Treta da semana (passada): o acordo.
Num depoimento apresentado ao grupo parlamentar de Acompanhamento da Aplicação do Acordo Ortográfico, José Mário Costa, jornalista e coordenador do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, esclarece algumas «inverdades à volta do Acordo Ortográfico»(1). Aponta que é falso (“inverdadeiro”?) que o Brasil tenha adiado a aplicação do AO, que o AO complique o uso do hífen e que aumente o número de palavras com formas de escrita diferentes, e salienta que muitos meios de comunicação, instituições e até software já usam a nova ortografia. Porreiro. Parece-me que o José Mário Costa sabe o que diz e, ainda para mais, gosto imenso do site que ele coordena. Por isso, não me custa dar-lhe razão nestas coisas. Se este fosse um acordo entre académicos de vários países, dele resultasse um conjunto de recomendações e uma data de gente as seguisse por serem tão virtuosas como o José Mário Costa defende, provavelmente eu já o tinha adoptado, adotado e até adoçado de tanta adoção. Mas na defesa das virtudes académicas do AO o José Mário Costa acaba por salientar os seus piores defeitos.
Segundo cita o José Mário Costa, já em 1967 «alguns dos principais filólogos portugueses e brasileiros» consideravam conveniente uniformizar a ortografia: «Além da extrema conveniência de ordem prática, deve pesar-se nesta decisão que, sendo a grafia secundária em relação à oralidade e representação sempre meramente convencional desta, não é mais nem menos científica uma grafia simplificada, em que se renuncia a certos hábitos gráficos apoiados numa tradição mais ou menos longa, do que uma grafia dita etimológica». Concordo. Até seria mais prático fazer como alguns fazem nos SMS e substituir os “qu” por “k”, usar acrónimos como LOL e WTF e assim por diante. Nem seria difícil arranjar regras para isso. O problema é que lá por algo ser convencional não quer dizer que se deva subordinar a convenção a um conjunto de regras. O significado das palavras, a gramática e até o simples facto de falarmos Português em vez de Inglês ou Russo são também fruto de convenção, mas não derivam de um conjunto de regras. A ideia parece ser termos um só dicionário, mas esquecem-se que o papel do dicionário é descrever o uso corrente da língua e não ditar como a língua se usa.
A minha primeira objecção ao AO é que não reconhece a ortografia como uma convenção do mesmo tipo da dicção, da semântica, dos gestos e dos costumes. Com legislação adequada é possível alterar estas convenções numa geração ou duas. Já o fizeram várias vezes com a ortografia. Reúne-se uns doutos ortógrafos, transcreve-se para lei as suas recomendações e o pessoal acaba por alinhar. Mas a língua é uma coisa viva e, como a história demonstra, volta e meia lá têm de inventar outra carrada de regras e incomodar o pessoal novamente só para fazer de conta que o dicionário manda em vez de descrever. O que determina a ortografia correcta, tal como a dicção e a semântica, é a forma como as pessoas usam a língua. Se as pessoas num certo sítio escrevem “acção” e o dicionário diz que se escreve “ação”, o dicionário está tão errado, para esse sítio, como se dissesse que “pardal” se escreve “sparrow”. São convenções, mas não é o dicionário, nem os linguistas nem o governo que determinam qual a convenção correcta. Somos todos nós, colectivamente. O que o AO pretende, no fundo, é que passemos todos a escrever de forma incorrecta na esperança de que essa se torne a forma correcta a tempo de a alterar novamente. Já no tempo do papel era duvidoso que valesse a pena este incómodo só para poupar nos dicionários. Hoje, com publicação electrónica e correctores ortográficos automáticos é uma parvoíce sem sentido nenhum.
Mas a minha objecção fundamental é outra. Escreve o José Mário Costa que «só daqui a três anos deixa de poder usar-se, no plano público, a ortografia [anterior, no Brasil e em Portugal]. Até lá, [...] a ortografia anterior continua a poder ser seguida por quem assim entender fazê-lo no seu uso pessoal.» Isto, para mim, é incompreensível. Nos próximos três anos vou poder seguir a ortografia que entender no meu uso pessoal. Muito bem. Mas depois acontece o quê? Serei castigado por escrever “acção” da mesma forma que agora me castigam se escrever “pharmácia”? O problema fundamental neste AO é o Estado transgredir os limites das suas competências legítimas. É verdade que já houve outros acordos desta natureza, mas o último que precedeu este de 1990 foi em 1945. O Estado era bem diferente nessa altura.
Em suma, a minha objecção a este AO não é uma objecção à ortografia proposta, acerca da qual não me pronuncio. Em parte, é a objecção à ideia destes linguistas de que mandam na língua que é de todos. Mas, principalmente, é a objecção a que um Estado democrático tenha o poder de regular a forma como os cidadãos escrevem.
1- Página da comissão e o documento, em pdf. Via ILC contra o Acordo Ortográfico.
Aprecio muitos os seus postes, mas parece-me que este não está ao seu nível habitual. Porque, espremido, dá pouco...
ResponderEliminarComeça por que o Estado não tem, como receia, o poder de regular a forma da escrita (donde, para quê o poste?)...
Ainda que o tente, o seu sucesso depende... dos cidadãos, da aceitação social, como é evidente.
Depois, custa-me a entender: 1) Que não se pronuncie quanto à ortografia proposta (que, portanto, não lhe merece objecções); 2) Que, mesmo assim, lá vai poste...
Finalmente, discordo de que deixe sem resposta as três refutações de JMC, o adiamento brasileiro, o problema do hífen, e o aumento do número das discordâncias Port./Brasil.
