sexta-feira, agosto 16, 2013

O mito da autoridade.

Comenta o Carlos Soares que eu não tenho «estaleca de cientista. O distanciamento, a objectividade, a imparcialidade, a neutralidade, o desinteresse, o desapego...»(1). Esta ideia está ligada à tese, muitas vezes defendida por apologistas religiosos, de que a fé é tão importante na ciência como nas religiões porque o fundamento de qualquer afirmação é sempre a confiança numa fonte autoritária. No caso da ciência, reza este mito, temos fé no cientista porque este é perfeitamente objectivo, imparcial e essas coisas. O que é obviamente treta. Não há gente assim. O grande forte da ciência é precisamente aceitar que todos temos paixões, interesses e pontos de vista subjectivos. Por isso, em vez da fé em alegações de quem se assume especial, prescreve a dúvida sistemática para filtrar os erros. Em ciência não se confia no cientista perfeitamente objectivo e isento. Exige-se é que o suporte das alegações não dependa de subjectividades, crenças ou interesses de quem as propõe.

Isto foi uma grande mudança. Durante milénios, o critério universal para apurar a verdade de qualquer alegação foi a autoridade da fonte. Ainda hoje, fora da ciência, é esta a regra. Dos pitagóricos aos cristãos e dos cientólogos aos astrólogos, o fundamental sempre foi ter o fundador mais santo ou o livro mais sagrado. A ciência é radicalmente diferente. Em vez de exigir a perfeição do praticante exige a descrição detalhada de como testou o que alega. Nenhuma encíclica papal, manual de astrologia, livro de dianética, evangelho ou sura descreve o método que usaram para obter aquelas conclusões de forma a permitir uma confirmação independente dos resultados. A ciência sujeita todas as alegações a essa verificação independente. Quando a Maya apresentou o seu novo método de tarot ou Pio XII afirmou que o corpo de Maria ascendeu fisicamente ao Céu, a comunidade dos respectivos fieis simplesmente aceitou que era verdade por vir de quem vinha. Em ciência não importa se a ideia vem de Einstein ou do Zé da Esquina; a sua avaliação não depende do mérito ou demérito da fonte.

Esta diferença entre a ciência e coisas como religiões, astrologias, vidências e afins é tão grande que devia ser facilmente reconhecida. Em ciência não se considera algo verdadeiro porque está escrito num livro ou foi dito pelo mestre. Escreve-se nos livros e ensina-se aquilo que passou suficientes testes para que, provisoriamente, mereça confiar-se que é verdade. No entanto, o sucesso desta abordagem criou um problema às tais “formas alternativas de conhecimento”. Por um lado, é contraditório dizerem-se amantes da “Verdade” sem terem qualquer método para testar o que defendem de forma independente das suas crenças. A desculpa de que estudam o transcendente, o inefável e o misterioso, e por isso não podem testar o que afirmam, não justifica depositar qualquer confiança nas suas teses. Por outro lado, também não podem avaliar os seus dogmas com o rigor que a ciência exige. Como a ciência procura a verdade, seja qual esta for, não tem problemas em rever ou descartar qualquer tese. É cada religião e superstição que assenta a sua identidade em dogmas pré-concebidos sem os quais deixa de existir. Não pode haver cientologia sem a crença nos textos de Hubbard nem cristianismo sem a crença na divindade de Jesus. Por isso, não podem avaliar os seus pressupostos sem a fé que depositam neles. Resta-lhes então tentar fazer parecer que a ciência é apenas mais uma fé, quando a ciência é precisamente aquilo com que resta quando se justifica as alegações sem recurso à fé.

O Carlos quer que os cientistas sejam santos da objectividade e desprovidos de paixão. Máquinas de calcular com braços, para garantir que se limitam a fazer contas e não opinam acerca de nada que possa contrariar o Carlos. Infelizmente para o Carlos, os cientistas são pessoas. Sentem, desejam, têm opinião e até exprimem o que pensam. Felizmente para todos, a ciência foi pensada tendo em conta a natureza humana e é por isso que funciona muito melhor do que qualquer treta que dependa de santos.

