domingo, setembro 28, 2014

Treta da semana (passada): a treta fracturada.

Alexandre Homem de Cristo escreveu que «a esquerda fracturante» sofreu uma «importante derrota política» porque tem afirmado «que o aquecimento global é uma evidência dos nossos tempos […] E com uma causa simples de identificar: a poluição causada pelo homem». Mas agora, segundo Cristo, está demonstrado que «O aquecimento global estagnou»(1), daí a alegada derrota. Isto no início do texto. No fim, Cristo admite que a sua premissa é falsa ao afirmar que «a questão-chave nunca foi reconhecer que há aquecimento global ou que a acção humana pode contribuir para o efeito estufa (isso está efectivamente demonstrado)». No entanto, para Cristo a falsidade assumida da premissa nada interfere na validade da conclusão.

Não se querendo ficar pela confusão lógica de suportar a sua conclusão negando a premissa da qual esta depende, Cristo dedica também boa parte do seu texto à confusão conceptual entre aquecimento global e alterações climáticas. Afirma que «as evidências [para o aquecimento global] deixaram de ser evidentes» porque «um artigo publicado na reputada revista “Science” […] mostra como é complexo o equilíbrio de factores que têm influência sobre o clima». O aquecimento global é o aumento da temperatura média da Terra. A Terra recebe energia do Sol e irradia energia para o espaço. Conforme aumentamos a concentração de CO2 na atmosfera diminuímos a quantidade de energia que a Terra irradia àquela temperatura. Como passa a receber mais energia do que perde, a temperatura média aumenta até atingir um novo equilíbrio entre a energia que perde e a que recebe do Sol. As alterações climáticas são os efeitos que este aumento de temperatura tem no clima. Este é um problema muito diferente, e muito mais complexo, porque o clima de cada região depende de muitos factores, entre os quais a distribuição das temperaturas, que não é uniforme. O artigo que Cristo menciona é sobre este problema e não tem nada que indique que «o aquecimento global estagnou no início deste século». Pelo contrário.

Consistente com o rigor da sua análise, Cristo refere o artigo apenas como «um artigo publicado na reputada revista “Science”». Ao leitor que queira verificar as suas alegações resta o Google e o contexto para encontrar o artigo (2). O que talvez não tenha sido acidental porque o artigo não suporta em nada a tese de Cristo. Segundo Cristo, o artigo afirma que «o aquecimento global estagnou no início deste século e, tudo indica, assim permanecerá até cerca de 2030». No entanto, o que o artigo afirma é que «Um escoadouro global de calor a profundidades intermédias dos oceanos está associado a diferentes regimes climáticos de aquecimento da superfície sob efeito antropogénico: A parte final do século XX viu um aquecimento global rápido porque mais calor permaneceu à superfície. No século XXI, o aquecimento da superfície abrandou conforme mais calor se deslocou para os oceanos profundos.» (3).

Ao contrário da confusão que Cristo faz, este artigo não indica que o aquecimento global abrandou. Algumas outras explicações propostas para o abrandamento do aquecimento da superfície incluem o abrandamento do aquecimento global. Por exemplo, aumento da irradiação pela redução da concentração de vapor de água na atmosfera ou o efeito de outros poluentes que reflectem parte da luz do Sol. Mas este artigo indica precisamente o contrário: que a diferença está apenas no aquecimento à superfície e não no aquecimento global. Enquanto que no final do Século XX a superfície dos oceanos aqueceu mais rapidamente, agora são as águas profundas que estão a aquecer, como demonstram as medições de temperatura a várias profundidades. Os autores propõem que esta transferência de calor se deve a correntes verticais geradas por variações na salinidade e que este fenómeno é cíclico, pelo que podemos esperar que, após um período em que aquecem as águas profundas dos oceanos, volte a aquecer novamente a superfície. Mas, globalmente, se este artigo estiver correcto, o aquecimento continua e não há razão para ficarmos mais descansados por o aquecimento actual ocorrer nas águas profundas. O nível dos oceanos continua a subir, porque um mecanismo importante é a expansão térmica da água (4); alterações na temperatura afectam as correntes oceânicas que, por sua vez, têm muita influência no clima; e o fundo dos oceanos contém quantidades muito grandes de gases de estufa, como o metano, sequestrados pela combinação de pressões altas e temperaturas baixas (5). O aquecimento dessa parte dos oceanos não é boa notícia.

É irónico que o argumento de Cristo para demonstrar a suposta aldrabice ideologicamente motivada da «esquerda fracturante» seja esta aldrabice confusa e auto contraditória que, fora de um quadro clínico, só se explica por uma forte influência ideológica. De outra forma, não se compreende porque é que ele haveria de suportar a sua tese num artigo que diz o contrário do que ele defende. O aquecimento global não arrefeceu e a complexidade dos efeitos deste aquecimento é mais uma boa razão para o tentarmos travar. E isto não é um problema só da “esquerda fracturante”. É um problema de todos que só a direita pateta tem dificuldade em perceber.

1- Observador, O aquecimento global arrefeceu a esquerda fracturante
2- Chen, Xianyao, and Ka-Kit Tung. "Varying planetary heat sink led to global-warming slowdown and acceleration." Science 345.6199 (2014): 897-903. (pdf disponível aqui)
3- « A vacillating global heat sink at intermediate ocean depths is associated with different climate regimes of surface warming under anthropogenic forcing: The latter part of the 20th century saw rapid global warming as more heat stayed near the surface. In the 21st century, surface warming slowed as more heat moved into deeper oceans.»
4- Wikipedia, Current sea level rise
5- Wikipedia, Methane clathrate

8 comentários:

  1. Eu cá tenho uma ideia a respeito dos srs. negacionistas do aqucimento global & ca.
    Sugiro que sejam recambiados para uma daquela ilhas que mais coisa menos coisa vão desaparecer rapidamente com a subida do nível do mar. Não convém que seja uma das do Pácifico Sul, qualquer uma ao largo da Antárctida ou da Gronelândia servia. Só tinham que fazer uma coisa: todos os meses medir e reportar as temperaturas e o nível do mar.

