O objecto da crença.
Uma conversa com o João Vasco e o Cordeiro Lobo (CL), enterrada sob trezentos e tal comentários num post da semana passada (1), mostrou mais uma vez que um problema em discutir crenças é perceber o que se quer dizer com “crença”. Acreditar, estar convicto, é considerar algo verdadeiro. Pode ser num sentido lato, que inclui verdade como correspondência à realidade (a Terra é redonda), consistência (um número ímpar não é divisível por dois) ou até mesmo a partilha de um juízo de valor (não se deve maltratar crianças). Mas não se pode acreditar em algo que não se possa considerar verdade. Ou seja, algo que não seja uma proposição.
Não posso acreditar na cadeira. Posso me sentar na cadeira, partir a cadeira ou atirar a cadeira, mas “acredito na cadeira” não faz sentido porque a cadeira não é verdade nem mentira. Posso acreditar que ela existe, acreditar que está ali. Se ela falar até posso acreditar no que me diz. Mas só posso acreditar em proposições. A cadeira em si não pode ser objecto de uma crença.
Há quem afirme, como o CL, que «não tem qualquer sentido acreditar na não existência do que quer que seja» porque «É um absurdo a inexistência de algo, real ou meramente imaginário, poder ser objecto de pensamento ou de crença.»(1) Isto está errado. A hipótese “o rei da França não tem barba” refere algo que não existe. Mas a nossa linguagem permite referir coisas não existem ou até coisas que não podem existir, como o número que é maior que todos os outros ou um triângulo circular. E isto é irrelevante porque aquilo que a hipótese refere não depende de acreditarmos nela. Acreditar na inexistência do rei da França não é absurdo. É simplesmente aceitar como verdade a hipótese “o rei da França não existe”, que é razoável desde 1793*.
Esta confusão entre o objecto da crença, que é a hipótese, e aquilo que a hipótese refere serve para falsificar justificações para várias crenças. Cremos verdadeira a afirmação “o paciente tem uma infecção bacteriana” se as evidências lhe derem mais suporte que às alternativas. Sinais como febre e velocidade de sedimentação, sintomas como dores e cansaço, etc. Mas para justificar crer que “o paciente tem uma desarmonia na aura”, os tretólogos dizem não precisar de evidências porque o objecto desta crença é de outro tipo. É espiritual e não científico. Isto é falso, porque os objectos destas crenças são ambos proposições acerca da realidade. São do mesmo tipo.
Com a religião há o mesmo problema. Em rigor, não se pode crer em deuses mesmo que existam. Seria como crer em cadeiras. Não são um objecto legítimo de crença. “Acredito em deus” quer apenas dizer que a pessoa acredita em certas hipóteses acerca desse deus. Que existe, que foi crucificado, que vai voltar e assim por diante. E como essas hipóteses são acerca da realidade estas crenças são do mesmo tipo que as crenças científicas. São do tipo de crer que a hipótese corresponde à realidade.
Crenças noutros tipos de proposição justificam-se de forma diferente. Se o enunciado do exame de lógica diz que P é uma proposição verdadeira eu acredito sem exigir evidências. Até porque “P” não refere nada. Se me propõem um juízo de valor eu aceito-o ou rejeito-o – acredito ou não acredito – comparando-o com os meus valores e não com dados objectivos, visto que estes não podem comprovar um “deve ser”. Mas estas crenças justificam-se de forma diferente porque recorrem a diferentes noções de verdade para avaliar as proposições em causa.
Quando a noção de verdade é a correspondência com a realidade o critério para crer numa hipótese tem que ser sempre o peso das evidências, seja qual for o objecto da hipótese. Seja infecção bacteriana, desarmonia da alma, existência de um deus ou de um rei da França, só se justifica concluir que a hipótese está de acordo com a realidade se as evidências a favorecem em detrimento das alternativas.
Realmente, há diferença entre não acreditar que Deus existe e acreditar que Deus não existe. Mas não é por ser impossível acreditar que algo não existe. Isso não tem problema. A diferença é que para a primeira basta que as evidências não favoreçam a hipótese que esse deus existe enquanto que para justificar a segunda é preciso que as evidências favoreçam a hipótese que esse deus não existe. O critério é mais exigente mas não é absurdo nenhum. E é isso que as evidências indicam, no caso do deus cristão. O peso das evidência sugere que as hipóteses de Jesus ter ressuscitado, de esse deus amar as crianças que pisam minas e importar-se com os preservativos são tão treta como a hipótese que a barba do rei da França é azul.
* Correcção: avisaram-me agora por email que o último rei da França, Luís Filipe I, abdicou em 1884 1848.
1- Sócrates e Jesus.
eu percebo o ateísmo,
ResponderEliminarmas o ludwing deve ter uma paranoia qualquer. Desculpe a sinceridade, mas é estar a chover no molhado. Há convicções (ou crenças) na não existencia de Deus, ta mais que provado que não existe e volta-se a falar.
Talvez daqui a uns tempos crie um blog e me dedique a escrever sobre a não existencia de sereias e do pai natal.
Um abraço ludwing
quem tem a necessidade de se estar sempre a justificar, pode significar (nao estou a dizer q seja, estou a dizer que pode querer dizer) alguma insegurança naquilo que defende. Acho eu.
ResponderEliminarSamuel,
ResponderEliminarEstá mais provado que nem existem deuses nem sereias. Infelizmente, há muitos milhões de pessoas enganadas, e a ser enganadas, acerca disto, e muitas a inventar tretas para o fazer.
Quanto à paranoia, o que uns chamam paranoia outros chamam hobby :)
Luis,
«quem tem a necessidade de se estar sempre a justificar, pode significar [...] alguma insegurança naquilo que defende.»
Claro. Por outro lado, quem não sente necessidade de se justificar tem uma segurança maior do que a que devia ter. Quando afirmamos algo acerca da realidade nunca o devemos fazer com mais segurança que aquela que achamos necessário justificar.
Antonio, só vê quem quer. Há de haver pessoas que hão de morrer a acreditar que foram raptadas por ETs por mais que lhes digam que estão a ser disparatadas.
ResponderEliminarLudwig, aquilo que eu nem compreendo é haver pessoas que acreditem que a mera afirmação "X não existe" é impossível. São as mesmas pessoas que dizem que basta que a mente "pense" na possibilidade de "X", esta existe necessariamente.
Segue-se necessariamente que são pessoas que vivem no mundo do faz-de-conta, da fantasia. Se ao menos parassem de tomar drogas, ainda se poderia ter uma discussão frutífera com os mesmos... assim estamos condenados a ouvir os seus delírios semânticos
António Parente,
ResponderEliminar«Está mais do que provado que não existe Deus?»
Sim. Sempre que a hipótese de que existe o deus cristão é posta à prova, falha o teste. Nunca se conseguiu que essa hipótese passasse qualquer prova que a distinguisse da alternativa, que é não existir o deus cristão. Pelo contrário, os resultados tenderam a favorecer a hipótese contrária.
É por isso que muitos cristão passaram a adoptar a posição de que a existência do seu deus não pode ser posta à prova. Isto é análogo a um aluno dizer que sabe a matéria toda mas que o seu conhecimento não pode ser posto à prova, e é por isso que reprova nos exames. Teoricamente possível mas pouco credível.
Off Topic.
ResponderEliminarVejam. Espectacular, via Blasfémias, esta entrevista (e debate) a uma mulheraça que se auto-proclama secular e humanista que se confronta com aquilo que chama a ideologia da idade das trevas, da bestialidade, da violência, etc.
Aqui.
Que haja mais gente assim! Please!
ludwing,
ResponderEliminareu acredito e dou sempre o beneficio da duvida a quem argumenta. Agora o ludwing dá saltos argumentativos que não pode dar. E os mais distraídos ao lerem o seu comentário, dirão que sim senhor faz sentido.
Mas, vamos por pontos.
1- "Sempre que a hipótese de que existe o deus cristão é posta à prova, falha o teste."
Que prova e que teste? Lembro-lhe que "Deus existe" é uma afirmação metafísica, muito diferente de dizer "a cadeira existe".
2- "Pelo contrário, os resultados tenderam a favorecer a hipótese contrária."
Que resultados? Que experiências lhe fez? Como me garante que as experiencias são as mais adequadas para o objecto em estudo?
um abraço!
LP:
ResponderEliminar"Está mais provado que nem existem deuses nem sereias." - mostre lá as provas científicas que tem.
Está à espera de quê para as dar a conhecer ao mundo!?
Ora, sem provas, acreditar "que existe Deus", está no mesmo plano de acreditar que "não existe Deus" (já sei que a resposta de mau pagador será dizer que "acreditar que existe" tem por contrário "não acreditar que existe" - só que, sem provas, trata-se de uma crença igual).
Portanto, como não estamos no dominio da ciência, as evidencias de que Deus existe são multiplas, transversais a diferentes culturas e gerações, e sujacentes propria civilização humana.
Daí que a crença em que "não existe Deus", seja um mero disturbio social que afecta uma minoria insignificante - uma crença quase sem seguidores e, seguramente, sem fundmento.
Há uns tempos falava-se nos blogs ateistas sobre a relação entre fé (religiosa) e saúde. Pelos vistos há quem tenha estudado tal relação, de uma forma muito diferente dos ateus.
