Atalhos.
Já vi em vários sítios a notícia de um casal australiano que decidiu abortar dois gémeos, rapazes, porque querem uma filha. A possibilidade de abortar por razões triviais é um problema para a defesa do aborto a pedido*. Quando começou o processo de referendar isto até que a lei fosse alterada, fui pressionado a não publicar um post que ofendia outro participante desse blog por mencionar que alguém poderia abortar para não estragar as férias ou não ter de comprar outro vestido. O episódio contribuiu para criar este blog, onde posso ofender à vontade, e os exemplos não são meramente hipotéticos. A lei que agora temos obriga o SNS a pagar o aborto até por razões destas, e os números sugerem que muitos abortos não se devem a situações de extrema necessidade. «No HSM, duas em cada três mulheres não aparecem à consulta de planeamento familiar que, nos termos da lei, deve ocorrer no prazo de um mês após o aborto. […] 433 mulheres que fizeram IVG em 2008 já tinham quatro abortos no seu historial»(2).
O problema é que só se pode justificar o aborto por razões económicas, sociais ou de planeamento familiar assumindo que a vida do abortado vale muito menos que a vida de um ser humano. Apesar de ser humano. E, nesse caso, vale tudo. É uma premissa frágil porque, por um lado, qualquer falta que tenha por ser feto ou embrião será meramente temporária e, por outro, só muito depois de nascer é que adquirimos as capacidades cognitivas e a autonomia características de uma pessoa. O que distingue um humano de um cão não surge sequer perto das dez semanas de gestação. Escolhendo exemplos dramáticos de miséria e coerção pode-se disfarçar a fragilidade da premissa, mas uma mulher abortar rapazes porque quer uma rapariga ou já ir no quinto aborto e não querer saber de contraceptivos mostram o erro do aborto como um direito incondicional.
Em grande parte, a posição irracional do aborto como um direito é uma reacção à posição igualmente irracional do aborto como um crime indesculpável, que nem permite o aborto a uma miúda de nove anos que foi violada, alegando que vida humana é “sagrada”. Ambos os extremos cometem o erro de reduzir o valor da vida a um só factor. A vida não vale pelo nosso estado às dez semanas de gestação nem pela bandarilha de sagrado que algum deus nos tenha cravado. A vida vale por tudo o que nos forma, que nos torna no que somos, por cada momento e por todos os momentos que vivemos. Qualquer vida. Umas valem mais do que outras, conforme as capacidades e possibilidades daqueles que as vivem, mas não se justifica traçar fronteiras arbitrárias entre espécies, idades, sexos ou raças. A prova do pudim está no sabor, e o valor da vida está em vivê-la.
Isto priva-nos dos atalhos convenientes das dez semanas e do sagrado, que permitem resolver tudo sem pensar mais no assunto. Mas estes atalhos são falsas soluções. O problema exige ponderar os valores das várias vidas em jogo. O valor da autonomia, por exemplo. Se me raptarem para dar transfusões de sangue a um violinista famoso (3) eu tenho o direito de arrancar os tubos e fugir mesmo que isso o mate, e mesmo que o violinista seja pessoa e inocente do sucedido. Da mesma forma, uma mulher violada tem o direito de abortar. Não pode ser obrigada àquela situação. Em contraste, se tenho relações sexuais com uma mulher e ela engravida não tenho o direito de “abortar” a paternidade e dizer que não é nada comigo. Quem opta por ter relações sexuais assume responsabilidades e, no mínimo, abortar por conveniência devia ser tão imoral (e ilegal) como não pagar pensão de alimentos.
Outro problema é a selecção de características congénitas. Abortar um feto por ter o sexo errado é claramente imoral. Mas abortar um feto que sofra de uma doença incurável pode não o ser. Porque além do impacto negativo nas pessoas que irão cuidar dessa criança, essa vida vale menos. Isto pode chocar, mas é a realidade. Não é um juízo arbitrário de quem proclama, de fora, que vale menos porque tem dez semanas ou vale mais porque tem um carimbo divino. É algo que se pode constatar imaginando, por exemplo, viver sem braços nem pernas ou com uma deficiência mental profunda. É evidente que uma vida dessas vale menos que a vida de uma pessoa saudável.
Neste caso dos australianos, os fetos foram abortados porque a lei proíbe os pais de escolher o sexo dos filhos mas permite abortar quando não são do sexo que eles querem. O que se alega, como fundamento, para proibir a escolha do sexo – e uma data de outras coisas como, por cá, a reprodução medicamente assistida para mulheres solteiras – é o princípio da não-instrumentalização da pessoa humana (4). Outro atalho da treta.
As pessoas têm filhos em dois tipos de situação. Por acidente, ou porque ter um filho é um instrumento para algum propósito. Proibir que uma mulher solteira tenha ajuda médica para engravidar, ou que um casal escolha os espermatozóides pelos seus cromossomas, em nome da “não-instrumentalização” não faz sentido. É um disparate como o do carácter sagrado da vida ou a bitola dez semanas. Em vez de resolver os problemas, estas simplificações grosseiras apenas impõem preconceitos e geram problemas ainda maiores.
* Neste caso, a decisão não é tão leviana quanto parece. A mulher ficou traumatizada com a morte da primeira filha já tiveram vários rapazes enquanto tentavam ter uma rapariga. Agora pedem uma alteração à lei que proíbe a selecção do sexo dos filhos (1). No entanto, também está longe dos exemplos dramáticos da miséria e pressões sociais a que se recorre para justificar o aborto SCUT.
1- Herald Sun, Couple aborts twin boys for girl
2- Público, 15-7-2009, Segundo aborto devia ser a pagar, diz director do serviço de ginecologia de Santa Maria
3- Judith Jarvis Thomson, 1971, A Defense of Abortion, Philosophy & Public Affairs, Vol. 1, no. 1
4- CNECV, Relatório – parecer sobre reprodução medicamente assistida (3/CNE/93)
Ludwig,
ResponderEliminarQuando começou o processo de referendar isto até que a lei fosse alterada, fui pressionado a não publicar um post que ofendia outro participante desse blog por mencionar que alguém poderia abortar para não estragar as férias ou não ter de comprar outro vestido.
Não quero meter a foice em seara alheia, mas isso de certa demonstra que muitos dos se prezam como "pensadores livres" mais não são do que indivíduos com uma agenda - agenda essa que não tolera opinião divergente mesmo vinda de pessoas com quem estão de acordo em quase tudo.
De "livres pensadores" só tem o título.
O episódio contribuiu para criar este blog, onde posso ofender à vontade, e os exemplos não são meramente hipotéticos.
hmmmm... Não temes represálias quando os "donos" do outro blogue forem notificados da "ofensa"?
Ludwig,
ResponderEliminarem geral estou de acordo com a tua linha de raciocínio. O aborto é um acto cujas causas ou consequências não são unilaterais e, por isso, o aborto não é um acto incondicional ou inconsequente.
Alguns pontos de reflexão.
1) Mesmo que a distinção entre um embirão humano e o de um cão não seja clara sequer perto das 10 semanas, é uma questão de aparência porque geneticamente isso é muito claro, penso que concordas. A questão que coloco é na declaração de ser uma pessoa ou não. Não me refiro ao facto de ser ou não um ser humano (porque é-o sempre geneticamente desde o momento da fecundação), mas ao conceito de pessoa. Não percebi qual a noção de pessoa para ti e pedia-te se podias elaborar um pouco.
2) Alegas que alguém que considera a vida humana como "sagrada" comete o erro de reduzir o valor da vida a um só factor. Não percebi o racionício porque eu considero a vida humana como sagrada e nisso estão contidos inúmeros factores como a sua dignidade, liberdade, sobrevivência, direitos, deveres, capacidades, relacionamentos (mãe-filho, filho-familiares, mãe-pai ...), etc., não um só factor. Nesse sentido, podias elaborar um pouco mais sobre o que entendes por alegar a vida humana como sagrada?
Por outro lado, mais à frente, afirmas que o "sagrado" é uma conveniência que permite resolver tudo sem pensar mais no assunto. Não percebo como pode o sagrado ser uma conveniência. Se considero algo como sagrado implica uma série de pensamentos sobre as implicações dessa consideração, logo, o sagrado não o pode ser sem que eu tome uma atitude em relação ao que é sagrado e, nesse sentido, que pense sobre essa atitude, bem como com as suas causas e consequências. Ou seja, é mais complexo do que uma mera conveniência.
3) Afirmas que «Qualquer vida. Umas valem mais do que outras, conforme as capacidades e possibilidades daqueles que as vivem...»
Quer isso dizer que o valor da vida depende das possibilidades de quem vive? Podias elaborar um pouco mais sobre a que te referes como "possibilidades"?
4) Afirmas que as pessoas têm filhos por acidente ou porque ter um filho é um instrumento para algum propósito. Não sei em qual das categorias te encaixas, mas posso testemunhar-te que não me encaixo em nenhuma delas. Embora ter um filho implique necessariamente uma condição contingente, cada um dos meus filhos foi pensado (planeado), desejado e fruto dos amor dos pais. Acho que deverias considerar também esta situação que não é um resultado "em nome" da "não-instrumentalização", mas em nome do amor que se for vivido como dom-de-si-mesmo e reciprocamente, por definição, não lhe é concebível sequer instrumentalizar.
O aborto espontâneo é uma realidade natural, o propositado possui necessariamente uma conotação moral, logo o problema do aborto não está no aborto em si, mas na inevitável interacção entre as razões de quem aborta e o problema do momento em que se considera um óvulo fecundado como pessoa ou não.
Eu penso que se o valor orientador for o da vida humana, em que somos convidados a nos colocar na pele daquele óvulo fecundado, momento que todos nós vivemos e a partir do qual entrámos num processo contínuo até hoje, talvez o pensamento de não abortar em toda e qualquer circunstância nos permitiria ir ao âmago das causas e amadurecer nas duras consequências. Por mais duras que sejam as histórias de quem engravida, em cada vida nova há sempre um sinal de futuro e esperança. Os problemas que daí possam advir são sempre sinal da incapacidade de lidarmos com o "âmago" e o "amadurecer".
Obrigado pelo post :)
eu ainda não percebi , o problema de as mulheres abortarem mais do que uma vez é económico ou é moral ? tenho visto as três abordagens com a inevitável moral-económico
ResponderEliminarpara mim é simplesmente cultural e deriva da dificulda
de de se poder servir educação sexual nas escolas e de as pessoas facilitarem
mas que se faz ? obriga.se as mulheres a parir ?
ou abriga-se a irem fazer de novo abortos ilegais ?
Por mais duras que sejam as histórias de quem engravida, em cada vida nova há sempre um sinal de futuro e esperança.
ResponderEliminare de contas para pagar e de vida que se vai e de tempo perdido a educar etc etc
pode dar jeito, pode não dar.
um filho ou que é possível ou então mais vale não ser.
«O que distingue um humano de um cão não surge sequer perto das dez semanas de gestação.»
ResponderEliminarSurge até mesmo na meiose. Mas isso não interessa muito.
«Em grande parte, a posição irracional»
Estás só a falar da posição irracional, ou a caracterizar todas as posições como irracionais? :) Porque posições irracionais não queremos nunca. Mas dizer que a posição que admite o aborto em circunstâncias diferentes das tuas é irracional parece-me no mínimo uma adjectivação injusta.
« do aborto como um direito é uma reacção à posição igualmente irracional do aborto como um crime indesculpável, que nem permite o aborto a uma miúda de nove anos que foi violada, alegando que vida humana é “sagrada”.»
Não acredito nessa tese da "reacção". Pode ser que exista, mas não é de todo geral. Por outro lado, não acho que o aborto não seja um direito das pessoas tanto como é seu direito ter todos os filhos que conseguir.
Eu posso ter 10 filhos só porque me apetece, e esse direito não me é questionado. Serei criticado, eventualmente, mas nunca ninguém me vai impedir de ter todos os filhos que me apetecer. E a lei não diz nada sobre isso. Nem mesmo que tenha apenas 18 anos e esteja desempregado. Não me parece sério olhar para a questão do aborto sem olhar para a questão do direito de ter filhos.
(Curiosamente, tanto quanto vejo, a crítica à decisão de ter mais filhos dos que se pode suportar é tão criticada como a decisão de abortar frivolamente antes do limite legal. Tal como o infanticídio é moralmente equiparado ao homicídio.)
Porque se de facto devem ser avaliadas as circunstâncias que tornam o aborto legítimo ou criminoso, tendo em vista que é um ser humano que vai ser gerado ou não – e friso esta última premissa – então o mesmo deve ser feito em relação ao direito reprodutivo tendo em vista os direitos futuros de um ser humano hipotético.
A questão é séria e pertinente para crentes e descrentes – que direito temos nós de criar uma vida humana? Esse direito assume-se à partida. Que legitimidade tem? O direito de ter filhos simplesmente porque queremos será assim tão diferente de abortarmos logo a seguir, só porque queremos?
O limite que já várias vezes tenho defendido deve ser posto quando surge arbitrariedade na independência do feto – um limite questionável (um pouco vago à partida e sempre aberto às capacidades técnicas da Medicina), admito, mas não mais arbitrário como o limite posto com base na eventual não fixação do embrião nas paredes do endométrio no caso do recurso à pílula.
Ou seja, se for possível um feto ter um destino diferente às mãos de pais diferentes, ainda para mais quando esse destino é entre a vida e a morte, creio que a melhor decisão estaria em impedir o aborto.
Quando isso não é possível, então a decisão de terminar a gravidez seria equiparável a uma decisão do foro reprodutivo.
«É um disparate como o do carácter sagrado da vida ou a bitola dez semanas.»
Tal como o carácter sagrado não é desconsiderado só porque nos apetece ser ateus, mas porque a sua arbitrariedade é demonstrável, também se deve fazer o mesmo em relação a outros limites. A "bitola dez semanas" não foi decidida com dados, parece-me...
Assim, também eu digo que o limite imposto pelo facto de o património genético de um embrião ser o de um H. sapiens é um disparate.
Eu ainda não entendi a solução do LK para o dilema, afinal deixa-se as mulheres abortarem ou não ?
ResponderEliminarFrancisco,
ResponderEliminar«Estás só a falar da posição irracional, ou a caracterizar todas as posições como irracionais?»
Considero irracional as posições que dependem de descartar como irrelevante o valor da vida do abortado porque não há razões eticamente relevantes para fazer isso (não é por ser demasiado novo que todo o seu futuro deixa de ter valor).
«Eu posso ter 10 filhos só porque me apetece, e esse direito não me é questionado.»
Esse direito é questionado assim que limitar indevidamente os direitos dos outros. Por exemplo, se começares a violar mulheres para ter mais filhos.
Por isso é que o direito de ter um filho é diferente do “direito” de matar um filho (é claro que se pode considerar que só é filho depois das 10 semanas de gestação, mas não vejo razões que justifiquem isso, por isso parece-me irracional fazê-lo :)
«Porque se de facto devem ser avaliadas as circunstâncias que tornam o aborto legítimo ou criminoso, tendo em vista que é um ser humano que vai ser gerado ou não – e friso esta última premissa – então o mesmo deve ser feito em relação ao direito reprodutivo tendo em vista os direitos futuros de um ser humano hipotético.»
O abortado não é hipotético. É um ser, já foi gerado, está em desenvolvimento, e se não fosse esta a situação não seria preciso abortar. Portanto, o aborto é a morte deliberada de um ser humano, justificada apenas por ser demasiado novo para contar para alguma coisa.
O ser humano hipotético é diferente. Vou dar o mesmo exemplo que, há tempos, penso que dei ao João Vasco. Por decidir ficar aqui em casa em vez de ir para África salvar uma criança de morrer à fome, essa criança vai morrer. Se a trouxer aqui para casa, a fechar num quarto e esperar que morra à fome, essa criança vai morrer também. Mas há uma diferença ética importante.
No primeiro caso, a relação causal entre a minha decisão de ficar em casa e a criança morrer é muito ténue. Ela morre por muitos outros factores. É ainda mais ténue a ligação entre as minhas opções sexuais e cada um dos milhares de milhões de hipotéticos filhos que eu poderia ter (todas as combinações de óvulos e espermatozóides).
Mas no segundo caso há uma forte relação causal entre a minha decisão e o resultado, e isso é importante para a ética porque a ética visa as decisões, não apenas os acontecimentos. E é esse o caso do aborto. É aquele embrião ou feto que vamos matar, não um hipotético entre milhões equivalentes, dos quais apenas uns poucos poderiam nascer de qualquer forma.
«O limite que já várias vezes tenho defendido deve ser posto quando surge arbitrariedade na independência do feto»
É um atalho, mas nada mais. O facto de ter um ser humano dependente e não o poder passar a outro que cuide dele não justifica o direito de matar. Estás a criar uma regra ad hoc que não se aplica em qualquer outra situação. A educadora está sozinha no infantário com algumas crianças e cai um nevão, mais ninguém pode lá ir. O médico está a operar o paciente e não há mais ninguém que o substitua. Não há leite em pó e só a mãe pode alimentar o bébé, senão ele morre. Etc. Essa posição parece-me irracional porque oferece uma desculpa em vez de razões.
«Assim, também eu digo que o limite imposto pelo facto de o património genético de um embrião ser o de um H. sapiens é um disparate.»
Concordo perfeitamente. Por exemplo, se o Jardim Zoológico decidisse abortar chimpanzés por razões económicas eu era contra por razões éticas e defendia que arranjassem alternativas. Não é tão grave como abortar humanos, presumo, mas a vida de um chimpanzé também é algo de valor (para o chimpanzé que a vive, e é isso que conta).
Nuvens,
ResponderEliminar«eu ainda não percebi , o problema de as mulheres abortarem mais do que uma vez é económico ou é moral ?»
Matar um feto ou embrião saudáveis, em desenvolvimento, com um excelente prognóstico de continuar a vida como nós se os deixarem viver, é um problema ético proporcional ao valor que essa vida tem para o embrião ou feto em causa (maior no caso de humanos, chimpanzés e golfinhos, menor para ratos e afins, irrelevante para baratas e nemátodos :)
Além disso há também o problema económico. Faz mais sentido investir em pílulas e preservativos que em abortos.
«mas que se faz ? obriga.se as mulheres a parir ?
ou abriga-se a irem fazer de novo abortos ilegais ?»
Não me parece que as únicas duas opções sejam a) prender as mulheres que abortam ou b) abortos livres às custas do Estado para quem quiser. Julgo que há muita margem no meio para soluções mais razoáveis que se possam adaptar aos problemas que tentam resolver.
Nem me choca que a solução seja um processo gradual começando por fazer abortos em boas condições médicas e progredindo para mais prevenção, alternativas como a adopção, melhoria das condições das mães jovens e afins. O problema é que uma vez que se vai a referendo decidir que o aborto é um direito está tudo estragado. Não há forma de ir resolvendo o problema mais grave, que são 20,000 mortes propositadas por ano.
Nuvens,
ResponderEliminar«Eu ainda não entendi a solução do LK para o dilema, afinal deixa-se as mulheres abortarem ou não ?»
No dia em que para apontar um problema for obrigatório apresentar a solução acabam-se os blogs :)
Mats,
ResponderEliminar«Não temes represálias quando os "donos" do outro blogue forem notificados da "ofensa"»
Nah. Já foi há anos, sempre souberam, e nunca houve represálias nenhumas. Nem sequer acreditam que vou parar ao inferno por isso.
Miguel Panão,
ResponderEliminar«Mesmo que a distinção entre um embirão humano e o de um cão não seja clara sequer perto das 10 semanas, é uma questão de aparência porque geneticamente isso é muito claro, penso que concordas.»
Eticamente, a sequência de nucleótidos é irrelevante.
«Não percebi qual a noção de pessoa para ti e pedia-te se podias elaborar um pouco.»
“Pessoa” é uma categoria arbitrária inventada por alguns seres humanos para distinguir-se a eles, mais algumas entidades fictícias, dos restantes organismos, fingindo haver uma diferença radical entre esses grupos.
A minha posição é que se trata de uma escala gradual de capacidades sensoriais e cognitivas, de autonomia, etc. Essa escala vai desde a vida sem valor, como os cogumelos e as baratas, que não sentem nem percebem nada, até às vidas com grande valor como as dos primatas, cetáceos, humanos, etc. E por valor quero dizer o valor da vida segundo aquele que a vive. Não me refiro a uma classificação arbitrária feita por terceiros. A minha vida tem valor porque tem valor para mim, e não importa se gostam de mim ou não, se há deus ou não há, se tenho estes genes ou aqueles.
«Alegas que alguém que considera a vida humana como "sagrada" comete o erro de reduzir o valor da vida a um só factor.»
Dá a entender que se não houver deus nenhum e se o “sagrado” for apenas uma ficção humana, então a vida deixa de ter valor. Chamo isso um erro porque está a procurar o valor da vida em algo que irrelevante (até porque me parece que é esse o caso, e que tudo isso do sagrado e divino é simples treta).
« Se considero algo como sagrado implica uma série de pensamentos»
Nem por isso. Implica apenas acreditar quando te disseram “isto é sagrado” :)
«Quer isso dizer que o valor da vida depende das possibilidades de quem vive? Podias elaborar um pouco mais sobre a que te referes como "possibilidades"?»
Sim. Por exemplo, uma mulher grávida num sítio onde não há comida e onde o seu filho tem 90% de probabilidades de morrer à fome nos primeiros anos e 10% de viver subnutrido, doente e aleijado durante uma curta vida sofrida. Nesse caso o custo ético de abortar é muito inferior ao de uma mulher grávida numa região próspera onde o seu filho cresceria livre, saudável e feliz. Porque esta segunda vida tem muito mais valor.
« cada um dos meus filhos foi pensado (planeado), desejado e fruto dos amor dos pais.»
Ora ai está. Não foi um fim em si mesmo, mas, pelo menos em parte, um instrumento da realização pessoal dos pais. O meu ponto é que a noção de “não-instrumentalização” é absurda neste contexto.
«mas em nome do amor que se for vivido como dom-de-si-mesmo e reciprocamente, por definição, não lhe é concebível sequer instrumentalizar.»
A mesma coisa pode dizer uma mulher solteira que queira ter um filho por FIV e dar-lhe todo o “dom-de-si-mesma” mais o que calhe.
Ludwig Krippahl
ResponderEliminarhummm
Existem alternativas o problema é que é moroso e os efeitos fazem-se sentir apenas ao longo de gerações e não pdoemos esperar resultados já.
pessoalmente concordo com a ideia de que não se deva usar o aborto em vez da pílula, mas tenho a certeza que estes casos são pessoas de baixa instrução, poucos conhecimentos, etc
o problema não é o aborto mas as condições de vida das pessoas, a sua falta de educação, a sua basicidade.:(
vivemos num país que tem imensos problemas de educação, uma franja que eu por alto (em baixa :))estimo em cerca de 10% da população é simplesmente imbecil. digo imbecil no sentido de não conseguir absorver uma mínimo de conhecimentos úteis,q uer para eles quer para os outros e viver a vida sem grande consciência de si.
no passado, provavelmente ,poderiam fazer alguma coisa, recolher estrume, coisas desse grau de dificuldade. mas hoje exige-se deles demasiado e o resultado são estes casos
há pessoas que nem sequer conseguem aprender a arrumar gavetas , há pessoas que necessitam de ajuda para a mais básica organização doméstica, como é que se pode esperar que estas pessoas com uma capacidade extremamente reduzida de aprendizagem consigam reter conceitos abstractos e complexos?
temos 2M de alcoólicos crónicos, so isto gera de certeza uma quantidade de pessoas que passados uns anos está ao mesmo nível de uma esponja marinha em termos cognitivos.
eu moro perto do intendente , basta patrulha um pouco as tascas que por esses lados existem que encontramos muitos destes casos ue eu relato. penso que alguns dos nossos primos primatas com um pouco de esforço conseguiriam bater alguns dos espécimes em rapidez de raciocinio. é triste mas é a mais crua realidade
a nossa capacidade de prever o futuro e consequentemente a de sermos responsáveis depende em larga medida da nossa inteligência por isso não podemos ficar espantados que para muita gente abortar hoje, amanhã e depois seja igual ao litro.
já ouvi a perigosa teoria da laqueação de trompas , temos de ter muito cuidado onde as nossas ideias podem desaguar , chamar a razão estas pessoas pode simplesmente não ser possível. e se assim for que se faz ? a pergunta é essa
Eu concordo filosoficamente com a posição do Ludwig. Mas quando me fazem a pergunta - Se o aborto não é legal devem as mulheres que o fizerem ser penalizadas? - tenho dificuldade em dizer que sim.
ResponderEliminarE numa lógica semelhante mas ainda mais extrema - Se é equiparável a matar um ser humano então deve aplicar-se a moldura penal inerente ao homicídio, mesmo que na versão com mais atenuantes? - E aqui acho mesmo que não deve ser assim.
Por razões práticas e sendo contra o aborto, não sou contra a despenalização do mesmo, como aconteceu, chocando-me naturalmente estes exemplos mais radicais que revelam o mais elementar desrespeito pelo ser humano, desleixo ou conveniência.
Ludwig:
ResponderEliminarO terrorista XPTO vai deixar uma bomba, e pensa com isso matar cerca de 3 pessoas.
A sua escolha de deixar lá a bomba parece-nos imoral, pois previsivelmente serão mortos três pessoas anónimas. Não sabemos ainda quem, podem ser uns ou outros. Mas em resultado da escolha do terrorista provavelmente cerca de 3 pessoas que de outra forma viveriam, assim não viverão.