Se estudar o assunto, verá que a refutação é que é inverdadeira, não as acusações. Ou não conhece, por exemplo, o resultado das contas feitas por certa especialista, publicadas em vários meios, quanto às ditas discordâncias?
Peço desculpa, cumps.
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EliminarSinto alguma estranheza com os argumentos de João C. : o inglês não se distância, as diferenças ortográficas são muito pequenas e não segue as receitas que aqui e no Brasil são preconizadas. O mesmo para o castelhano, ou para o francês.
EliminarSerá que não é razão para reflectir?
Qual o motivo porque são as do português maiores? Por motivos meramente políticos.
E os piores deles, provincianos e proto-fascitas:
Prof. Doutor Maurício Silva:
«ASSIM, PODE-SE DIZER QUE GRANDE PARTE DA DISCUSSÃO EM TORNO DA ORTOGRAFIA DA LINGUA PORTUGUESA - COMO, DE RESTO, EM TORNO DA PRÓPRIA LINGUA - REDUNDA NA TENTATIVA DE AFIRMAÇÃO NACIONALISTA DE UMA VERTENTE BRASILEIRA DO IDIOMA, EM FRANCA OPOSIÇÃO À VERTENTE LUSITANA.»
O que é corroborado pelo próprio HOUAISS que explicou ao «Folha de S. Paulo», em 11 de Maio de 1986, porque é que os brasileiros rejeitaram o acordo de 1945: «Sentimos que a ortografia de 1945 era lusitanizante».
Entretanto, o analfabetismo (clássico e funcional) no Brasil é de 75% e as universidades brasileiras contam com 38% de analfabetos funcionais entre os seus alunos.
Albino,
ResponderEliminarNão tem nada que pedir desculpa, ora essa :)
O problema principal para mim não é o poder do Estado em si, neste caso, mas «o Estado transgredir os limites das suas competências legítimas.» Suponha que saía uma resolução do conselho de ministros a obrigar todos os funcionários públicos a usar roupa interior amarela. O meu problema com isto não seria se os ministros conseguiam fiscalizar o cumprimento desta resolução mas, logo à partida, com a transgressão dos limites legítimos do seu poder. E isto independentemente das vantagens ou desvantagens que pudesse haver na roupa interior ser amarela.
Quem tem razão acerca do problema do hífen, do adiamento e afins preocupa-me pouco. Até podem ser questões interessantes, mas para mim parece-me muito mais importante o problema dos ministros estarem a tentar exercer poder de forma ilegítima. Se muita gente escreve e diz "oiro" não compete a ministro algum obrigar a dizer e escrever "ouro". Nem é o dicionário nem os linguistas que devem decidir isto. São as pessoas. O mesmo se aplica a facto, espectadores e assim por diante. Se um dia toda a gente escrever espetadores, pois seja. Nessa altura também não me vou preocupar com o mérito relativo das ortografias. A língua convenciona-se por consenso e quem a quer usar com eficácia deve respeitar o consenso. É por isso que não me pronuncio acerca da ortografia proposta. Logo se vê.
O problema principal aqui, para mim, é tentarem regular a língua. Nem é assim que a língua funciona -- é algo que surge da forma como as pessoas a usam e não de um conjunto de regras como a canasta ou o monopólio -- nem é legítimo do Estado comprometer ou obrigar seja quem for a este respeito. O problema dos funcionários do Estado passarem os limites legítimos do seu poder parece-me muito mais importante do que a questão do hífen...
Não me parece que deixes um argumento forte para que se aceitem umas convenções e não outras, já que é isso que propões. Simplesmente aceitas as feitas na ditadura, não te vejo a queixar a querer elimina-las e não aceitas estas feitas em democracia.
ResponderEliminarTambém não consegues desembaraçar-te do sentido em que vais da liberadade ortográfica, onde mais uma vez dizes "ad-hoc" onde está o ponto em que cada um tem de seguir as regras convencionadas.
Ou isso, ou não estou mesmo a compreender os teus argumentos. Há sempre essa hipote.
Propõe que haja um numero minimo de utilizadores de determinadas formas para elas serem as ortográficas? E que dentro desse numero se aceite essa nova convenção para esse grupo? E que dentro desse grupo os que querm falar como no resto do país passam a estar errados ou então têm de se mudar? Ou sugeres que se admitam várias formas ortograficas, desde que seja compreensivel?
Eu por mim sou a favor da liberdade ortográfica, como bem demonstro, mas não parece-mos partilhar um ponto de vista que sequer me permita perceber o teu. E isso é bizarro.
É que em nome da liberdade ortográfica, não se devia chatear ninguem por escrever diferente, mas seria de aceitar a liberdade de haver convenções feitas com o proposito de retardar a separação das linguas, se for essa a vontade dos povos.
É que parece-me que essa vontade de que exista um espaço lusofono existe. O que não existe são pessoas a quererem fazer compromissos e alterar convenções para que isso se possa manter mais uns seculos ( a separação linguistica parece-me inevitavel, mas com a internet nunca se sabe).
Parece-me também que em nome da liberdade, pode haver convenções de académicos, que é quem tem a melhor capacidade de pensar de como convergir as linguas, e que pode bem haver um espaço cultural próprio para usar as convenções mais adequadas - tal como em publicações profissionais e comerciais, teses académicas, etc.