1- Comentário em Treta da semana (passada): escala.

15 comentários:

  1. A estratégia do Ludwig só dificulta a tarefa de quem pretende esclarecer ideias. Não acredito que o Ludwig labore intencionalmente na confusão, mas labora na confusão e essa é a sua marca. Por exemplo, quando contrapõe ciência a cristianismo, não passa sem dizer que o cristianismo e os evangelhos são uma espécie de astrologia ou de mitologia greco-romana. Ou que a ciência funciona melhor do que tretas que dependam de santos. Este é um exemplo entre inúmeros que já lhe foram assinalados neste blogue, sempre que insiste que existe um problema de falta de ciência na fé dos cristãos. Mas o que é que têm de mal os santos? E por que é que a ciência não é santa? E por que é que o Ludwig não dá um exemplo de treta que dependa dos santos? E por que é que os santos vêm associados a tretas e dissociados de ciência?
    Não vejo o Ludwig minimamente preocupado com a ciência, pelo contrário. Ninguém é santo por ser objetivo e desprovido de paixão. E ninguém é cientista por acreditar em teorias mais ou menos desapaixonadas.
    Agora, vir o Ludwig confundir cientista com ciência, só mesmo para tergiversar. Sim, sim, Ludwig, tenha paixão…pela ciência, que a ciência não julga nem sente. Sem esquecer que os deveres de um “sacerdote” da ciência não se confundem com os deveres de um sacerdote de Deus.
    E também não vejo o Ludwig preocupado em reconhecer que a doutrina cristã, que os valores cristãos, que o espírito de Cristo é, praticamente, tudo de que dispõe para examinar, ajuizar e avaliar os cristãos e a fé dos cristãos.
    O Ludwig diz que o cristianismo não é um sistema de conhecimento, nem de filosofia, nem de moral, nem de ideologia e, paradoxalmente, está sempre a considerar que a fé dos cristãos é uma “pretensa” ciência…
    Só por si, este erro (intenções à parte) é bastante para curto-circuitar o raciocínio.
    Não conheço ninguém que não reconheça a diferença entre ciência e religiões. Não sou infeliz nem feliz porque os cientistas são pessoas, ou porque os astrólogos não são ET’s. Onde é que as preocupações científicas do Ludwig foram buscar essa ideia?
    Os Evangelhos não são científicos nem anti-científicos. A ressurreição de Jesus não é científica, nem anti-científica. Se pretendermos explicá-la pelo método científico, deparamos com uma impossibilidade. Tinha de ser de outro modo?
    O que há de anti-científico no facto de alguém ter Fé, Esperança e Caridade?
    Os evangelhos não dizem que ninguém se salva se não for “absolutamente” cientista, ou que, só o cientista do topo da hierarquia dos cientistas é que tem a chave do reino.
    Os evangelhos “funcionam” num plano humano de virtudes e, essencialmente, num plano divino de amor. O mérito do conhecimento e do domínio das técnicas, à luz dos evangelhos, pode até ser nada, ou menos que nada. O maior cientista, à luz dos evangelhos, pode ser um monstro diabólico, enquanto o atrasado mental que não sabe pronunciar uma palavra e que nunca produziu um algarismo ou uma batata, pode ser um santo.
    Quando Jesus diz que o reino de Deus é semelhante a um grão de mostarda, não está a fazer ciência segundo o método científico e, no entanto, espera ser compreendido pelos ouvintes.
    Suponhamos que os evangelhos, ou a Bíblia, tinham sido inventados e escritos por um ou por um milhão de indivíduos. O Ludwig passava a ter mais razão, mesmo que isso se provasse, pelo método científico?

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  2. Ludwig,

    a fé na ciência é uma confiança na inteligibilidade daquilo que estuda. A fé na religião é um dom que o crente acolhe, ou seja é uma confiança de natureza diferente de "fonte autoritária".