Quando tu alegas que existe algo de fundamentalmente semelhante entre a situação da rapariga que toma a pílula do dia seguinte (um método abortivo) e com isso provoca 3 abortos, e a situação do terrorista, fundamentas a semelhança no facto de, independentemente das características PRESENTES dos seres que ela destroi, a sua escolha impediu que três vidas fossem vivas quando a alternativa previsível seria que o fossem.
E isto parece fazer sentido.
Mas a falha torna-se é quando argumentas que não existe uma semelhança fundamental entre esta situação e a da mulher que previsivelmente teria 2,3 filhos, mas ao invés escolhe não ter nenhum.
Se independentemente das características PRESENTES dos seres destruídos, o que importa é a implicação que a escolha tem em termos das vidas que não são vividas mas que o seriam de outra forma, tens de chegar à conclusão absurda de a decisão de não ter filhos, mais do que eticamente imoral, é homicida.
Tu negas esta implicação, mas os teus argumentos para negá-la não são minimamente convincentes.
Mesmo que "não ter filhos" fosse análogo a recusar ir salvar criancinhas a áfrica por oposição a matar, ainda assim seria algo consideravelmente imoral: se a generalidade dos casais "salvam" uma ou duas vidas, o casal que escolhe não salvar nenhuma merece que a sua escolha seja vista como vergonhosa. E o casal que escolhe "salvar" umas 15 crianças deve ser visto como heróico.
Mas o teu argumento da acção e inacção esbarra contra o argumento relativo às consequências das escolhas. Se independentemente do aborto destruir um ser humano ou uma célula, o que importa são as consequências da escolha ao nível da vida que já não será vivida; então as consequências da escolha da rapariga que teve relações sexuais com um rapaz, e depois optou pela pílula do dia seguinte, são ao nível da existência do potencial "Miguel" ou "Fernando" ou "Maria"*, indistinguíveis da escolha dessa rapariga de ter relações protegidas ou não ter relações sexuais durante esse ano. Em nenhum dos casos o "Miguel" vai viver até aos 70 anos...
Se o mal essencial de matar alguém fosse a vida que já não será vivida, toda a gente deveria ter tantos filhos quantos pudesse, até rebentar com o planeta.
Matar alguém não é nada o mesmo que não deixar uma vida HUMANA surgir.
Mesmo que o não deixar seja "activo" (como quando se usa preservativo).
*Imagino que não acredites que o ADN define uma pessoa. Sabes que dois gémeos têm o mesmo ADN e são pessoas diferentes.
Aborto:
ResponderEliminar"A doctor who gave abortions to minorities, immigrants and poor women in a "house of horrors" clinic was charged with eight counts of murder in the deaths of a patient and seven babies who were born alive and then killed with scissors, prosecutors said Wednesday."
(...)
Gosnell "induced labor, forced the live birth of viable babies in the sixth, seventh, eighth month of pregnancy and then killed those babies by cutting into the back of the neck with scissors and severing their spinal cord," Williams said.
.........
Incoerência total: quando está dentro do útero, não é ser humano. Mas o mesmo ser fora do útero já é ser humano uma vez que a sua morte já conta como assassínio.
Mats,
ResponderEliminarNão li aqui ninguém defender que o aborto é legítimo até ao nascimento.
Isso foi invenção tua.
João,
ResponderEliminar«Se o aborto não é legal devem as mulheres que o fizerem ser penalizadas? - tenho dificuldade em dizer que sim.»
Eu tenho dificuldade em dizer que sim ou que não porque depende da situação.
Se a mulher aborta porque está numa situação em que não vê outra alternativa, os tais casos dramáticos de miséria e afins, então castigá-la ainda por cima é injustificável (se bem que castigar quem ganha dinheiro a abortar fetos parece ser mais simples de defender).
Mas se uma mulher aborta porque o filho não tem o sexo que ela queria, ou aborta pela quinta vez porque não se quer incomodar com contraceptivos, então penso que merece um desincentivo.
No fundo, se o tipo que dorme na rua e mendiga não paga pensão de alimentos à ex-namorada que engravidou, não acho que deva ir para a prisão. Mas se tem dinheiro e não paga só porque não quer dar, merece castigo. Não pode simplesmente desresponsabilizar-se do que fez.
Nuvens,
ResponderEliminar«o problema não é o aborto mas as condições de vida das pessoas, a sua falta de educação, a sua basicidade»
O que me faz ficar ainda mais preocupado com esta legislação.
Os casos bandeira para isto são aqueles das mulheres pobres, sem dinheiro para alimentar os filhos, e que se vêm forçadas a abortar pela sua miséria. Isso é uma situação terrível, tal que não se justifica castigar ainda mais uma mãe que se vê forçada a isso.
Mas a solução para essa situação terrível é melhorar as condições dessas pessoas. Aquilo que antes desta lei era uma tragédia miserável visto como uma tragédia e uma miséria, depois da lei continua trágico e miserável mas agora pode-se dizer à mulher, não sejas parva, aborta e pronto. É uma solução falsa que só disfarça o problema.
Ludwig:
ResponderEliminar«O terrorista XPTO vai deixar uma bomba, e pensa com isso matar cerca de 3 pessoas.»
Nesta fase, o terrorista é culpado de tentar matar as pessoas que lá estiverem quando a bomba explodir. Nota que se a bomba tiver um temporizador de cem anos e nenhuma dessas pessoas existir neste momento é irrelevante, porque quando as matar vão ser aquelas que lá estão. É essa a sua intenção.
«Mas a falha torna-se é quando argumentas que não existe uma semelhança fundamental entre esta situação e a da mulher que previsivelmente teria 2,3 filhos, mas ao invés escolhe não ter nenhum.»
Supõe que o terrorista mata a Maria. Podemos dizer que o terrorista matou a Maria porque sabemos que a causa de morte da Maria foi a bomba e que foi o terrorista que lá pôs a bomba, para matar quem lá tivesse.
Supõe também que a Maria está grávida de 9 meses, e o feto morre na explosão. O terrorista é culpado de matar esse filho da Maria, pelo mesmo raciocínio.
Supõe agora que a Maria tem 20 mil óvulos, qualquer um desses pode ser combinado com um de milhares de milhões de espermatozóides de companheiros, presentes ou futuros, da Maria. Não se pode dizer que o terrorista seja culpado por eliminar a vida a nenhum desses hipotéticos descendentes. Isto porque, para qualquer um desses, o acto do terrorista é um factor irrelevante comparado a tudo o resto que contribuía para que cada um desses tivesse uma probabilidade muito pequena de nascer.
«Se independentemente das características PRESENTES dos seres destruídos, o que importa é a implicação que a escolha tem em termos das vidas que não são vividas mas que o seriam de outra forma, tens de chegar à conclusão absurda de a decisão de não ter filhos, mais do que eticamente imoral, é homicida.»
Só se assumires que as vidas são substituíveis e só interessa a quantidade. Por exemplo, se assumires que um bombeiro que salva 3 pessoas tem o direito de matar 3 sem ser condenado, porque isso dá-lhe um total de 0 mortes e 0 salvamentos, que é o que a maioria tem.
Mas se considerares que o que importa não é a mera soma algébrica das várias vidas mas cada vida, pelo seu valor para quem a vive, e o impacto que as decisões têm em cada vida em particular, então essas contas fazem pouco sentido.
«Mesmo que "não ter filhos" fosse análogo a recusar ir salvar criancinhas a áfrica por oposição a matar, ainda assim seria algo consideravelmente imoral»
Não é exactamente análogo, se bem que se distribuem no mesmo gradiente, visto ser uma questão da intensidade da relação entre o acto e a consequência.
Se uma criança morre à fome em África, podes apontar para essa morte e ver quais foram as causas dessa morte. Entre essas causas, muito diluída lá no meio, estará “o João Vasco, que até podia, não veio cá trazer uma lata de feijão”. Essa é a tua culpa pela morte dessa criança. E podes fazer isso para cada criança, mas para cada criança a tua culpa é muito pequena.
Se usas preservativo e não tens filhos, o raciocínio é análogo mas a ligação é ainda mais ténue. Para cada filho hipotético o preservativo foi apenas uma causa para esse não nascer. As restantes causas são todos os outros. Por exemplo, quando a minha mulher engravidou dos nossos filhos isso excluiu logo a possibilidade de milhares de milhões de outros que poderiam ter nascido. E além dessa causa estar tão diluída, nem sequer podemos dizer qual não teria nascido. Não temos sequer uma vítima para apontar.
Oops, o anterior era para o João Vasco. Maldito copy-paste :)
ResponderEliminarE aqui vai a continuação:
«Mas o teu argumento da acção e inacção esbarra contra o argumento relativo às consequências das escolhas.»
É o mesmo. Eu não distingo entre acção e inacção como uma divisão estanque. Eu avalio a consequência da escolha. Mas, para isso, é preciso avaliar também a intensidade da relação entre a escolha e a sua consequência. A escolha de não ires salvar aquela criança tem como consequência ela morrer, mas morte é consequência de tantos outros factores também que a tua escolha está muito desligada dessa consequência. Ao passo que se fores lá e lhe deres um tiro, apesar da consequência ser exactamente a mesma (ela morre), agora passas tu a ser o culpado. E o estado presente da criança é irrelevante nisso.
«as consequências da escolha da rapariga que teve relações sexuais com um rapaz, e depois optou pela pílula do dia seguinte»
São mais graves que as de usar preservativo, mas não muito mais. Porque há muitos factores que contribuem para o embrião não se implantar no útero, pelo que a culpabilidade da rapariga é bem menor que no caso do aborto, em que se pode atribuir toda a responsabilidade pelas consequências à decisão de abortar.
Além disso, do ponto de vista prescritivo, é impossível determinar se ela é culpada ou não, pelo que podemos especular acerca dos aspectos normativos, mas não dá para justificar regras como leis nesse caso.
«Se o mal essencial de matar alguém fosse a vida que já não será vivida, toda a gente deveria ter tantos filhos quantos pudesse, até rebentar com o planeta.»
Confundes duas coisas diferentes: quão desejável é um desfecho, e quão responsáveis somos por garantir que esse seja o desfecho. Não são o mesmo.
Concordo que, tudo o resto sendo equivalente, um mundo onde vivem mais pessoas felizes é melhor que um mundo onde vivem menos pessoas felizes, se bem que não seja uma simples adição do número de pessoas, mais pela possibilidade de cada uma ser feliz, que não teria se não existisse.
Mas isso não quer dizer que haja um dever moral de cada um de nós fazer com que isso assim seja, e ainda por cima um dever que se sobreponha ao direito de vivermos como quisermos.
Para usar o mesmo exemplo, o teu direito de dormir até tarde, ir para a faculdade e ao cinema é superior ao teu dever de ir salvar crianças em África, mesmo sabendo que a situação lá é terrível. Será moralmente louvável que as salves, mas moralmente permissível que continues a viver a tua vida. Isso é o que eu considero da contracepção. É moralmente louvável criar filhos felizes e com vidas de valor, mas moralmente permissível não ter nenhum, e ainda mais neste caso do que no outro das crianças que morrem à fome.
Mas a situação é bem diferente se quiseres matar uma criança. Não que pelas consequências, que são as mesmas que a deixar morrer à fome, mas pela ligação entre a tua escolha e o desfecho.
«Só se assumires que as vidas são substituíveis e só interessa a quantidade. Por exemplo, se assumires que um bombeiro que salva 3 pessoas tem o direito de matar 3 sem ser condenado, porque isso dá-lhe um total de 0 mortes e 0 salvamentos, que é o que a maioria tem.
ResponderEliminarMas se considerares que o que importa não é a mera soma algébrica das várias vidas mas cada vida, pelo seu valor para quem a vive, e o impacto que as decisões têm em cada vida em particular, então essas contas fazem pouco sentido.»
Claro que essas contas fazem pouco sentido, mas elas foram uma invenção tua agora.
Quando falamos no número de mortos causados por um terramoto ou atentado não estamos a assumir que as vidas são substituíveis nem nada disso.
Não é nada verdade que seja preciso assumi-lo para que a implicação a que me referi se verifique.
«Se usas preservativo e não tens filhos, o raciocínio é análogo mas a ligação é ainda mais ténue. Para cada filho hipotético o preservativo foi apenas uma causa para esse não nascer»
E o terrorista foi apenas uma causa entre milhares para a Maria morrer no atentado. Outras causas foram ela ter perdido o autocarro, ter decidido ir ao dentista, e ter-se aproximado daquela barraquinha de gelado que cheirava deliciosamente.
Mas isso não importa, porque a consequência previsível da sua acção seria que cerca de 3 pessoas morreriam. Não importa que para cada uma destas que de facto vieram a morrer a bomba tinha sido uma causa entre milhares.
Ora quando a Maria usa preservativo a intenção é a de não engravidar. E a consequência é que alguém não vai nascer. Para cada uma destas, como no caso do bombista, o preservativo é uma entre milheres de causas. Mas no global, as consequências previsíveis do acto, são que uma pessoa (ou mais) não nasce.
Portanto eu contesto duas coisas:
a) eu discordo que não ter filhos seja ligeiramente imoral. Isto tu não negas. Acreditas que é uma opção moralmente inferior a ter filhos, mesmo que alegues que corresponde a uma gravidade menor que abster-se de abdicarmos de tudo para salvar vidas alheias.
b) eu acredito que estás a ser incoerente. Acredito que, se fosses coerente, terias de associar à abstinência ou contracepção um julgamento muito mais pesado. Acredito que as justificações que dás para alegar que não é o caso, não colhem.
João Vasco,
ResponderEliminar«E o terrorista foi apenas uma causa entre milhares para a Maria morrer no atentado. Outras causas foram ela ter perdido o autocarro, ter decidido ir ao dentista, e ter-se aproximado daquela barraquinha de gelado que cheirava deliciosamente.»
Não na mesma medida. Quando se for determinar qual a causa da morte de Maria, será consensual que vão pôr algo “morreu por causa da bomba que o terrorista lá pôs” e não “morreu por culpa do motorista de autocarro que não esperou por ela”. Se concordamos com isto, penso que concordas que a diferença entre a culpabilidade do terrorista e do motorista não tem nada que ver com o estado da Maria no instante em que morreu mas sim com a relação causal entre a morte dela e a decisão de cada um deles.
«Mas isso não importa, porque a consequência previsível da sua acção seria que cerca de 3 pessoas morreriam. Não importa que para cada uma destas que de facto vieram a morrer a bomba tinha sido uma causa entre milhares.»
Importa a relação causal. Tanto que condenamos o terrorista o não o dentista, o motorista ou o homem dos gelados.
«Ora quando a Maria usa preservativo a intenção é a de não engravidar.»
Certo.
«E a consequência é que alguém não vai nascer.»
Certo.
«Para cada uma destas, como no caso do bombista, o preservativo é uma entre milheres de causas.»
Errado. No caso do terrorista, podes apontar para um cadáver carbonizado e dizer esta pessoa morreu por causa desta bomba e esta bomba foi aqui posta por um terrorista.
No caso do aborto podes apontar para o feto desfeito e dizer este feto foi morto por estas pessoas a mando desta pessoa aqui.
(continuado)
ResponderEliminarNo caso do preservativo só tens a alegação, hipotética e não comprovada, que alguma pessoa, que não tens forma de saber quem em concreto, poderia ter nascido se não fosse esse preservativo. Além disso, sabes também que qualquer pessoa das que poderia ter nascido, mesmo sem o preservativo teria uma probabilidade baixíssima de nascer. É uma diferença grande.
Se eu estrangular uma criança, as consequências previsíveis são que uma criança vai morrer.
Se eu não levar comida a uma criança a morrer à fome em África, as consequências previsíveis são que uma criança vai morrer.
Se concordas que eu não sou culpado de homicídio no segundo caso mas sim no primeiro, podes explicar como se rejeitas a importância da relação causal entre o acto e as consequências?
«a) eu discordo que não ter filhos seja ligeiramente imoral. Isto tu não negas»
Nego. A moral é um conjunto de regras e normas que ditam o comportamento. A ética é o fundamento dessas normas. Eticamente, podemos dizer que é preferível ter mais filhos felizes do que não ter filhos, porque esses filhos felizes têm uma vida de valor. No entanto, eticamente é preferível dar liberdade a cada pessoa decidir se tem ou não filhos porque a relação causal entre essa decisão e qualquer um dos filhos que pode existir é muito ténue. Por isso não se justifica regras ou normas morais que pressionem as pessoas para ter filhos. Logo, não é imoral não ter filhos.
«b) eu acredito que estás a ser incoerente. Acredito que, se fosses coerente, terias de associar à abstinência ou contracepção um julgamento muito mais pesado. Acredito que as justificações que dás para alegar que não é o caso, não colhem.»
Não me parece, mas até pode ser. Só que esse problema é secundário.
Tu defendes que se deve avaliar a culpabilidade de matar um ser humano em função da idade desse ser humano. Se for muito novo, não há problema.
Eu defendo que isso é irrelevante porque o que tem valor na vida é a vida toda e não uma dada fase, e é esse valor, principalmente, que se deve defender.
Para o problema da contracepção eu explico mostrando um caso em que o estado é o mesmo – a criança a morrer à fome em África ou a criança a ser estrangulada – mas a culpabilidade é muito diferente por a ligação causal ser mais ténue. Esse exemplo não pode ser explicado pela tua hipótese das idades diferentes.
E tu não consegues apresentar algum exemplo em que claramente se tenha de dar menos valor a uma vida por o ser vivo ser ainda jovem, nem consegues justificar porque não te devemos prender por homicídio pelo facto de não salvares crianças que estão a morrer à fome. Nota que aquilo que te iliba de homicídio nesse caso também te iliba do homicídio no caso da contracepção (mas mais ainda, pois tratam-se de crianças meramente hipotéticas e apenas com uma probabilidade estimada de vir a nascer, em contraste com crianças reais mesmo a morrer à fome).
João Vasco,
ResponderEliminarNão li aqui ninguém defender que o aborto é legítimo até ao nascimento. Isso foi invenção tua.
Até que meses "é legítimo" fazer-se aborto?
Mas o ponto do antigo comentário era só a incoerência de quem defende o aborto. Se o "médico" tivesse morto os bebés estando estes dentro do ventre, não seria punido. Como os matou quando eles já se encontravam fora do ventre, já é indiciado com o crime de assassinio.
Mas que lógica é esta?
Ludwig,
ResponderEliminarSe eu estou a fazer um atalho, tu estás a fazer uma viagem no tempo para o futuro que um ovo poderá eventualmente vir a ter. O que eu fiz foi tentar não lesar aquilo a que damos efectivamente valor numa vida humana. É isso que está em causa, creio. Posso estar a fazê-lo de forma errada, mas não estou a tentar atalhar nada.
O exemplo da criança em África confunde mais do que esclarece, uma vez que a criança tem consciência da sua própria existência, sente angústia, medo e teme pelo seu futuro. Um feto, que eu saiba, não é capaz destas coisas. Mas o problema também não se resolve por aí, porque um recém-nascido também não será capaz disso.
Creio que um ovo agarrado ao endométrio não pode ser comparado a uma criança recém-nascida porque a última é independente. Uma criança não é propriedade dos seus pais. Um óvulo e um espermatozóide são propriedade da mãe e do pai, respectivamente, tanto como os ovários ou os testículos. Um ovo agarrado ao endométrio está na directa dependência de uma única pessoa (a questão de o pai ter responsabilidades vale para os casos em que uma mulher decide engravidar quando conta com o apoio do pai para criar o filho).
Uma criança que já nasceu não está na directa dependência de ninguém em particular – e se eu não posso matar uma criança por causa da sua independência de mim, então tenho de aceitar que não a posso abortar a partir do momento em que não seja absolutamente claro que o parto é impossível.
Se eu estivesse a definir o ser humano como um ser independente para depois concluir que não há problema em abortar um ser que é dependente, podias acusar-me de estar a atalhar com uma treta. Mas a lógica circular é apenas aparente.
O que estou a tentar fazer é mover-me nas zonas mais claras da questão, e ver que fronteiras é que se mantêm abertas.
Se é imoral abortar o filho de uma mulher que deseja dar à luz, é imoral abortar o filho de uma mulher que vai abortar se for possível entregá-lo antes a outra mulher, sem nenhum prejuízo para o feto nem para a mãe deste, convertendo assim a situação no primeiro caso. Isto no "limite à direita".
Num mundo ideal em que todas as gravidezes não desejadas pudessem ser encaminhadas desta forma, eu não aceitaria o aborto.
No "limite à esquerda", se admitirmos que é moral que um casal ou uma mulher reconsidere uma gravidez depois da fecundação do óvulo, então é moral abortar nalgumas situações, até um certo ponto. Qual? Se não quiser contradizer a consideração feita acima, tenho de pôr logo um limite no tempo a partir do qual sei que a gravidez apenas é arbitrariamente da responsabilidade daquele casal ou mulher.
Foi assim que encontrei uma data limite possível, ainda que questionável e talvez deixando outras questões em aberto, para o aborto. Até aqui, as únicas objecções que encontrei, por extensão são também contrárias à não-procriação ou à eutanásia e não me parecem muito sólidas.
Ludwig,
ResponderEliminar«Eu defendo que isso é irrelevante porque o que tem valor na vida é a vida toda e não uma dada fase, e é esse valor, principalmente, que se deve defender.»
Pois. Tenho estado a tentar mas não consigo dar crédito à proposta genérica de que “há uma pessoa a quem estamos a roubar a vida ao destruir um embrião”. E não consigo por duas razões: i) não há pessoa nenhuma; ii) não estamos a roubar ninhuém. Penso que também o João Vasco encontra aqui alguma perplexidade, já que escreve PRESENTE com maiúsculas para nos lembrar que uma coisa é o que existe e outra coisa é o que não existe mesmo que viesse a existir. Tu atribuis uma continuidade existencial àquilo que na verdade é uma descontinuidade gritante.
Há uma quantidade expectável de vida das pessoas, isso sabemos. Esta quantidade é ponderável num julgamento para efeitos de indemnizações, por exemplo. O erro fundamental que vejo na tua posição é quereres demarcar no futuro uma relação de pertença com alguém muito particular: ninguém. É a descontinuidade na natureza do sujeito que desencadeia toda uma lógica da batata: se o meu pão vai ter bolor dentro de três dias, vou deitá-lo fora hoje pois é um pão bolorento... dito de outra maneira: vou ali pagar as quotas do Benfica a este espermatozóide. Não faz sentido, digo eu. E o resto está um bocado engatado...
eticamente uma dezena de milhões de casais cinheses,indianos, africanos e etc que optam tal como o australiano por abortar uma (ou mais)filha, porque querem rapazes.
ResponderEliminarA possibilidade de abortar por razões sociais, de tradição etc pode destruir os fundamentos da sociedade, a norma são 105 fetos masculinos/100femininos
que devido a mortalidade acrescida acabam por se aproximar ao fim de 5anos dos 101/100
presentemente em algumas regiões dentro de faixas etárias perto dos 6 a 12 anos
há sex ratios de 140/100
a alteração do modo de vida tradicional
estará para breve, massas populacionais bastante grandes sem parceiras da sua classe etária
e sem possibilidades de deslocação para fora das suas áreas de nascimento
o passaporte interno e a degradação do nível de vida nos próximos anos tratam disso
Um óvulo e um espermatozóide são propriedade ...a vida como propriedade
ResponderEliminaruma semente da Monsanto é da Monsanto
um vírus é de quem o transformou
um medicamento biosintetizado pertence a quem alterou geneticamente o organismo que o produz
pois,.45%&$
Mats,
ResponderEliminarEm Portugal, um médico que aborte um feto com 6 meses (por exemplo) em condições normais (não existindo risco de vida para a mãe, etc..) comete um acto ilegal.
Se estivermos a falar de um ser com 3 semanas, isso não acontece.
Se estivermos a falar de um recém nascido, estamos a falar de um crime mais grave que o do primeiro caso.
Existe uma progressão, com duas descontinuidades, que corresponde -de uma maneira que necessariamente não é a ideal - à progressão gradual de ovo para ser humano.
Ludwig:
ResponderEliminara) «Eticamente, podemos dizer que é preferível ter mais filhos felizes do que não ter filhos»
A felicidade apareceu aí na discussão vinda do nada...
Afinal como é? Queres clarificar melhor estas questões éticas?
O que é que é preferível, eticamente, a este respeito? Na ignorância de se os filhos vão ser felizes ou não.
b)
«Tu defendes que se deve avaliar a culpabilidade de matar um ser humano em função da idade desse ser humano. Se for muito novo, não há problema.»
Erras logo aí.
Para mim o ponto essencial é aferir quando é que começa a vida do ser humano. Para mim o ovo não é um ser humano, até porque o ADN não define a pessoa (os gémeos têm-no igual). Portanto, do Ovo ao ser humano existe uma transformação gradual.
«nem consegues justificar porque não te devemos prender por homicídio pelo facto de não salvares crianças que estão a morrer à fome.»
Mas não sou eu que defendo que o problema do aborto é a vida em "potencial", por isso não sou eu que tenho essa justificação a dar.
Tu colocaste a questão em termos não do ser que é destruído - a meu ver não é um ser humano - mas sim em termos daquilo que é consensual; que em resultado da decisão de abortar um ser humano que viveria não vai viver.
Na altura pareceu um argumento forte, mas depois tornou-se claro o seu corolário: em resultado da decisão de não ter filhos, o mesmo acontece.
Por isso, ou colocas a questão em termos das consequências da decisão, e caís nesse corolário; ou então falas naquilo que de facto perde a vida em resultado do aborto, que não é uma pessoa.
