Treta da semana: os bifes da Maria.
Nasceu Maria Isabel Torres Baptista Parreira, cresceu na Linha, formou-se na Católica, casou com Nuno Maria Mariano de Carvalho Jonet, trabalhou em Bruxelas mas acabou por deixar a vida profissional para «acompanhar a integração escolar dos filhos» (1). Talvez tenha sido este percurso de vida que levou Isabel Jonet a expor-se recentemente a críticas por dar como exemplos de austeridade não comer bifes todos os dias ou ter de escolher entre ir a um concerto ou tirar uma radiografia depois de uma queda na ginástica (2). Uns dizem que deve abandonar a presidência do Banco Alimentar (3), outros defendem o seu trabalho «no combate à pobreza e à fome em concreto»(4) e a própria já esclareceu que «não estava a falar para os mais pobres»(5), o que quer que isso queira dizer. Esta polémica interessa-me pouco. Penso que uma pessoa com tempo disponível e contactos pode bem administrar voluntários e stocks de alimentos mesmo que as suas opiniões acerca da austeridade não estejam sequer na vizinhança da realidade. Por outro lado, os bancos alimentares combatem a pobreza da mesma forma que o paracetamol combate a pneumonia. Disfarçam alguns sintomas, o que pode ser melhor que nada, mas importa não os confundir com uma cura. O pobre auxiliado continua pobre à mesma.
Mais importante do que as metáforas infelizes da Isabel Jonet é a ideia de que quem sofre com a austeridade é quem esbanjou o dinheiro. O “nós” implícito em «Vivemos nos últimos anos muitas vezes acima das nossas reais possibilidades»(5). É como se pagássemos agora, todos por igual, uma asneira da qual somos todos igualmente responsáveis. Esta visão predomina na direita política, talvez por ser tão confortável para quem a austeridade é assim, sei lá, tipo não poder ir ao concerto por causa da queda na ginástica. Mas é completamente errada.
Quem paga mais caro esta situação são aquelas pessoas, muitas e cada vez mais, que trabalharam durante anos numa profissão e que agora estão sem emprego. Porque a fábrica fechou, ou o restaurante teve de despedir metade dos empregados, e não há mais ninguém que as contrate. O problema não é terem de comer menos bifes. O conceito pode ser difícil de compreender para alguém como a Isabel Jonet, mas o problema é que todo o rendimento destas pessoas vinha de venderem o seu trabalho. Sem comprador não têm dinheiro. Nenhum. Tanto faz se têm muitas dívidas ou poucas, se comiam muito ou se eram magrinhas. Agora ficaram com zero e não têm como viver.
Ao contrário do que explicou a Isabel Jonet, não perderam o emprego por falta de qualificações ou por alguma “restruturação” do mercado de trabalho. Não foi um enorme avanço na ciência da hotelaria que as tornou irrelevantes. A causa imediata foi a contracção do mercado. Se as pessoas compram menos há menos capacidade para manter empregados. A austeridade pode parecer uma virtude quando olhamos para quem decidiu poupar cortando despesas desnecessárias. Menos bifes, por exemplo. Mas quando o bairro todo faz isso várias pessoas perdem o emprego e já não o conseguem recuperar. O custo do reajustamento não é repartido por todos de forma equitativa.
Esta poupança é consequência dos cortes nas prestações sociais, cerca de metade do orçamento público, e nos salários da função pública, que é cerca de um quinto. Isto corresponde a uns 20% da economia portuguesa, só que estas pessoas gastam quase todo o seu rendimento em bens e serviços, pelo que cortes aqui têm um impacto grande na economia, agravado pela expectativa de mais cortes no futuro.
Por sua vez, estas medidas advêm da ideia de reduzir o défice cortando na despesa do Estado em vez de aumentar a receita. Dito assim soa bem, mas o que quer dizer é redistribuir menos. O Estado, supostamente, obtém mais receita de quem tem mais e gasta com quem mais precisa. Ajustar as contas pela despesa é cobrar o défice aos pobres. Não pagam todos por igual.
