Treta da semana (atrasada): o dia de reflexão.
O post anterior suscitou algumas dúvidas acerca da possível violação das directivas da Comissão Nacional de Eleições. Nomeadamente, «Aquele que no dia da eleição ou no anterior fizer propaganda eleitoral por qualquer modo é punido com prisão até seis meses e multa de 50 € a 500 €, nos termos do artigo 147º da LEALRAM.» Penso que não violei esta proibição, em primeiro lugar, porque a «propaganda eleitoral» refere-se especificamente a «actividade que vise directa ou indirectamente promover candidaturas, seja dos candidatos, dos partidos políticos, dos titulares dos seus órgãos ou seus agentes ou de quaisquer outras pessoas, nomeadamente a publicação de textos ou imagens que exprimam ou reproduzam o conteúdo dessa actividade». Ou seja, o que é proibido é a actividade de promoção de candidaturas – a campanha eleitoral – ou a divulgação dessa actividade. Ao contrário do que muita gente parece pensar, isto não equivale a uma proibição geral de qualquer discussão política durante o tal dia de reflexão.
Em segundo lugar, a lei eleitoral tem de estar subordinada à Constituição. Na Constituição não vem nada sobre um dia de reflexão mas está claramente estipulado, no artigo 13º, que «Todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informados, sem impedimentos nem discriminações». Por isso, a proibição da propaganda eleitoral na véspera e no dia das eleições tem de ser rigorosamente circunscrita à actividade de promoção de candidaturas porque, de outra forma, acaba por violar um direito fundamental que não é legítimo ao legislador negar a quem quer que seja.
Esta é uma razão pela qual acho importante discutir-se política hoje e amanhã também, se houver paciência. É legítimo, e razoável, que se proíba comícios, manifestações e arruadas nestes dias. Não queremos gente a gritar com cartazes em punho à porta dos locais de voto. Mas não é legítimo que se proíba as pessoas de dizerem o que pensam, mesmo que seja só por uns dias, e não podemos deixar o medo e a picuinhice tornarem a lei mais censória do que já é. Se nos coibirmos de falar de política com medo disto estaremos a transformar uma lei razoável de limitação da campanha eleitoral numa violação inadmissível da nossa liberdade de expressão.
Mas o mais grave é a forma como esta lei foi adaptada às novas tecnologias de comunicação. Por exemplo, «no que respeita à proibição de fazer propaganda em véspera e dia da eleição, as Cronologias Pessoais e as Páginas do Facebook não podem registar qualquer ação de propaganda praticada após as 00h00 da véspera da eleição. Ao invés, a atividade desenvolvida até essa hora pode aí permanecer (tal como acontece, por exemplo, com os cartazes afixados na rua)». A medida é ridícula. O problema, aparentemente, não é a pessoa ver o post no dia 3 ao almoço. A preocupação do legislador parece ter sido apenas se o post foi publicado às 00:00 do dia 3 ou às 23:59 do dia 2. Além disso, os sites dos partidos continuam online, os vídeos da campanha continuam no YouTube e os cartazes continuam escarrapachados por todo o lado. Esta medida faz-me lembrar uma recomendação da minha avó, há uns anos, para que eu não deixasse os miúdos ir à Internet à noite por causa dos programas que lá dão a essa hora.
Este blog, ou a minha página no Facebook, não são publicações no sentido tradicional do termo. Não são revistas que os leitores comprem na expectativa de ir ler reportagens sobre automóveis ou ver fotografias de gente famosa. O blog ou a página no Facebook também não são cartazes na rua nem comícios em locais públicos. Quem visita tais páginas fá-lo porque quer, de propósito e sem legitimidade para exigir nada de quem as escreve. Não estou a ocupar a via pública nem tenho qualquer contrato com os meus leitores. Por isso, as “redes sociais” são o equivalente a conversas de esplanada. Se eu estiver a conversar sobre isto com alguém, qualquer outra pessoa é livre de se sentar próximo e ouvir a conversa. É um espaço pessoal não privado. E até pode ser bem vinda. Mas veio ouvir uma conversa pessoal. Não está a ler o jornal que comprou nem a apanhar uma manifestação a caminho do trabalho. Por meio da Internet, conversamos com quem nos quiser ouvir mas fazêmo-lo no nosso espaço pessoal, sem intromissão no espaço de terceiros.