«No caso do preservativo só tens a alegação, hipotética e não comprovada, que alguma pessoa, que não tens forma de saber quem em concreto, poderia ter nascido se não fosse esse preservativo. Além disso, sabes também que qualquer pessoa das que poderia ter nascido, mesmo sem o preservativo teria uma probabilidade baixíssima de nascer. É uma diferença grande.»
Dizes que essa diferença é grande, mas eu discordo. Acredito que cada uma das diferenças que apontas tem pouca relevância para o que estamos a discutir. Ora vejamos:
a) não saber quem
Isso importa? Se um homicida matar alguém impossível de identificar, isso iliba-o? Não me parece.
b) hipotética e não comprovada
Isso é relevante? Hipoteticamente, se fosse certo que um ovo seria fecundado nessa noite, e a gravidez seria levada a bom termo, caso existissem relações sexuais, mas a rapariga optasse por usar contracepção, isso mudava o teu juízo?
c)«sabes também que qualquer pessoa das que poderia ter nascido, mesmo sem o preservativo teria uma probabilidade baixíssima de nascer»
Isto não é uma repetição das alegações anteriores?
Ludwig:
ResponderEliminarEstou de acordo com as criticas do João Vasco. Ia escrever algo do género quando vi que ele se tinha antecipado. Melhor para mim.
Só queria acrescentar uma coisa que pareces não resolver:
É como pretendes que sejam tomadas decisões em tempo real se não houver "atalhos"? Critérios de decisão universais, dos quais apenas esboças um, fortalecem a igualdade e logo a justiça. Mas são importante porque permitem tomar decisões e não fazer nada é uma decisão em si.
Algures tens de desenhar regras. Não só as pessoas precisam de saber com o que contam da lei, como não ha justiça se não houver consistencia na aplicação da lei. Admito que isso são problemas que nunca estão 100% resolvidos, mas tu pareces apontar para soluções ad-hoc caso a caso. É muito bonito eticamente, mas para tomar decisões em tempo real parece-me utópico. Se puderes "congelar" a gravidez...
Francisco,
ResponderEliminar«tu estás a fazer uma viagem no tempo para o futuro que um ovo poderá eventualmente vir a ter.»
Nope. Vê desta maneira: o aborto reduz em cerca de setenta anos a esperança de vida daquele ser humano. Isso, parece-me, é eticamente significativo. Seja como for, quando queres avaliar as consequências de uma acção, tens de olhar para o futuro. Excepto ao nível quântico, não afectas o passado.
«O exemplo da criança em África confunde mais do que esclarece»
Esse exemplo serve para mostrar como a relação entre o acto e a consequência é importante para os aspectos éticos, e porque há diferença entre usar um preservativo ou abortar mesmo sem assumir que um tem mais direitos por ser mais velho.
«Creio que um ovo agarrado ao endométrio não pode ser comparado a uma criança recém-nascida porque a última é independente.»
Presumo que não tenhas filhos :)
Esse é um exemplo do que eu chamo atalho porque é fácil ver que não abrange o que é relevante num problema. Por exemplo, numa aldeia sem leite em pó o recém nascido está totalmente dependente da mãe, e apenas da mãe, se mais ninguém o pode amamentar. Se só há um cirurgião nessa aldeia, o paciente que está de tórax aberto naquele momento está totalmente dependente do cirurgião, sem mais ninguém que saiba fechar-lhe o peito. Se a mãe com três filhos pequenos está numa cabana numa montanha isolada umas semanas por causa das tempestades, eles estão totalmente dependentes dela para se alimentarem, e mais ninguém os pode ajudar. Em nenhum desses casos me parece razoável defender que essa pessoa passa a ter o direito de matar os outros.
Pelo contrário. Essas relações de dependência total, quando são consequência de actos voluntários daqueles que podem ajudar os outros, geralmente implicam um dever adicional de os ajudar. A mãe ou o pai do recém-nascido – os que tiveram sexo para o fazer – têm mais obrigação de tratar dele do que um estranho.
Finalmente, não faz sentido nenhum “definir o ser humano como um ser independente”. Por um lado porque uma mosca é mais independente do que qualquer um de nós e, por outro, porque implica que um doente acamado seja menos humano que os outros, mesmo que seja só com um pé partido e tenha um prognóstico porreiro.
O meu veredicto: isso da independência é um atalho, e por maus caminhos :)
João VAsco:
ResponderEliminarCompletamente de acordo com quase tudo.
A realsar que apagar filhos hipoteticos é um crime hipotetico.
As concequencias não se medem pelo individuo hipotetico que não nasce, mas sim no que a ausencia do seu nascimento reprensenta factualmente no mundo real. Como por exemplo se houver muita gente a só querer filhas vai destabilizar a sociedade. Se o individuo que apagaste iria ser o proximo Einstein é uma não questão (caso esse argumento apareça por aí). Porque o que tu não sabes não é passivel de servir de argumento. É um apelo à ignorancia.
O problema está, a meu ver, que algures tens de desenhar uma linha arbitrária a dizer onde começa o ser humano. Não será uma divisão "real" por várias razões, mas uma que pode ser apoiada pelo conhecimento cientifico em vista do objectivo de se tomar uma decisão em tempo real. É preciso transformar um problema np em p. Eu propunha que fossemos ver em que idade é que podemos encontrar critérios de diagnóstico de sofrimento fetal. E baseados nisso, tirassemos para segurança um valor de 50%. Não sei factos para te dizer quando isto vai dar mas prevejo que vai dar algures pelos primeiros passos do aparecimento do sistema nervoso tal como ele é histologicamente. (notar que não é preciso a variedade de funções superiores de um adulto para sentir felicidade ou sofrimento - só é preciso o tronco cerebral, algo muito primitivo)
O estado de morula não tem sofrimento analogo ao de um feto. Aí não há duvidas. O ovo ainda menos. Mas um feto de 10 semanas? Eu iria para as 8 semanas:
http://www.buzzle.com/articles/brain-development-in-fetus.html
http://www.baby2see.com/development/week8.html
http://www.nlm.nih.gov/medlineplus/ency/article/002398.htm
Queria chamar a atenção para que a ausencia de estruturas viscerais completas, resulta na ausencia de emoções. As emoções são programas de acção corporal. Os sentimentos são o colectivo da representação dessas emoçoes. Por outro lado, nesta
Bruce,
ResponderEliminar«Pois. Tenho estado a tentar mas não consigo dar crédito à proposta genérica de que “há uma pessoa a quem estamos a roubar a vida ao destruir um embrião”. E não consigo por duas razões: i) não há pessoa nenhuma; ii) não estamos a roubar ninhuém.»
Porque caíste na armadilha da “pessoa”. É uma categoria arbitrária que cada um define como quer, e anda tudo a discutí-la quando é irrelevante. Esquece isso da pessoa.
O feto é um ser humano (no sentido de ser do género homo) que, se não for abortado, tem uma esperança de vida de seis ou sete décadas (por cá; noutros sítios o aborto pode ser mais aceitável ou até recomendável). Se for abortado esse período cai efectivamente para zero.
O valor dessas décadas de vida é o valor para quem a vive. E é considerável, a julgar pelo que observamos nos membros dessa espécie por cá. É esse valor que está em jogo.
O resto é brincar com as palavras.
«uma coisa é o que existe e outra coisa é o que não existe mesmo que viesse a existir.»
Não seja por isso. Se a questão for abortar fetos e embriões que não existem, por mim é na boa. Abortem à vontade. O problema só surge quando eles existem (daí a grande diferença entre a contracepção e o aborto).
É claro que podes dizer que existe mas não é pessoa, ao que eu respondo não interessa. Não é pessoa, nem jiribiti (definido como um gordo de bigode e chapéu amarelo) nem porotibó (uma rapariga de fato de balé) nem uma data de outras coisas. Mas o facto é que se não o abortarem, esse coiso que ali existe vai viver uma vida inteira como as nossas, e se o abortarem esse coiso vai morrer. Chama-lhe o que quiseres, a realidade continua a ser essa. E isso é relevante, até porque o propósito de o abortarem é precisamente impedir que continue a viver essa tal vida. Raramente uma mulher vai abortar só porque as calças lhe estão apertadas; é precisamente para impedir que aquele feto chegue a bebé, altura em que é fofinho e já se vê com maus olhos metê-lo num saco e atirá-lo ao rio.
João Vasco,
ResponderEliminar«A felicidade apareceu aí na discussão vinda do nada...
Afinal como é? Queres clarificar melhor estas questões éticas?»
É o mesmo. A vida vale pelo valor que tem para quem a vive. Sem vida, ou com a vida de uma barata ou um pinheiro, esse valor é zero. Uma vida boa, feliz, livre, etc, como as nossas tem um valor positivo grande. Uma vida de tortura, sofrimento, prisão, etc, tem um valor negativo.
Penso que já discutimos isto várias vezes...
«Para mim o ponto essencial é aferir quando é que começa a vida do ser humano.»
Isso é um problema biológico trivial. Um ser humano é um organismo do género homo, composto por um conjunto de células. A sua vida começa quando duas células dos seus progenitores se juntam para formar o novo organismo, e acaba quando o organismo fica irreversivelmente incapaz de funcionar como tal.
«Para mim o ovo não é um ser humano»
Tudo bem, mas o que é ou não é para ti não é eticamente relevante. Também podes dizer que, para ti, uma mulher ou alguém de pele escura não são humanos. Ou podes dizer que está bem torturar touros porque não são humanos. “Humano”, “pessoa”, etc, se são algo que pode ser para ti ou para mim, são meras categorias arbitrárias que temos de descartar como eticamente irrelevantes. São etiquetas.
O que importa é que um embrião saudável implantado tem uma esperança de vida muito grande, e é expectável que essa vida tenha grande valor para aquele que a vai viver, e isso é o que se tira a esse ser quando ele é abortado. Seja que nome for que lhe queiras dar.
«Tu colocaste a questão em termos não do ser que é destruído - a meu ver não é um ser humano - mas sim em termos daquilo que é consensual; que em resultado da decisão de abortar um ser humano que viveria não vai viver.
Na altura pareceu um argumento forte, mas depois tornou-se claro o seu corolário: em resultado da decisão de não ter filhos, o mesmo acontece.»
Só é o mesmo quando olhas apenas para o número de vidas. Por exemplo: o casal A concebe 3 filhos (fetos, embriões, coisos, o nome não importa) e aborta 2, total, 1 filho. Casal B concebe 1 filho, aborta 0, total 1 filho.
Mas estas contas também dão isto: Bombeiro A salva 3 pessoas de morrerem queimadas, mata duas regando-as com gasolina e pegando-lhes fogo. Total 1 pessoa salva. Bombeiro B só salva 1 pessoa, mata 0. Total, 1 pessoa salva.
Os actos dos casais são equivalentes apenas no sentido em que os dos bombeiros são equivalentes. Mas, eticamente, é preciso ver como o acto se relaciona com o efeito. No caso do bombeiro B e do casal B, não podes apontar para nenhuma vítima (não presumo que sejam pessoas; usa cães no exemplo dos bombeiros se quiseres) que tenha sido morta pelo bombeiro ou pelo casal. Mas no caso do casal A e do bombeiro A podes.
Ludwig,
ResponderEliminarEstás a valorizar mais do que eu a “armadilha pessoa”. Se todos sabemos que destruir um embrião é radicalmente diferente de torturar um feto, é por ser claro que um é uma entidade senciente e a outra não. Onde está a fronteira exacta entre os dois? Não nos interessa agora, porque estamos na margem segura das 10 semanas. O sujeito “alguém” e o sujeito “ninguém” que refiri situam-se cada um para cada lado dessa fronteira, é só isso. E o que continuas a afirmar é que “ninguém” é uma existência que devemos estimar. Absurdo. Por isso quando dizes
«Se a questão for abortar fetos e embriões que não existem, por mim é na boa. Abortem à vontade.»
eu assumo por coerência que não sou contra o aborto. Pessoalmente, e com excepção para a racionalização dos serviços de saúde, estou-me nas tintas. Sabendo nós que eliminar um embrião é radicalmente diferente de torturar um feto não vejo sequer motivo para me preocupar com isso, porque se sou contra alguma coisa é o sofrimento (permite-me a piroseira). O mais que posso dizer é que se as pessoas sofrem ao tomar a decisão de abortar, seja pela razão absurda de estar a matar alguém ou por outras mais lúcidas, não devem fazê-lo. Mas disso sabem elas perfeitamente, e se o fazem é para evitar sofrimentos maiores portanto prefiro nem dizer nada.
Já agora, esta questão do Jota é também é pertinente:
«A felicidade apareceu aí na discussão vinda do nada...»
Mais do que isso, parece-me que levanta um problema sério para ti: se por um lado podemos identificar as condições inquestionáveis para o aborto (falas em África, e o catano) por outro não podemos identificar as condições inquestionáveis para ter um filho feliz. E não me passa pela cabeça condenar alguém por conhecer a sua própria vida melhor do que eu.
(lamento vestir a pele do lobo e ensanguentar esta coisa com radicalismos)
João,
ResponderEliminarQuanto aos hipotéticos, etc, vê a minha resposta ao João Vasco.
Quanto a isto:
«O problema está, a meu ver, que algures tens de desenhar uma linha arbitrária a dizer onde começa o ser humano.»
É falso. É treta. Pior, é um atalho :)
Só tens de desenhar essa linha para definir a palavra. Para entendermos o que quer dizer “humano” temos de definir o que esse conjunto de letras refere. Mas, eticamente, isso é irrelevante. Por exemplo, se alguém disser que não há problema nenhum em regar cães com gasolina e deitar-lhes fogo porque os cães não são seres humanos. Ou que a vida de um chimpanzé não tem valor para o chimpanzé porque um chimpanzé não é uma pessoa. Etc.
Esse é um dos piores atalhos que há. Se olhares para a história, verás que uma grande parte das atrocidades assenta precisamente no truque de se definir onde “desenhar a linha arbitrária”.
Quanto ao sofrimento, duvido muito que um recém nascido sofra, no sentido subjectivo de sentir algo. Sofre como um ser inconsciente que reage a agressões, etc, mas o cérebro de um recém-nascido não parece ser capaz de mais que reflexos e aprendizagem.
Lembra-te que os humanos nascem muito prematuros. Por exemplo, os meus filhos nasceram duas ou três semanas antes do tempo e nem engolir sabiam (tiveram de ser alimentados por um tubo durante uma semana). Nós saímos do útero mesmo com o mínimo indispensável para uma existência de dependência total.
Ludwig:
ResponderEliminarNão respondeste à primeira questão que te coloquei.
«Isso é um problema biológico trivial. Um ser humano é um organismo do género homo, composto por um conjunto de células. A sua vida começa quando duas células dos seus progenitores se juntam para formar o novo organismo, e acaba quando o organismo fica irreversivelmente incapaz de funcionar como tal.»
Isto é falso.
É claramente falso que seja um problema biológico trivial, e não existe qualquer fundamento para adoptar esse critério em prejuízo de outros.
Ou se existe foste incapaz de o defender.
«Tudo bem, mas o que é ou não é para ti não é eticamente relevante.»
Este argumento faria todo o sentido se tu tivesses acesso directo à VERDADE.
É óbvio que não importa se é humano para mim ou para ti, mas sim o que é humano na verdade.
Mas visto que discordamos nesse ponto, eu referi o "para mim". É evidente que na minha opinião não é só para mim, mas sim, "na verdade". Julguei que não tinha de explicar isso...
««Tu colocaste a questão em termos não do ser que é destruído - a meu ver não é um ser humano - mas sim em termos daquilo que é consensual; que em resultado da decisão de abortar um ser humano que viveria não vai viver.
Na altura pareceu um argumento forte, mas depois tornou-se claro o seu corolário: em resultado da decisão de não ter filhos, o mesmo acontece.»
Só é o mesmo quando olhas apenas para o número de vidas.»
Já disse que e falso. O corolário que referi é implicação do teu ponte de vista quer se olhe apenas para o número de vidas, quer não.
Em qualquer dos casos decorre do teu ponto de vista as implicações que referi, e não consegues mostrar que seja necessária essa crença adicional para que a implicação se verifique, para mim parece-me que cai do céu aos trambolhões.
«Os actos dos casais são equivalentes apenas no sentido em que os dos bombeiros são equivalentes. Mas, eticamente, é preciso ver como o acto se relaciona com o efeito. No caso do bombeiro B e do casal B, não podes apontar para nenhuma vítima»
Estás a contradizer-te.
No caso do aborto, a minha alegação é que não morre nenhum ser humano, mas sim um ovo.
Ou tu falas numa potencial vítima, e podes estabelecer a dita equivalência que rejeitas, ou falas nas células que são destruídas e não existe um ser humano morto, pois não estamos a falar nos potenciais 70 anos, mas naquelas células - as vítimas.
Quanto ao sofrimento, eticamente pode destruir-se qualquer forma de vida sem sistema nervoso, no sentido subjectivo de sentir algo.
ResponderEliminarSubjectividade do sofrimento pois sofre como um ser inconsciente que reage a agressões, etc, mas o cérebro de um recém-nascido não parece ser capaz de mais que reflexos e aprendizagem.
a) «Eticamente, podemos dizer que é preferível ter mais filhos felizes do que não ter filhos»
A felicidade vinda do nada...
deve avaliar a culpabilidade de molestar um ser humano em função da idade desse ser humano. Se for muito novo, não há problema
Erras logo sum.
o ponto essencial é aferir quando é que começa a vida do ser humano. Para mim o ovo não é um ser humano, até porque o ADN não define a pessoa (os gémeos têm-no igual). Portanto, do Ovo ao ser humano existe uma transformação gradual.Comer um ovo não é tirar a galinha potencial a um galo
porque não te devemos prender por homicídio pelo facto de não salvares crianças que estão a ser atropeladas ou a contrair infecções mortais
Mas não defendo que o problema do aborto é a vida em "potencial" porque há vida virtual e afins.
Se um computador tiver consciência é ético apaGÁ-LO porque não sente dor
and so it goes
ResponderEliminarslaughterhouse five is now
para quem fala de ética têm pouca...é o problema dos crentes
Perseguidor Pidesco:
ResponderEliminarEu nunca disse que o problema de matar é o sofrimento provocado ao próprio.
Há uma série de outros. Há tantos, que a "vida potencial" não é O problema do homicídio.
É por isso que eu posso rejeitar a ideia de que é homicida escolher não ter filhos. Se o problema principal de matar fosse esse, não o poderia fazer.
Bruce,
ResponderEliminar«Se todos sabemos que destruir um embrião é radicalmente diferente de torturar um feto, é por ser claro que um é uma entidade senciente e a outra não.»
Não acho que um feto sinta. Reage, mas o cérebro dele, e mesmo uns tempos depois do nascimento, é desorganizado demais para sentir, subjectivamente. Mas isto baralha dois problemas diferentes. Enquanto que torturar algo anestesiado (algo pode ser um cão ou um Bruce, tanto faz) é eticamente irrelevante, visto a vítima não sentir, matar algo anestesiado tem a consequência de lhe privar do resto da vida, sinta ou não na altura.
«E o que continuas a afirmar é que “ninguém” é uma existência que devemos estimar.»
Não. Não quero saber como tu, o João Vasco, ou o Hitler, o Ratzinger ou o Descartes distinguem entre o que conta como “alguém” e “ninguém”. Tanto me faz porque não estou a discutir o significado dos termos. O que me importa é que o ser que se aborta – e que existe, está lá, e está vivo, caso contrário não haveria problema nenhum – vai, como consequência directa e intencional desse acto, ter a sua esperança de vida reduzida em meia dúzia de décadas. Como, tal como tu, «não me passa pela cabeça condenar alguém por conhecer a sua própria vida melhor do que eu», não vou julgar se acho que aquilo é pessoa, jiribi, o que calhe. Vou apenas considerar se, para esse coiso, seja que nome tenha, essa meia dúzia de décadas é algo de valor ou não.
E parece-me que é.
«Mas isto baralha dois problemas diferentes.»
ResponderEliminarNão, tu é que introduzes a confusão. E para quê (pergunto eu) confundir o que estamos a falar com “algo anestesiado”? Baralhas com isso as duas circunstâncias do futuro expectável (a que “alguém” tem direito) com o futuro imaginário do “ninguém” que nem sequer nasceu.
Além disso, se sentir ou não sentir não conferem robustez ao critério de ser alguém ou ninguém, mais difícil é que o simples facto de estar vivo resolva o problema que nos divide. Portanto afirmar que
«O que me importa é que o ser que se aborta – e que existe, está lá, e está vivo, caso contrário não haveria problema nenhum»
projecta a discussão do aborto para a morte em geral, pois pura e simplesmente não poderias “tirar a vida” a uma única urtiga se fosse “a vida” o critério mais robusto para diferenciar o “valor” das coisas. Ou dos coisos, como dizes :)
LK
ResponderEliminarnão consigo ver diferença nenhuma entre a sacralização da vida como a icar a define e forma como estás a colocar o problema.
mas aceitando que é uma posição mais relativista , o que duvido, e menos dogmática , o problema do aborto diz respeito apenas à mulher e ao feto a mais ninguém.
ora a meu ver, e até se demonstrar o contrário, o feto não pode ser ouvido e por isso tem de ser a mulher a decidir.
como o interesse da mulher supera o do feto em tudo, vida, consciência, etc não entendo muito bem o problema a não ser que tenhamos uma visão quase religiosa da vida potêncial. não é errado ver as coisas dessa forma apenas confunde o que está em causa: a vontade de maternidade ou não.
num mundo ideal as mulheres não necessitariam de abortar, concordo
por isso é que temos leis imperfeitas para lidar com um mundo imperfeito.
a alternativa ou as alternativas são todas piores
obrigar pessoas a parir é um disparate por isso, se a mulher quer abortar cumpre ao estado fornecer condições mínimas e obrigar as consultas para que a coisa não se volte a passar, como ? indo ao bolso que é onde doi, cancelando RSI por exemplo em caso de não faltarem etc
esta é a minha solução, mas e se apessoa não for beneficiária do RSI ?
multas gradativas e por dia
mas e se a pessoa tiver outros filhos ? dever-se-á fazer esses sofrerem multas pelo que nunca irá existir ?
problemas e mais problemas
resultado, mais fiscalização mas com calma que isto é muito pantanoso
João Vasco,
ResponderEliminar«É claramente falso que seja um problema biológico trivial, e não existe qualquer fundamento para adoptar esse critério em prejuízo de outros.»
Biologicamente, o termo “humano” está bem definido. Designa os organismos do género Homo. E, biologicamente, também é fácil determinar quando um organismo surge em espécies como estas. É na concepção (daí o termo).
É claro que eticamente o problema é diferente. Mas é precisamente isso que eu estou a dizer. Eticamente, não é a definição do termo “humano” que nos importa.
«É óbvio que não importa se é humano para mim ou para ti, mas sim o que é humano na verdade.»
Não há “humano na verdade”. “Humano” é um conjunto de letras que designa o que quisermos que designe. É uma mera ferramenta de comunicação. Eu uso esse conjunto de letras no sentido biológico comum de referir os organismos do género Homo (nós, os neandertal, etc). Mas eticamente é irrelevante o que é humano “na verdade” porque o humano “na verdade” é o que quisermos, basta definir a palavra. É como discutir se Plutão é um planeta. Só tem relevância para a classificação e comunicação de conceitos, mas Plutão é exactamente a mesma coisa qualquer que seja o termo que usamos para o descrever.
O meu ponto é que, na realidade, seja que palavras uses, o aborto é um acto intencional que visa reduzir a zero a vida esperada de 60-70 anos, equivalente às nossas, daquele organismo em concreto. Se queres discutir os termos que uso para que fique claro o que refiro, tudo bem, mas não altera a realidade. Aquele coiso que está vivo e que viveria, provavelmente, 70 anos de vida com grande valor para si, enquanto a vivesse, não vai viver coisa nenhuma porque o matam. É isso que importa.
«No caso do aborto, a minha alegação é que não morre nenhum ser humano, mas sim um ovo.»
Um feto de dez semanas não é um ovo, pelo menos no sentido normal do termo. Mas, seja, chamemos-lhe ovo*, com o * indicando que é “ovo” pela tua definição.
Se matas esse ovo*, qualquer que seja a terminologia, o facto é que estás a causar a morte de algo que iria viver 70 anos como ser inteligente, independente, consciente, e que iria dar grande valor a essa vida. E que já existe, está vivo, e estás tu a matá-lo. Ou seja, estás a agir para roubar essa vida a esse ser.
Se usas um preservativo é possível que isso impeça um outro organismo de surgir. Há uns milhares de biliões de possibilidades (óvulos x espermatozóides), cada uma com uma probabilidade muito pequena de se concretizar sem o preservativo. Quando levas um bebé num avião aumentas a probabilidade de ele vir a ter cancro. Quando decidiste não ser bombeiro há uma probabilidade de que alguém (alguém genérico, pode ser um cão ou uma ovelha, que também é mau que morram queimados) venha a morrer por isso. Etc. Mas quando olhamos para o que morreu queimado ou quando, vinte anos mais tarde, o tal bebé tiver cancro, não é claro que a causa principal tenha sido a tua decisão. Mas se abortas um ovo*, sabemos que aquele ovo* passou de ovo* vivo com 70 anos de esperança de vida para ovo* morto por tua culpa, directa e intencional.