Também não somos todos igualmente responsáveis pelo défice. Parte do problema está em diferenças estruturais de logística, tecnologia, formação e cultura que tornam Portugal menos eficiente a vender coisas caras do que outros países como a Alemanha. Isto não é culpa de ninguém vivo hoje nem se pode resolver em poucas décadas. Mas o problema principal é os governos, principalmente os de direita, terem cobrado menos do que gastaram. As Jonets dirão que é culpa dos pobres que se fartaram de comer bifes, mas não é. O défice deve-se, por um lado, a dar dinheiro aos ricos em coisas como PPPs e resgates bancários e, por outro lado, a aumentar quase somente impostos sobre os salários evitando aumentar impostos sobre lucros de empresas, especulação financeira e qualquer coisa que incomode os mais ricos (6). Os ricos preferem dizer que o problema foi gastar-se muito em hospitais e escolas, mas parece-me que o mal foi eles não pagarem o que deviam ter pago e levarem mais do que deviam ter levado.
Ajustar o défice pela austeridade é injusto porque penaliza mais severamente quem tem menos culpa. E é um disparate porque deprime a economia tanto ou mais do que um aumento nos impostos sobre lucros e especulação com a agravante de reduzir o apoio aos mais necessitados. Daí ser tão prejudicial esta ideia hipócrita de que “nós” vivemos acima dos nossos meios e, por isso, “nós” temos de aceitar privações, coitadinhos de “nós”. Uns são mais nós do que outros.
1- Visão, Novembro de 2011, A Sra. Banco Alimentar
2- Alfredo Pereira (YouTube), O inacreditável discurso de Isabel Jonet, presidente do Banco Alimentar Contra a Fome.
3- Por exemplo, Petição Isabel Jonet: Demita-se !
4- Expresso, Isabel Jonet, as palavras e os atos
5- Rádio Renascença, OPINIÃO DE ISABEL JONET
6- Correio da Manhã, Estado duplica receita com o IRS cobrado
Excelente. Finalmente, uma visão lúcida sobre o assunto. Grato.
ResponderEliminarPois, isto de aumentar os impostos sobre as empresas não é tão directo como possa parecer, até haver um acordo europeu de impostos, aumentar impostos sobre as empresas só faz com quem possa mude a sede para outro país onde paga menos (como já aconteceu com quase todas as maiores empresas portuguesas). Aumentar os impostos sobre quem ganha mais está a aumentar a imigração destas mesmas pessoas. Eu pessoalmente prefiro que aumentem o IRC do que o IRS, pois uma empresa quando apresenta lucro é porque já não tem mais sítio onde meter dinheiro, até os sacos azuis não podem encher mais sem rebentar... O problema disto é que todas as empresas que puderem mudar a sede para outro local com IRC mais favorável vão fazê-lo. No meu modesto entender não vejo como resolver o problema português sem um acordo europeu de impostos, que acho que nunca vai acontecer porque os países para onde as nossas empresas estão a fugir não estão interessados nisto.
ResponderEliminarA BÍBLIA E A ECONOMIA: ALGUMAS NOTAS
ResponderEliminarEm matéria de economia, a Bíblia parece ter alguns princípios dignos de nota.
A economia deve reflectir o carácter de Deus e guiar-se por princípios de bondade, justiça.
A Bíblia ensina que quem oprime o pobre insulta o Seu Criador.
A Bíblia enfatiza o uso dos talentos dados por Deus, no sentido da sua multiplicação, numa atitude de iniciativa e criatividade e de respeito por princípios de justiça e integridade. As transacções devem ser verdadeiras e justas.
Esse ensino encontra-se em toda a Bíblia.
Também se encontra na Bíblia, logo nos primeiros capítulos de Génesis, a ideia de que o ser humano deve ser verdadeiro, íntegro, amoroso, desenvolvendo a sua actividade laboral cuidando da natureza criada.
A referência que é feita ao dízimo, igualmente no Génesis, salienta a importância de a criação de riqueza ser levada a cabo numa atitude de subordinação a Deus e de reconhecimento de que a riqueza produzida é uma benção de Deus, devendo por isso ser obtida e gerida de forma correcta.
O dízimo consistia em reservar um 10% dos rendimentos para o sustento do culto, para a ajuda aos necessitados (v.g. órfãos, viúvas, estrangeiros) e para a realização de eventos festivos envolvendo toda a sociedade.
O titular dos rendimentos ainda ficava para si com 90% do rendimento. Quem nos dera! A despesa não podia ir além do gerado pelo dízimo.
O dízimo era um imposto proporcional, justo, moderado, fácil de calcular e de cobrar, favorável à criação de riqueza, evitando a complexidade labiríntica dos actuais sistemas fiscais que favorecem a evasão e a fraude fiscal (v.g. fuga para os "off-shore's") e sobrecarregam o tecido empresarial.
