Direitos de autor.
A conversa de ontem, na audição pública sobre censura e internet (1), deu-me inspiração para vários posts. Falta agora o tempo para os escrever mas, para já, aproveito para agradecer o convite do grupo parlamentar do Bloco de Esquerda e a todos os intervenientes pela estimulante troca de ideias. Nestes anos de crítica aos defensores de direitos exclusivos de cópia, por vezes tenho receado estar a criticar caricaturas exageradas em vez daquilo que realmente defendem. Estou, por isso, grato aos intervenientes que me ajudaram a pôr de parte este medo.
Durante a conversa, muita gente falou sobre direitos de autor. Que são importantes, que temos de os respeitar e assim por diante. Estou inteiramente de acordo. No entanto, penso que há algum equívoco no uso da expressão e espero que este post ajude a desfazê-lo.
O autor tem o direito de criar sem ser perseguido, preso, torturado ou morto por aquilo que criou.
O autor tem o direito a uma educação e ao acesso às obras de que necessita para desenvolver o seu potencial. A todas as obras publicadas, e mesmo que o autor seja pobre.
O autor tem o direito de manter as suas obras privadas e tem o direito de as tornar públicas sem que o forcem, proíbam ou censurem. Tem, em especial, o direito de copiar e distribuir as suas obras como e quando quiser sem que outros reclamem monopólios sobre elas.
O autor tem o direito de transformar as obras dos outros. Ninguém cria do nada e criação é sempre transformação. Por isso, o autor tem o direito de se inspirar no que já foi feito, tem o direito de citar, de adaptar e de combinar o que outros criaram antes. E tem o direito de contribuir para o que os outros vierem a criar depois fazendo o mesmo com as obras que ele criou.
O autor tem o direito de ser reconhecido como criador das suas obras e tem o direito de mudar de ideias e repudiar aquilo que criou mas no qual já não se revê.
O autor tem os mesmos direitos que todos nós temos porque, no fundo, todos somos autores. Todos criamos coisas novas transformando o que já existe e todos contribuímos algo para os que vierem depois. E, como todos nós, o autor tem o dever de respeitar os direitos dos outros.
Além disto, há também uma lei que concede monopólios sobre a cópia de expressões materiais das obras com o propósito de tornar as cópias mais caras. Estes não são bem direitos. São mais como as licenças dos táxis, que podem ir dando rendimento ao dono ou podem ser vendidas a terceiros. Como estes monopólios legais costumam ser vendidos, e como duram até setenta anos após a morte do autor, normalmente nem sequer são do autor. O costume é acabarem nas mãos dos fabricantes de cópias, que são quem mais proveito tira deste sistema. Infelizmente, em muitos casos em que alguém diz defender os “direitos de autor”, refere-se apenas a este disparate ignorando os outros que são mesmo direitos e mesmo do autor.
1- Pirataria e censura digital.