É que ao contrário do que afirmas, uma coisa ser convencionada, não implica que tenha de se convencionar como uns acham que é a melhor maneira face à maneira de falar. Estamos a milhas da ideal ortografia face à fonética e a fonética parece ser um problema ainda mais complicado que a ortografia se quisermos fazer regras.
O critério pode bem ser tentar o afastamento linguistico, e usar as convenções quando faz sentido que se usem altos graus de formalidade.
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EliminarNão percebo como ainda podem levar a sério as ruminações do Ludwig...
ResponderEliminarUm ser humano tem cerca de 100 000 enzimas e proteínas, comparando com 2000 de uma bactéria.
A probabilidade de uma simples proteína de 100 aminoácidos precisamente sequenciados surgir por acaso é de 1 em 10^158. Ora, geralmente as proteínas têm várias centenas de aminoácidos precisamente sequenciados.
Para além disso, para funcionarem as proteínas têm de ser dobradas de forma extremamente precisa. Erros na dobragem das proteínas podem causar doenças graves.
Como os cientistas observam:
"...diseases that result from misfolded proteins, including Alzheimer's disease, Parkinson's, multiple sclerosis, Type 1 diabetes, cancer and mad cow disease."
Tudo isso corrobora inteiramente o que a Bíblia afirma sobre a criação inteligente da vida e a sua sujeição à corrupção.
Tudo isso refuta a suposta evolução por processos aleatórios imaginada por cientistas naturalistas ateus...
A sujeição da vida a processos aleatórios não cria estruturas e funções inovadoras e mais complexas, antes destrói as estruturas e as funções existentes.
Como esta realidade óbvia pode passar ao lado de um autoproclamado professor de pensamento crítico (é verdade que também é autoproclamado "macaco tagarela") é algo que não consigo entender...
A minha avó escreve mãi e eu escrevo mãe. Por causa disso, fui deserdado e deixámos de nos falar.
ResponderEliminarEu escrevo óptimo e o meu filho escreverá ótimo. Por isso, fiz uma vasectomia.
Isto é mais um ataque da sociedade liberal aos valores da família.
PS: agora o CAPTCHA tem caracteres gregos? Isto deve ser conspiração do AO.
Deverá pensar que um inglês, um canadiano, um norte-americano, um australiano e mais umas centenas de milhões que usam diariamente o inglês, fosse há 100 anos, fosse há 30 ou hoje escreveriam sempre do mesmo modo.
Eliminar(Será que o inglês não "evolui"?)
O mesmo se diga de alguém que use o castelhano, o francês, o italiano ou o alemão.
Portugal está, hoje, 21 (vinte e um)lugares abaixo da Espanha em alfabetização e o Brasil está, hoje, 10 lugares abaixo do Zimbabwé.
Não sei se é um ataque aos valores da família. É um ataque ao principio da estabilidade ortográfica existentes em todos os países com grau zero de analfabetismo.
João,
ResponderEliminarEu considero que o consenso nas convenções linguísticas é muito importante, e quem quer ser compreendido deve respeitar as convenções da sua audiência. Caso contrário é natural que não queiram perder tempo a tentar percebê-lo.
Isto é transversal a toda a língua. Aplica-se ao vocabulário, à pronúncia, à estrutura das frases, e o demais, além da ortografia. Por isso a minha posição é de que as convenções devem ser respeitadas.
A granularidade dessas convenções -- se se restringem a um grupo pequeno como os habitantes dos Açores ou se abrangem grupos maiores -- resulta do grau de interacção com outros grupos. Se querem unificar a língua Portuguesa ponham as viagems de avião a cinquenta cêntimos. Por isso não faz sentido pronunciar-me acerca de quantas pessoas é preciso para ter esta ou aquela convenção.
Não tenho nada contra aquilo a que chamas "liberdade ortográfica". S keres xkrver assim, tá-se bem. Mas, em contrapartida, sou a favor da liberdade de escolher o que leio, e se vejo coisas mal escritas tenho todo o direito de passar à frente. E quando alguém tem responsabilidade profissional de se fazer entender, nesse caso é mesmo de exigir que seja claro. Mas pelo que vejo nos documentos oficiais o problema principal não está na ortografia mas na verborreia sem sentido.
Também concordo que «pode haver convenções de académicos, que é quem tem a melhor capacidade de pensar de como convergir as linguas, e que pode bem haver um espaço cultural próprio para usar as convenções mais adequadas». Não tenho nada contra tentarem convencionar simplificações à língua. Podiam acabar com os verbos irregulares, por exemplo. Eu sou, tu sês, ele sê. Muito mais simples.
Onde traço a linha é na lei. Tudo isto está muito bem e correcto enquanto não for coercivo. Mas se os legisladores se põem a querer mandar na forma como escrevemos (ou falamos, ou vestimos) aí penso que é dever de qualquer cidadão mandá-los dar uma curva e pô-los no seu lugar porque não é para isso que os elegemos.
Eu pessoalmente não podia concordar mais com o Ludwig: a forma como se fala num país não é ditada por decreto governamental. É por razões como essa que os Estados Unidos, por exemplo, não têm língua oficial. «Espera lá!» dirão alguns. «Mas nos Estados Unidos não se fala inglês há mais de dois séculos e meio?» Fala-se, pois claro. Mas não é a língua oficial. E porquê? Porque os libertários americanos não acham que deve ser o Governo a impôr aos seus cidadãos a forma como falam. Claro que os documentos federais estão escritos em inglês, mas podiam estar em japonês ou servo-croata, se fosse essa a língua que desse mais jeito. E alguns estados americanos têm mais do que uma língua — na Califórnia, a título de exemplo, os documentos oficiais estão em inglês e em espanhol (obrigatoriamente).