Se quiserem vejam o último Post do dr. Luciano, em:
http://anti-ateismo.blogspot.com
«Daí que a crença em que "não existe Deus", seja um mero disturbio social que afecta uma minoria insignificante - uma crença quase sem seguidores e, seguramente, sem fundmento.»
ResponderEliminarÉ capaz de ter alguma razão de facto a crença nos que não acreditam em Deus é pequena.
Mas será que os que acreditam em Deus é grande?
Parece que os crentes estão convencidos que os que acreditam em Deus são cada vez menos e daí as campanhas contínuas e caríssimas para tentar maior abandono.
Em questões religiosas cada vez mais quem ganha em número são os indiferentes, só que muitos deles por terem sido baptizados a ICAR, por exemplo, considera-os como pertencentes ao seu credo mas não praticantes.
Conhece alguma forma de um baptizado, por exemplo na religião católica, deixe de pertencer à ICAR?
De facto os clubes de futebol e até os partidos são bem mais honestos do que as Igrejas, pois basta aos seus sócios e militantes deixarem de pagar um certo número de quotas para serem excluídos do grupo.
Para terminar, não me parece que o “hobby” do Ludwig seja desnecessário infelizmente é necessário e muito dado haver muitos seres humanos capazes de matar, maltratar, ostracizar, outros seres humanos em nome de Jesus, Maomé ou qualquer outro.
Duas emendas ao comentário anterior:
ResponderEliminarParece que os crentes estão convencidos que os que acreditam em Deus são cada vez menos e daí as campanhas contínuas e caríssimas para tentar maior abandono.
Onde está "tentar" deverá ser:
evitar
Conhece alguma forma de um baptizado, por exemplo na religião católica, deixe de pertencer à ICAR?
onde está "deixe" deverá estar: deixar
António,
ResponderEliminar«Suponho que colocou já todas as hipóteses possíveis e imagináveis e que realizou todos os testes possíveis e imagináveis»
Não. Mas isso para o seu deus como para qualquer outro deus como para qualquer outra coisa. Há infinitos testes que nunca fiz para ver se a Lua é mesmo mais pequena que a Terra. No entanto considero que isso já está perfeitamente provado dada a consistência desse resultado em todos os testes que se faz.
Note que também não se fez todos os testes possíveis e imaginários para demonstrar que o tabaco faz mal à saúde. Isso não é desculpa para afirmar que fumar tabaco faz bem.
António Parente:
ResponderEliminar“Se esse dia surgir, então terei de admitir que a maior parte da minha vida foi um erro.”
Não é por acreditar em Deus que a sua vida se pode transformar num erro mesmo que a hipótese de Deus se venha a confirmar cientificamente como falsa.
De facto se não matar, maltratar ou despezar outros seres humanos em nome de Cristo, Maomé, ou outro deus qualquer não tem razão nenhuma para vir a considerar a sua crença em Deus como negativa. Apenas poderá talvez um dia encontrar um argumento que o convença que o tempo dedicado à fé num deus qualquer foi uma perda de tempo que aplicada noutra coisa qualquer teria, certamente, sido muito mais útil. Quem sabe a pescar, fazer desporto ou as palavras cruzadas.
"Com a religião há o mesmo problema"
ResponderEliminarQual delas?
"Sempre que a hipótese de que existe o deus cristão é posta à prova, falha o teste."
Do Deus Cristão, ou da caricatura que tu criaste Dele? Eu também não acredito no deus que tu falsificaste, portanto, em vez de ser o "Deus Cristão", deveria ser "o deus que o Ludwig pensa ser o Deus Cristão".
Que "teste" foi esse que falsificou a existência Do Deus Cristão?
"É por isso que muitos cristão passaram a adoptar a posição de que a existência do seu deus não pode ser posta à prova."
ResponderEliminarQual foi o cristão que disse isto, e o que é que significa "posto à prova" nesse contexto?
Mats:
ResponderEliminarDescreve então lá o teu Deus para se colocar à prova.
Mats,
ResponderEliminar«o que é que significa "posto à prova" nesse contexto?»
Inferir da hipótese a testar consequências observáveis que sejam diferentes das consequências que se infere das hipóteses alternativas. Depois testar, nas condições em que essas consequências serão observáveis, se o que se observa está de acordo com o previsto pela hipótese ou pelas alternativas. Neste contexto e em qualquer outro.
Por exemplo, da hipótese que há um ser omnipotente e omnisciente que nos ama a todos eu infiro que qualquer criança que esteja prestes a pisar uma mina vai ser avisada da presença da mina por esse deus bondoso que a ama. O que se observa é o esperado pela hipótese contrária, que não há tal deus, e a criança acaba mesmo por pisar a mina.
A seguir podem vir desculpas, que deus é misteriosamente bondoso, que ter ficado sem pernas até pode ser bom para a criança, que o que interessa é a vida depois da morte quando as pernas já não servem para nada. Mas são só desculpas de quem chumbou na prova.
ludwing,
ResponderEliminarimagino que tenha muito trabalho,
mas não se esqueça das perguntas que deixei no meu comentario às 12.43.
Quando puder.
abraço
cesar
Mats:
ResponderEliminar«Eu também não acredito no deus que tu falsificaste, portanto, em vez de ser o "Deus Cristão", deveria ser "o deus que o Ludwig pensa ser o Deus Cristão".»
Quem primeiro falsificou a ideia de Deus foram os Cristãos através do combate da ideia de religião aceite na altura.
De facto os primeiros ateus que a humanidade conheceu foram os cristãos porque travaram um luta feroz contra a ideia de Deus que existia entre os hebreus.
Portanto os Cristão não podem condenar agora o que eles próprios fizeram no passado isto é, repudir criticar e destruir as ideias religiosas dominantes actualmente. Cuidado que eu digo destruir as ideias e não as pessoas que no caso concreto dos cristão não respeitarem nem ideias nem pessoas.
Mats: «Qual foi o cristão que disse isto, e o que é que significa "posto à prova" nesse contexto?»
ResponderEliminarPor exemplo, Guilherme de Occam e Emanuel Kant. Ambos eram fideístas. Um fideísta é aquele que acredita que é impossível provar a existência de Deus, e assim fundamentam a sua crença meramente na fé. Guilherme de Occam era um opositor de Santo Agostinho e Kant refutou as provas clássicas da existência de Deus.
Mats: «e o que é que significa "posto à prova" nesse contexto?»
ResponderEliminarPor exemplo, imagina alguém que diz que Deus é um ser que é capaz interferir no mundo (milagres) e interessado em que o conheçam. Pega num baralho de cartas e baralha muito bem (isto é, de modo a não conheceres a ordem das cartas). Escreve num papel o nome de um naipe e de um valor de uma carta. Diz: "Se Deus existir, peço que a carta no topo tenho este naipe e este valor. Amén.". Viras a carta. Se não tiver aquele naipe ou aquele valor, então aquele Deus não existe.
Relacionado:
* Juizes 6
* MythBusters - Does God Exist?
* Why Won't God Heal Amputees
* How to Convert an Atheist Part 1
Cesar,
ResponderEliminar«Lembro-lhe que "Deus existe" é uma afirmação metafísica, muito diferente de dizer "a cadeira existe".»
A diferença é irrelevante porque ambas são hipóteses acerca da realidade, e em ambos os casos só se justifica crer nelas se houver evidências que distingam essa hipótese das alternativas.
Note que se eu propuser a existência metafísica do pai natal isso não torna a hipótese "o pai natal existe" mais credível. Apenas confunde o que se quer dizer (qual é a diferença entre existir metafisicamente e existir fisicamente?)
«Que resultados? Que experiências lhe fez? Como me garante que as experiencias são as mais adequadas para o objecto em estudo?»
Garantias nunca há. Para nada. Por isso temos que dispensar com certezas absolutas e definitivas.
Mas se a sua hipótese é que existe um deus bondoso, super poderoso e que nos ama a todos, há imensas evidências contrárias. E a existência do mal sempre foi um problema na teologia cristã. Porque é que nascem pessoas com fibrose cística, que vivem em sofrimento constante até que morrem, ainda jovens, sufocadas lentamente pelo muco que produzem nos pulmões? Isso parece-me um forte indício que o tal deus que é amor também é treta.
Pedro Couto:
ResponderEliminarEscreve num papel o nome de um naipe e de um valor de uma carta. Diz: "Se Deus existir, peço que a carta no topo tenho este naipe e este valor. Amén.". Viras a carta. Se não tiver aquele naipe ou aquele valor, então aquele Deus não existe.
Agora repte a experiencia, e que serve como prova:
"Escreve num papel o nome de um naipe e de um valor de uma carta. Diz: "Se o paneleirote Zé Socrates existir, peço que a carta no topo tenho este naipe e este valor. Amén.". Viras a carta. Se não tiver aquele naipe ou aquele valor, então aquele Zé Socrates não existe."
Ciência pura, by Krippahl. L et al.
"Ludwig Krippahl, professor universitário e presidente dos cépticos de Portugal desabafa neste espaço todas as tretas que o incomodamLudwig Krippahl, professor universitário e presidente dos cépticos de Portugal desabafa neste espaço todas as tretas que o incomodam" - incluido a justiça, os direitos de autor, o repseito pelos outros, etc, etc.
