Modelos
O modelo mais básico da epidemiologia é o dos susceptíveis (S), dos infectados (I) e dos recuperados (R), aos quais chamarei removidos por incluirem não só os que já não apanham a doença por terem ganhado imunidade mas também os que ficaram imunes por óbito. A ideia deste modelo é que pessoas infectadas contagiam os susceptíveis com uma certa taxa mas depois, no final do curso da doença, já não voltarão a contraí-la e, por isso, são removidos da população em risco. Assim, inicialmente o número de infectados vai crescendo exponencialmente em função da taxa de contágio mas, como o número de susceptíveis começa a diminuir, eventualmente a taxa de crescimento dos infectados é ultrapassada pela taxa de remoção (por recobro ou óbito) e o número de infectados começa a cair. O gráfico abaixo mostra uma comparação das curvas obtidas aplicando este modelo a uma gripe normal e à COVID-19 para uma população de 10 milhões de habitantes (1).
Tenho encontrado pessoas a criticar o alegado exagero das medidas que se está a tomar. Curiosamente, fogem de especificar a que medidas se referem. Lavar as mãos? Proibir missas e jogos de futebol? O que fazem é alegar vagamente que este novo vírus não é muito diferente da gripe normal. Mas é. É muito mais contagioso. A taxa de contágio dos vírus da gripe é aproximadamente 1.15, o número médio de pessoas que um doente infecta antes de recuperar. Para o vírus da COVID-19 as estimativas variam entre 2 e 2.5, ou mais se não houver sequer precauções elementares. Parece pouca diferença mas o que conta é o que está acima de 1, que é o que faz a epidemia crescer. Por isso podemos pensar na COVID-19 como sendo dez vezes mais contagiosa do que a gripe. E isto nota-se nas curvas simuladas assumindo estes parâmetros. Enquanto que um surto de gripe infecta, no pico, oitenta mil pessoas em Portugal, se deixarmos a COVID-19 à vontade ultrapassa os dois milhões. Isto é o número de pessoas doentes em simultâneo. Além disso, a doença é mais grave e prolongada. Em cada 10 pessoas, uma precisa de cuidados hospitalares, o que daria duzentos mil portugueses gravemente doentes para 35 mil camas e 1500 ventiladores disponíveis em Portugal. E isto assumindo que todos os outros doentes se curavam milagrosamente neste período para vagar lugares e equipamento. Eu simpatizo com quem questiona a autoridade e sou sempre a favor do cepticismo. Mas antes de dizerem asneiras façam as contas. Isto não é uma gripe.
Outra linha de argumentação que tem surgido é a comparação com o número de pessoas que morre em Portugal de pneumonia, de gripe e assim por diante. As contas são fáceis de fazer. A esperança média de vida em Portugal é 81 anos o que, com cerca de 10 milhões de habitantes, dá 10 mil mortes por mês. Morre por mês em Portugal quase tanta gente quanto as 13 mil pessoas que morreram em todo o mundo por causa do novo coronavírus desde o início do ano. Mas isto não são boas notícias. Primeiro, porque morreram 13 mil pessoas mesmo apesar de se tentar tomar as tais medidas que alguns acham exageradas. E, em segundo lugar, isto é apenas o início. O gráfico abaixo mostra a posição dos vários países contando as semanas passadas desde o primeiro caso reportado e se a corrida até ao pico fosse em Portugal (2).
Devo apontar que isto não são previsões. Pelo menos por cá, é provável que se consiga retardar a epidemia durante cerca de um ano até haver vacina. Com uma vacina a taxa de contágio fica muito reduzida (3) e a epidemia fica controlada. Infelizmente, as medidas de higiene e distanciamento social só funcionam onde há água canalizada e não é preciso reunir pessoas diariamente à volta do poço. Temo que muitos países farão a trágica escalada até ao cume daquele pico. Mas por cá as medidas que estamos a adoptar parecem fazer efeito e o aumento em proporção ao número de casos está a diminuir. O painel da esquerda mostra o número de casos em cada dia em proporção ao dia anterior a partir de 11 de Março (antes disso há muita flutuação porque os números são pequenos), a recta ajustada aos pontos e a mancha que dá ideia da incerteza no declive(4). Como esta redução faz os pontos desviarem-se da exponencial, podemos (pelo menos quem sofra do mesmo que eu) sentir-nos tentados a usar o modelo SIR. Isto é um erro porque o SIR pressupõe uma taxa constante de contágio e o que trava a infecção é a redução na fracção de indivíduos susceptíveis. Não é o que se passa agora e, como mostra o gráfico da direita, se formos ajustando o SIR aos dados que vêm vamos subestimar muito o perigo que ainda há por o modelo confundir o abrandamento causado pelas medidas tomadas com o ponto de inflexão na curva. Por exemplo, o modelo com os dados até hoje prevê um factor de contágio de 1.2 e um tempo de recuperação de cerca de um dia.