ResponderEliminarEvidentemente que os Estados Unidos não são o único exemplo. Na Índia reconhecem-se dezenas de línguas e centenas de dialectos, sem discriminar entre elas. Por uma questão de conveniência, o inglês é a língua dos documentos da União. Na China, a segunda língua mais falada é o inglês; embora os documentos oficiais estejam «em chinês», isto teve umas consequências engraçadas aquando da «anexação» de Macau: interrogou-se justamente o Governo chinês se os documentos oficiais da nova Zona Económica Especial de Macau (que eram em português) deviam passar a ser em Mandarim... ou Cantonês, que é o «chinês» mais falado em Macau, ou melhor, um seu dialecto local. O Governo chinês nunca «esclareceu» a dúvida. Deliberadamente: não há praticamente ninguém em Macau que fale Mandarim. Mas quase todos falam Cantonês. Apesar de se escreverem ambas as línguas com os mesmos caracteres, são línguas diferentes. Por omissão, deliberadamente, escreve-se então em Cantonês — que é a língua que os macaenses falam...
Portanto o argumento de que «o Estado não deve impôr às pessoas a forma como falam» é aplicado tanto na alegada democracia mais livre do mundo como no maior estado alegadamente não livre. E em muitos outros que estão entre os dois extremos.
No mundo anglo-saxónico, existe um consenso criado a partir da autoridade reconhecida pela comunidade de instituições não estatais e de especialistas: universidades, editoras etc.
EliminarDuas notas: 1 - a evolução ortográfica dá-se não através de mudanças de grafia mas do alcance de um elevado grau de estabilidade da ortografia, que apenas pode suceder porque há um acesso seguro e facilitado à norma.
2 - Convencional não significa arbitrário. As leis da perspectiva em pintura são convencionais, mas se as alterar obtêm-se diversos resultados de fidelidade da reprodução da realidade.
Mesmo assim, o Sr. José Mário Costa anda um pouco baralhado. É que o Acordo Ortográfico é meramente uma resolução da Assembleia da República — não é um decreto-lei. Assim,
ResponderEliminar1 - A nova ortografia foi promulgada pela Resolução da Assembleia da República n.º 26/91, de 23 de Agosto (com actualizações).
2 - O Código do Direito de Autor e Direitos Conexos foi promulgado pelo Decreto-Lei n.º 63/85, de 14 de Março (com actualizações).
3 - Na hierarquia legislativa, segundo me explicaram os juristas, um Decreto-Lei está acima duma Resolução da AR. Um Decreto-Lei é vinculativo, ao passo que uma Resolução é uma mera recomendação.
(agradecimentos ao António de Macedo que me mandou esta explicação há uns anos atrás)
Como recomendação, qualquer entidade pode, se quiser, adoptar o AO. Mas não pode obrigar ninguém a usá-lo — não tem força de lei. A entidade «Governo» adoptou o AO, e, sendo a maior entidade em Portugal — nomeadamente a que controla a maior parte do ensino — pode impôr aos seus funcionários o AO que quiser (ninguém é obrigado a ser funcionário público; mas, se o for, terá de submeter-se às regras internas). Outras entidades também adoptaram este AO e impôem-no aos seus colaboradores. Mas ninguém pode impôr o AO a todos os cidadãos portugueses e residentes em Portugal porque não há lei para isso!
Claro que isto é a teoria. Na prática não é tão fácil. Por exemplo, nem todas as editoras livreiras usam o novo AO. Algumas até recusam terminantemente fazê-lo; outras dão liberdade aos seus autores para escreverem como quiserem. No entanto, se uma editora quiser vender livros para as escolas públicas, é provável que sejam obrigadas a imprimi-los com o novo AO, senão o «Governo» não lhes compra os livros. Assim, independentemente da sua vontade, acabam por ser «forçados» — por questões comerciais! — a adoptar o novo AO, pois o Min. Educação é um bom cliente. Mas isto não é «universal» — os meus professores na universidade não têm qualquer problema em recomendar que eu leia livros publicados no Brasil. Ou que estejam escritos em inglês, ou servo-croata.
O "acordo" é um tratado internacional que, originalmente, apenas entraria em vigor por unanimidade.
EliminarDepois, pelo chamado 2º protocolo modificativo decidiram que a anuência de três estados bastaria. Porém, esse "protocolo modificativo" que mudava as regras precisava, e abdicava da unanimidade precisava de ser assinado e ratificado (são coisas diferentes) por... unanimidade. E não foi, até hoje.
Não sendo, mantém-se de pé a regra da unanimidade original da unanimidade que os estados intervenientes se impuseram.
Consequências: a)o acordo não está em vigor na ordem jurídica internacional; por isso, b) não está em vigor na ordem jurídica nacional. c) a resolução da assembleia da república ou do governo não pode revogar o Decreto 35228, que é o que regula hoje, legalmente, a ortografia portuguesa.
O resto é a medida da insuficiência do nosso estado de direito e da democracia.
Há depois uma outra questão neste processo todo, essa sim, a meu ver, bem mais grave, e que nada tem a ver com a alucinação colectiva do legislador (se fosse só para isto que fossem alucinados, nem era muito mau...). Apresentou-se, como argumentação para justificar um novo Acordo Ortográfico, um trabalho que foi rotulado de «científico». Ou seja: as duas argumentações principais (que se pode ler no Anexo II da resolução) para justificarem este acordo, que são atribuídas à «Academia das Ciências de Lisboa» (notem a palavra «ciência»), são 1) Isto vai afectar poucas palavras no léxico português; 2) vai tornar mais fácil a aprendizagem do português às criancianhas (que, fartas de mandar SMSs a dizer «kk kerex?», não percebem depois porque é que têm de escrever concepção com um P).