Eu sei que vais continuar a teimar que isto não faz diferença nenhuma, mas só teimar não chega...
e que existe, está lá, e está vivo, caso contrário não haveria problema nenhum
ResponderEliminarpode estar vivo e não ter conciência , estar vivo é apenas condição para se poder estar morto :D
acho que o problema é um e apenas um, para ti a vida é um valor que não pode ser relativizado, é esse o iníco da fé , seja ela religiosa ou não:)
mas tal coisa, valores não relativizaveis, não existem porque a cultura é sempre uma lente pela qual vemos a realidade.
continuo sem entender na prática qual a soluçaõ para os casos que de uma maneira geral concordamos serem reprováveis por vários motivos.
Nuvens,
ResponderEliminar«o problema do aborto diz respeito apenas à mulher e ao feto a mais ninguém.»
Tal como o problema da pedofilia diz apenas respeito ao pedófilo e à vítima. O mesmo para a violação, o assalto à mão armada, o trabalho infantil, etc... Acho que não :)
«ora a meu ver, e até se demonstrar o contrário, o feto não pode ser ouvido e por isso tem de ser a mulher a decidir.»
Um recém nascido debaixo de água também não se ouve nada. Só um leve borbulhar e é por pouco tempo. Acho que te está a escapar os aspectos éticos do problema... :)
«obrigar pessoas a parir é um disparate»
Em geral, sim. E obrigar as pessoas a amamentar também. Mas se uma mãe deixa um recém nascido morrer à fome e sede porque não o quis amamentar e não havia mais nada para lhe dar, temos de considerar as circunstâncias em que isso aconteceu e não podemos simplesmente dizer “bem, para mim, o recém-nascido não é pessoa e isso é entre a mãe e o filho”.
O meu ponto é que esse atalho não é aceitável. É preciso considerar os vários factores relevantes e não descartar tudo com uma simplificação grosseira.
«Se matas esse ovo*, qualquer que seja a terminologia, o facto é que estás a causar a morte de algo que iria viver 70 anos como ser inteligente, independente, consciente, e que iria dar grande valor a essa vida. E que já existe, está vivo, e estás tu a matá-lo. Ou seja, estás a agir para roubar essa vida a esse ser.»
ResponderEliminarLudwig, este parágrafo é um susto. Estar vivo e existir são dimensões difusas, concordo, mas será que nem no caso dos humanos a gente consegue compartimentar as coisas? É insofismável que estar vivo não é o mesmo que existir, no sentido em que a existência marca um direito ou uma expectativa. E se não existe não há como roubá-lo. Podes quando muito falar em “matá-lo”, desde que não digas humano a seguir.
COMO PODEMOS TER A CERTEZA ABSOLUTA DE QUE O LUDWIG HÁ MUITO QUE PERDEU O SEU DEBATE COM OS CRIACIONISTAS?
ResponderEliminarÉ muito simples:
1) Para defender a ciência, o Ludwig tem que postular que o Universo funciona racionalmente e pode ser compreendido racional, lógica e matematicamente.
A Bíblia ensina isso. A teoria da evolução (com a sua ênfase na irracionalidade dos processos), não.
A Bíblia ganha, porque o Ludwig tem que postular a visão bíblica do mundo para defender as possibilidades da ciência.
2) Para poder criticar o comportamento dos religiosos, o Ludwig tem que pressupor a existência de valores morais objectivos.
Caso contrário, são as suas próprias preferências morais subjectivas contra a dos religiosos, nomeadamente em matéria de aborto.
A Bíblia ensina que existem valores morais objectivos.
A teoria da evolução (com a sua ênfase no carácter amoral e predatório dos processos), não.
A Bíblia ganha, porque o Ludwig tem que postular a visão bíblica do mundo para as suas condenações morais serem plausíveis...
3) A Bíblia ensina que a vida foi criada por uma (super-)inteligência.
A existência de códigos e de informação codificada é a marca, por excelência, da inteligência e de racionalidade (v.g. computadores, ATM’s, GPS’s., Ipads).
A vida depende de códigos e informação codificada, com uma densidade e complexidade que a comunidade científica não consegue compreender e reproduzir.
Para aspirar a ganhar o debate, o Ludwig teria de a) mostrar um processo físico que crie códigos e informação codificada ou b) demonstrar que a vida não depende de códigos nem de informação codificada.
Como ambas as coisas são cientificamente impossíveis, a Bíblia ganha.
É por isso que é errado afastar a Bíblia deste debate, como alguns pretendem.
Ela dirige e vence o debate.
Sempre que tenta negar a Bíblia, defender a ciência e condenar a conduta dos cristãos (ou outros) o Ludwig tem que postular a visão bíblica do mundo.
Nuvens,
ResponderEliminar«acho que o problema é um e apenas um, para ti a vida é um valor que não pode ser relativizado, é esse o iníco da fé , seja ela religiosa ou não:)»
Pelo contrário. Todos os valores são relativos. Por isso acho que o aborto é aceitável em casos de violação, de malformações congénitas, etc.
Mas lá por ser relativo não quer dizer que seja zero. O meu ponto é que não se pode ignorar o valor daquela vida que se está a destruir (o valor da vida é o valor da vida toda, não do instante em que se está desmaiado, em coma, anestesiado ou com 10 semanas) só para que o problema pareça mais simples.
Bruce,
ResponderEliminar«É insofismável que estar vivo não é o mesmo que existir, no sentido em que a existência marca um direito ou uma expectativa.»
Onde surge o direito é precisamente o que estamos a discutir. E discordo que o direito só surja com a expectativa. Se pegares num recém nascido, o criares na miséria, maltratado, até ter idade para coser bolas de futebol, e depois o prenderes numa cave a fazer isso até morrer, é provável que as suas expectativas sejam muito baixas. Mas é inegável que tem o direito a uma vida melhor.
Mais uma vez, não estás a aplicar uma regra geral razoável. Estás a inventar regras ad hoc que fingem justificar o descartar do valor da vida do abortado. São esses atalhos que critico.
A “EVOLUÇÃO” NA GENÉTICA DAS POPULAÇÕES E O ERRO DO LUDWIG
ResponderEliminarO Ludwig fala muito na “evolução” partindo da genética das populações.
No entanto, sempre que apresenta exemplos de evolução extraídos da genética das populações não consegue dizer mais do que “gaivotas dão… gaivotas”, “lagartos dão… lagartos” e “pelicanos dão… pelicanos”.
Ou seja, ele não consegue refutar o que a Bíblia ensina: os seres vivos reproduzem-se de acordo com o seu género.
Admito que isto seja um pouco embaraçoso quando se debate com o criacionismo bíblico.
O que se passa então? O que é que está a falhar?
Qual é o erro do Ludwig?
Ou, melhor, qual é o erro da genética das populações que induz o Ludwig em erro?
A resposta é dada pelo evolucionista John Endler, no seu livro Natural Selection in the Wild, de 1986.
John Endler é referido por Richard Dawkins, no livro The Greatest Show On Earth, como um evolucionista importante, que estudou o modo como os guppies “evoluem” para… guppies!
John Endler tem o mérito por chamar a atenção para que:
1) a selecção natural não é o mesmo que evolução, já que não explica por si só a origem de novas estruturas e funções e de nova variabilidade genética;
2) os geneticistas das populações utilizam o termo evolução para referir a mudança de frequência dos genes e alelos, descurando, desde há décadas, o problema do surgimento de novos genes e alelos e das suas propriedades.
Isto, repito, é afirmado por um importante cientista evolucionista!
Ou seja, quando os geneticistas das populações falam na ocorrência de evolução eles aludem geralmente a alterações de frequência de genes e alelos pré-existentes, recombinadoras de características morfológicas pré-existentes, uma realidade que nenhum criacionista nega.
O problema é que estas alterações ocorrem sempre dentro do mesmo género (“gaivotas dão…gaivotas”), nada tendo a ver, necessariamente, com a criação de novos genes, estruturas e funções mais complexas.
Para John Endler, biólogos, geneticistas e geneticistas das populações devem dar mais atenção ao problema da criação de estruturas e funções inovadoras, em vez de se cingirem ao estudo da variação dentro de cada género a partir de informação e estruturas pré-existentes.
O erro do Ludwig é usar a genética das populações como evidência de evolução, embora a aquela seja acusada, pelos próprios evolucionistas, de se concentrar na alteração da frequência de genes e alelos e descurar a origem de informação codificada nova, capaz de transformar partículas em pessoas, bactérias em bacteriologistas, peixes em pescadores.
O erro do Ludwig e dos geneticistas das polulações não escapa aos criacionistas nem aos evolucionistas mais atentos.
«E discordo que o direito só surja com a expectativa.»
ResponderEliminarAinda bem que eu não disse isso. :)
Referia-me ao "ovo" do teu comentário, e não à Nike na Índia.
ResponderEliminarTal como o problema da pedofilia diz apenas respeito ao pedófilo e à vítima. O mesmo para a violação, o assalto à mão armada, o trabalho infantil, etc... Acho que não :)
ResponderEliminarnão, em todos os casos apresentados existem seres humanos reais e não projecções do que será ou deixara de ser.
O meu ponto é que não se pode ignorar o valor daquela vida que se está a destruir
ninguém ignora, apenas que se as mães não querem ter as criaturas que se pode fazer ? obrigar, voltamos ao mesmo.
este tema esgota-se em 5 min porque não assumindo essa postura de obrigatoriedade de parir, o tema fina-se :)
"Não há “humano na verdade”. “Humano” é um conjunto de letras que designa o que quisermos que designe. É uma mera ferramenta de comunicação."
ResponderEliminarMas tu estavas a usá-la, e a usá-la erradamente.
«Aquele coiso que está vivo e que viveria, provavelmente, 70 anos de vida com grande valor para si, enquanto a vivesse, não vai viver coisa nenhuma porque o matam. É isso que importa.»
Mas tens de te decidir. O que é que tem valor aqui? É o coiso ou os 70 anos que não vive?
És incoerente porque umas vezes alegas que o problema é o coiso, e outras alegas que são os 70 anos.
«Se usas um preservativo é possível que isso impeça um outro organismo de surgir. Há uns milhares de biliões de possibilidades (óvulos x espermatozóides), cada uma com uma probabilidade muito pequena de se concretizar sem o preservativo.»
Isso não colhe.
Um assassino telefona a um antigo amigo da escola, e pede que ele (inconsciente dos instintos homicidas do amigo) diga um número de BI qualquer. Depois vai e mata essa pessoa.
Ele matou uma pessoa em concreto, mas a sua decisão não foi de matar ESSA pessoa. Foi de matar uma. A que calhasse.
Importa pouco que em, resultado da decisão do assassino, a probabilidade dessa pessoa em concreto morrer fosse muito baixa.
Mas vamos resolver este assunto de uma vez por todas, respondendo às perguntas que já te tinha feito.
Imagina que um homem tinha o mesmo código genético em todos os preservativos, que se misturaria sempre da mesma forma com o código genético do óvulo da mulher (que teria sempre o mesmo código genético), e que não existiam abortos espontâneos, nem nada do tipo.
Imagina também que as relações sexuais tinham uma eficácia de 100% para a reprodução, cada vez que um homem e mulher copulavam, ela concebia.
Se o Carlos fosse ter relações com a Inês, o código gnético do filho seria aquele e mais nenhum, e o filho nasceria.
Neste caso, como classificarias a opção do Carlos e da Inês de optarem por um preservativo? Muito diferente da opção do carlos e da Inês no mundo real?
Muito mais grave?
Nada grave?
Explica este ponto.
João Vasco
ResponderEliminaraliás é esse o problema da icar uma vez que mete a vontade de deus a funcionar como um 100% sempre que deus decide há uma gravidez a menos que um preservativo impeça essa vontade
estamos nas franjas do metafísico, medo.....
para o LK o futuro pode interferir com o passado e não a nível quantico , medo
claro que esse futuro é ele que define no presente da forma que melhor lhe agrada para defender um ponto de vista exótico :))
Não creio que para a ICAR faça sentido ser contra o preservativo por essa via, porque assim a abstinência e as freirinhas seriam homicidas.
ResponderEliminarMas a posição da ICAR é coerente na medida em que acreditam que a alminha surge na concepção, tal como o ADN.
O Ludwig ora defende isto - o ovo já é uma pessoa - ora se desvia para a vida em potencial.
É esta incoerência que tenho apontado.
João (aos outros, desculpem o offtopic):
ResponderEliminarUma vez perguntaste-me porque uso o ".".
Há casos em que consigo subscrever um texto e acompanhar os comentários po e-mail sem colocar nenhum comentário meu.
Mas há vezes em que isso é impossível, e tenho de escrever um comentário. Como não tenho tempo para escrever, ou então nada a acrescentar, limito-me a esse ponto.
João Vasco
ResponderEliminarLOLL .
Estou a ficar com pouco tempo, por isso vai em batch, e terei de reduzir a frequência...
ResponderEliminarBruce:
«Referia-me ao "ovo" do teu comentário, e não à Nike na Índia.»
A ética tem de ser um fundamento para as regras morais. Como tal, tem de ir ao fundamental. Não pode haver uma para o ovo outra para a Nike.
O meu critério de avaliar a vida pelo valor que é dado, à vida toda, por quem a vive, parece-me o melhor porque serve tanto para o Nike na Índia, o “ovo”, o computador consciente e o extraterrestre de sílica que vive um milhão de anos e tem dez mil anos de gestação.
Nuvens,
«não, em todos os casos apresentados existem seres humanos reais e não projecções do que será ou deixara de ser.»
Como já disse, não me preocupo com o aborto de fetos imaginários ou embriões hipotéticos. Só os reais. E a definição do termo “ser humano” não é um factor eticamente relevante.
João Vasco,
«Mas tens de te decidir. O que é que tem valor aqui? É o coiso ou os 70 anos que não vive?»
O valor da vida é o valor total de tudo o que compõe a vida para aquele que a vive.
Ao avaliar uma acção devemos considerar o impacto dessa acção nos valores de quem essa acção afecta. No caso de uma acção que elimina uma vida, temos de considerar a diferença que essa acção causa no valor dessa vida.
O impacto é avaliado pelo desfecho pesado pela intensidade da relação causal entre o acto e o desfecho.
Para exemplos vê toda a nossa discussão anterior. Resumindo:
Aborto:
Diferença: Setenta anos de vida para esse organismo.
Valor em causa: valor desses setenta anos de vida para esse organismo.
Forte relação causal entre o acto de abortar e o desfecho desse organismo ficar privado desse período da sua vida.
Contracepção.
Diferença: possibilidade ter efeito na concepção de um de milhões de organismos possíveis, dos quais pelo menos quase todos não podem ser concebidos.
Valor em causa: valor desses setenta anos para o tal organismo hipotético.
Relação causal muito fraca porque aquilo que leva a que cada uma desses milhares de milhares de milhões de possibilidades não se concretize é muitíssimo mais que o preservativo (por exemplo, a possível concretização de cada um dos outros milhares de milhares de milhões).
Adicionalmente, em ambos os casos há que considerar o valor da vida dos pais, que inclui o controlo sobre as suas células (os gâmetas) mas não sobre as células de outros organismos (o feto), e que inclui também a responsabilidade sobre actos voluntários (sexo).
João Vasco,
ResponderEliminar«Um assassino telefona a um antigo amigo da escola, e pede que ele (inconsciente dos instintos homicidas do amigo) diga um número de BI qualquer. Depois vai e mata essa pessoa.
Ele matou uma pessoa em concreto, mas a sua decisão não foi de matar ESSA pessoa. Foi de matar uma. A que calhasse.
Importa pouco que em, resultado da decisão do assassino, a probabilidade dessa pessoa em concreto morrer fosse muito baixa.»
Quando a pessoa morre é evidente a relação causal entre a sua morte e o acto do assassino.
«Imagina que um homem tinha o mesmo código genético em todos os [espermatozóides], etc»
Com o código genético só não dá bem, porque mesmo gémeos idênticos são seres diferentes, com vidas diferentes.
Mas vamos ignorar as restrições da realidade e assumir que o Carlos e a Inês têm necessariamente o Luís como filho, só aquele, se tiverem relações sexuais sem preservativo, e que o Luís, e só o Luís, não nasce se usarem preservativo.
Nesse caso, se agirem de forma a que o Luís não seja concebido podemos dizer que o Carlos e a Inês são culpados pela inexistência do Luís. A sua decisão teve um grande impacto naquela vida que o Luís deixou de ter, e privou-o dessa vida.
No entanto, o acto de usar preservativo em nada afecta a situação do Luís. Estava por conceber, continua sem ser concebido.
Considera o caso do Miguel, uma criança africana a morrer à fome. Vamos assumir que não há mais nada relevante no mundo, a não ser o serviço postal automático, e que o Miguel não tem qualquer parentesco nem nada que ver com o Carlos e a Inês. Se o Carlos e a Inês decidem não enviar comida ao Miguel, o Miguel vai morrer. A decisão do Carlos e da Inês teve um grande impacto na vida do Miguel. No entanto, a sua decisão não alterou nada o estado do Miguel.
No fundo, o Carlos e a Inês são culpados de não melhorar a situação do Luís e do Miguel.
Diferente é quando o Luís está no útero da Inês e o abortam, ou convidam o Miguel para casa deles, onde há comida, e o trancam num quarto. Aí voluntariamente colocaram ambos numa situação em que poderiam continuar a viver, mas depois agiram para que eles morressem. Esse caso é pior.
Nota, no entanto, que nada disto se aplica ao que se passa na realidade. É apenas uma exploração em abstracto das consequências deste fundamento ético.
Nota também que estou, para simplificar, a ignorar o valor da autonomia do Miguel e da Inês, um factor crucial para distinguir o aborto da gravidez por sexo consensual e da gravidez por violação.
Finalmente, nota que nesta discussão só eu é que me dou ao trabalho de tentar sequer esboçar um critério coerente. Tu estás a fazer de criacionista, só exigindo que eu explique os teus exemplos por mais rebuscados que sejam e sem explicar porque é que ser “humano” é eticamente relevante ou porque é que um estado temporário de imaturidade é determinante para que toda essa vida deixe de ter valor...
João Vasco,
ResponderEliminar«O Ludwig ora defende isto - o ovo já é uma pessoa - ora se desvia para a vida em potencial.»
Nem um nem outro.
Já expliquei várias vezes que não me importa a etiqueta de “pessoa”, apenas o que acontece quando vive e quando não vive.
E o facto de ser “em potencial” é irrelevante porque todo o futuro é “em potencial” e apenas o futuro pode conter consequências das acções. Qualquer ética consequencialista tem de considerar as consequências “em potencial”. No instante em que o assassino puxa o gatilho a morte da vítima é meramente “em potencial”.
O que importa é a relação causal entre o acto e a realização desse potencial.
João Vasco,
ResponderEliminarUm exemplo, para ilustrar isto da relação causal. Considera dois cenários.
A- És cego, sempre foste, e eu tenho um poder mágico de curar a cegueira. Mas não te curo.
B- Vês bem, sempre viste, e eu tenho o poder mágico de causar cegueira. E pimba, cego-te.
Em ambos os casos, o valor em causa é tudo o valor de que tu verias para o resto da tua vida. É isso que ganharias se eu te curasse em A, ou que perdes por eu te cegar em B. É algo potencial, no instante da decisão, porque, como qualquer consequência, está no futuro.
Mas há outro factor eticamente relevante. No caso de A, tu vais continuar cego pelo resto da vida por duas razões: eu não te curei, e tu já eras cego. Eu só só parcialmente responsável por esse estado. Parte da responsabilidade é de uma situação que não fui eu que causei.
No caso de B tu vais ficar cego o resto da vida por uma razão principal: eu ceguei-te. O meu contributo, e a minha responsabilidade ética, em B é muito maior.
Sendo o valor em jogo o mesmo e a responsabilidade ética maior em B, em B o meu acto é mais reprovável.
Agora imagina que em vez de isto ser a meio da tua vida, era no início. Tinhas nascido às escuras, eras um bebé que nem sabia o que era ver. Eticamente, o problema é exactamente o mesmo. Porque só interessa o futuro, que é onde estão as consequências do meu acto (ou inacção).
Ludwig,
ResponderEliminarA dependência do ovo da mãe é igual à do fígado da mãe. Para todos os efeitos, é indistinguível de uma qualquer extensão do seu corpo. Mas uma criança que já nasceu e que é dependente da mãe é igualmente dependente seja de que mãe for. E uma criança que pode nascer em segurança já não está sob o completo arbítrio da sua mãe.
«Finalmente, não faz sentido nenhum “definir o ser humano como um ser independente”.»
Pois não, por isso mesmo é que não o fiz. Essa é uma possível conclusão que é coerente com o meu raciocínio mas não o ponto de partida. De facto, eu acho que uma das características da vida humana é essa independência, que se opõe ao homicídio, à escravatura e outras formas de opressão. Mas que não define o ser humano só por si.
De resto lamento que tenhas dado importância só àquilo em que não acredito e não ao meu raciocínio todo, que consiste simplesmente em partir de premissas que considero aceitáveis para ambas as partes e tentar encontrar limites de forma a que não se contradigam e não entrem em dissonância com outros valores humanos. No fim, é ainda possível observar o princípio da tal independência, que nos é tão cara.
Francisco,
ResponderEliminar«A dependência do ovo da mãe é igual à do fígado da mãe. Para todos os efeitos, é indistinguível de uma qualquer extensão do seu corpo.»
Isto é factualmente incorrecto. O ovo (embrião e feto, mais correctamente) é um organismo diferente, numa cavidade externa da mãe (o útero) e em vias de ganhar independência (é uma questão de anos, meses ou semanas, dependendo de como defines a independência).
Se disseres que o óvulo não fertilizado é equivalente a qualquer outra célula do corpo da mãe, concordo. Faz parte dessa colónia. Mas um feto de dez semanas não está nessa situação.
«Mas uma criança que já nasceu e que é dependente da mãe é igualmente dependente seja de que mãe for.»
Depende das circunstâncias. Se não houver mais ninguém, é dependente daquela mãe só.
A questão é se tu defendes mesmo que a dependência (temporária) legitima matar alguém. Se sim, posso tentar explicar porque discordo desse princípio, que considero injusto. Se não, então o mais prático é admitires que isto é só um atalho pelo qual queres simplificar a questão do aborto e não um princípio que sequer defendas :)
Ludwig:
ResponderEliminarFugiste à pergunta que te fiz.
A pergunta que te fiz sobre o "Luís" tinha um contexto: o de saber se é relevante o "Luís" ser um entre inúmeras possibilidades, ou não.
Ou bem que dizes que no exemplo que dei a atitude do Carlos e Inês é flagrantemente imoral, e aí alegas que na realidade não ter filhos nã é tão imoral por causa das condicionantes referidas; ou alegas que neste caso não é imoral não ter o filho, e aí deixas de mencionar como se fosse relevante o facto de se desconhecer o código genético da potencial criança antes da concepção.
Eu não estou a falar na diferença que estabeleces entre o que é activo e passivo - essa diferença pode existir, mas aí é incoerente estares a falar na decisão e nos 70 anos potenciais - mas nem é isso que estou a discutir.
Estou a falar na relevância que atribuis a não se conhecer o código genético da futura criança.
A tal lógica de "para cada uma das possíveis crianças a responsabilidade é muito pequena", como se para cada uma das possíveis vítimas do assassino do exemplo, a responsabilidade dele na sua futura morte fosse muito baixa antes do amigo lhe dar o número do BI.
Eu noto que tens fugido às minhas perguntas. Mas tens razão quando dizes que eu não tenho feito propostas alternativas. Discordo que tenha obrigação de as fazer, visto que limito-me a criticar a tua como incoerente.
Nada nesta crítica exige que eu tenha uma proposta coerente como alternativa, e se nem sequer consigo que respondas às perguntas que faço quando o assunto se limita às tuas incoerências, imagina como seria fácil desviarmo-nos do tema se em cima da mesa também estivessem as minhas propostas.
Um assunto de cada vez. Não é agradável ser acusado de debater como os criacionistas, mas julgo que é perfeitamente criticar o teu ponto de vista como incoerente sem ter de apresentar o meu.
Ludwig Krippahl
ResponderEliminarComo já disse, não me preocupo com o aborto de fetos imaginários ou embriões hipotéticos.
mas preocupas-te com vidas imaginárias que fetos que ainda nem se sabe se vão ser viáveis têm sobre vidas reais.
obviamente que o tempo legitima a morte
matar umas pessoas acamada de 90 anos a morrer de cancro e que pede para morrer não é o mesmo que matar uma criança saudável de 2 anos , essa sim com toda a vida pela frente.
o tempo é uma factor qeu tem de pesar quando se analisam este tipo de situações, e de que maneira
a tua posição nesta matéria é muito dogmática , partes de um centro absoluto - a vida do feto, coisa, ser, cluster de célualas, qualquer definição tem direitos .
e não tem, nunca teve e nunca terá porque no limite não se pode obrigar as pessoas a parirem, não se pode retirar fetos e implantar noutras pessoas ( oq ue seria tb muito jeitoso) e não se pode andar para trás no tempo.
pode ser éticamente reprovável o aborto , que não acho, mas como não temos mecanismos que nos permitam ,sem produzir um mal maior , punir ou voltar a colocar a situação anteriormente existente, é melhor deixar as coisas como estão.
fazer pagar o "justo" pelo "pecador" é sempre uma má decisão ética, seja qual for o assunto
Mais problemas:
ResponderEliminar«Ao avaliar uma acção devemos considerar o impacto dessa acção nos valores de quem essa acção afecta.»
E se calhar comparar com as acções alternativas, não?
Se uma acção vai ter um impacto péssimo, mas melhor que as alternativas, essa opção deve ser avaliada positivamente.
«O impacto é avaliado pelo desfecho pesado pela intensidade da relação causal entre o acto e o desfecho.»
«Contracepção.