ResponderEliminarGrande elogio (sobretudo se for feito por outro membro do gang ateu)!
Até lhe vou dedicar um soneto,no meu blog!
António Parente,
ResponderEliminar«Comparar o tabaco com Deus não me parece uma analogia boa.»
Porque não é uma analogia. São dois exemplos da vasta categoria de coisas acerca das quais temos que formar uma opinião antes de fazer todas as experiências possíveis e imagináveis. Que foi o que o António sugeriu:
«Suponho que colocou já todas as hipóteses possíveis e imagináveis e que realizou todos os testes possíveis e imagináveis»
Obrigado pela notícia acerca do meu blog nessa lista. Sabe quem a elaborou? E, já agora, quantos blogs tem? (Se este estiver entre os cem mil melhores de portugal não é dizer muito ;)
LP:
ResponderEliminarQuando tiver vagar responda à minha pergunta no P0st ""Sócrates e Jesus."
Zeca Portuga:
ResponderEliminar«
Agora repte a experiencia, e que serve como prova:
"Escreve num papel o nome de um naipe e de um valor de uma carta. Diz: "Se o paneleirote Zé Socrates existir, peço que a carta no topo tenho este naipe e este valor. Amén.". Viras a carta. Se não tiver aquele naipe ou aquele valor, então aquele Zé Socrates não existe."
Ciência pura, by Krippahl. L et al.
»
e tudo o que pedirdes na oração, crendo, recebereis.
(Mt 21: 22)
Em verdade, em verdade vos digo: Aquele que crê em mim, esse também fará as obras que eu faço, e as fará maiores do que estas; porque eu vou para o Pai; e tudo quanto pedirdes em meu nome, eu o farei, para que o Pai seja glorificado no Filho. Se me pedirdes alguma coisa em meu nome, eu a farei.
(Jo 14: 12-14)
Vós não me escolhestes a mim mas eu vos escolhi a vós, e vos designei, para que vades e deis frutos, e o vosso fruto permaneça, a fim de que tudo quanto pedirdes ao Pai em meu nome, ele vo-lo conceda.
(Jo 15: 16)
Naquele dia nada me perguntareis. Em verdade, em verdade vos digo que tudo quanto pedirdes ao Pai, ele vo-lo concederá em meu nome.
(Jo 16: 23)
Por isso vos digo que tudo o que pedirdes em oração, crede que o recebereis, e tê-lo-eis.
(Mc 11: 24)
Segundo a Bíblia (a infalível e inegável palavra de Deus), é possível fazer a prova das cartas pedindo a Deus (pelo menos ao deus cristão).
No entanto, nunca ninguém disse que com José Sócrates, ou um tal de "paneleirote Zé Socrates" isso seria possível. A não ser você, não é, Zeca?
Telemacus:
ResponderEliminar“e tudo o que pedirdes na oração, crendo, recebereis.”
E onde está a oração? – é uma formulação inventada por um qualquer palerma?
E onde está o crente? – é um ateu se o mínimo de decência?
E o “nunca porás Deus à prova”?
E o “não Invocarás Deus em vão”?
Portanto, uma experiência de simples “maquiavelismo” nunca teria a aceitação divina.
Já em relação ao "mafistotélico" Socrates, é perfeitamente aceitável que esse método seja usado.
Zeca Portuga:
ResponderEliminar«
E onde está a oração? – é uma formulação inventada por um qualquer palerma?
E onde está o crente? – é um ateu se o mínimo de decência?
»
Você É crente (pelo menos parece ser). Você ora (pelo menos deduzo isso pelo facto de ser crente). Você pode, então, realizar a experiência.
«
E o “nunca porás Deus à prova”?
E o “não Invocarás Deus em vão”?
»
1. Então não peçam para provar a inexistência de Deus, uma vez que nada em relação a ele pode ser provado, o que acaba inequivocamente por conduzir a uma situação de agnosticismo. (a menos que se acredite sem ver, como os 10, já que o Tomé ao menos era minimamente inteligente)
2. Não seria uma invocação em vão. Estaria em causa a conversão de ateus, a salvação de suas pobres alminhas. Só daria crédito a Deus e quem o anuncia.
«
Já em relação ao "mafistotélico" Socrates, é perfeitamente aceitável que esse método seja usado.
»
Ora, Zeca, todos sabemos que a honestidade de certos políticos é bastante duvidosa... Mas daí a afirmar que têm poderes sobrenaturais ao ponto de interferir em factos casuais já é abuso... Mas o mesmo não se aplica a Deus (ou eventualmente outros deuses)
Zé Portuga,
ResponderEliminarnão sabia que o Zé Sócrates tinha poderes divinos. Então quer dizer que se baralhar as cartas o Zé Sócrates sabe que estou a fazê-lo e ainda consegue colocar a carta que pedi no topo. Isso é extraordinário!
Mesmo que a tentativa tenha sido frustrada, cortar citações para ser mais fácil refutar é feio.
Eu começo por dizer: «Por exemplo, imagina alguém que diz que Deus é um ser que é capaz interferir no mundo (milagres) e interessado em que o conheçam.» E termino com: «Se não tiver aquele naipe ou aquele valor, então aquele Deus não existe.»
Claro que se não der resultado, pode-se também dizer que Deus não pode fazer isso ou então não o quis fazer. Mas assim, não tenho culpa se não acredito que existe.
Ludwig,
ResponderEliminarNão chegaste a responder à minha pergunta sobre qual das religiões tinhas em mente. Tendo em conta o propósito do uso da palavra "as religiões", entendo a tua posição.
"«o que é que significa "posto à prova" nesse contexto?»
Inferir da hipótese a testar consequências observáveis que sejam diferentes das consequências que se infere das hipóteses alternativas."
Quem é que decide sobre quais as hipóteses válidas e as inválidas?
"Por exemplo, da hipótese que há um ser omnipotente e omnisciente que nos ama a todos eu infiro que qualquer criança que esteja prestes a pisar uma mina vai ser avisada da presença da mina por esse deus bondoso que a ama."
Portanto, tal como eu tinha dito, este é um deus que tu criaste, e nao o Deus da Bíblia.
Pensa assim: se Deus fosse a impedir e/ou acabar com todo o mal da forma que tu esperas, quantos ateus é que estariam vivos hoje? ;-)
"O que se observa é o esperado pela hipótese contrária, que não há tal deus, e a criança acaba mesmo por pisar a mina."
Sim, o deus que tu criaste à tua imagem teria que fazer exactamente isso. Mas como esse deus não existe, ele também não pode fazer isso.
O Deus Criador, por outro lado, não precisa de tais artimanhas. Ele já preparou um caminho para resolver toda a maldade que nós pusemos no mundo.
Outro ponto que eu já levantei neste blog, é o de que a morte de uma criança é apenas problemático de houver alguma coisa de mal com isso. Na visão ateísta do mundo, vazia de referência absoluta para a moral, a morte de uma criança é apenas....a morte de uma composição de químicos.
"A seguir podem vir desculpas,"
Por "desculpas" tu queres dizer "esclarecimentos em relação às tuas falsas presopusições"?
Ou seja, fazes a pergunta, e depois já sabes que o que vais ouvir são "desculpas" (o que implica que não é verdade/factual).
Com uma posição assim, é "fácil" ser-se "ateu".
"que deus é misteriosamente bondoso, que ter ficado sem pernas até pode ser bom para a criança,"
Eu nunca ouvi um cristão dizer que uma criança perder as pernas numa mina é bom. (Mas também bom e mau são conceitos relativos, certo Ludwig?)
Não me digas que para além de criares uma caricatura de Deus, também fazes caricaturas de cristãos como forma de manteres a tua fé?!....
"que o que interessa é a vida depois da morte quando as pernas já não servem para nada. Mas são só desculpas de quem chumbou na prova."
Ou por outras palavras, "não me digam nada porque eu já tenho a mente completamente fechada".
A tua referência ao problema do mal no mundo é mais uma evidência de que:
1. Tu sabes que o ser humano não foi feito para sofrer
2. Tu sabes que existe uma lei moral absoluta na base do qual tu decides que a morte de uma criança não é bom.
Ambas estas coisas são crenças teístas e não ateístas. A tua constante referência a elas confirma o que o Apóstolo Paulo diz em Romanos 1:21:
"Porquanto, tendo conhecido a Deus, contudo não o glorificaram como Deus, nem lhe deram graças, antes nas suas especulações se desvaneceram, e o seu coração insensato se obscureceu."
Obrigado por mais uma vez confirmares que o Deus Cristão é Real.
Krippahl.
ResponderEliminarJá que referiu comentários meus a um seu outro post, aproveito para ir um pouco mais atrás e comentar algumas coisas que foram ditas em comentários a esse post, que de outro modo não comentaria. Não sou filósofo, nem profissional nem amador, e não domino esses assuntos, pelo que as minhas afirmações, mesmo que expressas com convicção, não passam de meras opiniões pessoais, sem qualquer outro valor. A minha temeridade em intrometer-me nesse campo terá de ser julgada com a indulgência devida aos ignorantes. Peço também alguma indulgência para a extensão deste comentário; no tempo disponível, não soube fazê-lo mais sintético. Por esta razão, hesitei em colocá-lo. Como já existe outro post para comentar e o ritmo dos comentários a este abrandou, e passou a existir a faculdade de omitir a apresentação dos comentários cuja leitura não interesse, resolvi colocá-lo, na presunção de que a sua extensão não importunaria.
