Afinal foi mesmo.
O jornal Sol confirmou a notícia: «'Upload' de 146 músicas resultou numa pena de 90 dias de prisão [...] Tem 28 anos, é do Algarve e pôs 146 músicas em upload no Kazaa e Limewire»(1). Como não tinha antecedentes criminais a pena pode ser substituída por uma multa de €1160 mais custas judiciais. Mas agora fica com antecedentes criminais...
Infelizmente, não há detalhes sobre o que ele fez de ilegal. Não se consegue determinar quantos uploads fez examinando o computador dele e o disposto no Artº 68º do Código de Direitos de Autor não se devia aplicar a redes P2P. Este artigo exige autorização do autor para «a colocação à disposição do público, por fio ou sem fio, da obra por forma a torná-la acessível a qualquer pessoa a partir do local e no momento por ela escolhido». Só que colocar «à disposição do público» exige uma infra-estrutura considerável.
Este blog está acessível ao público graças ao equipamento, largura de banda e motores de pesquisa que a Google disponibiliza. Mas se eu puser um ficheiro em partilha a situação é muito diferente. Só quem estiver próximo na rede (mesmo servidor ou a poucos nós de distância em redes distribuídas) é que descobre que eu tenho o ficheiro. A grande maioria dos utilizadores da rede P2P vai encontrar o ficheiro noutros sítios. Além disso a largura de banda e a capacidade do meu computador são muito limitadas. Só uma ou duas pessoas poderão descarregar o ficheiro de cada vez e, mesmo essas, só descarregarão partes do ficheiro. As redes P2P funcionam de forma a que cada um faz, em média, uma cópia para outro. Não há um ponto central que disponibiliza algo a todos. Infelizmente, poucos percebem a diferença.
Outro caso relacionado foi o de um miúdo que «assinou uma declaração de culpa sobre os seus actos»(2):
«Chamo-me N. tenho quinze anos e vivo nos Açores. Por várias vezes, acedi à Internet, onde consultei vários sites e utilizei alguns serviços Peer-to-Peer, como, por exemplo, o Kazaa e o Limewire.
Através desses serviços, fiz downloads de várias músicas, como o "Dei-te quase tudo" e o "Fala-me de Amor".
Depois partilhei-as e disponibilizei-as a outras pessoas na internet. Estes meus actos foram detectados e, no dia 3 de Maio de 2007, a Polícia apareceu em minha casa. Foi ao meu quarto, ao quarto da minha irmã e dos meus pais.
Os polícias correram a minha casa toda e levaram-me o meu computador, bem como os meus CDs e DVDs.»
Isto motivou «um apelo das associações ao endurecimento da legislação aplicável à pirataria.» Revistar casas, tirar computadores a miúdos e condenar a meses de cadeia quem partilha sem sequer se saber com quantas pessoas realmente partilhou é ser muito brando para um crime tão grave como permitir que outros ouçam música sem pagar. Eu prevejo que não vão ficar satisfeitos enquanto a lei não nos obrigar a ir todos os dias à loja deles comprar CDs de bosta musical.
Pois eu aproveito para deixar também dois apelos. Até 2004 o Código de Direitos de Autor não punia ninguém apenas por disponibilizar a obra. Era preciso provar que havia distribuição. A lei foi alterada pela Directiva 2001/29/CE do Parlamento Europeu (3) mas, apesar de tornar ilegal algo que milhões de pessoas já faziam por toda a Europa, a alteração à lei foi meramente burocrática. O meu primeiro apelo é para não deixar que os políticos se safem com estas coisas. Se os obrigarmos, eles escolhem os votos em vez do dinheiro.
Como as discográficas preferem o dinheiro o meu segundo apelo é para bater onde lhes dói. Não comprem CDs às editoras e recordem que o Artº 81º autoriza a reprodução «[p]ara uso exclusivamente privado, desde que não atinja a exploração normal da obra e não cause prejuízo injustificado dos interesses legítimos do autor». Se alguém perguntar, digam que só prejudicam os exploradores anormais e que é em defesa dos interesses do autor porque andam uns idiotas a pôr os fãs na prisão. O dinheiro que pouparem gastem em concertos que é o que mais ajuda os artistas.
1- Sol, Pirataria digital
2- Sapo-tek, Partilha ilegal de música já teve consequências para dois utilizadores e uma empresa, via Remixtures
3- Disponível no Instituto da Informática
Desculpa porque isto vem a despropósito.
ResponderEliminarFui ver o site do Mats mas não encontrei o filme que publicaste há dias. Podes dar uma indicação mais concreta?
Obrigado
Está neste post.
ResponderEliminarNormalmente ligo ao post só quando o post comenta alguma coisa, caso contrário ponho a ligação ao blog.