Diferença: possibilidade ter efeito na concepção de um de milhões de organismos possíveis, dos quais pelo menos quase todos não podem ser concebidos.
Valor em causa: valor desses setenta anos para o tal organismo hipotético.
Relação causal muito fraca porque aquilo que leva a que cada uma desses milhares de milhares de milhões de possibilidades não se concretize é muitíssimo mais que o preservativo (por exemplo, a possível concretização de cada um dos outros milhares de milhares de milhões).»
Estás a ver a contradição?
Na mensagem posterior a esta, o que era relevante não era saber quem nascia, mas o que era resultado de uma decisão activa e passiva.
Agora o mais relevante é o desconhecimento a respeito de quem é que seria "prejudicado" pela decisão de usar contracepção.
João Vasco,
ResponderEliminar«A pergunta que te fiz sobre o "Luís" tinha um contexto: o de saber se é relevante o "Luís" ser um entre inúmeras possibilidades, ou não.»
Pensava que isso já tinha ficado claro. Numa ética consequencialista, a relação causal entre o acto e a consequência é eticamente relevante. Por exemplo, se duzentas mil pessoas conduzem automóveis e, por causa do smog, duzentas pessoas morrem, a culpa de cada um é menor que se uma pessoa fecha outra na garagem e essa sufoca com o fumo do carro (mesmo que não seja intencional).
«Ou bem que dizes que no exemplo que dei a atitude do Carlos e Inês é flagrantemente imoral»
O “flagrantemente imoral” só se chega depois de pesar os valores todos em jogo. Por exemplo, ao pesar os valores da vida do abortado, da autonomia dos pais, da responsabilidade etc, eu concluo que abortar porque o feto tem o sexo errado é flagrantemente imoral mas abortar porque a mãe foi violada não é. Isto apesar do valor da vida do feto e da relação causal entre o acto e a morte deste ser a mesma. Há outros factores em jogo.
O meu ponto, nesta fase, é que não se deve descurar esse factor que é o valor da vida daquele coiso que se vai matar.
Quanto ao Carlos e à Inês, penso que não é flagrantemente imoral, tal como não seria flagrantemente imoral eu poder curar a tua cegueira e não curar. Era bom que o fizesse, e eticamente recomendável, mas não ao ponto de se sobrepor ao valor da minha autonomia de tal forma que fosse moralmente obrigatório fazê-lo.
«Estou a falar na relevância que atribuis a não se conhecer o código genético da futura criança.»
Tudo isto é relevante na medida em que afecta a relação causal entre o acto e a consequência. Já expliquei isso várias vezes, com vários exemplos diferentes.
«A tal lógica de "para cada uma das possíveis crianças a responsabilidade é muito pequena", como se para cada uma das possíveis vítimas do assassino do exemplo, a responsabilidade dele na sua futura morte fosse muito baixa antes do amigo lhe dar o número do BI.»
Antes do amigo dar o número o assassino não cometeu nada de eticamente muito significativo. A mera intenção de matar alguém é pouco relevante. O acto significativo é o acto de matar. Esse cria uma relação clara e inequívoca entre a morte daquela vítima e o acto do assassino. Essa relação nunca existe na contracepção, mas existe no aborto.
(continuado)
ResponderEliminar«Eu noto que tens fugido às minhas perguntas.»
Curiosamente, o que me parece é que tens fugido às minhas respostas :)
Tive de te dizer várias vezes que não me interessa os rótulos. Penso que finalmente aceitaste que a questão da “pessoa” não importa. Disse-te várias vezes que a relação causal entre o acto e o resultado é eticamente relevante, mas continuas escrever como se nunca o tivesse mencionado. Etc...
«julgo que é perfeitamente criticar o teu ponto de vista como incoerente sem ter de apresentar o meu.»
Mas pelo menos convém considerares o meu :)
Resumindo, os fundamentos:
Os valores são subjectivos e são avaliados por cada sujeito. O valor de uma vida não é função de acharmos que é pessoa, não é ou o que for, mas sim o que esse sujeito viverá ao longo de toda essa vida.
O impacto de cada acto é a diferença entre os valores que daí resultam, entre as várias alternativas. Curar a cegueira ou não curar, cegar ou não cegar, abortar ou não abortar, etc.
A relevância ética dessa consequência é tanto menor quanto a mais fraca for a relação causal. Se estás cego porque já eras e não te curei é menos mal do que estares cego porque te ceguei. Se nunca chegas a ser concebido porque não te concebi é menos mau do que se te mato durante a gestação.
Isto não me parece incoerente nem no caso da Inês nem no assassino do BI nem em nenhum desses exemplos que tu dás. Aplicar estes princípios funciona bem com os direitos animais, com os direitos humanos, etc. E parece bem mais consistente do que a decisão arbitrária das 10 semanas, ou a ideia de que não vale porque não tem o rótulo certo, ou de que se pode matar porque depende de nós, etc.
Nuvens,
ResponderEliminar«mas preocupas-te com vidas imaginárias que fetos que ainda nem se sabe se vão ser viáveis têm sobre vidas reais.»
Se por “vida real” queres dizer o presente, então o impacto do feto é pequeno. Uns enjoos, azia, dores nas costas, e passa em poucos meses.
Se por “vida real” queres dizer a mulher não querer ter um bebé, mudar fraldas, passar noites em claro, gastar imenso dinheiro, ter imensas responsabilidades, etc, então não faz sentido considerar isso mas não considerar a vida do borboto a quem ela vai mudar fraldas, que a vai acordar durante a noite, etc.
Já agora, a vida de um feto que vai ser abortado é real. Se não fosse, o aborto seria espontâneo e não haveria problema ético nenhum...
João Vasco,
ResponderEliminar«E se calhar comparar com as acções alternativas, não?»
Claro. Mas às tantas aborrece-me um pouco ter de repetir sempre as mesmas coisas...
«Na mensagem posterior a esta, o que era relevante não era saber quem nascia, mas o que era resultado de uma decisão activa e passiva.»
Não. Em todas as mensagens o que era relevante era a relação causal entre o acto de um sujeito e o seu impacto noutro sujeito. O que varia é a forma de descrever isso e a forma de deturpares o que eu escrevo. Mas o relevante foi sempre isso. Tudo o que afecta essa relação causal afecta a avaliação ética dessa decisão.
Ludwig Krippahl
ResponderEliminarSe por “vida real” queres dizer a mulher não querer ter um bebé, mudar fraldas, passar noites em claro, gastar imenso dinheiro, ter imensas responsabilidades, etc, então não faz sentido considerar isso mas não considerar a vida do borboto a quem ela vai mudar fraldas, que a vai acordar durante a noite, etc.
porque se a mãe não o quer não temos possibilidade de mudar a situação sem a piorar. essa a consequência de sermos livres - podermos escolher, e o aborto é uma das escolhas possiveis num caso desses, gostemos ou não das consequencias
Já agora, a vida de um feto que vai ser abortado é real.
não é real, é potêncial, como gostas de viajar no tempo e fazer com que o futuro possa interferir no aqui e agora não podes descartar que aquele feto venha a ser um aborto num futuro possível. é apenas uma probabilidade, anda mais.
onde é que num planeta com 9 biliões de seres humanos , numa lógica quantitativa vamos dizer que uma vida é importante ?
quanto menos melhor, o planeta agradece
deixar que probabilidades tenham direitos é muito estranho :)))
resumindo, a forma de avaliar o aborto para o LK seria caso a caso, olhando para a situação em particular e decidindo de acordo.
ResponderEliminaraté posso concordar o problema é que não serve de nada esse tipo de abordagem
- não se pode proceder assim e a lei tem de ser geral
- não adiantava de nada se a decisão feita não se sabe por que conselho de sábios fosse contra a vontade da mãe
seria uma perdade tempo e dinheiro pior que a lei anterior e colocaria pessoas escolhidas por um qualquer processo discricionário a decidirem sobre as vidas das outras, vidas concretas e não vidas "futuras"
é uma solução com contornos muito sinistros.
é esta a leitura que faço do que é possível entender do que seria a aplicação À prática daquilo que defendes
prefiro o estado actual, por muito mau que seja é melhor serem as próprias pessoas as decidir sobre a sua descendência
João Vasco,
ResponderEliminarTalvez alguns exemplos ajudem a resolver o nosso desentendimento.
Um homem assina o projecto de uma ponte sabendo que isso vai matar cerca de 10 trabalhadores, mas não sabe quem. Outro põe uma bomba numa rua sabendo que vai matar cerca de 10 transeuntes, mas não sabe quem.
A diferença ética está, como sempre tenho defendido, na relação causal entre os dois actos. Quando um trabalhador morrer, será em parte porque o homem assinou o projecto, mas em parte porque se esqueceu de por o arnês, em parte porque não teve cuidado, em parte por outra razão qualquer. Quando um transeunte morrer, será principalmente e acima de tudo por causa da bomba. Neste caso desconhecer as vítimas não é importante, é igual em ambos os cenários.
Quando um médico dá um medicamento ao paciente A e não ao B, sabe que B vai morrer. Quando dá ao paciente A sabendo que poderá vir aí um B, quando B chegar e não houver medicamento, vai morrer. Neste caso faz alguma diferença se B já lá está ou se é uma possibilidade porque, no segundo caso, a relação causal entre a morte de B e a decisão de dar o medicamento a A torna-se mais fraca.
E assim por diante. Com certeza podes encontrar exemplos é que é difícil comparar se a relação causal é mais forte ou mais fraca, e ponderar quais são os factores mais importantes (se as probabilidades, a intenção, se em retrospectiva depois do acto cometido, etc). Mas isso são dificuldades práticas que não são importantes para o meu ponto principal: o valor da vida do coiso que se aborta (feto, humano, ovo*, pessoa, zebedoing, o que quiseres chamar-lhe) é um factor relevante e um daqueles que se tem de tomar em consideração para avaliar essa decisão.
O outro ponto, menos relevante mas onde insistes também, é que no caso da contracepção, a relação causal entre a decisão de usar preservativo e o não nascimento da Maria, do Manuel, do Miguel, etc (vezes milhares de milhões) é muito mais ténue do que a relação entre a decisão de abortar e a destruição da vida daquele coiso (que também se pode chamar Manuel, ou Maria, mas não é o nome que importa).
Finalmente, é preciso avaliar as alternativas. Isso (pensava até recentemente) não é preciso dizer.
Nuvens,
ResponderEliminar«porque se a mãe não o quer não temos possibilidade de mudar a situação sem a piorar.»
Se o aborto é a solução menos má, então que venha o aborto.
Mas isso não tem nada que ver com o facto de ser preciso considerar a morte daquele que se está a matar no aborto, e o valor da vida que ele teria se não fosse abortado.
O facto de preferires o carro pior por ser mais barato não torna falso o facto do outro ser melhor, apesar de mais caro. Dizer “ah, o outro não presta” quando isso é falso é outro exemplo dos tais atalhos que critico.
«Curiosamente, o que me parece é que tens fugido às minhas respostas :)»
ResponderEliminarNão é que eu fuja das respostas que dás (outras não dás), mas sim que elas se contradigam.
Se afirmares duas premissas contraditórias podes provar o que quiseres.
Quando te chamo a atenção para uma falha, podes sempre dizer que isso está em contradição com outra coisa que afirmaste, e que portanto não tive em atenção tudo o que disseste. Mas o problema é precisamente afirmares coisas contraditórias.
Por exemplo, falas na "força" da relação causal. Mas o que queres dizer com isto varia conforme o contexto, como mostrei.
Por exemplo, se eu agora decido ir salvar uma pessoa, mas posso salvar uma entre milhões, e lanço dados para deixar ao acaso a escolha. A força da relação causal não muda: em resultado da minha decisão, uma pessoa foi salva, chamemos-lhe Miguel. Para essa pessoa a "força" da relação causal entre a minha decisão de salvar alguém e o seu salvamento, parece-me que alegas, é total. Não foram os dados que a salvaram, fui eu.
Mas se um casal decide ter um filho em vez de não ter nenhum. A lotaria cósmica faz com que nasça, entre tantas crianças possíveis, o Miguel. Qual foi a força da relação causal entre a decisão do casal e a existência do Miguel? Como dizer que é reduzida?
Mas se é forte, é extramamente louvável ter filhos. Quer dizer que quase todos os casais têm esse acto extremamente louvável. O casal que não tem filhos, ao contrário dos casais que têm, não comente esse acto tão nobre.
O casal que tem 11 filhos deveria ser objecto da nossa admiração moral. O valor que a vida de cada um desses filhos dá a ela própria, e uma relação causal fortíssima. Como quem "salva" 11 vidas.
É quando dizes que isto não faz sentido, que contradizes os teus fundamentos.
«Já te disse que defendo A, em contradição com isso.»
Pois, mas se isto decorre do que escreveste, como mostrei, estás em contradição.
Pois
O casal que tem 11 filhos deveria ser objecto da nossa admiração moral.
ResponderEliminardesde que não vá jantar ao mesmo restaurante que eu enquanto eles tiverem menos de 21 anos está-se bem, caso contrário....
João Vasco,
ResponderEliminar«Por exemplo, falas na "força" da relação causal. Mas o que queres dizer com isto varia conforme o contexto, como mostrei.»
Não. O que depende do contexto é a força da relação causal, não o que eu quero dizer.
«Por exemplo, se eu agora decido ir salvar uma pessoa, mas posso salvar uma entre milhões, e lanço dados para deixar ao acaso a escolha. A força da relação causal não muda: em resultado da minha decisão, uma pessoa foi salva,»
Concordo. Quando salvas a pessoa – é esse o acto eticamente relevante – temos uma relação clara entre o teu acto e o salvamento. Independentemente se lançaste dados antes ou não.
«Mas se um casal decide ter um filho em vez de não ter nenhum.»
Aí também. Essa decisão tem uma relação causal clara com o filho que nasceu.
«Mas se é forte, é extramamente louvável ter filhos.»
Sim, acho que ter filhos cuja vida tem muito valor, é louvável na medida em que se contribui para o valor dessa vida (nota, no entanto, que boa parte do mérito desse valor poderá vir do filho; a decisão dos pais acaba por se diluir numa data de coisas que dão valor àquela vida).
«O casal que tem 11 filhos deveria ser objecto da nossa admiração moral.»
Isso já não sei. Não percebo como a admiração moral será um dever. Mas o casal que tem 11 filhos e há uma relação causal forte entre as decisões do casal e o valor das vidas desses filhos, agiu de forma eticamente louvável. Não me parece uma conclusão disparatada. Se tens uma boa vida e és feliz graças, em grande parte, ao que os teus pais fizeram por ti, não achas que agiram de forma louvável? Não achas que é mais louvável do que se decidissem nunca te ter tido? Eu acho que sim, no meu caso, mas da tua vida saberás tu melhor :)
O que rejeito é a tua ideia de que isto implica ser moralmente condenável não ter filhos ou usar contraceptivos. Essa é que está errada, tão errada como dizer que é moralmente condenável não escolher ser nadador salvador como carreira profissional. Salvar pessoas é louvável, mas não ser salvador é perfeitamente aceitável. Precisamente porque as relações causais entre cada afogamento e a opção de carreira e entre a inexistência de cada possível filho e a decisão de não os ter, são tão ténues que tornam a decisão eticamente irrelevante (e se tem de assumir que a vida de quem se afoga não tem valor por, nesse momento, estar totalmente dependente do nadador salvador...).
Oops... "(e se tem de assumir" devia ser "(e não se tem de assumir"
ResponderEliminarJá agora, um esclarecimento, antes que o João Vasco me salte em cima :)
ResponderEliminarA relação causal entre as decisões dos pais e o valor da vida do filho vai-se cimentando com o tempo. No início, na concepção, é muito pequena. Mesmo a decisão de não usar preservativo afecta apenas muito pouco a probabilidade de conceber aquele sujeito em particular, e dilui-se no grande número de acontecimentos que levam a que seja esse a existir e não um dos muitos milhões de outros.
Mas a partir daí, desde a mãe deixar de fumar e tomar o folicil, às noites a dar de mamar, aos passeios no jardim, aos brinquedos, carinhos e assim por diante, o valor da vida desse ser pode ser uma consequência muito ligada aos actos dos pais.
E se o meu sistema me obriga a aceitar que isso implica que os pais que agem assim agem de forma eticamente louvável, não vejo problema nenhum nisso.
«O casal que tem 11 filhos deveria ser objecto da nossa admiração moral.»
ResponderEliminarIsso já não sei. Não percebo como a admiração moral será um dever. »
Caramba! Não digo isto no sentido de ser um "dever". Mas sim no sentido lógico. Pela tua lógica deveríamos concluír isto.
Ou seja, acreditas que ter 11 filhos é análogo a salvar 11 vidas. Para ti não é absurdo.
Escolher ter zero filhos em vez de dois é como escolher salvar zero vidas em vez de duas, mas não há nada de censurável nessa escolha.
yup...
PS- A questão do nadador salvador é diferente, porque aí existe a obrigação profissional ao barulho, que baralha um bocado as coisas.
Sim, acho que ter filhos cuja vida tem muito valor, é louvável na medida em que se contribui para o valor dessa vida (nota, no entanto, que boa parte do mérito desse valor poderá vir do filho; a decisão dos pais acaba por se diluir numa data de coisas que dão valor àquela vida).
ResponderEliminaresta tentativa de quantificar as coisas parece-me não dar grande resultado, tem tantas contradições que continuo a preferir a minha forma prática de analisar o problema.
há solução ? não então próximo
é que senão caímos num labirinto sem solução
João Vasco,
ResponderEliminarJoão Vasco,
«Caramba! Não digo isto no sentido de ser um "dever". Mas sim no sentido lógico. Pela tua lógica deveríamos concluír isto.»
É por isso que a seguir considerei essa interpretação da expressão...
«Ou seja, acreditas que ter 11 filhos é análogo a salvar 11 vidas. Para ti não é absurdo.»
Se por análogo queres dizer equivalente, não, não acredito nisso. O simples facto de ter 11 filhos (i.e. fazê-los e parí-los) não equivale a salvar 11 pessoas de morrer afogadas, por exemplo.
Mas isto é fácil perceber. Imagina que os teus pais te tinham abandonado à nascença. Se a única coisa que fizeram por ti foi esquecerem-se de tomar contraceptivos, então pouco lhes deves. Menso que ao salvador que te tirou da piscina quando eras miudo.
Mas imagina que, ao contrário, os teus pais sempre te amaram, fizeram muito por ti e contribuiram imenso para que tivesses uma vida boa e à qual dás grande valor. Nesse caso, diria que lhes deves mais a eles que ao nadador salvador que te tirou da piscina quando eras miúdo.
Nota importante: isto não é por uma vez querer dizer umas coisas e outra vez querer dizer outras. Eu estou sempre a avaliar isto em função do impacto que as decisões têm nos valores e na relação causal entre a decisão e a variação nos valores em cada individuo afectado. O que se passa é que as circunstâncias podem ser muito diferentes de caso para caso.
«PS- A questão do nadador salvador é diferente, porque aí existe a obrigação profissional ao barulho, que baralha um bocado as coisas.»
Ah estás-te a contradizer. Primeiro dizes salvar, depois já não é salvar, agora é obrigação profissional e já estás a dizer que o nadador salvador tem a obrigação de abortar pais de 11 filhos. AHA!
(ok, estou a brincar, mas apeteceu-me desabafar :)
Nuvens,
ResponderEliminar«esta tentativa de quantificar as coisas parece-me não dar grande resultado, tem tantas contradições que continuo a preferir a minha forma prática de analisar o problema.
há solução ? não então próximo»
Isso era bonito se fosse possível identificar soluções sem quantificar se são boas ou más. Infelizmente, sem o fazer arriscas-te a ter "soluções" bem horríveis...
«Mas isto é fácil perceber. Imagina que os teus pais te tinham abandonado à nascença. Se a única coisa que fizeram por ti foi esquecerem-se de tomar contraceptivos, então pouco lhes deves. »
ResponderEliminarConcordo com isso. Mas está em gritante contradição com os princípios que antes enunciaste.
Ora vejamos:
1) decisão de não tomar contraceptivos
«Os valores são subjectivos e são avaliados por cada sujeito. O valor de uma vida não é função de acharmos que é pessoa, não é ou o que for, mas sim o que esse sujeito viverá ao longo de toda essa vida.»
Vamos supor que dou muito valor à minha vida.
«O impacto de cada acto é a diferença entre os valores que daí resultam, entre as várias alternativas.»
Neste caso a alternativa seria eu não existir. Temos um impacto elevado.
«A relevância ética dessa consequência é tanto menor quanto a mais fraca for a relação causal.»
Neste caso a relação causal é directa. Se não tomassem essa decisão, eu não existia.
Pelos teus princípios, eu muito lhes deveria. Mas tu rejeitas isso.
Parece-me uma contradição flagrante.
João Vasco,
ResponderEliminarPrimeiro, quero apontar que não estamos a falar de contradições no critério de avaliação, apenas a discutir o mérito de ter filhos e abandoná-los, e como calculá-lo.
Supõe que dás grande valor à tua vida e que tudo o que os teus pais fizeram foi não usar contraceptivos e abandonar-te. Se tivessem usado contraceptivos, tu não existias. Mas, por não usar contraceptivos, apenas deram uma pequena probabilidade à tua existência. Se fizeres bem as contas, a probabilidade de teres sido tu a nascer sabendo apenas que não usaram contraceptivos era muito pequena.
Portanto, quando entras em conta com a relação causal, o valor ético desse acto de não usar preservativo é muito pequeno, correspondendo apenas a uma fracção minúscula do valor da tua vida.
Mas tudo o que fizessem a seguir, caso cuidassem de ti e contribuissem para o valor da tua vida, tudo isso iria fortalecer a relação causal entre tu teres uma vida boa (tu, não um hipotético filho abstracto com milhões de possibilidades diferentes) e as decisões deles. E isso tem mérito.
«Neste caso a relação causal é directa. Se não tomassem essa decisão, eu não existia.»
Mas, tomando-a, não fizeram mais que dar uma pequena hipótese à tua existência.
Supõe que alguém deixa cair uma moeda, tu encontras a moeda, serve-te para fazer uma chamada importante da cabine quando o telemóvel pifou, graças a isso consegues a entrevista para o emprego, consegues o emprego, és promovido e ao fim de vinte anos és um poderoso homem de negócios. Podemos dizer que deixar cair essa moeda teve um grande impacto na tua vida. Mas não podemos dizer que foi eticamente louvável porque esse acto (mesmo que fosse propositado) apenas te daria uma pequena hipótese. O resto veio de ti e de outros factores.
Mas se, em vez da moeda, te dessem um tiro na nuca, aí tínhamos uma situação bem diferente.
Não me parece que haja uma inconsistência na minha abordagem, até porque é um utilitarismo bastante corriqueiro e testado (o valor é o que cada um dá, e o mérito ético de um acto depende da relação com as consequências). O que me parece é que não estás a considerar bem a relação entre acto e consequência. Não podes dizer que a causa principal da Microsoft foi o pai do Bill Gates se esquecer do preservativo. É um factor, mas entre muitos...
Isso era bonito se fosse possível identificar soluções sem quantificar se são boas ou más.
ResponderEliminarneste caso só tens uma solução , todas as alternativas foram experimentadas com resultados nada animadores
podes ter razão no campo dos princípios, mas a realidade desmente-te : )))
a vida é tramada ; )
«Infelizmente, sem o fazer arriscas-te a ter "soluções" bem horríveis... »
ResponderEliminarNão inventes, Ludwig :) Matar ovos não é horrível, horrível é matar galinhas. Há um eterno retorno ao erro que te apontei desde logo, porque confundes a natureza de sujeitos diferentes ainda por cima numa instância em que não há sujeito nenhum que valha a pena considerar. Só pode dar buraco.
Eu não advogo a banalização do aborto, já agora. Penso até que as pessoas fazem muito bem um evitar um gesto que significa nada mais nada menos do que a falência de uma das suas competências humanas mais significativas, que é evitar os erros em vez de os lamentar. Mas para ser franco gostava que mesmo aqueles que se dizem “contra o aborto e a favor da despenalização” se deixassem de discursos bacocos das pessoas de bem. O que está em causa no plano ético é o valor objectivo de um embrião com semanas (aprox. = 0). O resto é conversa fiada. Sorry.
sorree, raios.
ResponderEliminarsorry, gaita.
ResponderEliminarLudwig:
ResponderEliminarEntras novamente em contradição.
Quando falei no indivíduo que escolhia salvar uma pessoa ao acaso, disseste que a sua responsabilidade por salvar aquela vida em particular era quase total. Que a "força da relação causal" era grande. Mesmo quando em resultado da sua decisão de salvar, a probabilidade de ter sido aquela pessoa em particular fosse muito pequena.
Isso é intuitivo, e podemos discutir se é correcto ou incorrecto. Mas eu assumi como correct e logo te apanhei em contradição.
Agora, quando sabemos que foi a minha vida e nenhuma outra que resultou do não uso da contracepção, dizes que a força da relação causal foi reduzida.
Então em que é que ficamos? Se tanto poderia ser eu como o Miguel, como o Joaquim, etc, a ser salvo pelo Joel, mas fui eu, atribuimos a grande fatia da responsabilidade ao Joel ou à lotaria cósmica?
E se em vez do Joel for o casal que me concebeu e me abandonou depois do nascimento?
Porque é que a resposta seria diferente?
Ludwig,
ResponderEliminar«A questão é se tu defendes mesmo que a dependência (temporária) legitima matar alguém. Se sim, posso tentar explicar porque discordo desse princípio, que considero injusto. Se não, então o mais prático é admitires que isto é só um atalho pelo qual queres simplificar a questão do aborto e não um princípio que sequer defendas»
Nem uma, nem outra. Eu não defendo que é a dependência/independência do ovo/embrião/feto que torna legítimo o aborto. E tão pouco acho que seja um atalho.
