terça-feira, outubro 17, 2023

J'adoube.

É mais fácil apontar defeitos do que propor soluções. Por isso começo pelos defeitos da reacção de Israel. Pretende isolar Gaza até que libertem os reféns, bombardear edifícios usados pelos terroristas e enviar tropas para destruir o Hamas. Isto vai matar muita gente. Infelizmente, das partes atentas ao conflito, que além dos protagonistas incluem eleitores israelitas, o povo de Gaza e a comunidade internacional, o Hamas é a que menos receia a morte de civis palestinos. Seja para recrutamento, financiamento ou reduzir o apoio internacional a Israel, quanto mais crianças palestinas morrerem melhor será para o Hamas. Chamam-lhes mártires e são um dos activos principais destes grupos terroristas. Além disso, a ameaça de bloqueio é politicamente insustentável. Nem a comunidade internacional nem os israelitas vão tolerar que Netanyahu mate civis sem termo numa tentativa fútil de fazer o Hamas ceder. Parece-me que o governo de Israel está a entalar-se num beco de onde só pode sair recuando.

O objectivo de desmantelar o Hamas também me parece mal pensado. O Hamas não é apenas um grupo de terroristas. É um sintoma. Descendente da Irmandade Muçulmana do Egipto, é uma de muitas secreções daquela doença que mantém milhões de mulheres de cara tapada, que arrastou o Afeganistão e o Irão de volta à idade do bronze, que põe bombas em Madrid, mata desenhadores em Paris e de vez em quando tenta assassinar o Salman Rushdie. Destruir o Hamas é coçar as borbulhas sem tratar a infecção. O alívio é muito breve e pode até piorar o problema, pois não vão faltar voluntários para substituir quaisquer baixas.

Não vejo boas opções. Mas as restrições do problema parecem tão fortes que limitam muito a escolha. Neste momento, Israel não pode fazer cedências nem procurar negociar com o Hamas. Seria recompensar o ataque de dia 7 e incentivar novas tentativas. E uma ofensiva vinda de Israel é precisamente o que o Hamas quer. O fundamentalismo impede o pensamento crítico mas é compatível com a manha e o Hamas sabe que nem rockets nem ataques terroristas vão ganhar esta guerra. O propósito de bombardear Israel a partir de zonas densamente povoadas, e todos os outros actos terroristas, é provocar Israel a matar palestinos. A morte de civis palestinos alimenta o ódio, mantém o Hamas no poder, torna a guerra ainda mais santa e, insha'Allah, há de haver virgens para todos. É só vantagens. A longo prazo têm de manter a natalidade acima das perdas mas para isso o Islão sabe convencer as mulheres a colaborar.

Quando todas as jogadas são más o melhor é não jogar. Israel tem apenas de ajeitar as peças. Tem de melhorar a segurança nas fronteiras, identificar e corrigir as falhas de informação que permitiram este ataque de surpresa e procurar mediadores que convençam o Hamas a devolver os reféns. Mas podia deixar o resto na mesma. Ganhava capital diplomático, frustrava os planos do Hamas e poupava imensas vidas. Infelizmente, mesmo em circunstâncias favoráveis há uma tendência para preferir medidas drásticas. Em momentos como este é ainda mais difícil vender soluções racionais. Especialmente com as forças políticas que agora controlam o governo israelita.

Para terminar, aponto também um defeito a este texto. A racionalidade de um acto depende do seu propósito e esta declaração de guerra é irracional apenas se o governo de Israel estiver à procura de um caminho para a paz. É isso que pressuponho porque acho que devia ser esse o objectivo último de qualquer medida para gerir este conflito. Mas o que deve ser nem sempre é.