ResponderEliminarAmbas as «conclusões» são falaciosas, mas isto é apresentado como um resultado científico, e isso é que é preocupante para mim.
A primeira conclusão pode ser verdadeira, analizando-se o léxico. Mas o próprio texto diz (por exemplo, a propósito da dupla grafia) coisas como «O número de palavras abrangidas pela dupla grafia é de cerca de 0,5% do vocabulário geral da língua, o que é pouco significativo (ou seja, pouco mais de 575 palavras em cerca de 110000), embora nele se incluam também alguns vocábulos de uso muito frequente.» Pois. É aqui que a porca torce o rabo. Pouco me interessa saber com quantos CC se escreve «contrafacção», porque a maioria das pessoas escreve essa palavra poucas vezes. Mas «objecto» e «acção» são palavras muito vulgares. Ou seja, é verdade que são poucas as palavras que mudaram de ortografia, mas contam-se entre estas muitas das palavras mais usadas em português». O que é falacioso é afirmar a correlação entre «poucas palavras afectadas» e «poucas palavras usadas», porque até o linguísta mais básico e atrasado mental sabe perfeitamente que a esmagadora maioria dos portugueses não usa 110.000 palavras diariamente. Usa umas 2 ou 3 mil. Entre as quais se contam centenas que mudaram de grafia. O problema não é a legislação em si; é a afirmação pseudo-científica (pois foi aceite pelos legisladores como «apelo à autoridade» — «os cientistas disseram-nos que isto não ia fazer grande diferença, por isso cegamente aceitamos as suas palavras e vamos aprovar a resolução» — mas é um apelo a uma autoridade... falaciosa) que «legitima» a alteração do AO com critérios alegadamente «científicos»... quando são tudo menos isso. A Academia de Ciências de Lisboa devia ter vergonha de ter publicado uma coisa assim usando o seu (suposto) bom nome.
"Esquecem", nesses cômputos as ocorrências de cada lema: "accionar", por exemplo, terá de ser multiplicada por 49 vezes, correspondentes às pessoas, modos e tempos verbais...
EliminarQuanto aos cês e pês, não atrapalham nada porque a apreensão das palavras é feita globalmente. Estar lá um c ou dois cc ou três pps é, por isso, indiferente para a aprendizagem.
O Braisl, que não tem consoantes mudas, não deixa, por isso, de ser um dos países com mais elevada taxa de analfabetismo e com os piores resultados nos testes PISA em competências linguísticas.
O ponto 2 é ainda mais falso. A argumentação é que é «mais fácil» ensinar às criancinhas escrever conceção, perceção, ato do que concepção, percepção, acto. Já nem falando na questão de que depois se tem de lhes explicar que ato (de «atar os sapatos») não é a mesma coisa que um ato judicial ou legislativo, ou que os bancários usam, de facto, fatos. Ou de fato, fatos? (No Brasil estas dúvidas não se colocam porque os bancários vestem ternos e não fatos...) Ou seja, substitui-se uma complexidade (ortografia) por outra (semântica), e, a meu ver, a semântica é mais difícil de compreender (falo apenas de uma perspectiva da informática — em inteligência artificial, é fácil analizar ortografia, mas o problema da semântica é complexíssimo, e há boas razões para crer que o mesmo se passa com os seres humanos). Já por si, isto já seria um argumento falacioso. Mas a verdade é que, da forma como esta explicação está escrita, dá a entender que seria impossível a uma criancinha aprender a escrever chinês ou japonês — porque é infinitamente mais complexo aprender chinês/japonês do que aprender a escrever percepção com um P. Isso não impede mais de milhar e meio de milhões de pessoas de escreverem e falarem fluentemente chinês ou japonês, e as criancinhas chinesas e japonesas não são socialmente menos adaptadas do que as portuguesas. Mas mesmo no campo europeu as coisas não são assim como está descrito no documento. Por exemplo, o espanhol (antigo castelhano) é das línguas mais regulares que existe, em termos de ortografia. Mas o alemão também é incrivelmente regular, apesar de, para um português, seja muito mais fácil de aprender espanhol do que alemão — não é, obviamente, por causa da grafia ser mais «regular» que a língua é mais fácil ou mais difícil de aprender. Em contraste, o inglês é arcaico e completamente ilógico na sua grafia — cada palavra parece ter a sua própria regra para ser escrita, e, mesmo para um falante nativo de inglês, as regras parecem ser totalmente aleatórias. Decora-se e pronto. Isso não impediu o inglês de se tornar na língua da cultura e da ciência neste século XXI, e ser a «segunda língua» da maioria da população mundial (até mesmo para os chineses!!)
ResponderEliminarOu seja, este segundo argumento também é totalmente falacioso.
Donde se tem de concluir várias coisas.
ResponderEliminarA primeira (argumento da incompetência) é que a Academia de Ciências de Lisboa percebe tanto de ciência como eu, ou seja, nada. Nesse caso, não deveriam ser eles os convidados a elaborarem um estudo sobre a língua portuguesa!