A redistribuição do rendimento era efectuada através da despesa, ajudando os realmente necessitados.
Na Bíblia proíbe-se os empréstimos usurários ao mesmo tempo que se alerta para os perigos do recurso ao crédito.
Além disso, estabelece-se, na Bíblia, que de 50 em 50 anos haveria o Ano do Jubileu, em que se redistribuíam as terras, de forma a evitar que as desigualdades económicas e sociais se tornassem intoleráveis.
Na Bíblia, a economia não é a lei do mais forte.
A Bíblia não defende, nem o capitalismo sem justiça, nem o comunismo sem liberdade.
Ela propõe a optimização da liberdade e da justiça, preocupando-se com a criação de riqueza, sem esquecer o amor a Deus e ao próximo, de acordo com princípios de justiça, bondade e verdade.
Na Bíblia, a criação de riqueza é sempre acompanhada por imperativos de justiça social, solidariedade social e segurança social.
O dízimo era de 10%. Os mandamentos de Deus eram 10.
Tudo simples e fácil, possível de ser calculado com os dedos das mãos.
À medida que nos afastamos de Deus, e a injustiça e a desonestidade se multiplicam, os sistemas fiscal e jurídico tornam-se mais complexos e as relações sociais e económicas tornam-se mais injustas.
É certo que a Bíblia descreve (sem nunca prescrever) situações de escravatura e opressão.
Mas as mesmas surgem sempre como consequências do pecado humano e do afastamento dos princípios de justiça e bondade de Deus.
um testemunho interessante vindo do mundo da música...
ResponderEliminarBravo! Muito bem escrito.
ResponderEliminarNuma altura em que Angela Merkel, filha de um Pastor Protestante, vem a Portugal é interessante reflectir sobre o modo como os Estados fundados numa ética Protestante se saíram tendencialmente melhor do que os fundados numa ética católica ou ortodoxa...
ResponderEliminarNormalmente costuma-se dizer que a ética católica tende a fazer mais o elogio da ascese e da pobreza (desde que não seja do alto clero!) ao passo que a ética protestante acentua os valores do trabalho secular (ascese intra-mundana), da laboriosidade, da organização, do metodismo, da integridade, da frugalidade e da poupança...
Embora as coisas sejam mais complexas do que isto, todos concordam que há uma boa dose de verdade nisso...
perspectiva,
Eliminarparece que já não queres responder-me.
Desafio-te a debater comigo sobre ética por escrito em tempo real, num sistema próprio que possa ser visto em público.
Pedro, que tal um Hangout do Google? :-)
EliminarEu ia assistir de camarote :-)
Um problema é que eu sei perfeitamente que não sou bom em debates orais.
EliminarO Jónatas é literalmente um profissional nisso (não me admirava se gabasse disso e sugerisse que sou um cobarde, no tom cínico que já nos habituámos).
Sou tímido com desconhecidos e sensível no modo como trato as pessoas.
É fácil, por exemplo, interromperem-me sem que eu proteste e o Jónatas podia facilmente usar a táctica Gish Gallop e eu atrapalhar-me-ia.
Sei perfeitamente que seria péssimo como advogado, comercial ou político.
Tive há pouco tempo duas formações com uma psicóloga para aprender a corrigir-me, mas preciso de treino.
Além disso, e mais importante: estou a mudar de casa :p
(Ainda hoje fui lá, a correr, para receber um estivador para desenho e montar uma secretária enorme em 2ª mão, quando Testemunhas de Jeová tocaram na campainha e eu pensava que eram os vizinhos para se queixarem do barulho. LOL)
Não quero que me ouçam em casa num debate e posso ser interrompido por familiares.
Se, mesmo assim, preferirem um Hangout, posso aceitar, mas isso teria de ser para o próximo ano.
Desejo a maior sorte à sua psicóloga.
EliminarSe quiser uma ajuda pode ir lendo alguma coisa sobre teísmo, ateísmo, direito e ética
Entretanto chamo a atenção para dois estudos recentes que mostram as diferenças genéticas e as as diferenças epigenéticas e regulatórias que nos separam dos macacos (em sentido amplo)...
Elas corroboram um Criador comum que criou géneros distintos...
perspectiva,
Eliminarpelos vistos continuas a gostar de ser sarcástico.
É uma psicóloga do trabalho, que explica como fazer boas apresentações, gerir conflictos no trabalho, etc.