Neste contexto, é inadmissível que o Estado intervenha de forma censória para proteger a liberdade de decisão de quem só cá vem ler o que quer. E este ponto é muito mais importante do que apenas pela treta do dia de reflexão. Enquanto os legisladores não compreenderem que a Internet é diferente da rádio, das revistas ou dos cartazes na rua, corremos o risco de violarem a nossa liberdade de expressão pessoal apenas porque usamos uma tecnologia nova para comunicar. Se a CNE proibisse conversas políticas por telefone ou por carta, saltava-lhes logo tudo em cima. Mas como esta coisa da Internet só existe há umas décadas e é parecida com a televisão, pouca gente percebe que estas proibições, o bloqueio de sites, a limitação do anonimato e medidas afins são um ataque sério ao direito de conversar.
Eu gosto de treta
ResponderEliminarVAI TOMAR NO KÚ
Eu gosto de treta
ResponderEliminarVAI TOMAR NO KÚ
Confesso-me dividido :) No dia de reflexão, por exemplo, por auto-censura (mas esse é um direito que tenho!), abstenho-me de falar de política, mesmo no café, com ou sem ninguém a ouvir. Mas na verdade ninguém me pode proibir de o fazer, e concordo que o Facebook ou o blog seja uma «extensão do café» (além disso, a tradição europeia pré-comunicação social de massa era, justamente, discutir política nos cafés; era aí que a população — que podia votar, porque mesmo no Reino Unido democrático do séc. XVII nem todos tinham o voto, claro está — discutia política).
ResponderEliminarPor outro lado, as novas tecnologias de informação chegam às massas com facilidade: basta ver como é simples fazer spam no email, ou colocar anúncios no Facebook ou no Google para que surjam apenas no dia da reflexão (e chegar assim a uma maior faixa da população do que um cartaz na rua, por exemplo) a apelar ao voto no partido X ou Y. Mas o mesmo se poderia dizer da distribuição de folhetos de propaganda política no dia da reflexão, colocados na caixa de correio das pessoas: não se faz.
Ou seja: o que me parece, na lei que citaste, é que se está a ultrapassar uma linha vermelha, não ficando exactamente claro o que é uma «actividade de propaganda». Se no dia da reflexão disser: «vá votar!» (mas não disser em que partido), isso é permitido — seja na rua, no café, no Facebook, ou na rádio e TV — pois ninguém nos impede de falar sobre política, desde que não esteja directamente a apelar ao voto em determinado partido. Mas se disser o nome do partido em quem quero que votem, já é uma «actividade de propaganda». No entanto, podem estar cartazes na rua (por uma questão de logística). Então e se receber em casa um folheto na caixa de correio com o rosto de um político, impresso com as cores de um partido, com o texto: «Portugueses, por favor vão às urnas votar!» (mas sem apelar ao voto no candidato ou no seu partido, nem identificando o mesmo), isto é proibido ou não?
Não me parece, pois, que haja aqui muita consistência (o tal preciosismo de proibir posts no Facebook às 00:00, então, é um exagero!). E, se me perdoarem o pleonasmo, acho que temos de fazer um pouco mais de reflexão sobre estas regras do dia da reflexão, tendo em conta as novas tecnologias e as capacidades progressivamente mais criativas dos partidos a fazerem campanha política...
um gajo dividido ou um bipolar assumido o que não é raro um krip com page von fakelook und um apelo ao suicídio culetivo e dois repetidos sabe-se lá de quem e nem uma mensagem jesuítica nem nada o dia da re flexão está tão acabado como os b-logs e outras logaritmices que raio é um sequeira? inda se fosse um de sequeiro
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