Treta da Semana: A crise chega aos milagres.
As coisas já não são como no tempo de Nuno Álvares Pereira, quando o barril de petróleo nem um cêntimo valia e ninguém se queixava do preço da electricidade. Hoje vivemos uma crise que afecta tudo e todos. Beatificado em 1918 pela piedade com que fustigou nuestros hermanos, Dom Nuno passou quase um século a interceder junto ao Altíssimo para que Este concedesse um milagre, requisito sine qua non para que a Igreja Católica admita um beato ao restrito clube de setecentos santos de reconhecida eficácia intercessora.
Maria teve um filho ainda virgem e fez bailar o Sol no céu. Fernando, mais conhecido por António, deu uma lição no seu mosteiro ao mesmo tempo que pregava na igreja de São Pedro em Limoges e convenceu um burro e centenas de peixes a adorar Deus. Ao Nuno, coitado, calhou-lhe um milagre em tempo de crise. A Sra. Dona Guilhermina de Jesus, uma sexagenária de Vila Franca de Xira, estava a fritar peixe quando um salpico de óleo lhe caiu no olho esquerdo. «O olho deveria ficar tapado de forma a não ser sujeito à luminosidade do sol e a senhora era obrigada a tomar medicamentos diários na tentativa de debelar a queimadura. “Mas mesmo com esses tratamentos não havia garantia de cura e a solução poderia ser um transplante de córnea”, explicou à Agência LUSA o Pe. Francisco Rodrigues»(1).
Sem garantia de cura, de olho tapado e medicada, a Sra. Dona Guilhermina recorreu à única hipótese que restava. O único que a poderia curar. O beato Nuno Álvares Pereira, comandante do exército Português, vitorioso de Aljubarrota e flagelo dos castelhanos. «Depois de várias novenas»(1), e passados três meses, começou a ver novamente do olho que o peixe tão traiçoeiramente, qual invasor espanhol, lhe havia salpicado. Esta cura «foi analisada por uma equipa de cinco médicos e teólogos em Roma, que a consideraram miraculosa.» Só podia ser. Nunca, sem garantias de cura, podia a medicação e tratamentos ter reparado os danos causados por um salpico de óleo.
E por aqui também se vê a excelência destes médicos e teólogos. Dominam não só tudo o que a ciência sabe acerca da fisiologia ocular como também tudo o que a ciência algum dia poderá saber. É este conhecimento total sobre a ciência de hoje e do futuro que lhes permite identificar o carácter milagroso da cura do salpico, cientificamente inexplicável.
Graças a este trabalho, o processo de canonização irá avançar e em breve teremos mais um intercessor a quem pedir ajustes ao Plano Divino. Deus é omnisciente e todo-poderoso, o universo segue um plano traçado desde a Criação e tudo foi criado com um Propósito que é por nós insondável. Mas se alguém se magoa, tem um exame importante ou perde as chaves do carro não custa nada pedir um jeitinho. E tanto melhor se conhecermos alguém bem colocado lá dentro. Todos sabem que é assim que as coisas funcionam. É a diferença entre esperar três meses que a papelada fique pronta ou ser amigo da secretária do director.
1- Ecclesia, Beato Nuno Álvares Pereira
2- Ecclesia, Papa reconhece milagre do Beato Nuno de Santa Maria
eh!eh!eh!
ResponderEliminarOs espanhois é que podem gostar menos que o Nuno seja santificado. Afinal, além do milagre do óleo, aquilo que ele de relevante fez foi inflingir-lhes uma pesadíssima derrota, causando vários castelhanos mortos, e outros tantos humilhados.
Se Roma considera esse gesto muito piedoso, que é que isso faz dos espanhois?
"que é que isso faz dos espanhois?"
ResponderEliminarCampeões da europa de futebol? Nós só somos vice-campeões, por isso merecem mesmo porrada velha!
eh!eh!eh!
ResponderEliminarJoão
ResponderEliminarIsto não é para rir! A Nossa Senhora do Caravaggio sofreu um grave golpe de popularidade! Isto se era a santa de eleição desta vez, porque eu não vi um único jogo nem um único dos milhentos momentos de histeria futebolística com que os mortais possuidores de caixinha mágica (aka televisão) foram brindados.
Em contrapartida fui obrigada a gramar com 2 segundos de uma canção parola inventada pelos tipos da RFM. Não mais que isso porque me dava os nervos e mudava de estação. Faço o mesmo quando dá João Pedro Pais, Pedro Abrunhosa, Mafalda Veiga e Mika. Às vezes penso que sou um bocadinho estranha!
Voltando ao assunto do post, um milagre em condições seria pôr a selecção campeã. Ou o Pinto da Costa na cadeia. Acho que os objectivos destes santos são demasiado modestos: milagres na medicina é para meninos! Milagres no futebol ou na justiça é que era!