21 comentários:

  1. nem a comunidade internacional nem os israelitas vão deter o massacre de uns milhares de civis palestinianos, daqui a uma semana a guerra contra o hamas continuará e haverá provável escassez de alimentos e centenas de milhares continuarão amontoados em rafah

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    1. passaram 9 dias e a comunidade internacional está-se lixando daqui a uma semana inda não há cessar fogo nem nada que o valha o cerco e invasão de gaza pode durar meses

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    2. a bolívia corta relações diplomáticas com israel dia 25

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    3. 31 dias depois a comunidade internacional vai dando uns bitaites e costa demite-se

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    4. a ofensiva final contra gaza continua agora com 4 horas de pausa

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    5. reunião na arábia saudita para um cessar-fogo, descobre-se que deus é costa e a guerra prossegue a bom ritmo

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    6. hospitais em Gaza em colapso, a ofensiva prossegue em bom ritmo, Galamba aguenta-se até terça-feira plo menos

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    7. trégua à vista galamba caiu na 2ª feira o resto cai um dia destes lá para 2024

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    8. De sempre
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      1328 a trégua dura mais uns dias e a guerra recomeça dentro de momentos a comunidade internacional está-se lixando

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    9. iste tem altos e baixos, mais uns dias de trégua De sempre
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    10. continua o ataque ao sul e escaramuças na cisjordânia, israel está-se lixando para a dita opinião internacional que também não se manifesta muito

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    11. Biden avisa israel e israel avisa biden que guerra vai continuar mesmo sem apoio americano

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  2. A conversa sobre as virgens é um despropósito completo que visa patologizar a ira justificada de quem é oprimido, e tenta perpassar a ideia de que há um problema religioso, quando não há. A religião é o amparo de quem sofre e se sente impotente. Muitos deles terão certamente visto familiares/amigos a serem mortos, expropriados, etc, e os violentadores estão completamente impunes. A conversa das virgens é uma caricatura infantil de quem não percebe patavina da violência e iniquidade a que israel submete os palestenianos. Deixe aqui a definição de terrorista e mostro-lhe com facilidade que: i) o Hamas não é terrorista; ou ii) o Hamas e israel são terroristas (entre outros buddies aliados); ou iii) que a sua definição de terrorismo é sinónimo de Hamas. Deixo só um documentário particularmente revoltante: https://www.aljazeera.com/program/radicalised-youth/2018/11/13/thou-shalt-not-kill-israels-hilltop-youth

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  3. Factos:
    1) israel é um estado de apartheid sobre os palestenianos (relatório da Human Rights Watch: https://www.hrw.org/report/2021/04/27/threshold-crossed/israeli-authorities-and-crimes-apartheid-and-persecution). Um vídeo para digestão rápida: https://www.youtube.com/watch?v=MknerYjob0w.
    2) a comunidade internacional "cagou de alto" (i.e. ignorou prepotentemente) todas as tentativas no quadro do direito internacional de que fosse feita justiça pelas continuadas violações dos direitos humanos cometidas por israel. Exemplos aqui: https://jacobin.com/2023/10/israel-western-allies-bds-palestine-nonviolent-resistance-opposition.
    3) Exemplos recentes do facismo racista de israel:
    a) Israel security minister bans Palestinian flag-flying in public: https://www.theguardian.com/world/2023/jan/09/israel-security-minister-bans-palestinian-flag-flying-in-public
    b) Netanyahu’s call to deport Eritreans shows Israel’s racism is global: https://www.aljazeera.com/opinions/2023/9/6/netanyahus-call-to-deport-eritreans-shows-israels-racism-is-global
    c) Israel used 'calorie count' to limit Gaza food during blockade, critics claim (Oct 2012): https://www.theguardian.com/world/2012/oct/17/israeli-military-calorie-limit-gaza
    E podia passar a vida nisto.
    Criaram um monstro que é uma potência nuclear e agora é esta merda que se vê. Enfim, é um mundo de impunidade ad nausea.

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  4. Deixo abaixo link para um documentário onde se pode ter uma ideia de qual é o pensamento da juventude de Palesteniana e de Gaza em particular. A propósito da manifestação "The March of Great Return", na qual os Palestenianos refugiados reclamavam o direito a regressar às suas terras (ver Nakba). O estado racista, prepotente e impune israelita matou 223 palestenianos, e feriu (muitas delas gravemente) outras 9204. https://www.aljazeera.com/program/witness/2018/9/24/between-fire-sea-the-man-behind-gazas-great-march-of-return

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  5. @Ludwig: veja se estuda o assunto e deixe de ser burro. Você não percebe nada da natureza humana, e cria caricaturas para simplificar a construção do modelo pelo qual vê mundo. Simplificar é importante em ciência, mas não ao ponto de deiteramos fora aspectos cruciais para a compreensão de um fenómeno.