Se calhar não me fiz entender bem, mas o que quis dizer foi que uma das qualidades da vida humana, a independência, não é desrespeitada nos limites "à esquerda" e "à direita" de duas situações em que ambos concordamos que é legítimo e ilegítimo, respectivamente, provocar o aborto. Uma simetria de gauge, vá...
O meu argumento não foi aquele que afirmas. Eu compreendo que de facto é difícil seguir uma discussão que passou dos 93 comentários em 26 horas, mas creio que a minha linha de raciocínio não foi compreendida.
João Vasco,
ResponderEliminarSupõe que há 100 pessoas a afogar-se. Tu saltas para a água, vais ter com uma (ao acaso), pegas nela, trazes essa pessoa para o barco. A relação causal entre o teu acto e essa pessoa salvar-se é forte.
Mas se, de um avião, atiras uma boia, uma pessoa apanha essa boia e assim salva-se, a relação causal entre o teu acto e o salvamento dessa pessoa é muito mais ténue.
O facto de, antes de saltares para a água, lançares os dados para veres quem vais salvar não é muito relevante. O relevante é que, chegada a altura de agir de forma eticamente pertinente, o que fizeste foi ir até aquela pessoa e salvá-la.
Mas se atiras a bóia e quem apanhar apanhou, então o teu mérito pelo salvamento do Joaquim é bastante mais reduzido. Porque a tua acção, por si só, não aumentava muito a probabilidade dele se safar se não fosse estar perto da bóia, ir lá apanhá-la, nadar para terra agarrado a ela, etc.
«Agora, quando sabemos que foi a minha vida e nenhuma outra que resultou do não uso da contracepção, dizes que a força da relação causal foi reduzida.»
Sim, porque o facto de ser a tua vida e não outra não se deve apenas ao não uso da contracepção, tal como o facto do Joaquim se safar não se deve apenas a teres atirado a bóia. Há aí muitos outros factores importantes que diluem essa relação causal.
Em contraste, se pegares numa espingarda e matares o Joaquim, ou se a tua mãe te abortasse, aí poderíamos ver uma relação causal muito forte entre o acto e as consequências.
Seja como for, não vejo como os detalhes de como avaliar a relação causal em cada caso (que é onde pareces insistir exclusivamente agora) possam demonstrar uma inconsistência no uso dessa relação como factor relevante para aferir o mérito ético de cada acto.
Qual é a inconsistência do princípio de que a relevância de um acto para as consequências influencía quanto as consequências contam na avaliação desse acto? Parece-me que o contrário é que dá problemas porque, sem isso, se alguém assassina o Manuel tem de se prender também os avós do Manuel por serem igualmente culpados pela situação...
Bruce,
ResponderEliminar«Há um eterno retorno ao erro que te apontei desde logo, porque confundes a natureza de sujeitos diferentes ainda por cima numa instância em que não há sujeito nenhum que valha a pena considerar. Só pode dar buraco.»
A diferença entre um feto e uma pessoa é como a diferença entre Plutão e um planeta. É pertinente apenas para a definição das palavras.
A natureza do feto com nove semanas é igual à natureza do feto com 11, e assim por diante. Se assumires que vem uma alma e se incorpora nessa altura, ainda vá, mas se o que estás a decidir se lhe lixamos o resto da vida ou não, essa "natureza" é irrelevante.
Francisco,
ResponderEliminar«Se calhar não me fiz entender bem, mas o que quis dizer foi que uma das qualidades da vida humana, a independência, não é desrespeitada nos limites "à esquerda" e "à direita" de duas situações em que ambos concordamos que é legítimo e ilegítimo»
Nisso estou de acordo. Por isso é que não me parece relevante o critério da dependência/independência. É independente nos primeiros dias (pode-se desenvolver numa caixa de petri durante uns tempos), é dependente depois durante uns anos, de uma pessoa e depois de várias, e depois torna-se independente, mais ou menos, dentro das limitações da independência humana. E nada disso é pertinente para a ética de o matar.
«mas creio que a minha linha de raciocínio não foi compreendida.»
É o mais certo. Talvez seja altura de formarmos um clube :)
«A diferença entre um feto e uma pessoa é como a diferença entre Plutão e um planeta. É pertinente apenas para a definição das palavras.»
ResponderEliminar?
Como está definido na lei, se é desse aborto que estamos a falar, consideras um embrião. E chamar pessoa a um embrião, mais do que um abuso de linguagem, é um insulto às expectativas do ser humano que te propões defender precisamente ao defender o embrião como se fosse uma pessoa. O que é estranho é que nunca te vi fazer nada do género...
Ludwig:
ResponderEliminar«Supõe que há 100 pessoas a afogar-se. Tu saltas para a água, vais ter com uma (ao acaso), pegas nela, trazes essa pessoa para o barco. A relação causal entre o teu acto e essa pessoa salvar-se é forte.
Mas se, de um avião, atiras uma boia, uma pessoa apanha essa boia e assim salva-se, a relação causal entre o teu acto e o salvamento dessa pessoa é muito mais ténue.»
Concordo. Mas discordo que isso seja relevante para a contradição que te apontei.
No segundo caso podes dizer que a relação causal entre o acto de atirar a boia e alguém se salvar é reduzida porque as consequências previsíveis de atirar a boia não são que alguém se salve, mas sim que a probabilidade de uma pessoa se salvar aumente um bocadinho.
Mas essa distinção aplica-se ao teu exemplo, mas não ao dilema em relação ao qual apontei a tua contradição.
Aí, nesses exemplos concretos que te dei, não conseguiste encontrar nenhum critério que permitisse atribuir "forças da relação causal" diferentes, conforme fazes. E tanto não conseguiste, que foste procurar um exemplo diferente.
«que é onde pareces insistir exclusivamente agora»
Isso porque convém discutir um assunto de cada vez. Já assim é uma confusão enorme.
Bruce,
ResponderEliminar«Como está definido na lei, se é desse aborto que estamos a falar, consideras um embrião.»
Ao organismo da espécie H. sapiens chama-se feto a partir das 8 semanas de desenvolvimento. Se abortas às 10 (salvo seja... :) abortas um feto.
« E chamar pessoa a um embrião, mais do que um abuso de linguagem, é um insulto às expectativas do ser humano...»
Para esse peditório já dei. Não me importa o que lhe chamam. O que importa é que, se o matam, já não vive, se o deixam viver, vive uns 70 anos, durante os quais lhe vão chamar muita coisa com certeza.
Ludwig,
ResponderEliminarSim, de facto a independência, por si só, não chega. Mas é muito importante, creio. E de todos os valores em causa, talvez o mais importante – estamos potencialmente a decidir pela vida de outra pessoa, direito que não nos cabe em muitas situações.
Mas a dependência de que falo não é uma dependência física directa, como uma criança que precisa de mamar. Aí, nem eu sou independente porque preciso de comer... A independência de que falo é a arbitrariedade de destinos dos quais posso vir a depender.
O limite que escolhi é passível de ser revisto. Simplesmente não contraria duas situações em que, creio, é bastante claro ser legítimo e ilegítimo, respectivamente, abortar. Para mostrar que esse limite viola um outro valor importante para aquilo que consideramos a vida humana é preciso encontrar um caso em que ele se mostre fraco. Até agora não conheço nenhum que se me tenha figurado cogente.
«Não me importa o que lhe chamam.»
ResponderEliminarAcho muito bem, porque o que importa é a natureza diferente dos sujeitos diferentes. E como para esse peditório também já dei vou ficar a ver-te levar uma cuecada do João Vasco.
Quanto à diferença de duas semanas que referes, ok. Eu reformulo.
ResponderEliminarBruce,
ResponderEliminar«Acho muito bem, porque o que importa é a natureza diferente dos sujeitos diferentes.»
Então em que é que a natureza de um feto de 10 semanas difere da de um feto de 11 semanas, ou de um recém nascido? Já agora, em que é que difere da natureza de um chimpanzé ou de um humano adulto? Gostava que explicasses como é que isso da natureza te safa.
«Então em que é que a natureza de um feto de 10 semanas difere da de um feto de 11 semanas, ou de um recém nascido?»
ResponderEliminarDe-ma-go-gi-a. Não é possível traçar essa linha, de facto. Mas isso não nos impede de reconhecer que às 10 semanas não há equivalência possível entre um embrião e um ser humano, ou sequer entre um embrião e uma entidade senciente.
"Deixámos de ter nas urgências hospitalares as consequências do aborto clandestino. Praticamente já não fazemos corretagens e isso é um grande ganho em termos de saúde", sintetizou Luís Graça. "Num ano, quase 18 mil mulheres puderam interromper uma gravidez não desejada sem terem de se submeter à indignidade do aborto ilegal", reforça Duarte Vilar
ResponderEliminaristo para mim é o que conta, melhor acesso à saúde.
o problema do aborto poderá ser resolvido com o aumento da educação ou não, mas como tenho um pendor muito pragmático fico muito feliz por esta lei permitir melhorar as condições de vida das pessoas
tudo o resto é musica das esferas, sexo dos anjos, etc
João Vasco,
ResponderEliminarParece-me que já estamos a discutir questões menores. Mas seja.
Assumindo que se sabe, à partida, que em cada um destes cenários se vai salvar uma pessoa, eu proponho por por ordem decrescente de mérito (e de valor ético, portanto), os seguintes intervenientes (em cenários diferentes, tais que em cada um se saiba salvar-se uma pessoa):
Primeiro, o que salta para a água e traz uma pessoa para terra.
Segundo, o que atira uma bóia para o meio dos náufragos, a ver se algum se safa.
Terceiro, o que grita acudam, que esta gente se afoga, esperando depois que venha alguém fazer algo pelos outros.
Apesar de em todos os casos o acto resultar exactamente num salvamento, proponho que valor ético diminui porque a relação causal entre o acto e o salvamento é cada vez menor. E é cada vez menor porque cada vez exige uma combinação de um número maior de factores para que aquela pessoa em particular se salve.
«Mas essa distinção aplica-se ao teu exemplo, mas não ao dilema em relação ao qual apontei a tua contradição.»
O teu exemplo foi “salvar uma pessoa ao acaso”. Mas é preciso decidir como é que esse acaso afecta a relação causal entre o acto de salvar e aquela pessoa ser salva.
No teu exemplo dos dados, é claro que o lançamento dos dados, que precede o acto em causa, é irrelevante. O que é eticamente relevante foi salvar aquela pessoa, seja qual for o resultado dos dados.
Mas se o acaso vem no acto, como o de atirar a bóia e quem se salvar que se salve, então isso pode enfraquecer a relação causal por diluí-la entre outros factores.
Achas que é preciso mais exemplos para explicar isto?
Bruce,
ResponderEliminar«De-ma-go-gi-a. Não é possível traçar essa linha, de facto. Mas isso não nos impede de reconhecer que às 10 semanas não há equivalência possível entre um embrião e um ser humano, ou sequer entre um embrião e uma entidade senciente.»
Mas se, ao enumerarmos as razões desse “reconhecimento”, constatarmos que, seguindo esses critérios de senciencia, cognição e afins, devemos mais respeito a um rato adulto do que a um humano recém-nascido ou anestesiado, isso deveria levar-nos a questionar se serão essas as características mais importantes. Se fossemos minimamente consistentes, claro, o que não se pode exigir a todos ;)
Não é possível traçar essa linha, de facto.
ResponderEliminareu acho que é possível mas desnecessário , o que está em causa é o tempo entre o conhecimento da gravidez 4 semanas e o tempo de se decidir se se quer manter ou não a dita. tem de ser sempre superior a 5 semanas e não deve entrar muito em fases muito avançadas onde de facto é possível questionar porque o estado avançado , porque não uma decisão mais sólida etc
a disponibilidade do aborto apenas pretende evitar os problemas anteriores , não pretende ser uma solulção ética , nunca pretendeu e ´colocar as coisas nessa perpectiva não adianta nada
E é cada vez menor porque cada vez exige uma combinação de um número maior de factores para que aquela pessoa em particular se salve.
ResponderEliminarportanto se eu saltar para a água e salvar um é melhor que se eu lançar um bote e salvar n ?
se eu usar tenologia complexa e uma rede como a protecção civil tenho menos mérito que se andar feito idiota de capa de super heroi a salvar velhinhas na rua ?
oi ?????
Ludwig:
ResponderEliminarTu podes dar os exemplos que quiseres.
Eu apontei-te uma contradição entre uma situação A e uma situação B, em relação às quais dizes existir uma "força da relação causal" diferente, mas não consegues justificar essa diferença com base em nenhum critério.
Para responderes, podes dar inúmeros exemplos de situações C, ou D, ou E, nos quais até poderia existir realmente distinção entre a situação A e essas, e justificar-se aquilo a que chamas "força da relação causal diferente".
Então tu olhas para essas situações, e alegas que como existe distinção justificável entre C e A, também existe entre A e B.
Não importa quantos exemplos arranjes. A minha pergunta foi em relação à situação B, não a essas.
Tu consideras que esta é uma questão menor, mas eu discordo.
Se tu entras em contradição, podes provar o que quiseres, creio que sabes disso.
Se te contradizes na forma como avalias a força da relação causal, e não te apercebes dessa contradição, então todo o teu raciocínio cai como um castelo de cartas.
Francisco,
ResponderEliminar«Sim, de facto a independência, por si só, não chega. Mas é muito importante, creio. E de todos os valores em causa, talvez o mais importante – estamos potencialmente a decidir pela vida de outra pessoa, direito que não nos cabe em muitas situações.»
Estamos a decidir sobre duas vidas. Esse é o fundamental do meu ponto. A decisão é entre 9 meses de gravidez para uma e 70 anos outra ou 2 meses de gravidez para uma e 0 anos outra. A dependência é importante para ver que opções temos (se tivéssemos incubadoras para isso, podíamos optar por 2 meses de gravidez para uma e 70 anos para a outra) mas não serve para decidir que esses 70 anos valem zero.
«Para mostrar que esse limite viola um outro valor importante para aquilo que consideramos a vida humana»
Esse é um problema fundamental, e um erro preocupante. A questão não pode ser determinada pelo que tu ou eu consideramos ser a vida humana. Temos inúmeros exemplos históricos da asneira que é fazer depender questões éticas da definição de termos ou outras classificações arbitrárias. Temos de evitar isso a todo o custo.
Por isso defendo que temos de olhar para as consequências e para como elas são avaliadas por aqueles a quem as alternativas fazem diferença. E não andar a decidir as coisas com base em como definimos as palavras.
João Vasco,
ResponderEliminar«Eu apontei-te uma contradição entre uma situação A e uma situação B, em relação às quais dizes existir uma "força da relação causal" diferente, mas não consegues justificar essa diferença com base em nenhum critério.»
Faz lá copy/paste dessa passagem, por favor, porque com tantos exemplos que já demos não sei a qual te referes.
Ludwig:
ResponderEliminarTu podes dar os exemplos que quiseres.
Eu apontei-te uma contradição entre uma situação A e uma situação B, em relação às quais dizes existir uma "força da relação causal" diferente, mas não consegues justificar essa diferença com base em nenhum critério.
Para responderes, podes dar inúmeros exemplos de situações C, ou D, ou E, nos quais até poderia existir realmente distinção entre a situação A e essas, e justificar-se aquilo a que chamas "força da relação causal diferente".
Então tu olhas para essas situações, e alegas que como existe distinção justificável entre C e A, também existe entre A e B.
Mas tal implicação é falsa.
Não importa quantos exemplos arranjes. A minha pergunta foi em relação à situação B, não a essas.
Tu consideras que esta é uma questão menor, mas eu discordo.
Se tu entras em contradição, podes provar o que quiseres, creio que sabes disso.
Se te contradizes na forma como avalias a força da relação causal, e não te apercebes dessa contradição, então todo o teu raciocínio cai como um castelo de cartas.
ok:
ResponderEliminar«Quando falei no indivíduo que escolhia salvar uma pessoa ao acaso, disseste que a sua responsabilidade por salvar aquela vida em particular era quase total. Que a "força da relação causal" era grande. Mesmo quando em resultado da sua decisão de salvar, a probabilidade de ter sido aquela pessoa em particular fosse muito pequena.
Isso é intuitivo, e podemos discutir se é correcto ou incorrecto. Mas eu assumi como correct e logo te apanhei em contradição.
Agora, quando sabemos que foi a minha vida e nenhuma outra que resultou do não uso da contracepção, dizes que a força da relação causal foi reduzida.
Então em que é que ficamos? Se tanto poderia ser eu como o Miguel, como o Joaquim, etc, a ser salvo pelo Joel, mas fui eu, atribuimos a grande fatia da responsabilidade ao Joel ou à lotaria cósmica?
E se em vez do Joel for o casal que me concebeu e me abandonou depois do nascimento?
Porque é que a resposta seria diferente?»
Nuvens,
ResponderEliminar«portanto se eu saltar para a água e salvar um é melhor que se eu lançar um bote e salvar n ?»
Não. O desfecho melhor é se se salvarem mais. Melhor ainda é saberem todos nadar e salvarem-se todos mesmo sem ajuda.
No entanto, como já expliquei várias vezes, o valor ético de um acto não é apenas função do valor das consequências, mas também da relação causal entre o acto e as consequências.
«se eu usar tenologia complexa e uma rede como a protecção civil tenho menos mérito que se andar feito idiota de capa de super heroi a salvar velhinhas na rua ?»
Pelo contrário. Se optas por usar o método menos eficaz, então tens demérito. Por isso é que frizei que seriam cenários diferentes, e não opções diferentes no mesmo cenário; já antecipava esta picuinhice :)
João Vasco,
ResponderEliminar«Então em que é que ficamos? Se tanto poderia ser eu como o Miguel, como o Joaquim, etc, a ser salvo pelo Joel, mas fui eu, atribuimos a grande fatia da responsabilidade ao Joel ou à lotaria cósmica?»
Se o Joel saltou para a água, nadou para ti e te salvou, então há uma relação causal muito forte entre o acto do Joel e o teu salvamento.
Se o Joel passou de avião, atirou uma bóia e tu, vendo a bóia, te agarraste e te salvaste, o mérito do Joel é diluido pelos outros factores com o vento e as tuas acções.
«E se em vez do Joel for o casal que me concebeu e me abandonou depois do nascimento?
Porque é que a resposta seria diferente?»
Depende de como o Joel te salvou, mas no caso do casal, o que fizeram foi apenas um entre muitos milhões de factores que fizeram com que aqueles dois gametas se juntassem, aquela mórula conseguisse prender-se ao útero, formasses a placenta, te desenvolvesses, etc. A maior parte do que levou ao teu nascimento não foi por causa deles, que apenas contribuíram uma pequena fracção (menos ainda que atirar uma bóia, diria eu, mas não quero estar agora a discutir quantos náufragos teriam de estar na água para que equivalesse aos espermatozóides :)
Nota que estou a repetir o que já disse antes, por isso é que acho injusta essa acusação de fugir ao teu exemplo...
Ludwig Krippahl
ResponderEliminarLOLLLLLL
essa quantificação do mérito ético implica um zero ou qe tipo de grandeza é essa ?
Nuvens,
ResponderEliminar«essa quantificação do mérito ético implica um zero ou qe tipo de grandeza é essa ?»
Zeros, não sei, mas não estou a ver como podes ter um sistema moral sem quantificar culpa, mérito, correcto, errado, etc. É tudo igualmente reprovável e permissível, sem nada ser pior nem melhor que o resto? Nota que assim que tens uma ordenação parcial já tens uma forma de quantificação (a<b<c, etc)
«Mas se, ao enumerarmos as razões desse “reconhecimento”, constatarmos que, seguindo esses critérios de senciencia, cognição e afins, devemos mais respeito a um rato adulto do que a um humano recém-nascido ou anestesiado, isso deveria levar-nos a questionar se serão essas as características mais importantes.»
ResponderEliminarLudwig,
não penses por um segundo que eu tenho dificuldade em reconhecer mais valor a um rato adulto do que a uma gosma de células, mesmo que sejam da minha família. Só não estou a perceber onde queres chegar com o recém-nascido ou a pessoa anestesiada... se estamos a falar nas diferentes naturezas dos sujeitos diferentes, não me parece que esses casos marquem nenhuma diferença com o ser humano.
«Se fossemos minimamente consistentes,»
Eu penso que estou a ser minimamente consistente... até já te tinha dito que essas comparações além de agravarem desnecessariamente a dificuldade do tema incorrem precisamente na confusão que te apontei no meu primeiro comentário (vê-me bem esta consistência :) É que ao defenderes a vida dos embriões estás a demarcar no futuro uma relação de propriedade com uma entidade muito particular: ninguém. Ao defenderes a vida de recém-nascidos estás a demarcar no futuro uma expectativa a que têm direito. Faz uma certa diferença...
É tudo igualmente reprovável e permissível, sem nada ser pior nem melhor que o resto?
ResponderEliminartudo é defensável , eu sou muito pessimista mesmo relativamente a haver uma valoração. penso que há n-valorações e devemos escolher o caminho de menor atrito e não ao caminho de maior benefício
repara tu escolhes o caminho de maximização ( simplificando a coisa em muito ) da potencialidade da situação no momento X.
i.e., em X o feto tem 70 anos de vida e a mãe tem o% de escolha
mas...
para que essa posição seja implementada e partindo do prinípio que a mãe tem vontade em acabar com a gravidez tu teria de a forçar a ter o filho, e como é óbvio essa é uma situação terrível para a mãe.
podes afirmar que aí estamos no lado oposto, 0 anos para o feto e 100% para a mãe, certo.
o problema é que ao contrário do feto que é um ser continuo no tempo a soluçaõ
é de natureza discreta , aliás binária, 0 ou 1, não podemos ter abortos a 50% esquecendo alguns pol+itcos da praça :S
seja ,
para mim e por muita argumentação que possa ser usada, não se podendo forçar uma gravidez , temos de aceitar a escolha da mãe, não encontro saída para este dilema que não seja esta.
mas
podemos evitar as repetições de abortos? não sabemos mas suspeito que sim, como dizia obrigando a consultas, implantando a pílula, não sei pode haver um processo gradativo mas com muito muito cuidado
o que não podemos é forçar pessoas a parir e não podemo entregar pessoas a situações terríveis de infecções e outras situações lamentáveis
não é a melhor escolha a a única escolha que temos quando se escolhe abortar
aliás esta questão pode ficar ainda mais complicada se metermos o pai na coisa contra a vontade da mãe, seja no sentido do aborto seja no sentido contra
ResponderEliminarna série boston legal um dos episódios focava um caso em que uma mulher usava o espema de um companheiro sem a sua autorização e engravidava e ele queria que ela tomasse a pílula abortiva no periodo legal para a coisa, curiosa situação
Ludwig:
ResponderEliminarÉ que tu respondes às contradições que te aponto com mais contradições. A contradição naquilo que escreves é evidente, mas cada vez que te mostro de forma clara, respondes com mais contradições.
Tu dizes que a distinção entre o exemplo da boia e o exemplo do salvador é o mesmo que o do exemplo da concepção e abandono e o exemplo do salvador.
Mas não é. No caso da boia é possível alegar que a falta de "força da relação causal" não se deve a não se saber que indivíduo é que se vai salvar, mas sim ao facto de ser perfeitamente possível mandar a boia e não se salvar ninguém. Digamos até, muito provável.
Se fosse certo que uma pessoa se salvaria com a boia, em resultado de a lançar, o exemplo da boia seria indistinguível do exemplo do salvador a esse respeito.
Saber se seria esta pessoa ou aquela é irrelevante. Saber se o facto de ter calhado a sorte grande a esta ou aquela dependeu de X factores além da decisão de ter lançado a boia é irrelevante. Desde que esses factores não correspondam a uma menor probabilidade de ALGUÉM se salvar. Ou seja, se é quase certo que uma pessoa se salva, é irrelevante se estão lá 100 pessoas e a probabilidade de cada uma ser salva é 1%, ou 1000, ou 2 milhões. É irrelevante se o facto de ter sido esta e não aquela a salvar-se dependeu de X factores além da boia. O que importa é que graças à boia alguém se salvou.
Ou seja, ignorando a distinção entre C (boia) e B (concepção), fica clara a falta de critérios que tens para distinguir qualquer delas da situação A (salvamento).
A dinstinção entre A e C existe, mas só existe enquanto C é diferente de B. Tornas C análogo a B, e essa distinção desaparece, evidenciando a contradição do teu raciocínio.
João Vasco disse...
ResponderEliminarPerseguidor Pidesco:
Ou seja, ignorando a distinção entre P(PIDE) organização de segurança de um estado já desaparecido, ineficiente, burocrática e que dependia de denúncias para ter um baixo grau de eficácia e P (Perseguir),implica consistência no trabalho ou interesse no alvo
tal não sucede, raramente discuto com infantilidades políticas com a mania da perseguição fica clara a falta de critérios que tens para distinguir qualquer delas da situação P (Parvoíce).
A vida é um fenómeno sem par o facto de ter sistema nervoso ou não e de sofrer o que é um antropomorfismo, um sol pensa, uma rocha filosofa...sinceramente não sei, são todos agregados materiais, um fluxo de fotões ou de partículas é diferente do fluxo de cargas que se designam por influxo nervoso?
és de um egocentrismo absoluto miúdo, é comum nos que têm aspirações de mudar o mundo
isto é uma placa giratória nada mais...