O chato é que um boicote à compra de CDs é interpretado como um aumento da pirataria.
ResponderEliminarPouco lhes interessa que se esteja a passar um momento de crise em que o dinheiro falta para bens supérfluos.
E fugindo um pouco ao tema, pouco lhes interessa também que um DVD copiado é melhor que um legítimo: um DVD copiado não me obriga a ver 5 minutos de propaganda anti-cópia de cada vez que quero ver um episódio de 30min de uma série.
Pedro,
ResponderEliminarEu acho que um boicote mostrava que muito pior que deixar as pessoas partilhar músicas é querer pôr os clientes na cadeia. Neste momento as pessoas que estão à frente destes lobbies e associações têm a ideia contrária, e penso que perder rapidamente o negócio chamava-lhes a atenção.
Além disso acelerava o fim deste modelo de negócio obsoleto. É como tirar o penso depressa em vez de arrancando um pelinho de cada vez :)
«um DVD copiado não me obriga a ver 5 minutos de propaganda anti-cópia»
E podes lê-lo em qualquer leitor, e os CDs copiados não instalam software que não queres no teu PC, e os jogos crackados não exigem que tenhas o DVD metido no leitor sempre a girar só para ver que é o original e entretanto ir estragando o leitor, etc...
A filosofia é de criar inconvenientes ao cliente para que o produto que vendem não só seja mais caro mas claramente inferior ao que se obtém de borla. O objectivo parece ser mudar o negócio da venda de produtos para a extorsão de indemnizações. Um boicote talvez lhes tire o fundo de maneio para contratar os advogados e mate o mal pela raíz :)
«[...]desde que não atinja a exploração normal da obra e não cause prejuízo injustificado dos interesses legítimos do autor» - dado que eu me recuso a dar dinheiro por um CD, pelos diversos motivos já aqui mencionados, entre outros, posso fazer downloads à vontade, porque não estou a prejudicar os interesses legítimos do autor.
ResponderEliminarAliás, eu até zelo mais pelos interesses do autor, do que se comprasse CDs, dado que se gosto de uma banda, pago para ir assistir a um concerto deles.
Como eu nunca iria comprar CDs, copiá-los não vai causar prejuízo à editora, pois o meu dinheiro não viam de qualquer forma.
Não estou a obter nada que seja um bem físico, sem o qual a editora fica privada de o vender a quem pague por ele, portanto também não estou a "roubar" - não estou a fazer com que eu passe a deter algo material à custa de outra pessoa deixar de o ter.
Será que um argumento destes seria aceite em julgamento?
Raul,
ResponderEliminarO que é aceite ou não num julgamento só se sabe no julgamento porque depende dos advogados e do juíz.
Mas julgo que com a lei que temos não será provável condenar alguém só porque fez download de alguma coisa. O "download ilegal" é pura propaganda.
O que tem sido condenado noutros países, e foi condenado aqui, é partilhar.
De qualquer forma, o que fale no julgamento é a lei e a interpretação do juíz. Este caso é grave porque os juízes geralmente não percebem da tecnologia e a lei foi feita considerando apenas os interesses dos "gestores de direitos". O importante é pressionar para que mudem a lei. Na Suécia isso está bem encaminhado, e lá já vários partidos políticos fazem deste assunto parte do seu programa eleitoral.
Se isso só agora começa a ser um ponto de agenda na política Sueca, só lá pra 2500 é que Portugal chega lá.
ResponderEliminarQuando toda a gente usar i-phones em vez de computadores e lasers projectados na retina em vez de écrans acaba-se esta marmelada.
ResponderEliminarAliás, o capital vais facilitar isto tudo para que a publicidade se proceda como no 'Minority Report':dirigida específicamente ao indivíduo. Para isso toda a gente tem que ter acesso constante e em qualquer lugar. Logo, presumo que mais tarde ou mais cedo a net e todos os downloads possíveis sejam gratuitos, pois os lucros da publicidade serão astronómicos.
bjs
Ludwig,
ResponderEliminarSendo assim julgo que começo a estar convertido à tua tese insurgente. Apesar de não fazer a menor ideia do que é ser fã de uma vedeta pop de forma a compensá-la com abundante pecúlio de bilheteira (sou daquele tipo crominho que por uma questão de pedantismo se entretém a sonhar à distância com estas coisas - http://br.youtube.com/watch?v=FWUvI7bMMB0) também estou saturado de feudalismo.
Mas porque nem tudo é mau e nem tudo é música, faço saber que a Igreja Adventista dos Saldos dos Últimos Dias prepara romagem ao C.C. Colombo com maratona eucarística em honra de S. Belmyro pela boa obra na recuperação da praia de Tróia. Inscrevam-se e habilitem-se ao grande sorteio de uma bonita vivenda nas dunas!