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  6. O Von Neumann também não percebia nada da natureza humana e, não fossem pessoas mais entendidas, poderíamos ter enfrentando uma guerra nuclear. Ver minmax strategy, e como os modelos simplificados que aproximam a natureza humana são uma bela merda.

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  7. Olá Ludwig,

    Vejo que continuas sob o jugo da peregrina ideia de que o grande problema dos palestinianos, é que seguem uma religião particularmente bárbara... O que é asneira da grossa, porque mesmo se eles fossem ateus hiper-racionais, qualquer ser humano que não seja um espantalho, que passasse *décadas* a sofrer o que eles sofreram (e continuam a sofrer), reagiria através da violência.

    Contudo, o último parágrafo diz-me que a tua mente está a abrir-se para a possibilidade de que, se calhar, talvez apenas, haja mais factores em jogo. Apenas posso esperar que em algum momento os mainstream media decidam relatar o sofrimento dos civis palestinianos do mesmo modo como retratam o dos civis ucranianos (e agora, também o dos civis israelitas). Talvez aí finalmente te dês conta da enormidade do disparate que é dizer que o sarilho que envolve o médio oriente é por causa do islão...

    Finalmente, isto é simplesmente falso: «O fundamentalismo impede o pensamento crítico». Não, não impede. Apenas baseia esse pensamento em premissas que no ocidente são (felizmente!) inaceitáveis. Afirmar o contrário é chauvinismo ocidental (i.e., aquela velha ideia que pensamento crítico, só com a superioridade óbvia dos valores ocidentais, caso contrário, na pas). Meio século depois do fim do colonialismo, ainda andamos nisto...

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  8. PhD thesis (Oxford, 1986): Jewish terrorist activities and the British government in Palestine, 1939-1947.

    From 1939 to 1947 two Jewish terrorist organizations, the Irgun Zvai Leumi and the Lohamei Herut Israel (known to Jews by its Hebrew acronym, Lehi, and to the British as "The Stern Gang") challenged Britain's rule over Palestine. Those eight years began with the publication of the White Paper in May 1939 and ended in September 1947 with the decision taken by the British Government to surrender its League of Nations Mandate and withdraw from Palestine. This thesis examines the influence that Jewish terrorist activities had on Britain's policy for Palestine and seeks to ascertain the role played by terrorism in that decision. Through an examination of British policy and the strategies employed by the British Army to defeat the terrorists, this study demonstrates why the British failed to reach either a military or a political settlement in Palestine. This failure can.be attributed both to the irreconcilable nature of Arab and Jewish claims to the country and the lack of a clear and consistent policy for Palestine on Britain's part. The situation was further aggravated by the weaknesses of the Palestine Police Force, the futile efforts of the Palestine Government to obtain the cooperation of the Jewish public against the terrorists and the debilitating effect of Jewish terrorist activities on the morale of the British soldier in Palestine. The search for a solution to the Palestine problem after World War II took place amid increasing terrorist violence in the country. As British authority in Palestine deteriorated, Britain's will to remain there dissolved. This thesis concludes that no single factor itself can be considered responsible for the decision to surrender the mandate and leave Palestine. At the same time, however, Jewish terrorist activities played an important--and even a decisive--role in the events that led to the termination of British rule over Palestine and the establishment of the State of Israel.

    Os métodos terroristas, de inspiração nazi e fascista, levados a cabo pelo Irgun, liderado por Menachem Begin, também foram denunciados por diversos intelectuais judeus, entre os quais Albert Einstein e Hannah Arendt, numa carta aberta publicado pelo jornal The New York Times no dia 4 de dezembro de 1948.

    Menachem Begin
    Primeiro-ministro de Israel
    Período 20 de Junho de 1977 – 10 de Outubro de 1983

    Nos meses seguintes à proclamação do Estado de Israel, em 1948, a maior parte dos integrantes da Irgun e da Haganá integraram-se no exército regular, tendo a organização sido oficialmente desmantelada em janeiro de 1949.[4] [5]

    Alguns dos antigos membros da organização também ajudaram a formar o partido Herut ("Liberdade"), criado no fim do mesmo ano. O Herut foi a matriz do atual Likud, partido de direita israelense.

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