A segunda (argumento da malícia) é que a Academia de Ciências de Lisboa (ACL) tinha uma agenda política que nada tem a ver com o método científico. Nesse caso, devia-lhes ser retirada a palavra «ciência» do nome. Coisas como a Cientologia ou o Cristianismo Científico também nada têm a ver com «ciência»; abusam do nome apenas para dar «credibilidade» às suas crenças, usando a razoável boa reputação da ciência. Ora a ACL pelos vistos faz o mesmo. Isto deveria ser combatido. Podiam chamar-lhe Academia da Política Linguística de Lisboa, que não havia problema algum — em política, ninguém é obrigado a sustentar a argumentação de forma racional e lógica.
Também se pode aplicar o mesmo raciocínio ao legislador. O legislador pede a peritos para o auxiliar no seu processo legislativo, pois nem toda a gente é obrigada a saber tudo quando exerce um cargo eleito democraticamente. Bom, nesse caso, se estivermos no caso 1, o legislador deve ser informado de que contratou os peritos errados, pois estes não percebem de ciência, e não podem, pois, ser considerados peritos. Sendo assim, no mínimo, deveria ser removido este Anexo II da resolução da AR e riscado o nome da Academia de Ciência das Letras do texto legal — os políticos podem legislar sobre disparates à vontade, mas não podem sustentar a sua argumentação em peritos que não o são. Terão de inventar outra justificação que não seja a da ciência — por exemplo, «aprovámos isto porque fomos eleitos e podemos fazer o que quisermos». Certo. É mais justo. O que é incorrecto é dizer «aprovámos isto porque está cientificamente comprovado que é o melhor para o país, segundo o relatório dos peritos», pois isso é falso.
Há também a alternativa da malícia, e isto tem sido referido por alguns analistas. Porque foi escolhida a ACL como «perita» para elaborar um relatório falacioso? Porque, dizem alguns adeptos da teoria da conspiração, se fosse usado o método científico — por exemplo, apoiar/financiar projectos científicos para analizar realmente o impacto das alterações, de uma forma que use o método científico e resultasse em artigos em publicações académicas — o legislador seria confrontado com a realidade das conclusões, que seria contra a sua vontade (embora, ironicamente, fosse de acordo com a vontade popular... o que normalmente se espera que seja a base de trabalho do legislador!). Assim, precisou de encontrar uma entidade com a palavra «ciência» lá pelo meio do nome, mas que estivesse disposta a emitir um comunicado, «em nome da ciência», de acordo com a vontade do legislador.
Isto é precisamente o mesmo tipo de argumentação que é usado nalguns estados americanos para promover o criacionismo nas escolas: pede-se a uma associação religiosa que elabore um estudo sobre a aprendizagem do criacionismo, e usa-se isso como argumentação para aplicar leis que proíbam que se ensine a teoria da evolução das espécies nas aulas. Pois. A forma como o AO foi redigido segue precisamente o mesmo princípio.
Já nem falando no outro aspecto da questão, que é o acesso da opinião pública e da sociedade civil ao processo de discussão. Claro que em 1989 já se sabia que ia ser aprovado um AO novo, completamente disparatado, e já na altura era discutida a inutilidade do mesmo. Mas depois todas estas opiniões foram totalmente rejeitadas pelo legislador, e foi-se buscar apenas uma opinião falaciosa — por ignorância ou malícia — rejeitando todas as restantes (excepto a das editoras livreiras que publicam livros escolares, pois estas claramente queriam o novo AO, e, de preferência, um AO novo todos os anos). Ora não é assim que se legisla em Portugal — nem mesmo em Portugal!
O poder político ignorou todos os pareceres científicos - que froam todos contrários ao "acordo", menos o do Malaca... - Ignorou e escondeu-os, tendo sido necessário várias intervenções da deputada Zita Seabra no Assembleia da República para que fosse conhecida a existência de alguns e o teor de outros.
EliminarA decisão foi política e representa uma subserviência aos interesses brasileiros. O brasileiro - tão falado há uns anos - tem um problema: ao contrário do português não é uma língua internacional. Daí o take over.
Ludwig, se o que te incomoda é que o Estado possa legislar sobre ortografia, então o teu problema não data de 1990, nem de 2012, mas de 1911… Também és contra a IUPAC? ;-)
ResponderEliminarQuanto ao resto que aqui se disse, enfim são as mesmas asneiras que já se diziam em 1989 — o anti-brasileirismo disfarçado, a desinformação do cágado cagado e da melância na ambulancia, o afiançar-se que o “této” vai passar a ser “têto” (o que um disparate complêto!), as comparações dispropositadas com outras línguas sem distinguir o francês e o inglês (que têm ortografias arequológicas) do castelhano e do italiano (que tiveram reformas ortográficas profundas bem antes da nossa de 1911), a aselhice enfim do «antes é que era bom». Há de lhes passar…
Para edificação, fica um par de “linques”:
http://lampadamagica.blogspot.pt/search/label/acordo%20ortogr%C3%A1fico
http://lampadamagica.blogspot.pt/search/label/an%C3%A1lise%20do%20vocabul%C3%A1rio%20da%20mudan%C3%A7a
(Não, não é o meu blogue, é o de um gajo que teve/tem bem mais paciência e habilidade do que eu.)
Um estudo interessante mostra que as tartarugas estão a baralhar a árvore evolutiva e mostram evidência que corrobora design inteligente mostrando que se explicam melhor a partir de um Criador comum do que de especulações sobre um hipotético antepassado comum.
ResponderEliminarBaralhando a árvore evolutiva:
"...turtles are not primitive reptiles as previously thought, but are related to the group comprising birds and crocodilians, which also includes extinct dinosaurs."