Bruce,
ResponderEliminar«Só não estou a perceber onde queres chegar com o recém-nascido ou a pessoa anestesiada... se estamos a falar nas diferentes naturezas dos sujeitos diferentes, não me parece que esses casos marquem nenhuma diferença com o ser humano.»
O meu problema é perceber o que é isso da “natureza” a que te referes. Não pode ser nada com genes, fisiologia, átomos e moléculas, porque disso tenho a mesma natureza agora do que tinha quando tinha 10 semanas de gestação. Tenho mais células e em estruturas mais complexas, mas a natureza é exactamente a mesma.
Portanto presumo que queres dizer que agora penso e falo, sonho, desejo e assim, mas na altura não conseguia fazer nada disso. Só que se estiver anestesiado, em coma, a dormir ou desmaiado também não faço nada disso. E o que me impedia de o fazer às 10 semanas era tão temporário como qualquer um destes problemas, e com um prognóstico melhor que alguns deles.
Finalmente, parece-me que presumes que um recém nascido sente, pensa, percebe e deseja. Isso, parece-me, é treta. Os primeiros meses depois do nascimento são dedicados a mielinar os neurónios do cérebro, e sem mielina aquilo não funciona. Quando nascemos, o nosso cérebro tem a natureza de uma coisa ainda por formar. Os chimpanzés e gorilas já nascem com alguma parte da capacidade cognitiva que terão em adulto. Nós, quando nascemos, somos seres com reflexos mas quase certamente sem senciência.
Portanto gostava que me explicasses o que é, neste organismo que agora te escreve, era de natureza diferente quando tinha dez semanas de gestação, da mesma natureza de hoje quando tinha nove meses de gestação, e de natureza diferente dos ratos e cães...
João Vasco,
ResponderEliminar«No caso da boia é possível alegar que a falta de "força da relação causal" não se deve a não se saber que indivíduo é que se vai salvar, mas sim ao facto de ser perfeitamente possível mandar a boia e não se salvar ninguém.»
Não são factores mutuamente exclusivos. Telefonar para o 112, mesmo sabendo que vai salvar alguém, cria uma ligação causal com o salvamento mais fraca do que, por exemplo, carregar a pessoa inconsciente para fora do edifício em chamas.
O coito ter cerca de 10% de probabilidade de resultar em gravidez sem preservativo tem influência. Haver uma número enorme de espermatozóides tem influência. O resultado depender de muitos factores complexos e incertos para além do acto de não usar preservativo, tem influência. Etc.
Tu estás a dizer que me contradigo sempre que aponto um factor, mas estes não são mutuamente exclusivos. Penso que concordas que o mérito do pai que copula e desaparece é inferior ao mérito do pai que acompanha o crescimento do filho. Isso porque mandar o caroço é só uma parte muito pequena do processo que leva alguém a viver uma vida de valor.
«Se fosse certo que uma pessoa se salvaria com a boia, em resultado de a lançar, o exemplo da boia seria indistinguível do exemplo do salvador a esse respeito.»
Não seria. Porque atirar a bóia deixa muitos outros factores a determinar o salvamento daquela pessoa, incluindo coisas que a própria pessoa faz (ver a bóia, agarrar a bóia, nadar com a bóia). Mas isto já é discutir picuinhices com pouca relevância para a contracepção...
«Saber se seria esta pessoa ou aquela é irrelevante.»
Por si só, sim, é irrelevante. O que interessa é o peso do acto do salvador no salvamento daquele que se salvou. Basicamente, pergunta quanto do que teve de acontecer para se salvar foi feito acontecer pelo salvador. Atirar a bóia dá menos disso do que ir lá salvar a pessoa.
«É irrelevante se o facto de ter sido esta e não aquela a salvar-se dependeu de X factores além da boia. O que importa é que graças à boia alguém se salvou.»
Não podes dizer que a intensidade de uma relação causal é independente do número de outros factores que influenciam o resultado. Isso sim, é uma contradição, porque deita fora o próprio conceito de teres relações causais mais fortes ou mais fracas; todas seriam causas por igual. Se assim fosse, então o avô do assassino seria tão causador da morte da vítima quanto o próprio assassino...
João Vasco,
ResponderEliminarJá agora, penso que detalhes à parte concordas que a relação causal entre o acto e a consequência faz diferença na avaliação ética do acto.
E, independentemente do que divergimos em relação à bóia, penso ser fácil perceber que a relação causal entre matar o Manuel e a morte do Manuel é mais forte que a relação causal entre não usar preservativo e a vida do Manuel que ainda vai ser concebido (em contraste com a da Maria, do Miguel, do Mário, etc..., vezes milhões, qualquer um que podia igualmente ter sido concebidos, mais a probabilidade de não ser concebido nenhum, que ocorre muitas vezes também).
Se concordares também que alterar o estado de algo (matar, bater, salvar, torturar) cria uma relação causal mais forte do que deixar estar como está (não salvar, não matar, etc), então facilmente percebes que, mesmo sendo o valor em jogo o mesmo (uma vida humana), o aborto é eticamente muito diferente da contracepção.
E se aceitares que uma pessoa que decida ter relações sexuais sabendo que isso pode gerar um filho é responsável pelo bem estar desse filho (por exemplo, se for um homem e a mulher engravidar), então a diferença é ainda mais óbvia.
Penso que há pouca necessidade de esmiuçar a diferença ética entre atirar a bóia, uma corda ou molhar os calções.
João Vasco, se ser contra o aborto obriga a pessoa a ser contra a 'não concepção do máximo número possível de pessoas', ser contra o infaticídio não obrigaria tambem?
ResponderEliminarLudwig,
ResponderEliminar«O meu problema é perceber o que é isso da “natureza” a que te referes. Não pode ser nada com genes, fisiologia, átomos e moléculas, porque disso tenho a mesma natureza agora do que tinha quando tinha 10 semanas de gestação.»
Se a natureza a que me refiro fossem os átomos e as moléculas não só terias a mesma natureza de um embrião como serias bastante parecido com uma urtiga, um pássaro ou um diospiro. Agora pensa assim. Se eu der um biqueiro no Perspectiva e ele gritar, diremos: “o Perspectiva tem uma natureza sensível”. Há este sentido comum do termo, para designar a característica fundamental de uma entidade (ou artefacto, no caso do Perspectiva) para um determinado contexto.
«Portanto presumo que queres dizer que agora penso e falo, sonho, desejo e assim, mas na altura não conseguia fazer nada disso.»
Exactamente.
Perguntas-me que fronteira podemos estabelecer entre o embrião e o feto para separar as diferentes naturezas. A dificuldade dessa questão coloca-se apenas se exigires um plano focal nítido que separe as duas fases. Como não há um plano focal nítido, o que te propões é garantir que não há duas instâncias diferentes? Parece-me que tens uma demonstração por fazer bem mais complexa do que aquela que me pedes a mim, porque se um embrião é uma amálgama de células incipiente um feto tardio reúne toda a tecnologia de ponta dos animais superiores.
«Só que se estiver anestesiado, em coma, a dormir ou desmaiado também não faço nada disso. E o que me impedia de o fazer às 10 semanas era tão temporário como qualquer um destes problemas, e com um prognóstico melhor que alguns deles.»
Não. Incorres na lógica da batata que referi lá para cima, que resulta de confundires os sujeitos de naturezas diferentes (que participam num mesmo processo, é certo) numa sobreposição temporal absurda. E ilustrei com um exemplo: “se o meu pão vai ter bolor daqui a uns dias, eu deito-o fora hoje porque é um pão bolorento”. Ao andares com o tempo de um sujeito para trás como se fosse a janela do browser não podes simplesmente teimar que o que vês no passado é aquilo que virá a ser quando há descontinuidades tremendas que és obrigado a considerar entretanto. Até porque nesse caso estavas mesmo a culpar-te pelos derrames de espermatozóides que despachaste inadvertidamente, roubando com isso uma vida boa a tão larga família.
«parece-me que presumes que um recém nascido sente, pensa, percebe e deseja. Isso, parece-me, é treta.»
Eu referi apenas uma “expectativa” natural de um recém-nascido. Penso que estás neste momento a cair num erro que já me apontaste, o de valorizar a questão pessoa. Voltando às naturezas dos sujeitos, o recém-nascido está no grupo abundante dos que pretendem desde logo sobreviver (ou será que a gritaria é só para chatear os pais?), sendo essa a sua expectativa que podemos assumir como fio condutor do seu direito à sobrevivência. Mas insisto que é um erro debater a natureza de uma amálgama de células depois das 10 semanas... que, ao que consta, nunca se preocupou com a dor nem com a morte.
Ludwig,
ResponderEliminar«a relação causal entre o acto e a consequência faz diferença na avaliação ética do acto.»
Concordo. Mas pisar uma pastilha elástica ou pisar um mendigo tem desde logo uma implicaçãozinha na avaliação ética.
EVOLUÇÃO E INFORMAÇÃO GENÉTICA NOVA
ResponderEliminarA evolução implica acrescentar novos genes.
Por isso não se pode confundir selecção natural ou variação da frequência dos genes e alelos dentro de uma população com evolução.
O próprio evolucionista John Endler, no seu livro Natural Selection in the Wild, de 1986, chama a atenção para este erro em que caem muitos biólogos e geneticistas das populações, num capítulo dedicado a definições.
A evolução de um micróbio para um organismo mais complexo, como o arroz ou um ser humano requer a adição de novos genes, codificadores de estruturas e funções inovadoras e mais complexas.
Como se sabe, o organismo unicelular mais simples tem cerca de 500 genes codificadores de proteínas, ao passo que os seres humanos tem acima de 20 000.
Isso significa que se nós tivermos começado como micróbios a partir de uma sopa pré-biótica (algo que está longe de ser demonstrado) muitos genes tiveram que ser acrescentados através de mutações – o único mecanismo disponível para os evolucionistas.
Por outras palavras, deveriam ter existido incontáveis mutações capazes de acrescentar novos genes, codificadores de estruturas e funções inovadoras, mais complexas e integradas.
Essas mutações não poderiam limitar-se a modificar ou recombinar genes pré-existentes, por via da alteração aleatória e descoordenada das respectivas sequências de nucleótidos.
Por exemplo, os genes que contêm as instruções para o fabrico dos nervos e das enzimas que permitem que os nervos funcionem não existem nos micróbios.
Os mesmos tiveram que ser criados “ex novo” se realmente evoluímos dos micróbios.
Existem muitas famílias de genes nos seres humanos que pura e simplesmente não existem nos micróbios, pelo que tem que existir um mecanismo viável de aditamento de novos genes e da respectiva informação (dependente de um código preciso de sequências de nucleótidos).
O problema é que, tanto quanto se pode observar as mutações que se conhecem não têm as propriedades “milagrosas” que os evolucionistas lhes atribuem.
A isto devemos acrescentar o facto de que o projecto ENCODE veio recentemente revelar a funcionalidade de praticamente de todo o genoma, evidenciando a existência aí de vários níveis de informação e meta-informação epigenética (i.e. informação sobre a utilização da informação).
De acordo com os novos conhecimentos, a vida é mais do que os genes.
Quando tomamos em consideração o DNA total, verificamo que a bactéria Micoplasma genitalium tem cerca de 580 pares de bases de nucleótidos, o arroz tem 466 milhões de pares de bases ao passo que os seres humanos têm 3,3 mil milhões. No entanto, os sapos têm cerca de 100 mil milhões de bases pares de bases!
Por aqui se vê que mesmo essa quantidade não é uma medida adequada da complexidade genética.
No dia em que os sapos se preocuparem com questões de genética, biologia, geologia, astrofísica, arquitectura, etc., poderemos começar a desconfiar que são mais complexos do que nós.
A verdade é que, como demonstra o projecto ENCODE, existem ulteriores níveis de informação epigenética extremamente complexa que regula a expressão dos genes, a dobragem de proteínas, a quantidade e qualidade das proteínas e enzimas que devem ser produzidas, a formação das células, etc.
Tudo isso constitui um sistema operativo, baseado em códigos e informação codificada, que a comunidade científica, envolvendo milhares de cientistas e laboratórios científicos, não consegue abarcar.
verificamo? que a bactéria Micoplasma genitalium
ResponderEliminarMicoplasmas não são bactérias ó obtusa pessoa
Bactérias têm uma parede celular com uma dada constituição
os micoplasmas possuem apenas uma membrana flexível, são parasitas obrigatórios apenas afectados pelas tetraciclinas
geneticamente são tão distintos das bactérias como das archeobactérias
logo se lhes chamam bactérias a fonte deve ser da Wikipédia João Vasquista
há tanta informação de lixo na internet
Atalhos ou curto-circuitos mentais....
Família: Mycoplasmataceae
ResponderEliminarGénero: Mycoplasma
Nowak 1929
há classificações pós1980
Bruce,
ResponderEliminar«Se a natureza a que me refiro fossem os átomos e as moléculas não só terias a mesma natureza de um embrião como serias bastante parecido com uma urtiga, um pássaro ou um diospiro.»
Tenho defendido essa tese aqui várias vezes, contra as opiniões de muitos, de católicos a criacionistas, passando por aficionados da tourada. Eu acho que temos todos a mesma natureza, só diferença de grau.
«Agora pensa assim. Se eu der um biqueiro no Perspectiva e ele gritar, diremos: “o Perspectiva tem uma natureza sensível”.»
Eu não. Eu diria que o Perspectiva está num estado em que sente. Tem a subjectividade ligada, por assim dizer. Porque o Perspectiva anestesiado ou desmaiado não teria uma natureza diferente (se bem que fosse mais fácil de aturar).
Se me disseres que há seres incapazes de ligar a subjectividade, e por isso merecem uma consideração ética diferente dos que são capazes, concordo. Não me meto em coisas de natureza, mas concordo que é relevante. É precisamente por isso que defendo que os valores são os de cada sujeito, e que o valor da vida de um pombo é inferior ao dos humanos. Não pela “natureza”, um conceito que me parece pouco útil, mas pelo diferente grau de percepção subjectiva, cognição, etc, dos quais são capazes.
Mas não é necessário que estejam a manifestar essa capacidade em cada instante. Eu anestesiado posso ter tanta consciência de mim como uma barata mas, por reter a capacidade de, mais tarde, ter consciência, a minha vida continua a ter valor. Por outro lado, se estiver em coma irreversível, pode-se dizer que, qualquer que seja a natureza, já dei o que tinha a dar e mais vale desligar a máquina.
É isso que conta. Se esse ser é tal que se espere ser consciente e ter uma vida subjectivamente valiosa. No futuro, claro, porque quando se mata alguém é só o futuro que alteramos. O passado, estando igual nos dois lados da equação, pode-se cortar.
E isso eu tinha tanto às 10 semanas quanto tenho agora.
«Perguntas-me que fronteira podemos estabelecer entre o embrião e o feto para separar as diferentes naturezas. A dificuldade dessa questão coloca-se apenas se exigires um plano focal nítido que separe as duas fases.»
Nada disso. A dificuldade principal é que tanto o embrião como o feto, como o anestesiado e o desmaiado, vão ter consciência. É isso que, eticamente, os separa da batata ou do irreversivelmente comatoso.
« “se o meu pão vai ter bolor daqui a uns dias, eu deito-o fora hoje porque é um pão bolorento”»
Porque aí presumimos que a existência do pão não tem valor para o pão, mas só para ti, por isso podes deitá-lo fora ou guardá-lo pelo critério que quiseres. Podes até guardá-lo precisamente porque, no futuro, vai lá crescer o Penicillum que tu queres.
Mas matar o meu cão porque vou de férias é diferente. A vida do meu cão vale mais para o cão que a “vida” do pão para o pão, e esse valor tenho de o considerar também. Mesmo que nesse momento o cão esteja a dormir, inconsciente, e sossegado na mira da caçadeira.
Se estás anestesiado no bloco operatório, todo aberto, estás inconsciente, insensível, dependente de outro ser humano, incapaz seja do que for. O que determina se é legítimo matar-te ou não é apenas isto: se é possível, no futuro, ultrapassares esses problemas. Se sim, é ilegítimo matar-te. Se não, então anota-se a hora e vaga-se a mesa de operações para quem precise.
É esse o critério que te aplico seja qual for a tua idade. Consegues, no teu futuro, com mais ou menos tempo, pensar, agir por ti, sentir, desejar, etc? Então a tua vida provavelmente terá valor para ti. Se não consegues, então a tua vida nunca te servirá de nada e podemos nós decidir como quisermos.
Bruce,
ResponderEliminar«Concordo. Mas pisar uma pastilha elástica ou pisar um mendigo tem desde logo uma implicaçãozinha na avaliação ética.»
Da parte dos valores. Lembrem-se da receita. A diferença que o desfecho faz nos valores de cada sujeito afectado, pesada pela relação causal entre o acto e esse desfecho. Se sempre que falo de um me apontam o outro tenho de começar a fazer lençóis de copy paste também...
Ludwig:
ResponderEliminarNão respondeste.
De acordo que definir mal uma linha dá azar e de acordo que muitas categorias mal definidas causaram problemas grossos na história da humanidade.
De acordo que regras com menos atalhos são melhores que regras mais rigidas.
Não estou de acordo que a morula seja um ser humano. Não o é para todos os efeitos ( e mais algum). Quem quer validar essa afirmação por crença pessoal parece-me que és tu e não o João Vasco. Aliás, logicamente, se consideras o ovulo equivalente ao ser humano pelo seu potencial futuro estás a dizer implicitamente que não é pelo que ele é agora.
Há muitos atomos de agua que poderão fazer parte do meu corpo se eu não os usar para lavar a loiça. Mas esse significado possivel, é apenas possivel.
TEns de dizer o que há na morula ou embrião que justifique a tua posição, e não apelar para o que ele pode vir a ser.
Eu aceito que um feto de 10 semanas sofra. Rudimentarmente, e provavelmente longe de significado como o de um ser consciente, mas admito sem reservas. Penso que será consensual que o sofrimento é mau, por isso aqui não penso que valha a pena perder tempo.
Agora, sem truques na manga diz lá o que exite num embrião de 8 semanas que te leve a sugerir que - pelo que ele tem e é- ele é um ser humano para todos os efeitos?
Sabendo que tens de tomar decisoes em tempo real - e ja que admites que tem de haver aborto em casos extremos como a crinça de 10 anos gravida de um filho mongoloide gerado por uma violação - tens de dizer onde é que começam e acabam esses casos E se tiver 11 anos? E se o filho for uma quimera com apenas 10% mongolismo? Etc... Algures vais ter de desenhar a tal linha. A não ser que queiras julgamentos ad-hoc personalizados e sem fim à vista.
Sem resolveres estes problemas estas a defender uma posição baseada numa crença pessoal, pois eles são tão válidos como os problemas que apontas e que eu não me oponho (excepto onde notado).
A diferença que o desfecho faz nos valores de cada sujeito afectado, pesada pela relação causal entre o acto e esse desfecho.
ResponderEliminaro erro está que tu inventas um desfecho ideal para o feto , ele crescerá, terá direito a uma educação, viverá até aos 70 anos :)))
ora isso é o que teria de ser provado se houvesse a hipótese de uma máquina do tempo
como não temos temos de partir não do que será mas do que é.
ora no aqui e no agora não me parece que possas afirmar que uma amálgama de células ( que nem se sabe se virão a ser alguma coisa caso o processo seja mantido) pode impor-se à vontade de um ser completo.
João,
ResponderEliminar«Não estou de acordo que a morula seja um ser humano.»
Depende. Se “ser humano” quer dizer “organismo do género Homo”, então é. Se quer dizer “criatura que aprecia poesia, lê e dá opiniões”, então não é. Se for “organismo do género Homo com mais do que 10 semanas porque menos que isso é pouco” então também não é.
Mas isso é discutir semântica e teologia. Para a ética, é irrelevante.
«TEns de dizer o que há na morula ou embrião que justifique a tua posição»
Não, porque a minha posição não se baseia no estado actual do bicho que se mata. A minha posição infiro-a do impacto que o acto tem. Ou seja, das suas consequências. E consequências são sempre no futuro (excepto em casos estranhos da mecânica quântica).
«Eu aceito que um feto de 10 semanas sofra.»
Eu não. Nem com 10 semanas de gestação, nem recém nascido, nem anestesiado, e provavelmente nem se levar uma bazucada na cabeça, porque a explosão destrói o cérebro todo muito antes dos neurónios poderem reagir. Mas nada disso é relevante porque o problema principal de matar um ser é a diferença entre a vida toda que teria se estivesse vivo e sem a qual ficará se o matarmos.
«Agora, sem truques na manga diz lá o que exite num embrião de 8 semanas que te leve a sugerir que - pelo que ele tem e é- ele é um ser humano para todos os efeitos?»
Biologicamente, ser do género Homo. Eticamente, com já expliquei, é irrelevante se é humano ou não. O que é relevante é o impacto subjectivo do nosso acto tem. E esse é fácil de calcular:
A: deixá-lo viver, tem 70 anos de vida com grande valor para si.
B: matá-lo, não tem nada.
Diferença, se o matármos: B-A= - 70 anos de vida
Eliminar 70 anos de vida como as nossas é um custo muito grande para se fazer só porque sim.
« e ja que admites que tem de haver aborto em casos extremos como a crinça de 10 anos gravida de um filho mongoloide gerado por uma violação - tens de dizer onde é que começam e acabam esses casos»
Não, não tenho. Há sempre casos em que é difícil. E não me importo de dar o benefício da dúvida a quem pode falar por si. Não é muito justo, mas em casos fronteira alguém tem de ter o benefício da dúvida.
Mas ainda assim posso dizer que os casos em que se vai eliminar os tais 70 anos de vida como a nossa só por razões económicas ou de conveniência são eticamente condenáveis e deviam mesmo ser moralmente reprováveis e desencorajados.
Nuvens,
ResponderEliminar«o erro está que tu inventas um desfecho ideal para o feto , ele crescerá, terá direito a uma educação, viverá até aos 70 anos :)))»
Não é o ideal. É o valor esperado.
«ora isso é o que teria de ser provado se houvesse a hipótese de uma máquina do tempo»
Se eu te queimar o carro, posso-me safar alegando que talvez te tenha salvo a vida? Não podes provar que não irias ter um acidente mortal, sem uma máquina do tempo...
(Mas olha, se são esses os argumentos agora, acho que é bom sinal para mim :)
Talvez tu tenhas pouca experiencia em estudar casos que têm de ter resolução em tempo real. Isto é, dentro de um prazo limite curto em numa perspectiva da vivencia humana.
ResponderEliminarExistem montes de doenças que são diagnosticadas quando satisfazem determinados critérios. Esses critérios são revistos com grande frequencia e é admitido que a cada momento não são perfeitos.
No entanto sabemos que se seguirmos essas linhas obtemos a melhor resposta possivel dentro de um tempo que ainda é util ao paciente.
Isto é consequente tambem do facto do nosso proprio cerebro funcionar assim. Forma padrões e categorias para identificar esses padroes. Tudo o que tu fazes é admitir que o problema de saber qual a divisão perfeita é, que não sabes e pode não existir, pode ser apenas uma limitação humana, não pode impedir de tomar uma decisão em tempo real.
Porque não tomar nenhuma decisão é uma decisão em si. E justificar isso com a duvida é uma asneira se pudermos classificar umas respostas como melhores que outras. Porque desde a matemática à medicina ou à lei, sabemos que mesmo que não saibamos tudo existem coisas que podemos saber (dentro de um minimo de pressupostos muito básicos).
E por isso é importante dizer quando é que o conjunto de moleculas é um ser humano. É quando estão dispostas em esperma e ovulos? É que quando formam cadeias helicoidais de DNA? É quando formam o ovo (pós fecundação)? E por ai fora.
Meu caro, algures tens de desenhar a linha. Ou mesmo propor uma faixa larga de inderterminação se quisers. Ou propor uma variedade de critérios com leitura lógica (Por ex: Têm de ser 3 verdadeiros da primeira categoria e 2 da segunda ou 2 da primeira e 4 da segunda ou 1 a primeira e 6 da segunda mas se e só se o primeiro da primeira categoria for falso). TEns claro de jsutificar esses critérios.
É o que te digo que não estas a querer fazer. Até finges que tal coisa não existe, apesar de aceitar o caso extremo.
E onde é que consideras que não é ser humano, as espermatogonias ja são? Quando perdermos um testiculo estamos a matar inumeros ser humanos reais e vivos? Somos portadores de uma autentica população de individuos humanos?
Nope. Acho que estamos a cair no ridiculo.
João Amado:
ResponderEliminarEu não fiz essa afirmação.
Os católicos podem ser contra o aborto de forma coerente, por exemplo.
As razões que o Ludwig dá é que têm essa implicação. As que tu dás são diferentes das dele.
«Não são factores mutuamente exclusivos. Telefonar para o 112, mesmo sabendo que vai salvar alguém, cria uma ligação causal com o salvamento mais fraca do que, por exemplo, carregar a pessoa inconsciente para fora do edifício em chamas.»
ResponderEliminarNo caso de telefonar para o 112 existem uma série de decisões cuja implicação pode ser que ninguém seja salvo.
Desde a decisão de cobrar impostos para que esse sistema exista, até à decisão de os pagar, passando pela decisão de escolher essa profissão e não outra, etc...
No caso da boia e da concepção, ao contrário do novo exemplo não análogo que dás - porque não consegues mostrar que a distinção existe nos exemplos CONCRETOS que dei - essas decisões de terceiros não estão envolvidas.
«O coito ter cerca de 10% de probabilidade de resultar em gravidez sem preservativo tem influência.»
Esse argumento é completamente diferente do argumento relativo ao não se sabe se é o Miguel ou o Joaquim que vai nascer.
