelo Pedro Pestana Bastos, a vossa petição não peticiona nada. Mas que grande argolada! Ludwig, trata lá de meter essa etiqueta neste post...

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