Mas porque é que eu faço isto!?
Num comentário a um post recente, o António Parente fez uma pergunta que merece mais que a breve resposta que dei:
«Se o Ludwig não exige que eu acredite em si porque tenta através de posts, da sátira e do humor corrosivo, da lógica aristotélica primária tentar provar que eu estou errado?»
Vejam o que esta pergunta faz: pede razões. Isto é fundamental no diálogo, e a única coisa que justifica chamarmo-nos “animal racional”. Exigimos razões. Damos razões. Temos razões. E não podem ser razões quaisquer. Porque sim, porque me dá na gana, ou porque Odin mandou não justificam o que faço. Quanto muito, são razões para achar que não sou racional.
É difícil dizer o que são ou não razões adequadas em geral, mas no caso do diálogo é relativamente simples. As razões adequadas são as que os intervenientes aceitam. O cerne do diálogo é a procura destas razões comuns que permitem partilhar um raciocínio e concordar numa conclusão. Em ciência, por exemplo, o diálogo racional (com razões) transforma uma infinidade de hipóteses, modelos, opiniões, e especulações em descrições consensuais da realidade. O Bernardo Motta diz que isto é positivismo (não é), e propõe outra definição para realidade:
«O Metafísico, em última análise, é o domínio do real absoluto. E o real, como bem explicou Guénon, é o possível metafísico. O que é possível metafisicamente, é real metafisicamente (mesmo que fisicamente isso não seja notório ou nítido).»
A isto chamo mafaguinhos (referência ao tal post anterior). Cada um de nós tem as suas ideias, a sua visão do mundo, e estamos isolados nesta subjectividade. Mas temos em comum um conjunto de observações que partilhamos e que muitos chamam realidade. E é aí que estão as tais provas científicas, e é ai que encontramos a base para o diálogo e a compreensão mutua. Qualquer um pode definir a palavra realidade como quiser. É como os mafaguinhos. Mas o problema de encontrar bases comuns para o diálogo mantém-se. As razões, em última análise, temos que as ir buscar ás observações que partilhamos.
E nisto a fé é irracional, pois não precisa de razões e não aceita razões que a demovam. Dizer que a fé é uma faceta da razão é como dizer que a careca é um penteado, ou que estar morto é uma maneira de viver a vida. Se exigimos razões e estamos abertos às razões dos outros nunca podemos ter certezas absolutas, pois fica sempre alguma dúvida pela possibilidade de haver razões que desconhecemos.
E eis que finalmente chego à razão que o António me pediu. Eu faço isto porque acho que é da responsabilidade de todos dar e exigir razões. Razões assentes naquilo que temos em comum entre nós: o que observamos da realidade que nos rodeia. Ter fé, ter a certeza absoluta que Jesus ressuscitou, fechar-se às razões dos outros é bom para quem quiser viver sozinho numa gruta no deserto. Quem vota, tem filhos, participa nesta sociedade, usufrui do direito de pensar e de se expressar, e age de forma que afecta todos os outros tem a obrigação cívica de se manter aberto às razões.
E, praticando o que apregoo, fundamento esta razão numa observação: a certeza absoluta e infundada é um perigo para todos. É o factor comum na inquisição, nos actos de Pizarro, Hitler, Stalin, ou Pol Pot, nas cruzadas, na escravatura, na discriminação de crianças e mulheres, nos massacres no Rwanda, e muitos outros exemplos. Por outro lado a dúvida e a procura de razões estão por trás dos maiores avanços morais, filosóficos e científicos. De Sócrates a Bentham, de Tales a Rawls, de Arquimedes a Heisenberg, é evidente o bem que trouxe a todos esta abordagem de testar e assentar ideias na realidade que partilhamos.
Todos fazemos coisas boas e coisas más. Mas para fazer coisas terríveis é preciso estar absolutamente convicto do que se faz, e para fazer coisas excelentes é preciso estar sempre preparado para mudar e melhorar.
Caro António,
ResponderEliminarLamento o seu desagrado, mas é uma questão de liberdade de expressão e de responsabilidade. Este blog é público, os comentários aqui são públicos, e qualquer pessoa tem a minha autorização de citar, total ou parcialmente, o que quer que seja que eu escrevo aqui.