Se não queres criar confusão, discute uma coisa de cada vez.
Uma coisa são factores que podem fazer com que ninguém se salve, ou que ninguém seja concebido, etc...
Outra coisa são factores que podem fazer com que seja salvo A em vez de B, ou nasça o Miguel em vez da Ana.
«Não podes dizer que a intensidade de uma relação causal é independente do número de outros factores que influenciam o resultado»
Citaste a frase mesmo acima, e logo a seguir fazer uma distorção grosseira.
Eu não disse que é independente desse número de factores que influenciam o resultado, disse que é independente desse número de factores cuja influência no resultado é a de salvar um vez de outro (por oposição a salvar um em vez de ninguém). Este era o ponto chave da minha frase.
«E, independentemente do que divergimos em relação à bóia, penso ser fácil perceber que a relação causal entre matar o Manuel e a morte do Manuel é mais forte que a relação causal entre não usar preservativo e a vida do Manuel que ainda vai ser concebido» ou do que a do Manuel que vai existir quando o ovo der origem a um ser humano, se der.
ResponderEliminarQuando há um aborto espontâneo, não morre um ser humano.
Ludwig:
ResponderEliminar"Mas isso é discutir semântica e teologia. Para a ética, é irrelevante."
Não é irrelevante. Irrelevante é o teu argumento. Quando dizes que é um "organismo que pertence ao genero homo" é uma afirmação vaga para o caso em questão. O embrião naquela fase não é caracterizado por nada que caracteriza o genero homo noutras fases. Para la de qualquer questão de definições para onde tu tentas levar o problema.
"Não, porque a minha posição não se baseia no estado actual do bicho que se mata. A minha posição infiro-a do impacto que o acto tem. Ou seja, das suas consequências. E consequências são sempre no futuro (excepto em casos estranhos da mecânica quântica)."
Certo, as consequencias. Isso faz-me lembrar outras discussoes que tive contigo. Eu apoiava as consequencias como medida de infraçao ou malfeitoria. E surpresa, ainda apoio. Mas não tem a mesma consequencia eliminar uma vida humana em curso que um embrião.
AS ramificaçoes são muito mais simples.
O sofrimento envolvido é muito menor para o embrião. (ausente).
Õ sofirmento envolvido é muito menor para amigos (quais) e familiares - não há uma historia afectiva longa.
Não há ainda definição individual pelo que não estamos a matar uma pessoa. Estamos a eliminar algo menos raro, menos unico, um embriao entre muitos.
As consequencias na sociedade são muito menores mesmo como mensagem ou decrescimo de utilidade - é um embrião entre muitos, sem papel definido - é uma peça que ainda não tem lugar.
Por exemplo se fosse um bebé:
Já tem sofrimento. (os fetos ja têm, se não aceitas isso podemos discurtir noutro dia)
Já causa enorme impacto na familia - e não apenas por sugestão de pontencial perdido - um bebé já é "aquele" bebé, ja teve inumeras repercursoes na vida da familia quando nasce. Ja tem lugar no mundo. Proponho que um feto em muitos casos tambem possa ter.
Um Bebé ja apresenta um grau de individualização razoavel. MEsmo gémeos identicos pode ter ja diferenças grandes devido a varios factores. Já tem uma historia biologica.
Um bebe humano tem um grau de diferenciação que o classifica como homo ja muito elevado. A fragilidade à nascença é uma delas. Mas o tamanho do cerebro e os milahres de neuronios também.
Potencialmente um embriao é muito inferior a um bebé como futuro humano. Até às 12 semanas a natureza reserva-se o direito de terminar a gravidez abruptamente. É muito frequente e leva 1/3 dos embrioes (salvo erro) - pode passar despercebido se não houve diagn+ostico de gravides. Isso acontece porque muitos embriões não são viaveis, pelo que tu não sabes de facto se a afirmação de ter um ser humano potencial é verdadeira. Mas sabes que tem uma margem grande para ser falsa.
Em resumo, um embrião é para todos os efeitos (e para la da definição) um embrião, neste caso do genero homo. E não um individuo do genero homo.
Existem imensas diferenças nas consequencias de matar um embrião e matar um individuo.
A etica tem de se preocupar com isso em vez de dizer que não se pode andar na estrado porque podemos atropelar pessoas. É preciso pensar nas consequencias reais e previsiveis e não apenas completamente hipoteticas.
Matar seres humanos hipoteticos é um crime hipotetico. Para todos os efeitos e para la das definições.
Ludwig:
ResponderEliminarA probabilidade de um embrião com 8 semanas chegar aos 70 anos se não for artificialmente terminado anda perto dos 100%? Nem penses.
Por outro lado, os problemas economicos são relevantes. Filhos infesejados ou sem meios para serem criados, segundo o Levitt do Freakonomics ( e fundamentado por ele estatisticamente) têm uma enorme probabilidade de terem vidas anti-sociais com o sofrimento pessoal e custos sociais que isso acarreta.
Se esse problema pode ser evitado sem sofrimento para o embrião e com um sofrrimento notavel para ninguem a não ser um blogger teimoso(ok, ok, sei que não estas sozinho, mas o teu sofrimento e os que pensam como tu tem de ser contabilizado e não entrar como veto!)
«E, independentemente do que divergimos em relação à bóia, penso ser fácil perceber que a relação causal entre matar o Manuel e a morte do Manuel é mais forte que a relação causal entre não usar preservativo e a vida do Manuel que ainda vai ser concebido» ou do que a de abortar o ovo ou embrião do Manuel que vai existir quando o ovo ou embrião der origem a um ser humano, se der.
ResponderEliminarQuando há um aborto espontâneo, não morre um ser humano.
Joao Vasco:
ResponderEliminar"Quando há um aborto espontâneo, não morre um ser humano."
Exacto. Para mim é aí que está a falacia de muitas argumentações do género.
A equivalencia ovo/embrião/feto - ser humano é falaciosa.
Mas admito que o potencial acrescente valor. Mas não dá equivalencia.
Se eu te queimar o carro, posso-me safar alegando que talvez te tenha salvo a vida? Não podes provar que não irias ter um acidente mortal, sem uma máquina do tempo...
ResponderEliminar(Mas olha, se são esses os argumentos agora, acho que é bom sinal para mim :)
Não é nada disso , tu concluis que a posição de abortar é negativa por implicar a eliminação de uma vida, mas não é uma vida qualquer é uma vida longa, é uma vida isto e aquilo, é uma data de suposições que dão uns toques dourados`à tua argumentação.
não concordo, acho que para o caso é irrelevante o futuro esperado, o futuro imaginado, etc, é indiferente saber se viria a ser um einstein ou um hitler.
o que interessa é que são as pessoas que têm capacidade de decisão que fazem as escolhas .
colocares-te numa posição de julgamento das escolhas dos outros em questões de reprodução é para mim muito perigoso e nada interessante.
mas esta lei nasce de um problema que era o de haver abortos clandestino com consequencias terríveis para as mulheres. mesmo sabendo das consequencias as mulheres abortavam
não me interessa nada se é ético ou não o aborto, interessa-me que existia um problema de saúde pública e que esse problema desapareceu
por isso a lei cumpre o seu propósito
como já disse pode ser melhorada mas no essencial a escolha tem de ser da mulher e sem pressões
atirar culpas de vida futuras é uma das muitas formas que as pessoas usaram para impedir o aborto e empurrar as mulheres para vãos de escadas, havia outras mas é tudo a mesma coisa - colocar do lado de quem escolhe uma falta, uma mancha contra a vida como se a vida fosse algo de imaculado.
mais ainda, o sistema que impede o aborto , seja com que fundamentação for, é um sistema que não funciona
por isso não há alternativa, é como o caso das drogas, os mais retr´+ogrados e conservadores continuam a luta perdida pela moral que segundo eles deverá ser a luta contra o narcotráfico. resultado: um desastre total , um custo social elevadíssimo e os EUA olham agora para o caso português.
negar a realidade com base em teorias do que deveria ser é sempre muito pior do que aceitar alguns males por um bem maior.
no caso do o aborto o bem maior é a saúde da mãe, dado que o feto irá sanita abaixo. compete saber se queremos que isso seja feito em meio hospitalar ou numa casa sem condições.
Mas ainda assim posso dizer que os casos em que se vai eliminar os tais 70 anos de vida como a nossa só por razões económicas ou de conveniência são eticamente condenáveis e deviam mesmo ser moralmente reprováveis e desencorajados.
ResponderEliminarlá está, o tique último de uma escala de valores quantificáveis e que se considera superior Às outras: a imposição a bem da ética . LOL
tudo são razões económicas, com dinheiro infinito não existe razão para não se levar com uma criancinha trissomica a vida toda, até pode ser muito feliz e realizada e viver 70 anos.
mas o melhor são as razões de conveniencia, tudo são razões de conveniencia uma vez que eu é que decido as coisas segundo me convém ou não, porque haveria no caso do aborto de ser diferente ?
a tua posição é que achas mal o aborto e então toca a aranjar toda uma argumentação que sustente isso.
é uma argumentação perigosa , emotiva e ingénua .
perigosa pelo tique de inquisidor desmonstrado
emotiva porque não escapas da ideia que tens da paternidade , chegaste a dizer que ser pai seria uma categoria à parte na compreensão do problema
ingénua porque acreditas que se pode saber os motivos reais de uma escolha
quem seriam as pessoas que iriam julgar se a mulher pode ou não aborta ? quem seria esse grupo de sábios ? leitores de mentes ?
o resultado, como sempre disse, da aplicação à prática da tua ideia seria algo de terrível: impor às mulheres uma gravidez e basear essa imposição em critérios altamente subjectivos e moralistas.
como disse e volto a manter, sendo as alternativas sempre piores, mais vale ficarmos onde estamos.
por muito ue justifiques só podes cair nessa imposição e isso é impensável
João Vasco,
ResponderEliminar«Esse argumento é completamente diferente do argumento relativo ao não se sabe se é o Miguel ou o Joaquim que vai nascer.»
O argumento não é esse. Isso resultava sempre de me pedires mais detalhes e, quando tos dou, ignorares tudo o que está para trás e focares apenas no último detalhe que te dei.
O argumento é este:
O valor ético de escolher uma alternativa em detrimento de outras é função das diferenças nos valores subjectivos que se espera dessa escolha e da relação causal entre a escolha e essas diferenças.
Esta premissa penso que não podes rejeitar e, ao mesmo tempo, adoptar uma ética consequencialista sem seres inconsistente. Por isso vou presumir que a aceitas. E esta basta para que o aborto seja um problema ético significativo e não possa ser despachado apenas como “a mulher que escolha”.
A relação causal entre a opção dos teus pais não usarem preservativo e tu seres o que és agora é muito mais fraca do que seria a relação causal entre a opção dos teus pais te matarem às 10 semanas de gestação e tu estares morto a partir daí.
Aqui podes invocar o que quiseres, seja as probabilidades, a incerteza, os outros factores, tanto me faz. Não concordo com a tua análise da causalidade em detalhe, mas penso que podemos concordar que a relação causal entre te matarem e ficares morto é mais forte que entre não usarem preservativo e teres um curso, emprego, namorada, escrever em blogs, etc. Isto justifica que a contracepção seja um problema ético muito menor que o aborto. Tão pequeno que até nem o considero problema.
Finalmente, proponho que em mais nenhum caso tu justificas um acto com efeitos permanentes e irreversíveis com base numa condição temporária. Se é menor, não vota até aos 18 anos. Não é não vota para sempre. Se está bêbado, não pode conduzir até estar sóbrio. Etc. Nunca há um caso em que se justifique matar algo só por um problema temporário e com bons prognósticos.
Eu estou a ser consistente com este sistema ético. Condeno quem deixe morrer à fome a criança que tem em casa, mas não quem deixa morrer à fome a criança em África. Se bem que seria preferível ajudar esta última também, a relação causal é suficientemente fraca para que o valor ético (que não é igual ao valor subjectivo das consequências) seja pequeno, e abaixo do valor da liberdade de escolha de cada um. É esse o raciocínio que me leva a condenar quem mata um feto que é responsabilidade sua mas não quem decide não ter filhos usando contraceptivos.
Quanto aos outros detalhes, proponho deixá-los em suspenso para quando forem preciso. O ponto mais importante é agora tu justificares porque desprezas o valor daquela vida que desaparece em consequência do aborto. Porque é que essa consequência não conta? Invocar o estado actual desse ser parece-me irrelevante (pode-se matar porque não sente é uma má desculpa)
«Quando há um aborto espontâneo, não morre um ser humano.»
E Plutão não é um planeta. Mesmo que seja verdade (depende da definição dos termos) é eticamente irrelevante. Mais ainda, é um erro axiológico grave decidir questões éticas com base na definição dos termos.
Nuvens e João,
ResponderEliminarHá um problema quando os pais querem controlar a educação dos filhos. Se alguém me disser que não há problema porque os pais é que mandam e podem fazer o que quiser, ou se me disserem que os pais não têm voto na matéria porque a educação é sagrada, eu respondo que estão a simplificar grosseiramente o problema.
É claro que, quando consideramos que tanto os pais como os filhos têm direitos e valores que merecem ser protegidos – mesmo que os filhos sejam novos demais sequer para perceber o valor da educação, ter quaisquer expectativas quanto a isso ou usufruir, naquela altura, do que aprendem – o problema torna-se muito mais complexo do que quando cortamos a direito e tentamos resolver uma caricatura grosseira.
Mas é assim a vida. Há problemas complexos, e o primeiro passo para os resolver é perceber que o são.
Daí a minha crítica a quem quer resolver o problema do aborto cortando uma das partes. Uns arredondam para zero a diferença que a gravidez e o parto fazem aos pais, e outros querem cortar da equação a diferença que ser abortado faz na vida do feto (ou embrião, ovo*, coiso, o caraças que seja). Ambos estão a cometer um erro crasso.
Agora, se me pedem para resolver, em detalhe, o problema dos pais que tiram as filhas da escola aos 10 anos ou o problema das mulheres que abortam, sei lá. É claro que não vou prender toda a gente. Mas o facto de não conseguir resolver o problema não justifica fingir que o problema é mais simples do que na verdade é.
«O valor ético de escolher uma alternativa em detrimento de outras é função das diferenças nos valores subjectivos que se espera dessa escolha e da relação causal entre a escolha e essas diferenças.»
ResponderEliminarO problema aqui é a tua forma inconsistente de avaliar a "relação causal".
Ora dizes que existe uma relação causal fraca entre não conceber o Miguel, e o Miguel não existir; ora dizes que existe uma relação causal forte entre abortar o ovo/embrião, e o Miguel não existir.
E tu dizes que existe uma diferença radical entre as duas situações, mas assim que começo a mostrar como os critérios para avaliar as diferenças que estabeleces acabam por resultar em contradições, alegas que estamos a discutir detalhes.
Eu tento ir a um detalhe cada vez maior, simplificando N factores, para que a tua contradição seja evidente para ti; mas tu chamas exemplos novos, novas situações, novos factores que complicam as coisas, e obscurecem a contradição evidente.
Mas o facto de não conseguir resolver o problema não justifica fingir que o problema é mais simples do que na verdade é.
ResponderEliminaré uma visão ,a minha é que problemas sem solução absoluta e consensual devem ser analisados não pela moral mas sim pela praticabilidade do que se quer implementar, pesando prós e contra e de mente aberta.
bom ou mau, o aborto nos hospitais é um mal menor comparado com a alternativa por isso nem sequer vale de muito andar a pensar mil vezes o assunto.
até ser apresentada uma alternativa viável, não impositiva, que respeite a autonomia e autodeterminação do ser humano, naõ moralista etc , esta lei está muito bem
num mundo imperfeito, esta lei é o que mais aproximado temos à perfeição
Já agora, o uso de fetos em investigaçao é consequentemente imoral ?
ResponderEliminarCurioso estou eu , hummmm
João Vasco,
ResponderEliminar«Ora dizes que existe uma relação causal fraca entre não conceber o Miguel, e o Miguel não existir; ora dizes que existe uma relação causal forte entre abortar o ovo/embrião, e o Miguel não existir.»
Existe uma relação causal forte entre matar o feto e o feto ficar morto, para sempre com 0 de vida.
Existe uma relação causal fraca entre um furo no preservativo e uma vida humana.
Portanto, existe uma relação forte entre o aborto e a eliminação de toda a vida futura daquele ser em desenvolvimento (independentemente do nome), mas uma relação causal muito fraca entre o preservativo e qualquer uma das vidas em particular que a ausência desse preservativo poderia originar, e uma relação muito fraca entre não usar o preservativo e tudo aquilo que dá valor à vida de alguém que venha eventualmente nascer.
Imagina que eu te aponto uma pistola à cabeça. Se disparo, sou a causa principal da eliminação de todo o teu futuro. Mas se não disparo não me torno a causa principal de tudo o que de bom te vier a acontecer nas próximas décadas.
É essa assimetria que te está a escapar.
Nuvens,
ResponderEliminarCriar um embrião numa caixa de petri é eticamente irrelevante porque a alternativa, não o criar, não lhe faz diferença absolutamente nenhuma.
Retirar um embrião do útero para fazer experiências e depois deitar ao caixote é eticamente condenável porque a alternativa, deixá-lo desenvolver-se e viver o resto da sua vidinha em paz, faz uma diferença muito grande para o sujeito que irá viver essa vidinha.
mas isto pode melhorar ainda mais, se o feto tem direito à vida, temos de equacionar procedimentos médicos que possam ser abortivos, como o caso da amnioqualquercoisa.
ResponderEliminarexiste uma probabilidade de aborto de 1% ou assim.
não conheço mais nenhum caso em que sejamos obrigados a uma probabilidade tão elevada de morte sem o nosso consentimento.
acabemos com esse atentado à vida
:O já :D
«Existe uma relação causal forte entre matar o feto e o feto ficar morto, para sempre com 0 de vida.
ResponderEliminarExiste uma relação causal fraca entre um furo no preservativo e uma vida humana.»
Ludwig,
Estás a voltar ao início. Agora posso respnder-te, mas com os mesmos argumentos que já tinha dado e aos quais já respondeste, e a cujas respostas já respondi e por aí fora.
Quando finalmente esmiucei a nossa divergência ao ponto de estar a discutir a coisa ao nível do detalhe em que te contradizias, quiseste voltar ao início em vez de responder. Agora é tudo repetido.
Queres mesmo que repita os argumentos que já dei?
Criar um embrião numa caixa de petri é eticamente irrelevante porque a alternativa, não o criar, não lhe faz diferença absolutamente nenhuma.
ResponderEliminarna na na na , são criados n embriões e depois um ( ou mais) é implantado e os outros são deitados fora.
é vida , toda igual, toda sagrada :)) , não sabemos se saborosa mas de travo porcino.
seja
o ato em primeiro lugar em criar n é logo crimisos pois o fim será o de n-1 ou n-2 abortos. não me parece que o local onde o embrião está seja relevante para aferir da sua qualidade de ser vivo, ou é ou não é.
sendo, o que me parece óbvio temos de descascar a lógica de se devemos, segundo a tua cartilha
ora...
por isso é um ser vivo segundo a tua definição, tem 70 anos de vida , deitar fora esta vida potêncial é mau porque poderia não ser produzida e entre não ser produzida em que mal nenhum é feito e ser produzida em que centenas de anos de vida são deitados fora temos de escolher o melhor, não usar.
estás a ver , acabemos com a medicina reprodutiva, esse grande mal
LOL
salvem o zezinho, só me ocorre isso
The Mycoplama Paradigma ou the candidato paradigma
ResponderEliminaré uma bactéria que perdeu a parede ou uma proto-bacteria ou um perseguidor KGBESCO? GESTAPESCO NUM FIca grande coisa
The universal ribosomal tree depicts the phylogenetic relationships of extant organisms, as inferred from sequence comparisons of ribosomal RNA genes. The boxed dates indicate the minimum age of selected branches, based on paleontological and biogeochemical data. From KNOLL, ANDREW H. A new molecular window on early life. Science 285(5430): 1025–1026, August 13, 1999.
F. Certainly one can draw an internally very consistent unrooted tree of 16S rRNA genes. But does the phylogenetic tree of 16S rRNA genes really reflect the phylogenetic history of the organisms than contain them?
1. All the prokaryotes are CLONAL
São todos vossos antepassados?
Ou são linhas inndependentes que trocaram material genético?
Em qualquer caso estão cá há mais tempo que vós têm talvez uma consciência colectiva
e se calhar até são DEUS
é deixá-los viver a sua vida
Ludwig:
ResponderEliminar"deixá-lo desenvolver-se e viver o resto da sua vidinha em paz, faz uma diferença muito grande para o sujeito que irá viver essa vidinha."
Qual sugeito? Por essa linha também és contra a masturbação e os sonhos eroticos.
Ludwig:
ResponderEliminar"Uns arredondam para zero a diferença que a gravidez e o parto fazem aos pais, e outros querem cortar da equação a diferença que ser abortado faz na vida do feto (ou embrião, ovo*, coiso, o caraças que seja). Ambos estão a cometer um erro crasso."
Não faz mais diferença na vida de embrião do qeu aquilo que ele tem de vida. É aLgo vegetativo, sem consciencia ou intenção.
Estas a ver no ovo e embrião mais do que lá esta.
Ludwig:
ResponderEliminarPara que o asterisco em ovo (*)? Vudu?
Ludwig,
ResponderEliminarToma lá os factos. O valor “em potência” de um embrião, no qual tentas equilibrar uma tonelada de argumentos, é apenas propiciar a fase seguinte de uma sequência. Pelo que as hipóteses são duas.
i) As pessoas querem ter um filho e o valor de um embrião é instrumental, igual ao valor instrumental de tirar as calças.
ii) As pessoas não querem ter um filho e o valor de um embrião é zero.
E uma vez que estás só a teimar no contrário eu posso vestir o meu fato de Capitão Ameijoa e vencer-te na teimosia, ai de mim se não posso! Mas como sou um tipo maquiavélico acho que prefiro votar no Cavaco só para te chatear.
Ludwig,
ResponderEliminarResumindo. (ainda sem o meu fato de Capitão Amêijoa :)
Tu propões uma espécie de teoria unificadora dos gâmetas à terceira
idade que faz todo o sentido se imaginarmos uma simples linha de
continuidade de A para B. Um sujeito, uma vida. Certíssimo. O fiasco é
se em vez de uma continuidade de A para B tivermos uma descontinuidade
entre A1 e A2, entre A2 e A3, …, An e B. E eu só te tenho apontado uma
das primeiras por ser a mais incompatível com a tua teoria da
unificação e a mais fácil para mim de reconhecer. Embrião → Feto. Ou
seja. Gosma → Criatura. Não podes fugir a isto.
Mesmo que apontes boas razões para não chamarmos “natureza diferente”
a cada uma das instâncias desse processo o que não podes de todo é
confundi-las e sobrepô-las. Principalmente se quiseres defender a
partir daqui uma equação ética transversal para lidar com as situações
em que um ser humano perde a consciência ou a autonomia, como se isso
o fizesse equivalente a um outro sujeito sem qualquer tipo de
expectativas, de passado ou ligações com a nossa existência. Porque
não faz. É um “showstopper” que te vejo cometer desde o início.
Outro erro diferente, e este serve como uma luva à parte prescritiva
da tua teoria unificadora (porque “unificadora” neste caso implica
proibição da IVG) é a ideia de que há um futuro que já existe para
cada ser que ainda não existe. E este erro é verdadeiramente exótico.
Justificas a projecção no futuro de uma “inexistência” (o embrião é um
rastilho biológico sem uma gota de subjectividade) com o facto das
acções só produzirem efeito no futuro e não no passado... Não bate a bota com a predigota. Com tanto receio de um
passado sem futuro para o embrião acabas por inventar um futuro sem
passado para um ser humano. Para os efeitos que nos interessam, a
diferença é que o segundo caso é impossível mas tu considera-lo como
elemento unificador da tua teoria.
Contra estes erros me bati valorosamente.
Um erro que não leio nos teus comentários mas que resulta
inevitavelmente da tua ideia sobre o futuro em crédito de um embrião é
a vinculação biológica da mulher (e apenas da mulher) ao serviço da
dívida. Hospedeira de um ser que ainda não é ser, a mulher torna-se ao
primeiro dia depositária não do que ele é, mas do que virá a ser.
Penso que em termos éticos esta acaba por ser a parte mais espinhosa da tua
especulação, no sentido cristão de espinhoso. Estranho portanto que
nenhuma fêmea da ludwiki tenha aparecido para nos recordar que a ética
é muito mais fácil em formato bitaite... talvez numa próxima.
E pronto. Presumo que já não tenhas pachorra mas faço questão de
organizar isto que já tinha dito para quando mudares de ideias ficares
em dívida comigo.
"Estranho portanto que nenhuma fêmea da ludwiki tenha aparecido para nos recordar que a ética é muito mais fácil em formato bitaite."
ResponderEliminarBruce,
quanto a mim, tem explicação: estive fora uns dias, sem computador, e quando voltei este post já ia nos 140 comentários. Juro que não sei quando é que os hei-de ler todos, até porque não há auto-eliminados, ou seja, não são spam do P.
Mesmo só lendo o teu resumo, é mais que claro que preciso de ler o todo para dar uma opinião. Não o tendo feito, calo-me. Tanto mais que se trata de um assunto sobre o qual não tenho certezas :-) Só uma: a decisão deve caber unicamente à mulher, sim, pelo menos enquanto não houver uma forma efectiva de co-responsabilizar o pai por todas as consequências, não apenas as económicas.