(este anúncio é para ti, jovem, que sempre quiseste pescar da varanda de casa)
Não sou um apologista da industria discográfica, mas tenho uma pergunta:
ResponderEliminarSe eu compuser um tema musical, pagar para a gravar, e com essa gravação editar um album, isso quer dizer que o tema deixou de ser meu?
Ou se eu compuser uma musica, não gravar album nenhum, mas um outro musico a interpretar e tiver um sucesso enorme, eu tenho de me conformar e não fazer nada?
Wyrm,
ResponderEliminar«Se eu compuser um tema musical, pagar para a gravar, e com essa gravação editar um album, isso quer dizer que o tema deixou de ser meu?»
Depende. Se queres dizer teu no sentido de seres o autor, como a teoria da relatividade é do Einstein, então é e sempre será. Se queres dizer teu como um par de calças ou um carro, então não. Não faz sentido seres dono de uma sequência de sons ou da ideia de uma música.
Se queres dizer que é teu no sentido de teres o direito de o tocar sempre que quiseres, então sim. Se queres dizer que é teu no sentido de proíbires os outros de o tocar ou ouvir, então não.
Se queres dizer que é teu no sentido de seres o dono dessa fita magnética, CD, ou o que seja onde está gravado o tema, então sim. Se queres dizer que és dono de qualquer sequência de números ou descrição matemática que permita reproduzir essa sequência de sons, então não.
Etc...
«Ou se eu compuser uma musica, não gravar album nenhum, mas um outro musico a interpretar e tiver um sucesso enorme, eu tenho de me conformar e não fazer nada?»
Se descobrires que uma proteína do HIV é muito conservada, publicares o resultado e alguém usar essa informação para fazer uma vacina e ganhar milhões, azar. Mas nesse caso ainda bem porque o tipo de regulação necessário a que se impeça esse uso da informação seria prejudicial a toda a sociedade.
No caso da música talvez não. Talvez seja benéfico para todos conferir ao autor a exclusividade da exploração comercial durante algum tempo.
Mas em qualquer dos casos o objectivo será a regulação comercial de forma a beneficiar todos. Não se trata de um direito do individuo de proibir o que os outros fazem com essa informação (excepto se for uma questão de privacidade; não sei se te referias a uma obra que tinhas guardado para ti mas que andaram a bisbilhotar para a descobrir).
Durante muitos anos assistiu-se a uma ditadura do "vocês ouvem o que bem nos apetecer", onde os músicos eram o elo mais fraco de toda a indústria, nomeadamente as bandas mais pequenas.
ResponderEliminarA net é uma séria ameaça às editoras e distribuidoras e possibilitará o formato "freelancer" a muitas bandas. A música como formato físico (cd, vinil) penso que estará limitada no futuro (com muita pena minha).
A partilha de informação musical já vem desde há muitos anos quando vieram as agora defuntas cassetes, com o fenómeno "tape trading" nos anos 80, onde as pessoas trocavam cassetes com os seus artistas favoritos entre si, sendo uma alternativa mais barata à edição original para os bolsos menos recheados.
O fenómeno dos downloads não é mais do que a extrapolação desta partilha no mundo global e em formatos bem mais práticos.
Na altura as editoras não o sentiam tanto no bolso. É natural que agora a indústria faça pressão para que se criminalizem e fiscalizem certas e determinadas situações, mas estas pessoas condenadas mais parecem bodes expiatórios para causar medo nos internautas.
PS: Eu compro muitos cds (devo ter uns 600) e nunca fiz um download na vida. Tenho amigos que possuem uma editora independente e muito se queixam dos poucos lucros que têm.
Mas não sou contra a pirataria. É uma boa maneira de prever a compra um álbum menos bom. E quando esse álbum é do nosso agrado defendo que deve ser comprado, quando possível.
Ludwig
ResponderEliminarUma questão só: qual foi a necessidade de entrarem pela casa do miúdo açoreano dentro e levarem o computador quando a prova estava online? E do que adiantou levar os CDs e DVDs? Isto não é mais uma acção espectacular à la ASAE? E isto será mesmo verdade?
Aqui que ninguém nos ouve, eu prendia-o só por ouvir aquela porcaria de música... eeek!
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderEliminarOk! Então de acordo com a tua teoria ninguém é dono das suas ideias.
ResponderEliminarE para ti o aproveitamento do trabalho/ideias/custos de produção de outrem sem qualquer tipo de compensação não só é normal como se recomenda.