    O pressuposto de que o crente não duvida está errado. Sempre ouvi que o problema de ser Cristão é precisamente esse, duvida e, por isso, procura respostas.

    Também o teólogo exige o suporte das alegações com objetividade, mas não exclui a subjetividade, a crença e o interesse de quem alega porque existe aí também verdade. Uma verdade, claro está, que deve ser confrontada com outras verdades alegadas, de modo a que nesse confrontar se chegue à Verdade em si mesma.

    Não podes meter toda a experiência no mesmo saco e uniformizar os eventos culturais da história, ou descartar a sua evolução. A ciência evoluiu, mas também a religião, sobretudo com o pensamento teológico. Por exemplo, quando referes o dogma da assunção de Maria ao Céu, importa ter presente o que é o Céu e se olhas para cima, esquece, já estás fora de contexto, como muitos crentes, devo dizer. Escrevi uma vez um post sobre isso: Um corpo-alma que se eleva ao Céu?

    E o que afirmas sobre que, em ciência, não importa se a ideia vem de Einstein ou do Zé Povinho sabes bem que não é verdade. A credibilidade em ciência tem imensa influência em ciência e leva tempo para a adquirirmos, e não a fazemos somente por nós próprios, mas juntamente com quem tem credibilidade também. O mesmo para o teólogo. Se a avaliação não dependesse do mérito … mas depende. Eu não partilho do intelligent design, mas quando o propuseram como teoria científica, muitas vozes se insurgiram em tom dogmático darwinista.

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  3. Esta diferença entre a ciência e coisas como religiões, astrologias, vidências e afins é tão grande que devia ser facilmente reconhecida.

    A diferença é boa e desejável, mas diferir não é separar e eliminar a complementaridade de experiências. Por outro lado, fazes uma leitura demasiado simplista da religião metendo, uma vez mais, tudo no mesmo saco. Na religião Cristã, quando se dá catequese ensina-se que devemos amar o outro, vendo Jesus nele, seja pobre, excluído, inimigo, etc … porque essa EXPERIÊNCIA passou suficientes testes para mereça confiar-se que é verdade. Esta experiência é também fonte de conhecimento, mas de uma natureza diferente, o problema está, sim, em não distinguir aquilo que é uma questão científica, da que é teológica ou religiosa. Mas compreendo-te, porque ao escreveres este post tens em mente a experiência de algum tipo de religiosidade, mas o problema está em generalizares esse "algum" para "todo".

    Por outro lado, também não podem avaliar os seus dogmas com o rigor que a ciência exige.

    … ora aí vem o cientismo … ou seja, esta é uma afirmação de natureza ideológica.

    Como a ciência procura a verdade, seja qual esta for, não tem problemas em rever ou descartar qualquer tese. É cada religião e superstição que assenta a sua identidade em dogmas pré-concebidos sem os quais deixa de existir.

    Errado. Os dogmas são estudados para aprofundar a verdade fundamental de encerram. O conteúdo mantém-se, mas não se pressupõe que o conhecemos plenamente, por isso, a forma vai mudando conforme o aprofundamento do conteúdo.

    Não pode haver cientologia sem a crença nos textos de Hubbard nem cristianismo sem a crença na divindade de Jesus. Por isso, não podem avaliar os seus pressupostos sem a fé que depositam neles.

    Nem pode haver ciência sem a crença na inteligibilidade daquilo que se estuda. Também a ciência é dogmática. O problema é pensar-se que ser dogmático é mau e impedimento para chegar à Verdade. Isso é um pressuposto, não a verdade. Como por exemplo, este

    a ciência é precisamente aquilo com que resta quando se justifica as alegações sem recurso à fé.

    O Carlos foi literário, mas com isso mostrou as limitações de algumas formas de ser ateu, semelhantes aos criacionistas, que levam tudo à letra, permanecendo na mistura do imiscível. Os religiosos são também pessoas, sentem, desejam, têm opinião e exprimem o que pensam. Aliás, muitos são cientistas credíveis.

    a ciência foi pensada tendo em conta a natureza humana e é por isso que funciona muito melhor do que qualquer treta que dependa de santos.