Enfim, com coisas que não lembram ao Diabo, querem eles saber. Faço das palavras da abobrinha minhas, coisas bem REAIS e OBJECTIVAS, ninguém quer saber.
ResponderEliminarRui.
Completamente alucinada esta gente a que a tudo chama milagre! Nem sabia que esse senhor era beato ou assim! A igreja está mm mal! Até que faz guerra é santo! Francamente! Daqui a pouco é mais plausível a igreja da ultima quinta-feira!
ResponderEliminarAbobrinha:
ResponderEliminarSe assim fosse, podias contar com a minha conversão imediata.
Passava logo a ser muito devoto da «Nossa Senhora do Caravaggio».
Caro Ludwig:
ResponderEliminarTem sentido falar de ciências de mais "baixo nível" (analogia com a terminologia informática)?
Desculpe o ter saído do tópico
Depois de várias novenas ao Santo Condestável feitas pelo pároco local e familiares, na noite de 7 de Dezembro de 2000, a senhora "encheu-se de coragem" e rezou de forma intensa ao Beato Nuno, tendo beijado uma imagem sua. "Logo então sentiu uma paz imensa. Foi sentar-se no sofá, ligou a televisão e apercebeu-se que via desse olho", recorda o sacerdote.
ResponderEliminarOlha que esta é a passagem mais significativa na descrição da cura miraculosa ou instantânea, pelo menos se tudo se passou assim como o sacerdote afirma, baseado naturalmente no testemunho da interessada.
De facto, este tipo de relatos é muitíssimo comum neste género de acontecimentos "miraculosos", e não apenas ligados à saúde física, embora talvez estes sejam os mais fáceis de comprovar e explicar de uma forma científica, através da unidade corpo-mente, a qual funciona em ambos os sentidos, claro.
Ou seja, aquilo que uma mente perturbada pode desarranjar, também uma mente imersa em uma paz imensa ou que "ultrapassa toda a compreensão", pode naturalmente voltar a arranjar.
No fundo, trata-se da mesmíssima aplicação da injunção bíblica atribuída a Cristo: "A tua fé te salvou". Ora fé e confiança são perfeitos sinónimos, da mesma forma que a santidade exterior é só um reflexo da interior. Rezar fervorosamente seja a quem for é manifestar uma ilimitada confiança naquilo que nós próprios somos, por paradoxal que tal possa parecer a quem continua de olhos tapados para factos tão simples e evidentes!
Por fim, milagre mesmo milagroso será pôr termo definitivamente à tremenda cegueira naturalista da ciência que resolve ignorar a inteligência patente na longa evolução deste universo, desde os seus primórdios ainda ignotos - com ou sem Big Bang, who knows?! - até à manifestação dessa mesma inteligência de forma explícita e autoconsciente.
Mas vá lá, já não estamos assim tão longe dessa cura... e é chegada a altura! :)
João
ResponderEliminarEstou a ver que és muito fácil. Sempre pensei que terias padrões mais elevados para uma conversão. Ou então dizes isso porque não acreditas mesmo! Nem por milagre.
Ludwig
ResponderEliminarNa referência (1) diz-se por um lado que o olho recuperaria e por outro que tinha "incapacidade". Terá sido o milagre a recuperação súbita? Acho que falta elementos quer para gozar quer para concordar (mas achei piada ao post).
Acho que passaste ao lado do verdadeiro milagre: "D. Nuno Álvares Pereira nunca praticou «guerra ofensiva» e obrigava os seus soldados a confessar-se e a ir à missa com regularidade, proibindo-os ainda de perseguir os espanhóis derrotados após as batalhas"... como é que ele ganhou a guerra??? Na volta é por isto que o Bush está a falhar!
Eventualmente 1/3 dos Portugueses discordará, mas temos algo a agradecer a esse senhor. Creio que foi ele que teve a ideia de cavar um buracos bem fundos, por-lhes uma quantidade generosa de lanças, e camuflá-los com vegetação para disfarçar.
ResponderEliminarCom a boa dose de arqueiros (ingleses, dos bons) e besteiros que tínhamos, o exército castelhano terá decidido avançar com a cavalaria, o que terá resultado em cavalinhos trespassados, e cavaleiros em fuga. Uma estratégia traiçoeira, e algo mal vista em termos dos valores da altura, mas que nos permitiu derrotar um exército cerca de 5 vezes superior. Claro que eles também não estavam para se esforçar muito, mas a verdade é que uma desproporção dessas não é brincadeira. Terem aguentado lá quietinhos à espera que os cavaleiros castelhanos caissem na esparrela em vez de fugir a sete pés já é obra.
Bem, mas pensando nisso, além dos espanhois todos, também temos cerca de 1/3 dos portugueses que terá dificuldades em engolir este "santo". Afinal, se não fosse ele é possível que a península estivesse unida.