É por isso que eu prefiro ir seguindo o que acontece usando curvas exponenciais ajustadas ao período mais recente, conforme os dados vão chegando. Por um lado, isto dá uma ideia visual do impacto futuro das medidas que vamos tomando, algo que não é perceptível no gráfico do declive. Mas, por outro lado, não comete o erro de presumir que nos estamos a afastar da fase de crescimento exponencial. Enquanto apenas uma fracção pequena de pessoas estiver infectada, e é crítico que assim se mantenha, o crescimento será exponencial. O que muda é o factor de multiplicação. Aqui fica então o boneco para hoje:
Nota: Se alguém quiser experimentar isto, pus o código e os dados nesta pasta partilhada. Precisam de Python 3.x e algumas bibliotecas; o mais prático será instalar a distribuição Anaconda (https://www.anaconda.com/distribution/). Se notarem erros, agradeço que me digam, de preferência depois de os corrigirem :)
1- Os parâmetros para a gripe tirei desta apresentação e para a COVID-19 usei um r0 de 2.2 e uma duração média de duas semanas.
2- Segundo dados do ECDC, aqui, e considerando apenas países com mais de 200 casos confirmados num só dia.
3- Muita gente julga que a vacina serve para nos protegermos individualmente. Em geral, a eficácia para isso é pouca, reduzindo apenas a probabilidade de ser infectado. Mas, colectivamente, se toda a gente se vacinar reduz-se o tal factor de propagação e a doença não arranca sequer. A protecção vem de não haver gente doente para nos contagiar.
4- A mancha e o desvio padrão no declive foram calculados por bootstrapping residual usando 1000 réplicas.
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ResponderEliminarOlá a todos, Meu nome é Andre Douglas, meu e-mail de hangout é andrecamilodouglas@gmail.com.
EliminarTenho sido HIV positivo desde os últimos três anos com minha namorada, mas hoje estou feliz por ser HIV negativo com a ajuda do medicamento fitoterápico do Dr. O.water, o grande curador. Eu estava navegando na Internet em busca de ajuda quando me deparei com um testemunho compartilhado por alguém sobre como o Dr. O.water o curou do vih. Sempre acreditei que existe solução para todos os problemas. Estou em Bedum, Holanda, mas tentei o meu melhor para ter certeza de que falaria com o Dr. O.water porque eu precisava muito de seu tratamento. Felizmente para mim, peguei o remédio e usei conforme as instruções. Dr. O.water trouxe um sorriso ao meu rosto com seu medicamento à base de ervas. Estou muito feliz hoje por termos alguém como esse grande curador por aí. Portanto, meu povo, por favor, contate este curandeiro em seu e-mail: DRWATERHIVCURECENTRE@GMAIL.COM ou Whatsapp: +2349050205019. Ele também pode curar Herpes, Hepatite B, Hepatite C, HPV, Diabetes, Câncer, Asma e muito mais
Suponho que será particularmente visível/detetável uma diminuição “brusca”do fator de multiplicação devido à nossa entrada em modo de afastamento social (físico). Se houver uma elevada “distribuição” do tempo necessário entre a infecção e os sintomas talvez ainda não seja possível detetar esta diminuição.
ResponderEliminarSeria interessante fazer uma análise similar aos dados da China (o factor de multiplicação). Porque ou algum fator desconhecido provocou a imunidade de grupo por lá, ou estão a brincar com o fogo. Parecem achar que, agora, basta o distanciamento social (físico) sem necessidade de lockdown agressivo (e custos associados). Talvez tenham razão e medidas adicionais sejam pura cosmética.
Obrigado Ludwig, parece muito interessante, a ver se logo dou uma olhada melhor. Entretanto, nitpick: "Mas, em colectivamente," -> será colectivo? :-)
ResponderEliminarOsvaldo,
ResponderEliminarEu penso que será difícil detectar uma mudança brusca porque o atraso entre a medida e o efeito varia de pessoa para pessoa. Se mil pessoas contraírem a doença na véspera de se impor uma quarentena, algumas vão manifestar sintomas ao fim de dois dias, outras três, quatro, etc. Portanto vai sempre ser algo distribuído por vários dias.
Mas quando tiver tempo vou dar uma olhada nos dados de outros países para ver o que se pode esperar por cá.
Óscar,
ResponderEliminarDevo ter mudado de “em conjunto” para “colectivamente” e escapou-me o “em”. Obrigado pela correcção; já editei o post.
Há quem esteja a usar o modelo exponencial para fazer previsões a médio / longo prazo. Isso, na minha opinião, não é correcto, pois no final de Abril teríamos 19 milhões de infectados!
ResponderEliminarEu fiz a regressão exponencial da curva da taxa de propagação e extrapolei para o futuro.
Um verdadeiro génio, muita saudade de si como professor. O melhor do mestrado, cumprimentos!
ResponderEliminarParabéns pela iniciativa
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