Proposições são expressões verbais através das quais exprimimos ideias ou juízos de muitas características ou qualidades. Não é obrigatório que as proposições exprimam ideias coerentes ou com qualquer outro valor. Podemos verbalizar as ideias mais diversas, incluindo palermices as mais variadas, incoerentes ou sem qualquer sentido. Por isso, ao contrário do que afirmava, 2=3 e X^2 são proposições; a primeira expressa uma ideia com sentido, enquanto a segunda não. Numa discussão séria, é necessário que as proposições expressem ideias com sentido e que essas ideias reflictam a crença de quem as concebe, aquilo em que acredita. "P implica Q", por exemplo, é uma proposição que exprime uma ideia com sentido, precisamente a ideia "P implica Q", e a crença de quem a concebeu ou aceitou.
As nossas crenças respeitam às ideias que concebemos. As ideias, têm por objecto muitas coisas (aquilo a que se referem e que por isso é o seu objecto) e são expressas por proposições, as verbalizações dessas ideias. O objecto das nossas crenças são as nossas ideias, e o objecto das nossas ideias são as muitas coisas ou seres, seus estados e atributos, sobre as quais podemos pensar através das conceptualizações que delas fazemos. Objectos das nossas ideias podem ser deuses, chapéus, bolas, elefantes, tigres, o super-homem, sereias, dragões e o pai natal, cadeiras, os seus estados e qualidades, para ilustrar apenas com os exemplos que têm sido usados. Só podemos pensar sobre estes objectos conceptualizando-os, não podemos pensar sobre eles metendo-os dentro da cabeça. Deuses, chapéus e cadeiras, por exemplo, antes de mais são objectos conceptuais, e os objectos conceptuais que os seus nomes designam podem ser também objectos reais empíricos, ou não. Mas desde que sejam objectos conceptuais, existem, ainda que possam existir apenas nessa qualidade.
Qualquer coisa pode existir na realidade empírica e não ser objecto das nossas ideias, porque não nos interessámos pela sua existência e atributos, ou por qualquer outra razão, e por isso ainda não pensámos sobre ela. A realidade empírica, afinal, existe independentemente das nossas ideias sobre ela. Assim como qualquer coisa pode não existir na realidade empírica e ser objecto das nossas ideias, porque a imaginamos, por simples devaneio, por criação artística, por suposição ou por conjectura de que exista na realidade empírica. Exista ou não na realidade empírica, desde que seja objecto das nossas ideias, qualquer coisa existe, ainda que apenas na nossa imaginação. Qualquer coisa que não existe, nem na realidade empírica nem na realidade imaginada, não se sabe o que seja; deste modo, não se pode crer na não existência de algo que não existe, que não se sabe o que seja, porque esta ideia não tem sentido. É escusado pensar que este algo que não existe refere algo que não existe agora, mas já existiu; existir não é estar presente, e não existir não é estar ausente. O sentido que lhe atribuo é o de algo que não existiu nem existirá.
Se algo é objecto das nossas ideias, é também, através delas, objecto das nossas crenças. Uma ideia implica uma crença, a crença no valor de verdade que a ideia contém por parte de quem a concebeu e expressou. Muita gente faz suas ideias alheias, aderindo a elas ou aceitando-as, e deste modo faz suas as crenças alheias. Quando alguém concebe ideias nas quais afirma não acreditar, como já tem sido invocado aqui repetidamente, está a entreter-se com tretas e a procurar entreter-nos. Uma coisa, porém, é acreditar nas ideias, outra coisa, distinta, é saber se o valor de verdade que as ideias possam expressar corresponde ou não à realidade. Não se acredita pouco ou muito numa ideia; acredita-se ou não se acredita, e neste sentido aceita-se ou não se aceita a ideia. Mas os juízos de verdade das ideias podem ser verdadeiros ou falsos. O grau de convicção no valor de verdade duma ideia, a certeza de que essa ideia corresponda à realidade, pode variar de crente para crente, independentemente do seu real valor de verdade.
As nossas ideias serem verdadeiras é independente da nossa crença no seu valor de verdade; mas é a nossa crença no seu valor de verdade que faz com que as concebamos e expressemos. Doutro modo, por que conceberíamos, expressaríamos e justificaríamos ideias? Não acreditamos nas nossas ideias porque saibamos que elas são certas, isto é, verdadeiras. Acreditamos nelas porque admitimos serem verdadeiras. A distinção entre o conhecimento ou o saber e a crença é precisamente o conhecimento ser verdadeiro e a crença ser mera convicção de verdade. Quando cremos não sabemos, apenas julgamos saber, admitimos saber, convencemo-nos de que sabemos. Quando sabemos não cremos. E também podemos acreditar nas nossas ideias por diversos modos. Pela fé, por exemplo, se confiamos nelas sem necessidade de qualquer plausibilidade ou justificação do seu valor de verdade; ou pela razão, pela racionalidade da sua plausibilidade e justificação. Apesar de tudo, algumas das nossas ideias não chegam a alcançar o estatuto de conhecimento ou de saber. Apesar de plausíveis e de justificadas, não temos como aquilatar o seu real valor de verdade, porque os referentes que usamos são auto-referidos, são referentes arbitrários. Daí que essas nossas ideias não possam almejar se não o estatuto de crenças, e que as melhores não ultrapassem o estatuto de crenças plausíveis e justificadas. Que mais poderemos fazer não sendo omniscientes?
É claro que “quando alguém diz que acredita em deus está a dizer que acredita na proposição "deus existe" (e que) quando alguém acredita que deus não existe, está a fazer o mesmo mas tendo por objecto de crença a negação dessa proposição”. Esta sua afirmação parece-me ser uma verdade de Lapalisse. A crença na existência de deus é a crença na ideia da existência de deus; e a ideia da existência é sobre o estado (de existência) do ser ou entidade concebida como deus. O que haveria de ser? E é precisamente por deus, a sua existência e os seus atributos, ser objecto das nossas ideias que ele é também objecto das nossas crenças. E deus pode ser ainda objecto das nossas proposições, desde que estas expressem as nossas ideias sobre ele. Mas não confunda as nossas proposições com as nossas ideias; estas, se forem apenas ideias pessoais e íntimas, podem existir sem serem expressas, verbalizadas, e não chegarem a ser proposições; as mesmas ideias podem ser expressas por proposições variadas; as proposições podem não expressar qualquer ideia ou pelo menos qualquer ideia inteligível, coerente ou com sentido; e uma proposição, desde que não expresse qualquer ideia, não implica qualquer crença. Ao contrário do que afirmava, as proposições não implicam as crenças; são as ideias que as proposições possam expressar que implicam as crenças.
A realidade existe, e o que pensamos sobre ela também; e uma e outra são coisas distintas. Não discutimos a realidade, formulamos ideias sobre a realidade e discutimo-las. E, claro, formulamos ideias sobre muitas coisas que nada têm a ver com a realidade empírica (mas com uma realidade imaginada, comummente designada por realidade virtual e considerada uma outra dimensão da realidade), principalmente nos diversos campos da imaginação, na arte, por exemplo, assim como noutras entretenhas menores às quais a estupidez se pode dedicar. Mas para a discussão sobre a realidade empírica (deixemos a outra de lado, para não acrescentar confusão desnecessária) é necessário que as ideias formuladas se lhe refiram; e para que ela seja séria é necessário que as ideias tenham um mínimo de sentido e que expressem a crença de quem as concebe ou aceita. Se uma ideia não tem sentido ou não expressa a crença de ninguém, que interesse tem discuti-la?
O que se verifica é que você e alguns comentadores que consigo fazem coro concebem ideias disparatadas, algumas do domínio da imaginação, e depois se comprazem a afirmar que não acreditam nelas. Exemplos: o tigre sentado no meu colo, o elefante de três cabeças, e outros do mesmo calibre. É-me difícil aceitar que alguém conceba ideias, mesmo nesses domínios, e não acredite nelas, negando a existência do que afirma existente. É que os objectos imaginados existem, mais do que não seja no domínio da imaginação. Se não existissem não poderiam ser invocados ou tidos como imaginados! Mas é habitual, por aqui, o recurso a um artifício: afirmar algo sobre objectos variados, seres e coisas, seus estados e atributos, do domínio da imaginação, e depois negar a sua existência no domínio da realidade empírica. Não se trata de qualquer crença errada de que algo imaginário exista na realidade empírica; trata-se da falácia de invocar uma ideia referente a seres ou coisas do domínio do imaginário, que se sabe não existirem na realidade empírica, e usá-la para negar a existência desses seres ou coisas imaginárias na realidade empírica ou que essas ideias não têm correspondência com esta realidade. Elaborar tais estratagemas pode ser uma entretenha interessante para algumas pessoas, mas não constitui nada de positivo para qualquer discussão séria. Não é com tretas que se combatem tretas, e com tretas destas como argumentos muito menos é possível combater crenças sérias. Não é por muito a ridicularizarmos que uma crença séria deixa de o ser e passa a ser treta.