Evidência que corrobora o design inteligente:
"...turtles follow the basic embryonic pattern during development. Rather than developing directly into a turtle-specific body shape with a shell, they first establish the vertebrates' basic body plan and then enter a turtle-specific development phase."
"Another unexpected finding of the study was that turtles possess a large number of olfactory receptors and must therefore have the ability to smell a wide variety of substances. The researchers identified more than 1000 olfactory receptors in the soft-shell turtle, which is one of the largest numbers ever to be found in a non-mammalian vertebrate."
Especulações evolucionistas sobre um antepassado comum:
"...the researchers predict that turtles must have split from this group around 250 million years ago, during one of the largest extinction events ever to take place on this planet."
Ou seja, ficamos a saber que as tartarugas têm características únicas bem definidas, o que corrobora a sua criação inteligente de acordo com o seu género, embora deixe os evolucionistas a especular sobre a sua origem...
O importante é não confundir factos observados sobre especulações sobre algo nunca observado...
Um estudo interessante corrobora a complexidade irredutível do sistema olfactivo dos ratos, mostrando que cada gene é importante e tem uma função específica, que não evoluiu, e que as mutações destroem estruturas e funções pré-existentes.
ResponderEliminarComplexidade irredutível:
"...has shown that removing one olfactory receptor from mice can have a profound effect on their behavior."
Cada gene é importante porque têm uma função:
"While normal mice innately avoid the scent marks of predators, mice lacking the TAAR4 receptor do not."
"...individual genes matter"
"If you remove just one olfactory receptor in mice, you can affect behavior."
As mutações destroem estruturas e funções pré existentes:
"Color vision is generated by the cooperative action of three light-sensitive receptors found in sensory neurons in the eye. People with mutations in even one of these receptors experience color blindness."
Não há evidência de evolução das funções olfactivas:
"The fact that TAARs are highly conserved means they are likely important for survival,"
Um estudo mostra a função específica de cada gene na formação dos vasos sanguíneos, mostrando que as mutações tendem a destruir estruturas e funções pré-existentes, criando doenças e morte.
ResponderEliminarFunção específica dos genes:
"During vascular development, specialized cells coalesce into three-dimensional "cords" that then hollow out to provide a path for transporting blood throughout the body."
"This process involves the complex coordination of molecular entities like growth factors and signaling molecules"
Carácter destrutivo das mutações:
"...that disrupting a gene that acts as a regulatory switch to turn on other genes can keep blood vessels from forming and developing properly."
"...defects that have been associated with human illnesses such as cancer, stroke, and atherosclerosis".
Como se vê, se qualquer pequena mutação afecta letalmente uma simples estrutura, porque acreditaríamos que milhões de anos de mutações iriam transformar micróbios em microbiologistas?
"A number of other studies have already shown a genetic link between mutations in CASZ1 and hypertension."
O "macaco tagarela" que dirige este blogue dizia que o DNA não codifica nada.
ResponderEliminarMas os cientistas que descodificam o genoma humano receiam agora que ele codifique demasiada informação, deparando-se com a complexidade extrema das interrelações entre a informação codificada...
Quantidades inabarcáveis de informação:
"...they find themselves increasingly threatened by the unthinkable: Too much data to make full sense of."
"...but as the science advances, the challenges become larger. The needle in the haystack of traditional GWAS involves searching through about one million SNPs. This will increase 10- to 100-fold, to about 3 billion positions."
Complexidade extrema das interrelações informativas:
"It's increasingly evident that highly heritable diseases and traits are influenced by a large number of genetic variants in different parts of the genome, each with small effects"
A Bíblia é clara: só um Deus omnisciente e omnipotente é que poderia deter quantidades inabarcáveis de informação e armazenâ-la num suporte de miniaturização extrema.
Por outro lado, a Bíblia também diz que toda a natureza criada ficou sujeita à corrupção por causa do pecado humano.
Zarolho,
ResponderEliminar«Ludwig, se o que te incomoda é que o Estado possa legislar sobre ortografia, então o teu problema não data de 1990, nem de 2012, mas de 1911…»
Eu estou ciente que o problema do abuso de poder por parte dos órgãos do Estado não foi uma invenção de 1990 nem de 2012. No entanto, preocupam-me mais os abusos de poder que decorrem neste momento do que os do tempo da ditadura, da monarquia ou das pirâmides.
«Também és contra a IUPAC? ;-)»
Não. Mas consideraria abusiva uma resolução do conselho de ministros a proibir que se designasse o etanol por álcool etílico. Estas convenções são perfeitamente legítimas enquanto recomendação dos peritos mas não é aceitável que se use a força da lei para as impor.
Outra diferença importante é que a nomenclatura da IUPAC descreve o uso consensual entre as pessoas que mais usam esses termos. O acordo ortográfico visa alterar o uso consensual. Se a IUPAC de repente recomendasse uma nomenclatura diferente da que se usa também acho que era de eleger uma nova IUPAC.
Além disso, a nomenclatura da IUPAC é, como o nome indica, a nomenclatura da IUPAC. Não tem pretensão de ser mais do que isso. É uma convenção entre os químicos. O AO tem a pretensão de definir a forma correcta de escrever, e isso é um disparate. A forma correcta de escrever é a forma como as pessoas consensualmente escrevem e não o que vai dando na telha a este ou aquele professor de ortografices.