Vais continuar a enviar comentários do género ou aceitar o desafio?
Tenho uma boa colecção de livros de filosofia, alguns sobre ética, consulto artigos especializados e tenho uma colecção de vídeos de filósofos sobre assunto. Não te preocupes.
Essa suposta "corroboração" é uma enorme treta.
EliminarO que seria algo que não corroboraria?
Com seres-vivos que trocam material genético apenas por combinação aos pares, pelo sexo, a evolução é vertical por isso espera-se que não existem partes que não são da mesma espécie ou incapazes de hibridização de forma natural.
Existem excepções que reforçam a regra: por exemplo, vírus podem injectar o seu material genético em humanos, o que é uma das particularidades que permite inferir como foram evoluíndo, quais foram as ancestrais de cada etnia (ex: os índios são descendentes dos mongóis ou chineses) ou indivíduos. E obviamente que isso também é possível artificialmente. Ou seja, é muito fácil perceber como a teoria da evolução seria refutada através de análises de genomas.
Por isso não é possível existirem quimeras, como é normal na imaginação humana, como os grifos, as sereias e centauros.
No caso dos objectos artificiais, não existem essas limitações biológicas, por isso é muito normal usar partes de um objecto para colocar noutro, ou construir objectos inovadores com partes de muitos outros objectos diferentes. Acontece sempre em informática.
No caso do artigo em particular, o que corrobora é a teoria de ancestralidade comum:
"Humans share over 90% of their DNA with their primate cousins." ... "In all three species, Dr. Gilad's lab found that transcription factor binding and histone modifications were identical in over 67% of regulatory elements in DNA segments that are regarded as promoter regions."
"The results, published in Nature Communications, showed that the gene -- miR-941 -- is unique to humans. The researchers say that it emerged between six and one million years ago, after humans had evolved from apes."
É de esperar que existam diferenças entre os humanos e outros primatas (senão seriam o mesmo, né?), de acordo com a ideia de que tiveram ancestrais comuns, há mais de 29 milhões de anos, separando-se mesmo antes de surgirem os ramapitecos, os australapitecos e as várias espécies do género Homo.
Também estás a ser desonesto. Felino não é género. Os leões e gatos não são do mesmo género. No entanto supostamente acreditas que evoluiram de um mesmo ancestrar, no que chamarias de "microevolução". Vais ter de decidir se Deus criou os géneros ou as famílias.
Os criacionistas têm que redefenir micro-evolução: é que aquilo a que se pode chamar "micro-evolução" são mudanças dentro da mesma espécie e não dentro do mesmo género, família, whatever. "Macro-evolução" é de espécie para cima - especiação já pode ser considerada "macro-evolução", sendo os termos micro e macro-evolução 2 dos preferidos dos criacionistas
Eliminarhttp://www.talkorigins.org/faqs/macroevolution.html#what
http://pt.wikipedia.org/wiki/Macroevolu%C3%A7%C3%A3o#cite_note-2
Olá Ludwig!
ResponderEliminarHá muito que não escrevo por aqui, nem os assuntos ligados à economia e finanças me interessaram grande coisa, de um modo geral.
Contudo, a leitura do blog Outra Margem levou-me a aprofundar algo que me parece muito interessante e se enquadra num movimento de base para a reformulação do atual sistema económico.
Deixo aqui o link para o tema que abri no fórum ThinkFN, um espaço de debate onde tais ideias suscitam natural oposição, sendo muitos dos participantes economistas ou estando diretamente ligados à área financeira.
Um sistema monetário democrático
A IRRACIONALIDADE DA CONCEPÇÃO DO LUDWIG SOBRE DIGNIDADE HUMANA
ResponderEliminarO Ludwig diz que a questão da dignidade humana não pode ficar dependente da questão factual da existência de Deus.
No entanto, a ideia de dignidade da pessoa humana é uma doutrina da teologia judaico-cristã!
Só tem sentido falar em dignidade humana se for verdade que Deus criou o homem e a mulher à Sua imagem, tendo-os dotado de racionalidade, moralidade, criatividade e subjectividade comunicativa e relacionai.
Diferentemente, a dignidade humana nunca poderia ser logicamente deduzida da mitologia grega, em que os próprios deuses se devoravam uns aos outros, de forma arbitrária e sem qualquer respeito pela dignidade uns dos outros, ao mesmo tempo que se compraziam a impor sofrimento e morte aos seres humanos sem qualquer justificação moral.