Não alcanço muito bem o que você pretenderá dizer com a frase “A cadeira em si não pode ser objecto de uma crença”. Não sou dado a coisas muito complexas, como alguém por aqui já notou. O que alcanço permite-me contrariá-lo, dizendo que “cadeira” pode ser objecto de crença. Acreditamos que “cadeira” é um conceito que designa um objecto real com estes e aqueles atributos, que nos permite sentar, partir ou atirar com ele, e não um objecto que ladra, por exemplo. Se acreditamos que o conceito reconstitui o objecto, estamos em presença duma crença. Conceitos são ideias, e quando as ideias reconstituem objectos reais, ainda que apenas designando-os, temos boas razões para acreditar nelas. Neste caso, temos boas razões para acreditar que “cadeira” designa o objecto com os atributos referidos. Não temos é nenhuma razão para acreditar no objecto empírico que designamos por cadeira, porque são as nossas ideias acerca dos objectos reais e não os próprios objectos reais que podem ser objecto de crença. Objectos reais podem ser conhecidos, sabidos; mas alguns dos seus atributos podem ter de ser objecto de crença, desde que não tenhamos modo de os conhecer.
Não compreendo também por que designa a proposição “o rei da França não tem barba” como sendo uma hipótese; não vejo nesta afirmação referida a sua qualidade de hipótese, pelo que pode designá-la simplesmente pelo que ela é: uma proposição, a verbalização duma ideia. A ideia “o rei da França não tem barba” existe e foi expressa por aquela proposição. Quem a concebeu e expressou acredita no juízo que a ideia exprime, a não ser que se entretenha a conceber e a expressar ideias que sabe de antemão não terem qualquer relação com a realidade. A ideia expressa pela proposição pode ser verdadeira ou falsa, e isso não decorre da crença de quem a concebeu e expressou; mas ter sido concebida e expressa decorre da crença, por parte de quem a concebeu, de que é verdadeira. As ideias exprimem as crenças de quem as concebe ou as aceita como suas. Em relação à ideia expressa por esta proposição, é facilmente verificável que ela não tem sentido, porque não se refere a objectos reais. Afinal, na realidade empírica não existe rei da França, diz você e bem. Mas a ideia dever ter sentido para quem a concebeu e expressou. Existiu e existe o conceito de rei (uma pessoa desempenhando uma determinada função); existiu e existe a França; e existiu o rei da França. Também pode ter existido algum rei da França que não tinha barba. Por ter existido, é fácil alguém cometer o erro de imaginar que continua existindo. E se “o rei da França não tem barba” não existe na realidade empírica existe na realidade imaginada de quem acredita que o que imaginou corresponde à realidade empírica.
Se a proposição “o rei da França não tem barba” é de sua autoria e não acredita nela, usando-a apenas para demonstrar que podem ser concebidas ideias sem sentido ou ideias falsas, foi pura perda de tempo. Muitas ideias não têm sentido e não são objecto de crença; e parte das nossas crenças é em ideias falsas. Não acreditar na verdade duma ideia é acreditar na sua falsidade. Acreditar na falsidade duma ideia não é sinónimo de acreditar na verdade duma ideia de sentido oposto. Temos razões para acreditar que a crença em que “deus existe” seja falsa; não temos razões para acreditar que a crença em que “deus não existe” seja verdadeira. O que é tomado por argumentos a favor da demonstração da crença de que “deus não existe” é verdadeira são afinal argumentos a favor da demonstração da crença de que “deus existe” é falsa. A existência de algo pode ser pensada, e assim algo passa a existir, nem que seja no pensamento; a inexistência de algo não pode ser pensada, e algo não pensado não pode existir, nem que seja no pensamento. O que não é suposto existir não é sinónimo do que é suposto não existir.
A “nossa linguagem permite referir coisas (que) não existem ou até coisas que não podem existir, como o número que é maior que todos os outros ou um triângulo circular”. Isso é apenas sinónimo de que com ela podemos expressar ideias, podemos expressar ideias sem qualquer sentido ou coerência, podemos expressar ideias falsas e de que até as nossas ideias falsas podem ser objecto de crença. A nossa linguagem permite expressarmo-nos, através de proposições; as nossas proposições podem expressar as ideias mais disparatadas, inteligíveis, sem sentido ou incoerentes, mas isso não invalida que quem as formula acredite nas ideias que elas possam expressar. Tais ideias podem não colher a adesão de outros, e não ser sua crença, mas elas expressam a crença de quem as concebeu e expressou. A crença de quem as expressou refere-se à aceitação do seu valor de verdade. O seu valor de verdade pode ser real ou não; não tendo como comprovar sem margem para erro, apenas podemos ter crenças na verdade e não o conhecimento ou o saber da verdade.
“Há quem afirme, como o CL, que «não tem qualquer sentido acreditar na não existência do que quer que seja» porque «É um absurdo a inexistência de algo, real ou meramente imaginário, poder ser objecto de pensamento ou de crença.». Isto está errado”. Afirmar “isto está errado”, não chega para demonstrar o eventual erro. Quando demonstrar que algo inexistente pode ser pensado e acreditado, poderei considerar os seus argumentos.
CL.
* «E onde está a oração? – é uma formulação inventada por um qualquer palerma?»
ResponderEliminarSe tem de ser qualquer palerma, podes ser tu. Deve ser por isso que não resulta comigo.
* «E onde está o crente? – é um ateu se o mínimo de decência?»
Não sabia que não havia crentes. Se um ateu não é crente, e crentes existem, então que o crente o faça. Se tu és um crente, então podes fazê-lo.
É curioso que para acreditar é preciso já ser crente. E como já é crente, não vale a pena testar. Então é por isso que não funciona com um ateu! Mas funciona com perseguidores de cristãos, como Saulo.
* «E o “nunca porás Deus à prova”?»
O que contradiz passagens como em Juízes 6, onde Gideão pediu provas três vezes. Indiquei o link mesmo de propósito para esse tipo de objecções.
Além disso se não se pode por Deus à prova, não se pode saber se existe. E como não se pode saber se existe, não acredito que exista, tal como não acredito em seja o que for que não se possa por à prova.
* «E o “não Invocarás Deus em vão”?»
Ex 20:7 e Deu 5:11 : «Não tomarás o nome do Senhor teu Deus em vão; porque o Senhor não terá por inocente o que tomar o seu nome em vão.»
* New Advent > The Ten Commandments : «According to this manner of reckoning, the injunction forbidding the use of the Lord's Name in vain comes second in order» (...) Clico em "use of the Lord's Name" e vai para "Blasphemy".
Fazer-se conhecer para converter um ateu é em vão? Não sabia que Deus ofendia-se assim tão facilmente. Se ofendesse assim tão facilmente de tal modo que não quer fazer-se conhecer, eu não posso ter culpa por causa disso. E não vou passar a acreditar numa coisa que não pode mostrada ou provada.
Qual é então a diferença entre existir e não existir um Deus?
Mats:
ResponderEliminar«Não chegaste a responder à minha pergunta sobre qual das religiões tinhas em mente»
Quando eu estudava Filosofia, lembro-me muito bem de se falar na religião, tal como se falava em senso-comum. A Filosofia... qual filosofia. Senso-comum... senso-comum de quem? É óbvio que está-se a referir ao universo das religiões. Tens algum problema em perceber o que é dito, ou é só retórica para perder tempo?
«Quem é que decide sobre quais as hipóteses válidas e as inválidas?»
Todas as hipóteses são válidas desde que possam ser testadas. Ou seja, do tipo: se X é verdade, então se Y acontece Z. Se com Y acontece Z, então a hipótese para além de válida, torna-se verdadeira.
«Portanto, tal como eu tinha dito, este é um deus que tu criaste, e nao o Deus da Bíblia.»
Então o Deus da Bíblia não é omnipotente, omnisciente e omnibondoso?
«
Pensa assim: se Deus fosse a impedir e/ou acabar com todo o mal da forma que tu esperas, quantos ateus é que estariam vivos hoje? ;-)»
O VenomFangX já usou-o e eu comentei-o. Se alguém pode impedir o mal, sem qualquer obstáculo, e quer que não haja mal, deixaria de haver o mal. Supondo que ser ateu é mau, então nunca existiriam ateus à partida, nem qualquer mal, caso esse Deus existisse. Duh!!!
«O Deus Criador, por outro lado, não precisa de tais artimanhas.»
Salvar uma criança é uma artimanha... Vou pensar nisso na próxima vez que alguém tiver em apuros. Ainda há pouco tempo um cego dirigia-se para o caminho-de-ferro e fui a correr para impedir que caísse. Foi uma grande artimanha. Mas Ludwig erra numa coisa: se esse Deus existisse, nem sequer existiria a oportunidade de crianças e cegos magoarem-se, se isso é um mal. E se a cegueira fosse um mal, nem sequer existiria, pois Deus poderia fazer tudo quanto desejasse sem obstáculos, sem limitações, logo tudo o que acontecesse seria porque quis. E se é bom, então não existira qualquer mal à partida, porque nada existiria antes Dele.
«Ele já preparou um caminho para resolver toda a maldade que nós pusemos no mundo.»
Veja a resposta que coloquei acima. Só quem tem limitações ou comete erros é que resolve as coisas à priori.
«Na visão ateísta do mundo, vazia de referência absoluta para a moral, a morte de uma criança é apenas....a morte de uma composição de químicos.»