    Pode a religião não ter em conta a natureza humana? A religião depende dos santos, ou o inverso?

    Enfim … chegados ao fim da leitura de post ficamos a perceber a natureza frágil da filosofia tretológica que sustenta algum do ateísmo português. Mistura tudo, sem aprofundar nada. Assenta mais em pressupostos filosófico que em verdades como alega. Incute mais a certeza que a dúvida. Promove o dogma, em vez da questão. Separa quando a tendência evolutiva é a unidade na distinção. Eu diria que é uma filosofia a caminhar para a extinção … mas enfim, será?

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  5. OS LIMITES DA CIÊNCIA E A AUTORIDADE DE DEUS

    Todos sabemos que a ciência é um empreendimento humano limitado.

    Ela é limitada, desde logo, pelos limites à indução. Basta apenas uma nova observação para destruir um modelo científico ou mesmo todo um paradigma científico. Isso acontece em ciência todos os dias.

    Acresce que a ciência se baseia em observações incompletas. Vivemos num Universo à escala da omnisciência e da omnipotência de Deus, que o ser humano não consegue abarcar na sua totalidade. Daí que o ser humano dificilmente possa fazer afirmações definitivas sobre o Universo no seu todo baseado na autoridade da ciência. Isso é pura futilidade.

    Como o Universo tem uma dimensão inabarcável, mesmo que o ser humano o conseguisse abarcar e compreender na sua totalidade, nunca poderia saber alguma ter a certeza disso mesmo.

    Por outro lado, a ciência está longe de ser objetiva. Os dados são muitas vezes selecionados e interpretados em função de modelos pré-concebidos, muitas vezes dependentes de filosofias, ideologias e interesses económicos.

    Isto, para não falar na tendência para a falsificação de dados e para o plágio.

    Além disso, a ciência não consegue confirmar diretamente as suas afirmações sobre a origem acidental do Universo e da vida ou sobre a transformação de partículas em pessoas ao longo de milhões de anos. Trata-se aí de afirmações inteiramente dependentes de pressuposições do naturalismo filosófico ateu, sem qualquer fundamento empírico.

    A ciência é boa para construir frigoríficos, automóveis, computadores, aviões, telefones, smartphones, mas mesmo aí ela apenas mostra que códigos e informação codificada são sempre criados por seres inteligentes e que o design de máquinas complexas não pode ser deixado ao acaso.

    A actividade científica em si mesma corrobora a Bíblia, na medida em que postula a inteligibilidade do cosmos e a inteligência humana, algo que a Bíblia afirma e justifica quando diz que ambos foram criados racionalmente por um Deus racional.

    Ela é uma forma de fazer “reverse engineering” mostrando como funciona o Universo que Deus criou.

    Mas não podemos colocar os nossos destinos nas pretensões de autoridade de uma ciência falível e feita por cientistas falíveis, baseada em observações incompletas, especialmente quando se reclama autoridade para falar definitivamente sobre a origem, o sentido e o destino do Universo, da vida e do ser humano.

    Isso transcende a ciência.

    Essa definitividade pressupõe omnisciência, atributo que só Deus pode reclamar.

    Deus quer algo melhor para nós. Ele quer dar-nos a certeza absoluta da nossa salvação.

    Daí que devamos confiar na revelação de Deus, apresentada à humanidade através do povo mais influente da história, Israel, do livro mais influente da história, a Bíblia, e da pessoa mais influente da história, Jesus Cristo.

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  6. Miguel Panão acusa os criacionistas de levarem tudo à letra.

    No entanto, essa crítica é absurda. Os criacionistas não levam à letra os textos assumidamente poéticos e metafóricos da Bíblia.

    Se fosse esse o caso, teriam de acreditar, por exemplo, que as pessoas são ovelhas que se alimentam de pastos, que Herodes era uma raposa, que Jesus é uma videira ou uma porta, que os cristãos são realmente feitos de sal, ou que o pão e o vinho são realmente o corpo e o sangue de Cristo.