Se o António não quer ser citado em algum sítio, penso que não poderá publicar as suas opiniões em lado nenhum, e terá que se abster de participar em trocas de opinião em fórum público.
Um abraço,
Ludwig
Caro António,
ResponderEliminarSe cria um blog num espaço público torna-se numa figura pública como qualquer outra que se pronuncie em público. Não é uma questão de respeito -- por certo esses que menciona não merecem menos respeito que o António só por serem mais conhecidos.
As caixas de comentário neste blog são públicas. Todos têm a liberdade de discordar publicamente do que eu escrevo aqui onde escrevo. Mas todos os que exercem essa liberdade são responsáveis pelo que escrevem.
Se os seus comentários tivessem sido dirigidos apenas a mim numa comunicação privada nunca o teria citado sem autorização. Mas se os decidiu tornar públicos (neste blog ou em qualquer outro) não me parece que tenha razão de queixa.
Um abraço,
Ludwig
Ludwig,
ResponderEliminarEu também vi o meu nome arrastado para a lama do Diário Ateísta.
Sinceramente, visto que não é a primeira nem a última vez que o meu nome é usado para gáudio ateísta, não me vou chatear muito com isso.
Mas o António tem razão num ponto: é de bom tom pedir autorização primeiro.
Eu não acho que o Ludwig não possa colocar as palavras noutros blogues. Elas estão tão públicas aqui como no DA. O problema, para mim, não é esse. É uma questão de tacto e de polidez: se ambos temos desavenças com o DA, se ambos temos um largo e vasto historial de maus tratos por parte do DA, é natural que se nos pergunte primeiro se concordamos com tais posts.
Sinceramente, estou-me nas tintas para o resultado final, porque não me preocupo assim tanto com o que os leitores medíocres do DA pensam de mim. Mas entenda, Ludwig, que há uma razão para eu ter passado a despender mais tempo aqui do que no DA. É porque estou saturado do DA e não queria ser obrigado a ter que ir ao DA defender o meu nome quando poderia estar a debater aqui serenamente...
Repare que não é justo, Ludwig, que ao colocar os seus posts que nos citam em dois lados diferentes, exija de nós o esforço de ter que exercer o direito de resposta em dois lados ao mesmo tempo.
Da parte que me toca, vou ignorar que fui citado no DA e nem me vou dar ao luxo de perder tempo a ir lá esclarecer a minha citação, mas é certo e sabido que será um fartar vilanagem naquelas caixas de comentários...
Um abraço,
Bernardo
Caros Bernardo e António,
ResponderEliminarEu não tenho qualquer controlo ou responsabilidade pela reprodução dos meus textos. O que eu publico aqui é precisamente isso: público. Para todos os que quiserem usarem como quiserem.
Não censuro nem controlo os comentários que aqui põem, mas considero-os igualmente públicos. Isto é um espaço de troca livre de ideias. Se alguém quiser comentar algo em privado, por favor contacte-me por email.
Também quero deixar claro que não ponho textos no DA, nem dou ao DA alguma autorização especial. É verdade que o João Vasco teve a gentileza de me pedir, há tempos, autorização para colocar lá um texto que eu escrevi. Mas eu disse ao João que qualquer pessoa pode fazê-lo sem pedir autorização.
Concordo com o Bernardo que não é justo colocar os meus posts em dois lados e obrigar quem os comenta a fazê-lo em dois lados. Mas não coloco os meus posts em dois lados. Coloco-os aqui. Já não pertenço ao DA, e pedi para me retirarem da lista de colaboradores quando criei este blog. Mas não vou negar a ninguém autorização para reproduzir os meus posts, até porque moralmente não ache que tenha autorização para dar.
Lamento o incómodo que isto cause ao Bernardo e ao António, mas a justificação fundamental para este blog e para os meus textos é a livre troca de ideias. Proibir a reprodução dos meus textos seja onde for seria contrário ao propósito de os tornar públicos.
Ludwig,
ResponderEliminarAs explicações dadas, como é evidente, chegam-me.
Não fazia ideia de que as coisas se passavam assim. Imaginava-o ainda colaborador esporádico do DA, e imaginava que participava nas citações aos seus artigos no DA.
Assunto encerrado.
Obrigado pelos esclarecimentos.
Um abraço,