E depois? Quando se toma drogas, o prazer vem de químicos. A menstruação surge por causa do desequilíbrio de químicos. A minha mão é matéria, mas quero tê-la.
Tu não me respondeste ao artigo que coloquei sobre a moral, por isso não existe qualquer valor quando falas em moral. Além disso, tu nem sequer sabes explicar de onde vêm as tuas morais na Bíblia. Por exemplo, consideras a pedofilia e escravatura imorais - a Bíblia diz que são?
«Por "desculpas" tu queres dizer "esclarecimentos em relação às tuas falsas presopusições"?»
É o que Popper chamava de justificacionismos. Coloca-se uma hipótese X. Se ela é verdadeira, então se Y, acontece Z. Se for falsa, não acontece. Testa-se, e não acontece Z. Então, quem defende a hipótese X, tenta inventar desculpas de modo a tentar que X seja irrefutável por não poder ser testável. Daí a importãncia da irrefutabilidade ou falseabilidade de uma hipótese. Por isso é que é fácil ser cristão e criacionista.
«Eu nunca ouvi um cristão dizer que uma criança perder as pernas numa mina é bom.»
Então és um ignorante. Leia sobre as compossibilidades e o positivismo de Leibniz (o melhor dos mundos), e o "Cândido" que goza com essa ideia. Mesmo em mensagens no YouTube houve quem defendesse essa ideia. Até sobre o dilema de Epicuro escrevi sobre elas:
«Numa mensagem pessoal já fizeram menção do positivismo de Leibniz: tudo existe pelo melhor. Portanto, para Deus maximizar o bem, então teria de fazer "pequenos males". Foi dado o exemplo de uma cirurgia dolorosa para salvar a vida. Mas q), r) e s) mostram o problema. Muitas vezes temos de fazer "pequenos males" porque não somos omnipotentes nem omniscientes. »
«Tu sabes que o ser humano não foi feito para sofrer»
Mas pelos vistos sofre. É só um bug.
«Tu sabes que existe uma lei moral absoluta na base do qual tu decides que a morte de uma criança não é bom.»
Não - é pela empatia. Um psicopata não tem empatia para perceber os sentimentos dos outros. São neurónios espelho que permitem a empatia. Se ficares sem eles, deixas-te de importar com a saúde das crianças.
Pelos vistos mostra-se que Deus existe com mera retórica e com uma passagem preconceitusa da Bíblia. Também posso dizer que finges ser cristão e voilá, temos o mesmo argumento voltado contra ti. Cá para mim foram só questões de retórica, e seja o que acontecesse, tomas como provado que existe um Deus. Mas as cartas não mentem.
CL:
ResponderEliminar«Quando cremos não sabemos, apenas julgamos saber, admitimos saber, convencemo-nos de que sabemos. Quando sabemos não cremos.»
Tanto quanto sei, isto é um erro.
O conhecimento corresponde às crenças verdadeiras e justificadas. Assim, mesmo que nem todas as crenças correspondam a conhecimento (obviamente), todo o conhecimento são crenças.
Por exemplo: eu acredito que a terra não é plana. Se não for, então esta crença é conhecimento - nesse caso será verdadeira, e certamente é justificada.
«mas é a nossa crença no seu valor de verdade que faz com que as concebamos e expressemos.»
Não. Muitas vezes as pessoas expressam ideias que acreditam serem falsas.
Por exemplo, quando mentem.
«para que ela seja séria é necessário que as ideias tenham um mínimo de sentido e que expressem a crença de quem as concebe ou aceita.»
Não vejo qual a justificação para isto.
Quer dizer, concordo que é necessário que as ideias tenham sentido.
Não entendo qual a justificação de que uma ideia deve expressar a crença de quem a concebe. Pelo contrário: em ciência (por exemplo) é comum conceber ideias nas quais não se acredita para testar outras ideias, para fazer "experiências mentais" que são muito conclusivas. As discussões podem ser muito sérias.
O cientista B não acredita na teoria A, mas assume-a verdadeira e conclui que essa teoria levaria à consequência y, por exemplo. Depois afirma que a consequência y não se verifica, e logo a ideia é falsa.
Neste caso terá concebido uma ideia - a consequência y - em cuja existência na realidade empírica não acredita, e no entanto a discussão foi bastante séria e frutuosa.
Digo mais, podem ser muito estérieis as discussões em que os intervenientes não têm esta capacidade de conceptualizar tendo por base ideias nas quais não acreditam, falando e elaborando sobre elas. É muito importante para compreender as ideias de outros, e mesmo até alterar as crenças se for caso disso.
«trata-se da falácia de invocar uma ideia referente a seres ou coisas do domínio do imaginário, que se sabe não existirem na realidade empírica, e usá-la para negar a existência desses seres ou coisas imaginárias na realidade empírica ou que essas ideias não têm correspondência com esta realidade.»
Realmente gostaria de conhecer o nome dessa falácia.
Não vejo nada de falacioso em conceber seres que se acredita não existirem na realidade empírica.
Se um escritor esclarecer que uma personagem que criou não existe, está a ser falacioso? Quem diria...
«Temos razões para acreditar que a crença em que “deus existe” seja falsa; não temos razões para acreditar que a crença em que “deus não existe” seja verdadeira.»
Ok, isto é mesmo uma contradição.
Se A tem valor lógico falso, ~A (não-A) tem valor lógico verdadeiro.
Assim, se temos razões para acreditar que A ("deus existe") é falsa, essas mesmas razões levam a acreditar que ~A é verdadeira, ou seja para acreditar que "deus não existe".
«Quando demonstrar que algo inexistente pode ser pensado e acreditado, poderei considerar os seus argumentos.»
Aquilo que ficou claro pelo texto do CL é que compeendeu perfeitamente que aquilo que se quer dizer com "Sereias não existem" é que embora as sereias possam existir enquanto seres imaginários, não existem enquanto parte da realidade empírica.
Assim sendo, neste sentido de "inexistente" (não é parte da realidade empírica), as sereias são um bom exemplo de algo inexistente que pode ser pensado e acreditado (já houve quem acreditasse).
A presença e os efeitos de Deus são perfeitamente detectáveis.
ResponderEliminar1. O Universo é um efeito da presença de Deus, já que ele não tem condições para se produzir a si próprio. Ele teve um princípio, estando hoje a perder energia e complexidade. Por isso, ele necessitou de uma causa que lhe tenha fornecido energia e ordem no princípio, e que não tenha tido ela mesmo um princípio.
Essa causa só pode ser um Deus todo poderoso, racional e eterno, tal como a Bíblia ensina.
2. O Universo encontra-se estruturado de acordo com leis físicas, as chamadas leis naturais. Por isso, ele pode ser estudado racionalmente. A ordem e a racionalidade inerentes ao Universo, juntamente com a sua extrema complexidade, permitem-nos corroborar a racionalidade, a omnisciência e a omnipotência de Deus. As leis da natureza são descobertas pelos cientistas, mas foram criadas por Deus. Ele é o legislador.
3) O Universo encontra-se plenamente sintonizado para a vida, falando os cientistas da existência de centenas de coincidências antrópicas.
Também isso é inteiramente consistente com a presença e com os efeitos de um Deus vivo que criou o Universo para manifestar a sua glória e para permitir a vida do ser humano criado à sua imagem e semelhança.
A sintonia do Universo para a vida só é um mistério para quem não conhece o Deus da Bíblia.
3) O Código de DNA contém informação codificada, especifidando a produção,a reprodução, o funcionamento e a adaptação dos seres vivos, em quantidade e qualidade que transcendem tudo o que o ser humano é capaz de compreender e imitar.
Não existe informação sem inteligência. Não existe código sem inteligência.
A vida só é possível graças à existência simultânea de informação codificada e do mecanismo necessário para a sua transcrição, tradução e execução.
A vida é um efeito visível de Deus.
De resto, não se conhece qualquer explicação naturalista para a origem da vida ou de informação codificada. A vida nunca poderia surgir por processos naturalisticos, na medida em que ela necessita de um ingrediente não naturaliistico: informação codificada.
4) Jesus Cristo, Deus connosco, foi visto por muitas pessoas, as quais presenciaram e registaram os seus milagres e a sua ressurreição. Eles registaram que Jesus era todo o poderoso e que a natureza obedecia prontamente às suas ordens. Ele curava cegos, ressuscitava mortos, transformava a água em vinho, andava sobre as águas, acalmava as tempestades, etc. Isso foi visto e registado, podendo ser investigado historicamente.
Infelizmente para os evolucionistas, o Big Bang nunca foi observada por ninguém. A origem do sistema solar a partir de uma nebulosa tão pouco foi observada. A origem casual da vida, também nunca foi observada ou explicada. Também o hipotético ancestral comum nunca foi visto ou descrito.
Existe evidência da vida e da ressurreição física de Jesus Cristo
Também a transformação de uma espécie menos complexa noutra mais complexa também não foi vista.
Curiosamente, alguns evolucionistas dizem que essa tranformação é demasiado lenta para poder ser observada em laboratório e demasiado rápida para ser observada no registo fóssil. O certo é que ela nunca foi nem pode ser observada.
Tanto basta para mostrar que a teoria da evolução é pura ilusão naturalista.