    Os criacionistas apenas levam à letra aquelas partes da Bíblia que, do ponto de vista literal, gramatical e sistemático, devem ser interpretadas literalmente.

    A criação em seis dias é uma delas.

    Para além de ela atestar a omnipotência e a racionalidade de Deus, ela foi tomada literalmente, como facto histórico, por Moisés e os Profetas e por Jesus e os Apóstolos.

    Vejamos, por exemplo, como o Apóstolo Paulo se refere a Adão e Eva, os primeiros seres humanos criados:

    "Todavia, a morte reinou desde o tempo de Adão até o de Moisés, mesmo sobre aqueles que não cometeram pecado semelhante à transgressão de Adão, o qual era um tipo daquele que haveria de vir." (Romanos 5:14)

    "Pois, da mesma forma que em Adão todos morrem, em Cristo todos serão vivificados." (I Coríntios 15:22)

    "Assim está escrito: "O primeiro homem, Adão, tornou-se um ser vivente"; o último Adão, espírito vivificante." (I Corintios 15:45)

    "Porque primeiro foi formado Adão e depois Eva." (I Timóteo 2:13)

    E Adão não foi enganado, mas sim a mulher que, tendo sido enganada, se tornou transgressora. (I Timóteo 2:14)


    "Mas temo que, assim como a serpente enganou Eva com a sua astúcia, assim também sejam de alguma sorte corrompidos os vossos sentidos, e se apartem da simplicidade que há em Cristo." (II Coríntios 11:13)

    É claro que para Paulo, baseado na autoridade de Génesis, a Criação e a Queda eram factos reais e Adão e Eva eram personagens históricas reais, construindo a teologia bíblica sobre isso.

    É claro, também, que Jesus morreu e ressuscitou porque a queda do homem introduziu a morte física e espiritual no mundo. Daí a necessidade da morte e da ressurreição de Jesus, para nos salvar dessa morte.

    É exactamente isso que os criacionistas sustentam. Á luz da Bíblia é a única posição consistentemente sustentável.











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    1. Criacionismo Bíblico (que raio de nome, mas enfim …),

      A criação em seis dias é uma delas.

      Penso que é este tipo de afirmações, bem como as que se seguem que diminuem o valor da Escritura e a desprovem do seu sentido e significado profundos.

      Porque fez Deus o mundo em 6 dias e não em 13.6 mil milhões de anos? Como é que esse aspecto atesta a omnipotência e racionalidade de Deus? O que é isso de omnipotência? O que sabemos nós da racionalidade de Deus?

      A que "morte" se refere S. Paulo? O conteúdo das afirmações de Paulo são científicas ou teológicas? De certeza que Paulo considerava Adão e Eva personagens históricas? Nas afirmações que citas não se reconhece nada que o ateste.

      a queda do homem introduziu a morte física e espiritual no mundo. Daí a necessidade da morte e da ressurreição de Jesus, para nos salvar dessa morte.

      Não sei em que corrente teológica te baseias para fazer estas afirmações, mas penso que esquecem a hermenêutica, exegese, entre outros fundamentos do método teológico. Galileu afirmava que a Sagrada Escritura não nos mostra como "vai o céu", mas como "se vai para o Céu". Eu não podia estar mais de acordo e creio que o Criacionismo não tem qualquer futuro, e que o Literalismo Bíblico tem os dias contados. Mais ciência, melhor religião. Não se confundem, complementam-se. Não se fundem ou separam, distinguem-se.

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  7. Como é que o Miguel Panão sabe que o Universo tem 13,6 mil milhões de anos? Estava lá para ver?

    Eu acredito na criação em 6 dias porque acredito que Deus estava lá para ver e disse claramente que criou em 6 dias. Será impossível?

    Por processos naturais seria certamente impossível. Mas a Bíblia diz que para Deus nada é impossível.

    A ressurreição de Jesus também é natural e humanamente impossível. Mas para Deus ela é possível e foi testemunhada por muitos.