Do mesmo modo, ela nunca poderia ser logicamente deduzida da ideia evolucionista de que o ser humano é um acidente cósmico, sem qualquer valor intrínseco, resultante de milhões de anos de processos aleatórios, predação, dor, sofrimento e morte...
O próprio Charles Darwin afirmou que, do ponto de vista evolucionista, falar em dignidade da pessoa humana é uma manifestação de preconceito natural e orgulho natural...
A dignidade da pessoa humana é uma doutrina bíblica, fundada na noção de que o homem e a mulher foram criados à imagem e semelhança de Deus e salvos por Ele.
O Budismo é muito interessante. Por um lado, surgiu no período atribuído pelos apologéticos ao reinado de Samuel. Por outro lado, tem características que apologéticos atribui ao cristianismo - ao ponto de haver teorias bizarras de Jesus ter visitado a Índia, tendo aprendido a ética Budista lá (não estou a defender tal coisa; a única prova é uma marca de uns pés furados num templo). Ora, o Budismo já tinha a Regra Dourada e respeitava, não só a vida humana, como de todos os animais como tendo todos direito à vida e sendo todos dignos.
EliminarE no século XIX, os ateus filósofos interessavam-se pelo Budismo, ao ponto Schopenhauer afirmar que a sua filosofia era muito semelhante aos ideais éticos dessa religião, que lhe foi apresentada por Friedrich Majer. Deixo alguns trechos de "História da Filosofia", de Bryan Magee:
"Quando pessoas profundamente reflexivas e inteligentes se confrontam com os mesmos problemas, não é de admirar que cheguem a muitas conclusões semelhantes. Existem semelhanças óbvias do hinduísmo e do budismo, por um lado, e entre a filosofia de Kant e Schopenhauer, por outro."
"O Buda já não acreditava na existência de um eu cósmico e permanente: por outras palavras, não acreditava na existência de um Deus criador. Ele parece ter achado que o predomínio difundido do mal e do sofrimento era um obstáculo insuperável para uma tal crença."
Portanto, se é para os ateus fundarem-se numa religião de amor e que defende a dignidade humana, pode perfeitamente fundar-se numa religião de um ateu indiano que existe antes do cristianismo e do judaísmo.
Duvido sinceramente que Jesus tenha visitado a Índia. Não é impossível, mas não é muito plausível. O problema desses relatos de "Jesus na Índia" é que o nome "Jesus" — "Yoshua" — era muito frequente nessa altura. Tipo "João" hoje em dia em Portugal. Devem haver toneladas de "João Carpinteiro" na lista telefónica.
EliminarHá, no entanto, duas explicações possíveis para se ter "inspirado" na ética budista do chamado Grande Veículo, que estava "na moda" um século antes dele nascer (e 4 séculos e meio depois da alegada vida do príncipe Siddhartha)
Em primeiro lugar, havia muito mais contactos entre civilizações do que se pensa — não eram "isoladas". Alexandre o Grande, uns séculos antes, tinha estabelecido contactos com o Budismo, e, na realidade, as representações estatuárias do Buda são influenciadas pela arte grega (é bem verdade... não havia "arte budista" de representação em estatuária antes dos gregos lá terem chegado). E no retorno trouxe monges budistas para estabelecerem um mosteiro... na sua nova capital, Alexandria.
Alexandria era, no tempo de Jesus de Nazaré, uma "capital da cultura" — tipo a Flandres no séc. XVII. Havia tolerância de religiões e de filosofias, e uma grande aquisição de conhecimentos — arquivadas na biblioteca que se perdeu. Haviam sábios de todo o mundo que estavam aí estabelecidos, e é natural que tenha havido muitos contactos aí e troca de informação. Não é de admirar, pois, que no século antes de Jesus ter nascido, tenham surgido filosofias muito semelhantes entre judeus esotéricos, zoroastristas, filósofos gregos, e sabe-se lá que mais que andava pelas ruas de Alexandria. Se foram "contaminados" pela "novidade" trazida do Oriente — que não era assim tão longe como isso: havia Budistas estabelecidos há séculos naquilo que hoje é o Afeganistão, nem sequer seria preciso viajar até à Índia (ou o Nepal, alegadamente terra de origem do príncipe Siddhartha) — isso é difícil de dizer. O que é certo é que nos cem anos antes de Cristo toda a gente andava a repetir as mesmas coisas, com maior ou menor grau de "teísmo", adaptando às suas religiões/filosofias de origem e re-interpretando sempre a mesma mensagem.