Parabéns pela fotografia e pela entrevista no Diário de Notícias do passado Sábado. Conseguir duas páginas dedicadas ao criacionismo é uma grande vitória.
ResponderEliminarSinceramente, nem sei bem o que se passou com a senhora Sócrates ao escrever aquele serviçal à idiotice. Mas como nem vi o jornal como um todo, fiquei-me pela versão net, pelo que posso ter tido uma má visão da coisa...
E se o Jónatas é "especialista" em alguma coisa que não a fala-baratice, eu vou ali e já venho.
António
ResponderEliminar"O Prof. Jónatas Machado foi fotografado em frente da Universidade de Coimbra fitando o horizonte, talvez o infinito."
É capaz de ter sido o horizonte mesmo, que o infinito é longe pra xuxu.
Já morreu
ResponderEliminarA primeira vez que o corrigi foi pela duquesa de mantua, agora tenho que o avisar que Luis Filipe abdicou em 1848. Caramba, a seguir vou começar a cobrar.
ResponderEliminarObrigado VF. Enquanto forem de borla, as suas correcções serão bem vindas :)
ResponderEliminarCL,
ResponderEliminarO que importa aqui são as ideias e eu também as prefiro expor sem ambiguidade. Depois logo se vê se está certo ou não. Por isso não precisa pedir indulgências.
Vou comentar alguns pontos em separado, o que não é muito elegante mas penso que ajuda porque temos que acertar os ponteiro em várias coisas para nos entendermos melhor.
«Proposições são expressões verbais através das quais exprimimos ideias ou juízos de muitas características ou qualidades.[...] Por isso, ao contrário do que afirmava, 2=3 e X^2 são proposições; a primeira expressa uma ideia com sentido, enquanto a segunda não.»
Concordo que proposições exprimem ideias ou juízos de vários tipos. Mas nem tudo são proposições . 2=3 é uma proposição. X^2 não é uma proposição.
Uma proposição é uma expressão que se pode considerar verdadeira ou falsa. "Porco-espinho" não é proposição. “O porco-espinho é um mamífero” é proposição porque pode ser verdade (no sentido de corresponder à realidade), tal como "matar porcos espinhos é uma maldade” pode ser verdade (no sentido de ser consistente com um conjunto de valores) e “se todo o porco-espinho é X e Y é porco-espinho então Y é X” (por consistência com um conjunto de axiomas).
«As nossas crenças respeitam às ideias que concebemos. As ideias, têm por objecto muitas coisas (aquilo a que se referem e que por isso é o seu objecto) e são expressas por proposições, as verbalizações dessas ideias.»
Certo. As nossas crenças têm por objecto proposições, que são ideias (mas que não são qualquer ideia, apenas aquelas às quais faz sentido associar o valor de verdadeiro ou falso).
«Qualquer coisa pode existir na realidade empírica»
Esta coisa da realidade empírica parece-me uma confusão desnecessária. Consideremos que “existe X” significa simplesmente “estão instanciadas as propriedades de X” ou, se preferir, “são verdadeiras as proposições que descrevem X”. Assim podemos dizer que existe um número par entre 23 e 25 e que existe um copo de vidro no meu armário da cozinha.
E neste caso é fácil ver que a existência de X não tem influência nenhuma na nossa capacidade de pensar nessa existência, ou de crer nela. Ou na inexistência. Porque basta-nos pensar nas proposições que descrevem X e julgar acerca da sua verdade. Por exemplo, seja X o número inteiro que é maior que 2040, menor que 2050 e não é o produto de números inteiros menores que X. Note que a sua capacidade de pensar na hipótese de X existir não depende de saber se há ou não há números primos entre 2040 e 2050.
«Se algo é objecto das nossas ideias, é também, através delas, objecto das nossas crenças.»
Não. As nossas crenças são um conjunto especializado de ideias acerca de proposições. Eu creio quando considero verdadeira uma proposição. Por isso posso ter uma ideia de um porco-espinho mas não posso ter uma crença no porco espinho. Só posso crer em proposições acerca do porco espinho. E mesmo uma proposição pode ser pensada sem formar crenças. Veja o exemplo do número primo acima. Pode pensar na proposição que existe esse número sem formar qualquer crença acerca disso.
«Quando alguém concebe ideias nas quais afirma não acreditar, como já tem sido invocado aqui repetidamente, está a entreter-se com tretas e a procurar entreter-nos.»
Ou a testar uma hipótese. Conceber ideias nas quais não se acredita é uma parte fundamental do processo de adquirir conhecimento, e é essencial se queremos crenças fundamentadas (pois nesse caso só podemos acreditar depois de ter concebido, duvidado, e testado devidamente uma hipótese).
«Não se acredita pouco ou muito numa ideia; acredita-se ou não se acredita, e neste sentido aceita-se ou não se aceita a ideia. [...] O grau de convicção no valor de verdade duma ideia, a certeza de que essa ideia corresponda à realidade, pode variar de crente para crente»
Está-se a contradizer. O grau de convicção é precisamente o grau em que se acredita. Crença é convicção. Posso crer pouco, muito, mais ou menos.
«As nossas ideias serem verdadeiras é independente da nossa crença no seu valor de verdade;»
Sim.
«mas é a nossa crença no seu valor de verdade que faz com que as concebamos e expressemos.»
Não. Eu posso conceber e exprimir que está um pinguim cor de rosa em cima do meu teclado. Até posso testar essa hipótese. Tudo isto sem que tenha de crer que é verdade. Se esta sua tese fosse válida não tínhamos ciência. Só tínhamos superstição.
«Quando cremos não sabemos, apenas julgamos saber, admitimos saber, convencemo-nos de que sabemos. Quando sabemos não cremos.»
É verdade que podemos crer sem saber. Mas não faz sentido dizer que sabemos sem crer. Considere: “Eu sei que a Lua existe, mas não acredito que exista, e estou absolutamente convencido de que não existe”. Isto é contraditório. Só se pode saber que uma proposição é verdadeira se se considerar verdadeira essa proposição. E considerar verdadeira uma proposição é crer nela.
«A crença na existência de deus é a crença na ideia da existência de deus»
O problema aqui é ambiguidade, porque “a ideia da existência de deus” pode crer dizer duas coisas muito diferentes. Se refere o conceito da instanciação dos atributos de deus, então não é objecto de crença como tal. É apenas a definição de um conceito. É uma designação, não uma proposição. Se refere a hipótese (proposição) que os atributos de deus estão instanciados, então pode ser objecto de crença. Mas o objecto de crença é a proposição, e pode igualmente ser objecto de crença a proposição contrária que diz que nem todos os atributos de deus estão instanciados e, nesse caso, temos a crença na inexistência desse deus.
O problema, novamente, é confundir a ideia de algo com as proposições acerca disso. A crença só se pode aplicar às proposições.
«É que os objectos imaginados existem, mais do que não seja no domínio da imaginação.»
Esta é outra confusão infeliz. Considere o cubo esférico, que é um sólido tridimensional que é uma esfera e é um cubo. O que eu imagino é um conjunto de proposições que descrevem este objecto. “É sólido tridimensional”, “é esfera”, “é cubo”. Mas este objecto não existe porque não há nada acerca do qual estas três proposições são verdadeiras. E eu não acredito que ele exista porque não acredito que estas três proposições sejam verdadeiras acerca da mesma coisa.
Penso que o seu problema está em fazer uma confusão desnecessária entre existências, ideias, crenças e proposições. Não vale a pena estar a dizer que isto existe na imaginação. Isso só desvaloriza o significado da palavra “existir” e aumenta a confusão.
Penso que isto cobre o principal naquilo que dificulta a comunicação entre nós. No próximo comentário abordo outro problema de natureza diferente.
CL,
ResponderEliminar«trata-se da falácia de invocar uma ideia referente a seres ou coisas do domínio do imaginário, que se sabe não existirem na realidade empírica, e usá-la para negar a existência desses seres ou coisas imaginárias na realidade empírica ou que essas ideias não têm correspondência com esta realidade.»
Não é só nesse passo. O raciocínio é assim:
Acreditamos que não existe o unicórnio invisível cor de rosa. Não porque haver alguma prova definitiva e irrevogável que esse ser não exista, mas porque acreditamos não existir todos os de cuja existência não haja indícios objectivos e fiáveis. O mesmo se passa com Horus, Odin, os Bagadjimbiri e milhares de outros deuses.
Ou seja, quando imaginamos um conjunto de atributos de um ser, a menos que haja evidências nesse sentido o mais correcto é supor (crer) que as proposições correspondentes a esses atributos não vão ser todas verdadeiras para o mesmo ser. Ou seja, esse ser que imaginamos não existe. Os exemplos abundam e são fáceis de compreender.
É por esse processo, que se justifica pela improbabilidade a priori de um conjunto de proposições arbitrárias ser totalmente verdade, que rejeitamos a existência destes seres hipotéticos.
O argumento contra os deuses que sobram não é que são imaginários porque os outros são. É que devemos considerá-los inexistentes porque estão na mesma situação que todos os milhentos outros que consideramos inexistentes por estar nessa situação.
E isso não me parece falacioso. Pelo contrário, fazer uma excepção para o deus favorito só porque se gosta mais deste é que será um raciocínio inválido, e invocar a revelação e tretas afins torna-o falacioso por tentar dar-lhe a aparência de uma legitimidade que não tem.