    Não percebeu ainda que o modelo do Big Bang, além de assentar em postulados naturalistas que excluem Deus à partida, nem sequer funciona cientificamente?

    Quer que eu lhe mostre aqui e agora que o modelo do Big Bang não funciona?

    O Big Bang conduz a má ciência e a má teologia.

    O que sabemos da racionalidade de Deus é o que Ele mesmo nos revela através da Sua Palavra.

    Ela mostra que Deus criou o Universo racionalmente, com uma estrutura racional, capaz de ser estudado por seres racionais criados à Sua imagem. É isso que a Bíblia diz.

    Deus é Logos (Razão) e encarnou em Jesus Cristo (João 1:1)

    A morte a que Paulo se referia é a morte física e espiritual a que o pecado nos condena. Por causa dessa morte Jesus morrei fisicamente e ressuscitou com um corpo incorruptível.

    E Paulo diz que ressucitaremos com corpos incorruptíveis. Qual é mesmo a sua dificuldade? Tem dificuldades de leitura?

    Os textos citados são claros. Eles mostram que Paulo estava inteiramente convencido de que por causa do pecado de Adão e Eva, e das suas consequências físicas, Jesus morreu e ressuscitou na carne.

    Se o problema fosse só espiritual, Jesus não teria que morrer fisicamente.

    Mas há mais textos que mostram que Paulo levava a criação de Adão e Eva a sério, como fato histórico.

    Quando falou aos Atenienses, que acreditavam em filosofias baratas como as que o Miguel Panão pretende misturar com o Cristianismo, o Apóstolo Paulo diz:

    "De um só fez ele todos os povos, para que povoassem toda a terra" (Atos 17:26)

    Este texto remete claramente para a criação de Adão e da própria Eva a partir de Adão.

    Os textos não podiam ser mais claros. A teologia de Paulo não se baseia em fantasias. Baseia-se em factos históricos. E por isso é que ela é importante.


    Por sua vez, Paulo ainda diz,

    "...assim como por meio da desobediência de um só homem muitos foram feitos pecadores, assim também por meio da obediência de um único homem muitos serão feitos justos" (Romanos 5: 19)

    Neste texto ele remete para a queda de Adão, que resultou no pecado de todos, e para a morte de Jesus, que possibilita a salvação dos que crê...

    A corrente teológica em que o criacionismo bíblico se baseia é aquela que assenta na autoridade de Moisés e os Profetas e de Jesus e os Apóstolos e não a de Galileu...

    O Miguel Panão é certamente sincero e bem intencionado. Mas a sua cabeça está teológica e cientificamente confusa.

    E nem sequer consegue com isso granjear o respeito dos ateus naturalistas, por eles percebem a sua confusão e as suas inconsistências.

    Diz que acredita em Deus, mas mistura com a sua teologia uma cosmogonia que assume a priori que o Universo surgiu do nada e se desenvolveu aleatoriamente...

    O Miguel Panão devia seguir o conselho de Paulo:

    "Tende cuidado, para que ninguém vos faça presa sua, por meio de filosofias e vãs subtilezas, segundo a tradição dos homens, segundo os rudimentos do mundo, e não segundo Cristo" (Colossenses 2:8)






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  8. O MIGUEL PANÃO, A FALÊNCIA DO BIG BANG E O UNIVERSO À ESCALA DE DEUS

    Não deixa de ser estranho ver Cristãos bem intencionados, como o Miguel Panão, a misturarem o Cristianismo com cosmologias naturalistas inventadas pelos homens, tentando fazer teologia com base em ideias humanas e não a partir da revelação de Deus.

    isso é tanto mais intrigante, quanto ele se apoia num modelo cujas debilidades estão à vista de toda a gente. Basta ler algumas notícias científicas recentes e tirar as devidas conclusões lógicas.

    Recentemente os dados recolhidos da descoberta do Bosão Higgs vieram ameaçar seriamente os modelos de inflação do Universo construídos sobre o Big Bang.