Ora nos Evangelhos alega-se que os pais de Jesus o levaram "para o Egipto"... aonde teriam ido? Alexandria (que fica justamente no Egipto!) faria todo o sentido: era uma cidade tolerante de espírito muito aberto. Especula-se que Jesus tenha encontrado grupos de Essénios, que tinham uma filosofia esotérica muito próxima da mensagem que Jesus depois propagou — e, que por sua vez, muito próxima da do Grande Veículo, mas "contaminada" com teísmo. O que não seria tão invulgar: também por essa mesma altura, na Índia, muitas escolas Hindus estavam a ser "contaminadas" com os mesmos ideais, mas mantendo uma base teísta. Não seria de admirar que o mesmo se passasse mais a ocidente.
EliminarNão seria de admirar igualmente que Jesus, educado em Alexandria, depois quando voltasse à sua terrinha, lá nos confins da Palestina, onde provavelmente o pensamento filosófico contemporâneo da altura não era propriamente encorajado e/ou disseminado, se tenha "destacado" com uma "novidade" que nunca tinha sido escutada por aquelas paragens, causando tal estranhamento por parte da população que tenha realmente sido registado por eventuais seguidores. Essa ideia de que "Jesus trouxe uma mensagem completamente nova e original" foi repetida ao longo dos séculos até aos nossos dias. Na realidade, a mensagem era pouco original, mas seria vanguardista num meio muito pouco alfabetizado e conservador, como era a sociedade judaica (que ainda é assim!). Já com a passagem do Cristianismo para Roma, este foi bem tolerado — Roma partilhava como Alexandria a tolerância e a abertura de espírito, e muito provavelmente já teria a sua dose de profetas e filósofos proclamando a "Regra de Ouro", pelo que mais um grupo a proclamar a mesma coisa seria bem tolerado...
Seja como for, corruptela por corruptela, os exemplos do passado mostram que é perfeitamente possível derivar uma moral e ética sem qualquer necessidade de "atribuição" a um "Deus criador", mas apenas pensando-se pela própria cabecinha — como alegadamente Siddhartha fez — e que este tipo de moral ateia pode perdurar por muitos milénios.
EliminarNão se pode dizer que "todas as sociedades com uma moral ateia são pacíficas" porque isso historicamente nem é verdade. No entanto, é legítimo afirmar que são mais pacíficas durante mais tempo do que as sociedades com uma moral teísta, alegadamente de inspiração divina. Por outras palavras: quando se coloca a origem da moral nas mãos de um deus qq., quem sofre são os humanos — com guerras e violência. Quando a moral é determinada por seres humanos para seres humanos, o resultado são sociedades tendencialmente mais pacíficas e mais pacíficas durante mais tempo.
Dá que pensar :)
A IRRACIONALIDADE DA POSIÇÃO DO LUDWIG FACE AOS VALORES ÉTICOS
ResponderEliminarOs princípios éticos da nossa sociedade têm sido o resultado da matriz judaico-cristã que a estruturou durante séculos. É apenas com com base nesses princípios que se pode defender, logicamente, a igual dignidade de todos os seres humanos.
Se os seres humanos são um acidente cósmico e o produto de milhões de anos de predação, crueldade, sofrimento e morte, é totalmente arbitrário afirmar que têm valor intrínseco e que devem ser tratados de forma igual.
O que tem valido aos Estados ocidentais é a sua matriz de moralidade, igualdade e justiça social derivada da Reforma Protestante e da Bíblia que a estruturou durante os últimos quatro séculos.
São os valores judaico-cristãos que nos ensinam o desvalor de certos actos, que devemos considerar criminosos, ou das drogas, bem como o valor da educação e do desenvolvimento pessoal.
Mas os valores não são massa e energia, nem se podem observar no campo ou em laboratório, existindo apenas num mundo espiritual e imaterial, refutando, pela sua própria existência, uma visão estritamente materialista, naturalista e ateísta do mundo.
É fácil deduzir logicamente a existência de valores de dignidade e igualdade a partir da premissa, que o Génesis estabelece, de que existe uma dimensão imaterial e valorativa no mundo, resultante da natureza boa e justa de Deus, e da igual dignidade de todos os seres humanos por terem sido criados à imagem de Deus.