    Podia ser que entretanto uma de 2 coisas acontecesse: 1) o mar subia e eles metiam água! 2) ocorresse um fenómeno extremo (certamente sem qualquer relação com o caso) e os levasse desta para outra!

    Há lá pachorra para estas baboseiras! Só faltava o "criacinista" aparecer com a sua arca (não pode ser frigorífica, "keep cool, not that cool") e resgatar o fulano da ilha... isso é que era azar!

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  2. Não se trata de negar ou afirmar o aquecimento global. Trata-se de estudar bem o tema em toda a sua complexidade sem dogmatismos e sem tentar silenciar o outro lado do argumento, como se torna demasiado frequente no debate científico.

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    1. Criacionista,

      Até hoje só tenho observado dogmatismos na parte exageradamente fundamentalista das religiões, sejam elas quais forem.

      De resto, o debate científico fica-se por coisas muito simples: formula-se uma hipótese, gera-se uma forma de validar a mesma e se passar formula-se uma teoria. Todo o processo é visto e revisto, se houverem falhas, estas vêm sempre à tona. Diz o povo que a mentira tem perna curta!

      A isto meu caro, chama-se método científico, e ainda está para alguém definir uma forma melhor de as coisas serem feitas.

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  3. Um artigo interessante mostra a recém descoberta de uma uma espécie de chinchila viva igual à que só se encontrava em fósseis e se julgava extinta.

    O que mostra que os fósseis não provam a evolução nem a idade dos seres vivos. Eles provam apenas o sepultamento abrupto e catastrófico de milhões de seres vivos, sendo que muitos estão ainda vivos e, por sinais, idênticos aos fósseis, sem mostras de qualquer evolução.

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    1. Criacionista,

      O seu comentário, o que realmente mostra sem margem para dúvidas, é que ainda não percebeu como é que evolução funciona!

      É normal haver espécies que simplesmente se mantêm como estão: qual a vantagem de mudar só por mudar? A natureza é avessa a desperdícios, assim tipo, "nequaquam vacuum" mas adaptado a exageros.

      As espécies só evoluem, i.é., sofrem modificações, quando existe pressão para tal, como mudança dos recursos disponíveis, alterações na cadeia trófica, etc. As espécies modificam-se para melhor tirarem proveitos de novas oportunidades, não é por decreto divino!

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  4. A CIÊNCIA DOS FÓSSEIS SUPOSTAMENTE ANTIGOS MAS MUITO BEM PRESERVADOS

    Os evolucionistas datam os fósseis com base em premissas naturalistas, evolucionistas e uniformitaristas acolhidas a priori e depois concluem, tautologicamente, que eles provam a evolução e a ausência de um dilúvio global com causa sobrenatural.


    O problema é que essas datações não encaixam nos dados realmente encontrados no terreno.

    Na verdade, os fósseis não provam a evolução, na medida em que sempre se referem a seres vivos de espécies bem identificadas e em muitos casos idênticas às atuais.

    Além disso, eles atestam uma catástrofe recente, na medida em que evidenciam sepultamento abrupto e catastrófico de triliões de seres vivos ainda em bom estado de preservação.

    É fácil falar em dezenas ou centenas de milhões de anos, embora nenhum de nós consiga sequer imaginar o que isso é. As civilizações mais antigas que conhecemos têm cerca de 4500 anos.

    A verdade, é que os fósseis que encontramos corroboram inteiramente um dilúvio global recente, catastrófico.

    Isso pode ser documentado com exemplos que todos os dias são publicados em revistas científicas por esse mundo fora.

    Por vezes encontram-se fósseis de plantas muito bem preservados, apesar de alegadamente terem 50 milhões de anos.

    Por vezes encontramos núcleos de células, membranas e cromossomas em fósseis supostamente com 180 milhões de anos.

    Conseguimos ver também resíduos de proteínas em fósseis de répteis supostamente com 50 milhões de anos.

    Também observamos ósseis de crustáceos supostamente com 500 milhões de anos mas já extremamente complexos e com aparência dos camarões modernos.

    Já para não falar em chinchilas vívas, idênticas às fossilizadas e supostamente extintas. Porque será?


    Em todas estas observações, a única coisa que contraria a Bíblia quando fala de um dilúvio global recente não são os fósseis, mas sim as premissas naturalistas, evolucionistas e uniformitaristas utilizadas pelos evolucionistas para a sua interpretação me datação.

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    1. Criacionista,

      Continuo a não perceber a ideia de insistir nessa coisa dos fósseis recentes!
      Está por acaso a insinuar que os métodos de datação estão errados? Estarei eu a ver argumentos a favor de uma Terra jovem? Onde estão as provas que refutam toda a ciência dos últimos 100 anos?

      Ainda não vi em qualquer desses artigos qualquer ataque directo quer aos métodos de datação, quer aos valores de datação apurados!, e meu caro, são todos bem acima dos famosos 5000 anos de criação!

      O facto de se considerar que uma espécie está extinta, é assim tipo "dado como morto porque ainda não foi encontrado vivo". Nada a ver com métodos de datação ou problemas com a evolução!

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  5. Eu bem que avisiei!... Fala-se do Mendes q'à porta o tendes!

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