Esclarecido. :)
Wyrm,
ResponderEliminar«Ok! Então de acordo com a tua teoria ninguém é dono das suas ideias.»
Ideias são padrões de actividade do cérebro. Ser dono de ideias é um absurdo. Como é que podes ser dono da forma como eu uso o meu cérebro?
«E para ti o aproveitamento do trabalho/ideias/custos de produção de outrem sem qualquer tipo de compensação não só é normal como se recomenda.»
Não. O meu trabalho vendo-o e sou remunerado por ele. Preparo aulas, dou as aulas, faço investigação e recebo o ordenado por isso. Isso é justo porque é uma troca consensual. Há quem me queira pagar e eu quero trocar o meu tempo e esforço por esse dinheiro.
Mas seria absurdo que eu usasse a lei para punir os meus alunos sempre que eles usassem o conhecimento que lhes dou sem me pagar e, desta forma, coagí-los a dar-me dinheiro quando já não estou a trabalhar para isso.
Por isso estou 100% de acordo que um compositor diga aos seus fãs que quer 50000€ para gravar um disco, pagos em adiantado. Se eles quiserem, e basta 2000 fãs dispostos a dar 25€ cada, é uma troca justa e consensual.
Mas estou 100% contra que o tipo grave o disco com os 50000€ da discográfica, esta desconte o dinheiro das vendas, ele receba quase nada e o pessoal seja obrigado a pagar os CDs à discográfica sob pena de ir para a cadeia se os copiar de borla. Esse sistema só fazia sentido quando precisávamos de uma fábrica para fazer as cópias. Agora que as cópias são à borla isso é um disparate.
Pirataria também é culpa dos fornecedores de Internet.
ResponderEliminarAlgo que eu já, faz muito tempo, tinha referido, inclusive tinha dando o exemplo do anúncio da Tele2 que fazia a referência de que o seu produto daria para fazer mais x downloads de músicas, etc... A métrica da velocidade era o download de MP3.
Ou seja, o mesmo que dizer: com a nossa ligação pirateias mais... Presumo que seja claro (sem o mínimo pudor).
ResponderEliminarMário,
ResponderEliminarMais uma evidência que os "gestores de direitos" só atrapalham. Qualquer dia estão a insistir na solução do Elton John...
Ludwig,
ResponderEliminarNão sei se de dás conta, mas estas a ser demagógico.
Já sabia disso, no entanto, o que referes não invalida o que disse.
Incorres na falácia Non sequitur . Pois o que eu referi é que há ISP's que claramente, inclusive na sua publicidade, apresentam o seu produto baseado no facto de ir de encontro ao que não se pode fazer de forma legal; e sobre isto não há volta a dar.
Há uma coisa que nunca referi explicitamente. Presumindo que estaria implícito, refiro-o para não haver dúvidas: sou a favor que quem quer fornecer a sua música à borla o faça, que dê a música; a mulher; os filhos; o piriquito; o diabo... Neste sentido, comungo só em parte das preocupações do Desidério, pois quanto mais borlas houver, mais custos partilhados por quem não consome o produto em causa (não há almoços grátis) ocorrem. Ou seja, mesmo que eu não consuma um software ou uma música, estou a paga-la através do custos de vida mais elevado, devido à distribuição dos custos anexados aos produtos/serviços publicitados
nos bem não essenciais (ficando de fora a educação/saúde etc...). É uma injustiça, eu não quero consumir nada daquilo mas tenho que "chupar" com a conta quando compro uma Coca-Cola. Mas é a vida, é um direito que eles dêem, sendo a minha liberdade limitado quando sou obrigado a pagar (num produto publicitado) algo que não quero (custo da borla de um produto não essencial que não consumo).
Resumindo: quem quiser fornecer de forma gratuita, que o faça; estou de acordo, embora seja injusto o que o sustenta, mas quem não quiser fornecer à borla tem NECESSARIAMENTE o direito de o fazer, porque é que, no teu ponto de vista, não tem esse direito?!?!?!
Há ainda outra situação: um músico ou fazer uma música, tem poder sobre ela. Por exemplo, não a divulga, perderiam os que pagariam por ela (necessariamente). O privilegio da divulgação é algo que tem que ser pago para ser incentivado, caso contrário nada haverá para pagar a quem quer ser pago, perdendo todos: músico e pagador. Isto para quem quer ser pago em detrimento de deixar de fazer música, conheço pessoalmente que tomou esta decisão, havendo dois grupos de pessoas que perderam neste processo, devido à pressão da borla (leia-se, pirataria).
Mas há ainda um facto, quem faz a música, automaticamente, é obrigado a torna-lá gratuita, é uma imposição que está sujeito?
10 Anos de Prisão Para "Seeder" de BitTorrent.
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