Mas é impossível deduzir, de forma lógica e não arbitrária, a existência desses valores a partir de uma visão materialista que nega a existência da dimensão espiritual e de tudo que não se pode ver e testar cientificamente.
Em todo o caso, o Ludwig, como especialista que diz ser em pensamento crítico poderia testar esse exercício aqui, de forma racional e fundamentada.
Ficamos à espera.
Desafio-te a defenderes isso em debate comigo em tempo-real.
Eliminardois malucos en temps real?
Eliminare o bilhete sai a quanto?
OS PROBLEMAS DO LUDWIG COM VALORES E NORMAS MORAIS
ResponderEliminarA posição do Ludwig face às normas morais é irracional e auto-refutante. Vejamos porquê:
1) O Ludwig é naturalista, acreditando que o mundo físico é tudo o que existe. Sendo assim ele tem um problema, porque valores e normas morais não existem no mundo físico.
2) O Ludwig diz que a observação científica é o único critério válido de conhecimento. Ora, nunca ninguém observou valores e normas morais no campo ou em laboratório.
3) O Ludwig diz que a moral é subjectiva. Ora, se são os sujeitos que criam valores e normas, eles não estão realmente vinculados por eles, podendo cada um criar valores e normas a seu gosto, o que nega a existência de normas morais.
4) Se a moral é subjectiva, como o Ludwig diz, dificilmente se poderá justificar qualquer pretensão de conferir validade universal às suas pretensas normas.
5) O Ludwig está sempre a dizer aos outros que não devem dizer aos outros o que devem ou não devem fazer. Ou seja, ele faz exactamente o que diz que os outros não devem fazer.
6) De milhões de anos de processos aleatórios de crueldade, dor, sofrimento e morte não se deduz logicamente qualquer valor intrínseco do ser humano nem qualquer dever moral de fazer isto ou aquilo.
Conclusão: sempre que fala em valores e normas morais o Ludwig é irracional e arbitrário.
P.S.
É claro que muitos ateus têm valores! Também eles foram criados à imagem de um Deus moral e muitos vivem com dignidade e liberdade numa civilização judaico-cristã.
O problema é que os ateus não conseguem justificar logicamente esses valores a partir da visão do mundo naturalista e evolucionista a que aderem pela fé.
Como diz a Bíblia (Romanos 1, 21ª e 22), “tendo conhecido a Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe renderam graças…” “…dizendo-se sábios, tornaram-se loucos”.
1) Não, mas existem na cabeça de quem as inventa. E essa cabeça é (alegadamente) física.
Eliminar2) A disciplina da ética observa justamente normas e valores morais "em laboratório". Assim como a sociologia, a antropologia, a psicologia...
3) Sim.
4) Apenas no sentido de que todos somos seres humanos, e que raciocinamos mais ou menos da mesma forma, logo, iremos chegar mais ou menos às mesmas conclusões. Afinal de contas, o autor que escreveu as normas morais judaico-cristãs-muçulmanas, inspirada divinamente ou não, chegou às mesmas conclusões que o resto do mundo.
5) Sim! Heh.
6) Não, mas pode-se observar justamente esses processos aleatórios de crueldade, dor, sofrimento e morte e perguntar: quais são as suas causas? E, encontrando-as, erradicá-las. Um ser humano que se dedique a isto tem valor :)
Quanto ao P.S., eu tb tenho essa questão, pois o Ludwig realmente parece advogar a arbitrariedade das normas morais (embora talvez eu o tenha entendido mal). Porque, historicamente, os ateus do passado conseguiram perfeitamente justificar logicamente esses valores a partir da sua visão do mundo, naturalista ou não (e nessa altura nao havia teoria da evolução, pelo menos não da forma que Darwin a apresentou), e, justamente por o fazerem de forma lógica, o processo é passível de ser replicado por terceiros.
"...visão do mundo naturalista e evolucionista a que aderem pela fé." Fé? Evidências, ao contrário do criacionismo. E gostava de saber o que é que o perspectiva quer dizer com "visão evolucionista".
EliminarO que é que o perspectiva quer dizer com evolucionista?
EliminarCOMO O LUDWIG VIOLA O DEVER DE RACIONALIDADE SEMPRE QUE AFIRMA A SUA EXISTÊNCIA
ResponderEliminarA certa altura, o Ludwig referiu-se a um dever de racionalidade a que, alegadamente, todos estamos subordinados.
O problema do Ludwig é que, por causa da sua visão ateísta e naturalista do mundo, não consegue justificar racionalmente a existência desse dever de racionalidade.