«Quanto ao resto que aqui se disse, enfim são as mesmas asneiras que já se diziam em 1989»
Se o Acordo Ortográfico fosse análogo à normalização dos nomes que a IUPAC faz – usar a forma mais consensual que já está em uso, aplicá-la dentro daquele domínio, não ter nada que ver com regulações ou leis nem afectar quem não tenha interesse particular em aderir a essa convenção – eu não teria nada contra. Se a academia do não sei quê publicasse o “Dicionário dos Carolas que Percebem Muito Mais de Português do que Vocês Todos Juntos” com uma ortografia diferente, por mim estavam à vontade. E até podia adoptá-la, se me parecesse útil.
Mas penso que até tu serias contra uma resolução do conselho de ministros a proibir a referência a qualquer substância química sem ser usando a nomenclatura IUPAC, em qualquer comunicação externa ou interna. Ao contrário do que defende o Miguel Sequeira acima, eu não acho que os empregados devam subserviência ilimitada aos seus patrões e a liberdade de expressão parece-me importante demais para ser submetida a este nível de regulação estatal.
Quanto aos links, gostei, mas não têm nada que ver com o meu ponto. Eu não tenho opinião formada acerca do AO em si, enquanto recomendação à lá IUPAC. É como a possibilidade de acabarmos com os verbos irregulares. Por um lado concordo que simplificava bastante a língua, por outro seria estranho dizer “eu sabo” em vez de “eu sei”, e ainda por outro aceito que ao fim de umas poucas gerações já estaria tudo habituado. Ou deixarmos o Português e adoptarmos o Esperanto.
A minha objecção é que, tal como acontece na IUPAC, isto não é matéria de decisão estatal, de resoluções em conselho de ministros, de tratados ou legislação. Não acho legítimo o exercício de poderes do Estado a este nível.
Miguel,
ResponderEliminar« pode impôr aos seus funcionários o AO que quiser (ninguém é obrigado a ser funcionário público; mas, se o for, terá de submeter-se às regras internas)»
Em geral, os contratos de trabalho não são o mesmo que a escravatura ou a servidão dos camponeses medievais. Não me parece que seja verdade isso de que, lá porque alguém foi contratado para desempenhar certas tarefas, automaticamente tenha de fazer tudo o que lhe mandarem.
Já tentaste fazer isso com os teus empregados? Funcionou? ;)
PARA RECORDAR: O LUDWIG VIOLA O DEVER DE RACIONALIDADE SEMPRE QUE AFIRMA A SUA EXISTÊNCIA
EliminarA certa altura, o Ludwig referiu-se a um dever de racionalidade a que, alegadamente, todos estamos subordinados.
O problema do Ludwig é que, por causa da sua visão ateísta e naturalista do mundo, não consegue justificar racionalmente a existência desse dever de racionalidade.
Em primeiro lugar, se o nosso cérebro é o resultado acidental de coincidências físicas e químicas torna-se difícil ter certezas sobre a nossa própria racionalidade.
Não é por acaso que o Ludwig se autodescreveu como “macaco tagarela” quando é certo que o próprio Charles Darwin punha em causa a fiabilidade das convicções que os seres humanos teriam se fossem descendentes dos macacos.
Em segundo lugar, se Universo, a vida e o homem são fruto de processos cegos, aleatórios e irracionais, não se vê como é que de uma sucessão naturalista de acasos cósmicos pode surgir qualquer dever, e muito menos um dever de racionalidade.
Já David Hume notava o que há de falacioso em deduzir valores e deveres (que são entidades imateriais) a partir de processos físicos.
O Ludwig é o primeiro a dizer que não existem deveres objectivos e que toda a moralidade é o resultado, em última análise, de preferências subjectivas arbitrárias.
Na verdade, se a visão ateísta do mundo estiver correcta, quando afirma que o Universo, a vida e o homem foram o resultado de processos irracionais, a ideia de que existe um dever de racionalidade é, em si mesma, totalmente arbitrária, porque destituída de qualquer fundamento racional.
Ou seja, o Ludwig mostra a sua irracionalidade porque sempre que afirma o dever de racionalidade o faz sem qualquer fundamento racional.
Ele viola o dever de racionalidade sempre que afirma a sua existência.
O dever de racionalidade existe apenas se for verdade que o Universo e a vida foram criados de forma racional por um Deus racional que nos criou à sua imagem e semelhança e nos dotou de racionalidade.
Apesar da corrupção moral e racional do ser humano, por causa do pecado, continuamos vinculados por deveres morais e racionais porque eles reflectem a natureza do Criador.
Daí o dever de racionalidade.
Um vídeo interessante sobre o facto de que a selecção natural nada tem que ver com a evolução!
ResponderEliminarNotícias científicas da semana passada comentadas sob a perspectiva criacionista
ResponderEliminar"E quando alguém tem responsabilidade profissional de se fazer entender, nesse caso é mesmo de exigir que seja claro"
ResponderEliminarO problema não tem nada a ver com o entendimento. Entender é fácil para muitas alterações ortográficas. Claramente o problema é outro. Deixo-te a ti descobrir qual é.
Quanto a julgar que textos se lê, para lá da compreensão e do conteudo, por uma questão ortográfica, parece-te assim uma ideia tão boa? Ignoras o conteudo por causa da forma?
Em relação ao profissional pago para se fazer entender por escrito, estou de acordo. Se te pagam para escrever segundo as convenções ou se aceita esse trabalho ou não. Mesmo assim é um pouco como obrigarem-te a vestir de determinada forma no trabalho.
Caro Ludwig,
ResponderEliminar«O que determina a ortografia correcta, tal como a dicção e a semântica, é a forma como as pessoas usam a língua.»
As pessoas não determinam a sintaxe correta. Por que razão haveria de ser assim com a ortografia?
Cumps,
Sofia