Exactamente, João Tilde! Ora a ver se eu percebo. Cristo sacrificou-se para unir a Humanidade e recuperar-nos da maleita egoísta. A sua mensagem foi lindamente recebida e no seu encalço vieram os "cristãos" que - por tanto desejarem o mesmo - quebraram o rumo das coisas e ainda hoje canonizam os campeões do chauvinismo medieval. É isto?
ResponderEliminarAos que aspiram à moral apesar desta religião: cubram-se de vergonha.
Dominam não só tudo o que a ciência sabe acerca da fisiologia ocular como também tudo o que a ciência algum dia poderá saber. É este conhecimento total sobre a ciência de hoje e do futuro que lhes permite identificar o carácter milagroso da cura do salpico, cientificamente inexplicável.
ResponderEliminarAquando do comentário anterior, centrado na descrição da cura espontânea por acção da fé, não tinha reparado neste enorme disparate, embalado sob a capa da ironia e da mera dicotomia "inexplicável" versus "inexplicado". Mas tal ingenuidade não pega, factos são factos e o resto é conversa!
Se é cientificamente inexplicável, tal refere-se ao desconhecimento actual dos processos curativos centrados nas enormes capacidades da própria mente humana. Infelizmente, uma medicina demasiado mecânica e robotizada, que continua a ver o organismo como uma série de peças interdependentes mas separadas e não encara o processo de cura na integralidade corpo-mente, tem vindo a desprezar a importância da consciência na saúde humana, tanto preventiva como curativamente.
Deste modo, não é de admirar que determinadas recuperações súbitas e inesperadas continuem sem explicação credível, o que certamente acontecerá no futuro, e tanto mais rapidamente quanto a voluntária cegueira a que aludi anteriormente for abandonada e o organismo passar a ser encarado na sua totalidade inteligente.
Mas, claro, quando ainda se considera a evolução biológica como uma série de acasos sem propósito nem sentido, é de facto difícil admitir que os organismos vivos são dotados de uma inteligência própria e autónoma que vai muito para além da especialização do sistema nervoso central.
Cada célula é, de per si, inteligente quanto baste para saber o que há-de fazer e qual o seu papel na economia do organismo. Este é mesmo o b-a-bá pelo qual se deve começar o estudo da biologia e da medicina, humana ou veterinária. Sem esta simplicíssima constatação é claro que o que não faltam são milagres, curas e remissões espontâneas acontecem felizmente a toda a hora, umas mais espectaculares e outras mais naturais.
Em suma, com ou sem auxílio exterior sob a forma de terapia, seja ela qual for, é sempre o organismo que se auto-regenera, segundo o velhinho princípio hipocrático da "vis natura medicatrix". Quando tal não é possível... it's over!
In a nutshell, this is it!
E, já agora, em que princípio se baseia o tal "milagre" regenerador das células estaminais ou tronco, senão nesse mesmo que, há bem mais de 2000 anos, Hipócrates descreveu?!
Uma vez mais, nada de novo debaixo do sol, mas sem filosofia e alguma reflexão sobre as bases reais ou os alicerces seguros do conhecimento científico, é claro que não se vai lá e nem os milagres mais simples se conseguem explicar, vide mero o efeito placebo!
Ludwig Krippahl, sssa tua frase final sobre a secretária do director é deliciosa. :-)
ResponderEliminarabobrinha,
ResponderEliminarnão me admira que exagerem nas qualidades morais do santo. Os católicos ultra-conservadores que são criticados por outros católicos, como no Montfort, até dizem que a Inquisição não foi assim tão má e que o primeiro genocídio na História foi durante a Revolução Francesa. Dizem até coisas tão belas como essas:
«A única época em que não houve escravos foi aquela em que a Igreja dominou a sociedade: a Idade Média.»
Leprechaun,
ResponderEliminar«Aquando do comentário anterior, centrado na descrição da cura espontânea por acção da fé, não tinha reparado neste enorme disparate, embalado sob a capa da ironia e da mera dicotomia "inexplicável" versus "inexplicado". Mas tal ingenuidade não pega, factos são factos e o resto é conversa!»
Com isto pareces propôr que milagre e ignorância são a mesma coisa. De certa forma concordo, mas não me parece ser essa a definição dos proponentes, que querem dizer por milagre algo que a natureza por si não poderia produzir, necessitando assim a intervenção de um ser sobrenatural. (Vê aqui).
Ora isso não pode ser algo como o enrolamento das proteínas ou as alterações climáticas, que não compreendemos em detalhe mas que deve ser por ignorância e não pelo sobrenatural. O milagre tem que ser algo que esteja para além da possibilidade de compreensão de quem souber mesmo tudo acerca da natureza. Daí que seja preciso uma equipa muito bem formada para identificar os milagres. Tem que ter todo o conhecimento da natureza, presente e futuro.
