domingo, agosto 10, 2008

Treta da Semana: Dr. Karadzic.

Radovan Karadzic foi psiquiatra, activista, presidente da Republica Sérvia, genocida, criminoso procurado e, em paralelo com este último, terapeuta de medicina alternativa numa clinica em Belgrado. Deu palestras como perito em «energia quântica humana» e publicou artigos numa revista da especialidade. Como tinha papeis falsos teve que dizer que tinha deixado o diploma de neuropsiquatria com a ex-mulher. Mas não houve problema. A revista apresentou-o como «investigador espiritual»(1).

Se alguém sem qualificações se faz passar por enfermeiro, cirurgião ou até canalizador topam-no num instante. Mas tretas como a medicina alternativa são mais permissivas. Se não há distinção entre o que funciona e o que não funciona qualquer um pode fazê-lo. É claro que depois de estabelecido o negócio vêm dizer que é preciso “regular” a actividade, “certificar” os praticantes e garantir a “qualidade” da prática. Ou seja, querem tachos. Mas continua a não funcionar.

Quando perguntaram à Sra. Chatfield, da sociedade britânica de homeopatas, se havia alguma forma de distinguir entre medicamentos homeopáticos ela respondeu «só pelo rótulo» (2). É que nestas coisas não há mais nada. O ano passado também apanharam por cá um tal Agostinho Coutinho Caridade que se fazia passar por padre. Celebrava casamentos, baptizados, missas e funerais mas não o descobriram por ter falhado a transubstanciação da hóstia ou por a água que benzia não ficar tão benta como a dos outros. Descobriram que o rótulo era falso (3).

Infelizmente, a dependência do rótulo não se limita a casos em que a imitação e o genuíno são o mesmo. O António Raposo foi professor no ensino secundário durante trinta anos, tendo apresentado um certificado falso de licenciatura em economia(4). Segundo os colegas e alunos, sempre desempenhou as suas funções «na perfeição»(5). Chegou até a presidente do conselho executivo, o que não quer dizer muito mas sugere que não era notavelmente menos competente que os seus pares. Aldrabou, mereceu o castigo, mas preocupa-me que a coisa tenha ficado por aí. Porque o que isto nos diz é que o rótulo não é de fiar.

Se o António era incompetente deixaram-no ensinar durante trinta anos sem notar nada. E se o António era competente então admitir professores no ensino secundário só pelo rótulo talvez seja asneira. Possivelmente a correlação entre uma licenciatura e a capacidade de ensinar crianças é muito ténue. E a matéria leccionada no ensino secundário não exige necessariamente formação superior. O problema não é fácil de resolver. Avaliar a qualidade dos professores é uma tarefa complexa. Mas isso não é desculpa para resolver o problema da forma errada só porque é mais simples.

Moral da história, não se fiem no rótulo. Se a única diferença é o que está no papelinho o mais certo é que o resto seja treta.

1- B92, 22-7-08, Karadžić "practiced alternative medicine"
2- Select Committee on Science and Technology, Examination of Witnesses (Questions 520-539)
3- DN Sapo, Falso padre até a casar era burlão
4- Diário IOL, Falso professor condenado a 18 meses de prisão
5-AEIOU, Falso professor apanha 18 meses de pena suspensa

5 comentários:

  1. off-topic
    Ludwig,
    isto não tem a ver com o tópico, mas serve de sugestão para um post: Proof of Geocentricity.
    Debate onde é feita referência a essa página: Theistic evolution.
    De onde fiquei conhecer essas páginas: VenomFangX is a Geocentrist

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  2. Se a unica diferença é o que está no papel, mais vale escolher o mais "barato", mas saber se a unica diferença é a que está no papel é uma analise à posteriori, e analises à posteriori tem custos, e por isso sai mais barato analisar com base no papel porque a probabilidade de erro é menor.

    Não quero com isto dizer que o papel é tudo, quero dizer que na ausencia de outros dados o papel é tudo. Por isso escolhem-se professores, consultores, medicos e afins com base no diploma, porque é o unico factor de decisão, não podemos escolher professores sem diploma na esperança de correr bem...

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  3. Bizarro,

    «Não quero com isto dizer que o papel é tudo, quero dizer que na ausencia de outros dados o papel é tudo. Por isso escolhem-se professores, consultores, medicos e afins com base no diploma, porque é o unico factor de decisão, não podemos escolher professores sem diploma na esperança de correr bem...»

    Isso assume que há uma correlação entre o papel e as qualidades que se quer encontrar. Se não há, então é o mesmo que atirar a moeda ao ar.

    Concordo que não podemos escolher professores sem diploma e na esperança que corra bem. Só digo é que não se justifica passar a depender dessa esperança só porque eles têm diploma. É preciso mais dados, e nesse caso o diploma deixa de ser absolutamente necessário.

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  4. Mas existe a correlação entre o papel e as qualidades que se quer encontrar, o papel não pode é ser escrito pelo proprio nem pela universidade do manuel joaquim que acordou e achou-se doutor. Claro que a correlação não é absoluta, mas a existe.

    Se eu vir um medicamento aprovado pela FDA muito mais facilmente o compro do que um boião de fruta cheio de uma mistela com um rotulo a dizer que cura tudo.

    Mas não considero correcto contratar para professor (ou seja la que cargo de maior especificidade) não licenciados, porque apenas faz com ninguem queira andar 4 anos a aprender mais do que precisa, para não ter nenhuma vantagem sobre os que não o fizeram. Eu pelo menos não o teria feito se soubesse que não tinha nenhuma vantagem em o fazer...

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  5. Radovan é 1 criminoso, mas tá sendo julgado pq é de 1 país "pequeno".
    Há outros criminosos piores do que ele impunes. Milivoj Asner, antigo Ustasha croata. Kissinger, Bush, Blair etc.

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