Em primeiro lugar, se o nosso cérebro é o resultado acidental de coincidências físicas e químicas torna-se difícil ter certezas sobre a nossa própria racionalidade.
Não é por acaso que o Ludwig se autodescreveu como “macaco tagarela” (sic)quando é certo que o próprio Charles Darwin punha em causa a fiabilidade das convicções que os seres humanos teriam se fossem descendentes dos macacos.
Em segundo lugar, se Universo, a vida e o homem são fruto de processos cegos, aleatórios e irracionais, não se vê como é que de uma sucessão naturalista de acasos cósmicos pode surgir qualquer dever, e muito menos um dever de racionalidade.
Já David Hume notava o que há de falacioso em deduzir valores e deveres (que são entidades imateriais) a partir de processos físicos.
O Ludwig é o primeiro a dizer que não existem deveres objectivos e que toda a moralidade é o resultado, em última análise, de preferências subjectivas arbitrárias.
Na verdade, se a visão ateísta do mundo estiver correcta, quando afirma que o Universo, a vida e o homem foram o resultado de processos irracionais, a ideia de que existe um dever de racionalidade é, em si mesma, totalmente arbitrária, porque destituída de qualquer fundamento racional.
Ou seja, o Ludwig mostra a sua irracionalidade porque sempre que afirma o dever de racionalidade o faz sem qualquer fundamento racional.
Ele viola o dever de racionalidade sempre que afirma a sua existência.
O dever de racionalidade existe apenas se for verdade que o Universo e a vida foram criados de forma racional por um Deus racional que nos criou à sua imagem e semelhança e nos dotou de racionalidade.
Apesar da corrupção moral e racional do ser humano, por causa do pecado, continuamos vinculados por deveres morais e racionais porque eles reflectem a natureza do Criador.
Daí o dever de racionalidade.
Atenção que não existe "a visão ateísta do mundo". Existem VÁRIAS visões ateístas do mundo. O Ludwig subscreve a uma delas, mas não é a única.
EliminarDa mesma forma não existe "a visão teísta do mundo". Cada religião tem a sua :)
Sendo assim, o seu argumento é igualmente válido para todas as religiões...
Notícias científicas interessantes:
ResponderEliminarOs estudos mais recentes apontam no sentido de que o cérebro humano foi programado para a harmonia e a elegância dos sons o que refuta a sua origem acidental e aleatória e corrobora inteiramente o que o livro de Génesis diz acerca da criação do homem por um Deus racional, criativo, ordenado e harmonioso e para o desenvolvimento imediato da música.
Do mesmo modo, também são corroboradas as ideias bíblicas de que o homem foi criado para adorar a Deus e de que a música ocupa um lugar central na adoração.
Por outro lado, um recente estudo sobre energia negra mostrou mais uma vez a insuficiência dos modelos cosmológicos dominantes levando os cientistas a concluir que "a radical rethink will be necessary".
A mudança mais radical em que se pode pensar é esta: começar a teorizar a partir do livro de Génesis!
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ResponderEliminarNotícias interessantes do ponto de vista bíblico:
ResponderEliminarO cérebro humano, a internet e o cosmos obedecem às mesmas leis...
Não admira. Existe um Criador comum que criou o Homem à sua imagem.
O cérebro dos chimpanzés é distinto do dos seres humanos
Não admira. Pertencem a géneros diferentes.
Chimpanzés e seres humanos têm semelhanças genéticas mas sistemas regulatórios diferentes
Não admira. Têm um Criador comum, mas pertencem a géneros diferentes.
As partes do genoma que se pensava serem inúteis cumprem, afinal, importantes funções regulatórias
Não admira. Foram criadas de forma inteligente para servir funções específicas.
Foram encontrados tecidos moles, proteínas e possivelmente DNA em ossos não fossilizados de dinossauros.
Não admira. Foram criados e extinguiram-se recentemente.
Um fóssil de âmbar contém uma aranha a atacar uma vespa iguais às actualmente existentes.
Não admira. Viverem e morreram recentemente, tendo perecido abruptamente.
Algumas células com mutações replicam sistematicamente o seu DNA com resultados desastrosos
Não admira. Tendo sido criadas de forma perfeita e precisa, elas estão afectadas pela corrupção e da morte que afectam toda a natureza por causa do pecado humano.
Só vejo filósofos aqui. Vão trabalhar e deixam-se de palhaçadas !
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