Pedro
ResponderEliminarÉ tudo uma questão de referencial. A Inquisição teve como consequências positivas muitas piadas dos Monty Python. E o desenvolvimento de toda uma tecnologia de tortura e pena capital (nem por isso: já existiam e foram usadas em contexto de aplicação de justiça pura e simples).
A Revolução Francesa não foi inteiramente kosher, é verdade. Mas... quer dizer...
Essa da escravatura é o disparate completo: há vários tipos de escravatura. Se não me falha a memória, até havia os servos da gleba. Servos são o quê? Agora se me disserem que não havia escravos negros, é mais ou menos verdade (mas nem creio que seja inteiramente verdade). E a época das descobertas e dos negreiros foi época de grande domínio da igreja.
Não sei porque é que te estou a dizer isso. Possivelmente é para eu mesma me convencer que não estou a ficar maluca, porque tenho lido relativizações de coisas que não acreditava possíveis.
Ludi,
ResponderEliminarNão sei por links aqui, mas vi isto e lembrei-me de ti :)
http://br.youtube.com/watch?v=gG9kqmhWMbk
Eu também apanhei com um salpico de óleo a fritar um ovo. Caiu-me em cima da roupa.
ResponderEliminarNo dia seguinte pus a roupa a lavar, a quente, numa máquina com um detergente bastante potente.
Depois de seca a roupa estava como nova. É certamente um milagre! Claro que não foi a pré-lavagem nem o detergente. A julgar pelas semelhanças, creio que fui o Beato Nuno. Ou isso ou então os glutões do Presto.
Caros amigos,
ResponderEliminarDe facto a ICAR anda cada vez pior. Os santos multiplicam-se quase exponencialmente e há-os para todos os gostos e feitios. E para todas as aflições.
Afinal, pergunto eu, o catolicismo é um ramo de uma religião monoteísta, o cristianismo, ou será que é politeísta ?
Mas há mais, o senhor cardeal português da causa dos santos, Saraiva Martins, para fazer um beato ou um santo tem lá as suas regras, mas estas podem ser alteradas um pouco à vontade do freguês. Agora digam-me será que é com a permissão de Deus ou pelo menos de Jesus Cristo ?
Francamente não entendo como é que alguém ainda pode embarcar nestas coisas.
Por falar em religião...
ResponderEliminarVestindo Satanás.
Vestindo Maomé.
Vestindo Cristo.
ResponderEliminarSatan's salvation.
Mais aqui.
Mais do mesmo.
ResponderEliminarNão vejo a utilidade de perder tempo a questionar tretas deste tipo.
ResponderEliminarAcho que o autor deste blog anda-se a armar em filósofo arauto da liberdade, democracia e virtude.
Jata,
ResponderEliminar«Não vejo a utilidade de perder tempo a questionar tretas deste tipo.»
Felizmente não somos ferramentas e a nossa existência não se tem que limitar ao que é útil. Podemos fazer coisas inúteis pelo simples gozo que nos dão.
Como o seu comentário, por exemplo.
"Acho que o autor deste blog anda-se a armar em filósofo arauto da liberdade, democracia e virtude."
ResponderEliminarElá Ludi estás em grande homem, não tarda ainda fazes um milagre qualquer :)
Joaninha,
ResponderEliminarSe te caír soro fisiológico a 37º C para o olho reza a mim que ficas logo bem. Não sou beato mas também curo :)
L.K.,
ResponderEliminarDe facto, concordo com
Felizmente não somos ferramentas e a nossa existência não se tem que limitar ao que é útil. Podemos fazer coisas inúteis pelo simples gozo que nos dão.
No entanto continuo a achar que
você anda-se a armar em filósofo arauto da liberdade, democracia e virtude.
E, se possível, gostaria de saber o que me diz desta minha afirmação.
Jata,
ResponderEliminar«No entanto continuo a achar que
você anda-se a armar em filósofo arauto da liberdade, democracia e virtude.
E, se possível, gostaria de saber o que me diz desta minha afirmação.»
Não tenho nada a dizer. Se fosse um raciocínio, se tentasse justificá-la, se dissesse porquê eu poderia concordar, discordar ou até tentar refutar.
Sendo a afirmação isolada de uma opinião subjectiva não tenho nada a dizer. Se me disser que gosta de ervilhas ou que não gosta de ir à praia também não terei nada para comentar...
Se Joana D' Arc foi canonizada por maioria de razão o deve ser o grande D. Nuno Álvares Pereira. Se a mão de Deus esteve na libertação de França dos Ingleses muito mais terá estado na libertação de Portugal de Castela. O resto são tretas, Portugal merece que o seu condestável receba esse título papal. Ou será que, como lamechas, vamos deixar que a "verdade" se meta pelo meio? E viva Portugal!
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