Krippahl.
ResponderEliminarRelendo com atenção o meu comentário, verifico que cometi algumas imprecisões, que se podem prestar a confusão, e alguns erros. Essas imprecisões e erros não foram assinalados. Deixo de lado os menores e aponto os que me parecem mais graves. Por exemplo, este: “Uma ideia implica uma crença, a crença no valor de verdade que a ideia contém por parte de quem a concebeu e expressou”; deveria ter dito: “Uma crença implica uma ideia, a convicção no valor de verdade que a ideia contém por parte de quem a concebeu e expressou”, porque algumas ideias não motivam qualquer crença, como decorre de várias passagens do texto. Ou este outro: “As nossas ideias serem verdadeiras é independente da nossa crença no seu valor de verdade; mas é a nossa crença no seu valor de verdade que faz com que as concebamos e expressemos”; deveria ter dito: “(…) mas é a nossa crença no seu valor de verdade que faz com que as expressemos”, porque apenas depois de concebidas as ideias o seu valor de verdade pode ser motivo de crença.
Não vislumbro ter feito qualquer “confusão desnecessária entre existências, ideias, crenças e proposições”, nem outras confusões infelizes, o que não invalida que a faça. Posso ter concepções diferentes, mas isso não constitui problema, do meu ponto de vista. Numa discussão séria, é necessário que as proposições expressem ideias com sentido e que os juízos contidos nessas ideias constituam o objecto das crenças de quem as concebeu e expressou, aquilo em que acredita. Se as ideias não têm sentido ou os juízos que expressam não constituem a crença de ninguém, que interesse tem discuti-las? Tagarelar? Mesmo no campo das hipóteses, quando se formulam umas para testar outras, a hipótese de teste de uma outra tem de expressar algum grau de convicção de quem a formula; doutro modo, o teste teria pouco valor. São as ideias que são defendidas com convicção, que constituem motivo de crença, que interessa discutir.
De algumas passagens dos seus comentários, parece-me que o significado de conceber não terá sido ainda devidamente apreendido. Assim como me parece não ter sido compreendido que a mera percepção da existência dos objectos está relacionada com alguns dos seus atributos. Quanto às ideias, existindo elas e referindo-se a determinados estados e qualidades de objectos, estes também deverão existir. Não compreendo, por isso, a persistência na negação de que o que é imaginado também existe. Alguns imaginam e crêem convictamente que o que imaginam existe fora da imaginação, na realidade empírica; outros imaginam o que crêem não existir na realidade empírica e, pelos vistos, nem crêem que o que imaginam exista na imaginação. Para aqueles, o imaginado é real e empírico; para estes, o imaginado não só não é empírico como nem tão pouco é real. Aqueles estão sonhando o que imaginam; estarão estes sonhando que imaginam?
CL.
"Se Deus existir, peço que a carta no topo tenha este naipe e este valor. Amén."
ResponderEliminarBoa piada! :)
Um Deus mágico à nossa ordem, qual génio de Aladino p'ra mudar nosso destino!
Interessante esse site "Why won't God heal amputees?", mas continua a haver algo tão tremendamente simples que parece ser ignorado em todas estas discussões ociosas e de lana caprina.
Se Deus é, por definição, omnipresente, então ele próprio É o médico e o doente, a doença e o remédio, a oração e a cura. Ou está presente nisso tudo, nada existe sem ele, como o Gita explicitamente declara.
Já deixei aqui este vídeo que ilustra um dos mais fabulosos poemas de Rumi, mas é preciso mesmo ter experimentado isso para compreender aquilo que o dervixe persa aí transmite de forma magnificente!
Rumi: Say I Am You
Mesmo intelectualmente isto é simples e lógico de entender, ainda que se considere uma tal proposição como meramente abstracta e que esse conceito não tem uma tradução real.
But it has... it really has! Por isso é que todo este universo é uma unidade inteligente, mas para o compreender é mesmo necessário saber de que forma a matéria surgiu e se organizou espontaneamente. Sem admitir essa proto-inteligência elementar não conseguiremos chegar a nenhuma explicação cabal do que quer que seja.
Por isso, tanto a física ao nível microscópico como a cosmologia no plano macroscópico se afundam num desarrazoado de hipóteses inconsequentes sem qualquer verosimelhança com a realidade que tanto se ufanam de estudar e descrever... oh really?!
Não há separação mas unidade, esse é um conceito central na ideia de Deus, claro. E sim, naquilo que digo atrás ou Rumi descreve, pode de facto identificar-se o universo como Deus, numa concepção panteísta ou panenteísta... whatever!
Still... isso só faz sentido com esse atributo central da inteligência, já vem sendo tempo de tantos cérebros esclarecidos admitirem uma tal proposição que qualquer labrego ignorante... vide ME!... sabe intuitivamente verdadeira!
Em suma: enquanto a razão humana se recusar a perceber essa noção central de unidade - "I am he as you are he as you are me and we are all together!" - nunca avançaremos na senda do saber realmente científico e não do mero arremedo tecnológico que temos hoje, desprovido da substância filosófica que lhe pode dar coesão.
Deus não existe "fora de" mas "dentro de" e ele é toda a inteligência natural ou o tal Logos de que São João afirma: "Todas as coisas foram feitas por intermédio dele, e sem ele nada do que foi feito se fez."
So easy to see... we all must agree! :)
CL,
ResponderEliminarVamos então tentar avançar um bocadinho de cada vez, começando por aqui:
«Numa discussão séria, é necessário que as proposições expressem ideias com sentido e que os juízos contidos nessas ideias constituam o objecto das crenças de quem as concebeu e expressou»
Concordo que as proposições têm que exprimir ideias com sentido. Essa é uma das minhas críticas à teologia e à religião em geral.
Mas discordo que as proposições apresentadas tenham que ser objecto das crenças de quem as expressou e concebeu.
Na investigação científica é comum é considerar-se várias hipóteses que depois serão distinguidas pelos resultados que se observa. Mesmo que o investigador tenha à partida uma hipótese favorita, e até pode crer (ter uma fezada) que é a certa, não consegue crer em todas e mal estaria a ciência se ele só pudesse conceber e expressar aquelas nas quais acredita.
E há muitas situações em que convém considerar precisamente a hipótese contrária àquela em que se acredita. Por exemplo, a demonstração da irracionalidade da raiz de 2 é por reductio ad absurdum, partindo do principio que raiz de 2 é um número racional e concluindo depois que não pode ser por chegar a uma contradição.
Em suma, podemos considerar, expressar e até tentar avaliar por critérios objectivos hipóteses de uma forma que não depende das nossas crenças acerca dessa hipóteses. Isso é mesmo uma fundação importante de toda a lógica, matemática, ciência e filosofia em geral. Só a religião é que defende o que tu defendes aqui (espero que não te importes que nos tratemos por tu; o "você" só atrapalha o diálogo...)
Rui Leprechaun,
ResponderEliminar«Um Deus mágico à nossa ordem, qual génio de Aladino p'ra mudar nosso destino!»
Era essa a ideia original, em todas as religiões. Senão fosse para rebentar as paredes das fortalezas, abrir o mar ao meio, fazer chover, trazer a carga ou o que raio o pessoal quisesse, de nada servia ter deuses.
Hoje em dia, estando a maioria desses problemas resolvido pela ciência, os sucedâneos modernos já só servem para a cura milagrosa muito de vez em quando, aparições a pastores e especulações teológicas que só são consequentes quando os legisladores lhes dão ouvidos (que, infelizmente, é muito mais frequente do que deveria ser).
Não, não importo. É mais cómodo.
ResponderEliminarEm relação ao teu comentário, lembro-te que quando fazemos de advogado do diabo temos de defender o nosso constituinte. Assim podemos saber se a nossa defesa é boa.
CL.
Quem não acredita em sereias e no pai natal não passa os dias e as noites a gritar que não acredita em sereias e no pai natal. A não ser que seja demente.
ResponderEliminarNuno Gaspar,
ResponderEliminar«Quem não acredita em sereias e no pai natal não passa os dias e as noites a gritar que não acredita em sereias e no pai natal. A não ser que seja demente.»
Ou a não ser que viva num país onde muita gente acredita em sereias e no pai natal, onde fazem procissões em honra de sereias e do pai natal, atrapalhando o trânsito, onde sacerdotes que rezam a sereias e ao pai natal são pagos pelos serviços de saúde para falar aos doentes de sereias e do pai natal, onde há tempo de antena na televisão pública, paga por todos, para que se fale de sereias e do pai natal, e assim por diante.
Também me parece algo estranho considerar que é demente alguém que diz não acreditar em sereias e no pai natal. É demente por dizê-lo? Que mal tem isso?
Ludwig,
ResponderEliminarNão digo que seja demente quem não acredita em sereais e no pai natal, longe disso. Já quem apenas se sente bem a falar no que não acredita, de manhã e à noite, com bandeiras ou com foguetes, aos pulos ou aos berros, me levanta mais dúvidas. Ainda assim, teve sorte em nascer e viver numa das regiões e num dos períodos mais laicos da história. Se tivesse nascido nas Arábias ou há uns 500 anos atrás ía concerteza ficar rouco.