    Por seu lado, bastou a descoberta recente de uma Galáxia anã para por em causa os modelos dominantes de formação de galáxias, edificados sobre o Big Bang, de resto há muito fustigado pela presença de galáxias maduras onde não se esperaria que estivessem.


    Do mesmo modo, bastou a recente descoberta de um planeta cor magenta para para por em causa os modelos dominantes de formação de planetas, igualmente edificados sobre o Big Bang, o que é problemático, dada a quantidade de planetas que se supõe existir.


    É caso para perguntar.

    Se o Big Bang não explica a inflação do Universo, a formação e localização dE milhares de milhões de galáxias e planetas, o que é que ele explica? Nada!

    De que Universo é que ele se propõe falar? Certamente não do nosso!

    O modelo do Big Bang exprime apenas a posição de uma parte da comunidade científica que pretende rejeitar a priori a possibilidade de criação sobrenatural e inteligente do Universo, tal como a Bíblia ensina.

    Mas existirão evidências que corroborem a criação inteligente e sobrenatural do Universo? Claro que sim!

    Estudos recentes mostram que o cérebro humano, a internet e a cosmologia obedecem às mesmas leis, o que corrobora a ideia de que o Universo, a vida e o homem foram criados por um Deus racional, omnisciente, omnipotente e comunicativo que criou o homem à sua imagem, com capacidade criativa, racional e comunicativa.


    A Bíblia diz que “os céus manifestam a obra de Deus, e o firmamento a obra das suas mãos”.

    O Universo foi feito por Deus, à Sua escala, como testemunho do seu infinito poder.

    Se a origem do Universo, das estrelas, das galáxias ou dos planetas pudesse ser realmente explicada com base nos postulados do naturalismo filosófico, os céus e o firmamento nada nos diriam sobre a omnipotência de Deus, dando-nos quando muito a ilusão da sua existência.

    Como as explicações naturalistas não funcionam, o design, o detalhe e as interligações macro e micro visíveis no cosmos, no corpo humano, na fauna, na flora, no genoma, nas moléculas, nos átomos e nas partículas subatómicas falam da omnisciência de Deus.

    A escala do Universo, visível nos milhares de milhões de galáxias e em triliões de estrelas, fala-nos da sua omnipotência.

    A aplicação universal das leis naturais e das regras da matemática e da lógica fala-nos da Sua omnipresença.

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  9. MIGUEL PANÃO, OS LIMITES DA CIÊNCIA E A REALIDADE DA TEOLOGIA CRISTÃ

    Antes de misturar modelos científicos claudicantes com o que a Bíblia diz, o Miguel Panão deveria reflectir sobre os limites da ciência.

    Ela é limitada, desde logo, pelos limites à indução. Basta apenas uma nova observação para destruir um modelo científico ou mesmo todo um paradigma científico. Isso acontece em ciência todos os dias.

    Acresce que a ciência se baseia em observações incompletas. Vivemos num Universo à escala da omnisciência e da omnipotência de Deus, que o ser humano não consegue abarcar na sua totalidade. Daí que o ser humano dificilmente possa fazer afirmações definitivas sobre o Universo no seu todo baseado na autoridade da ciência. Isso é pura futilidade.

    Como o Universo tem uma dimensão inabarcável, mesmo que o ser humano alguma vez pretendesse abarcá-lo e compreende-lo na sua totalidade, nunca poderia ter a certeza de que o tinha conseguido, na medida em que necessitaria de uma autoridade externa omnisciente para confirmar o acerto dessa pretensão.

    Por outro lado, a ciência está longe de ser objetiva e neutra. Os dados são muitas vezes selecionados e interpretados em função de modelos pré-concebidos, muitas vezes dependentes de filosofias, ideologias e interesses económicos.

    Isto, para não falar na tendência para a falsificação de dados e para o plágio.

    Além disso, a ciência não consegue confirmar diretamente as suas afirmações sobre a origem acidental do Universo e da vida ou sobre a transformação de partículas em pessoas ao longo de milhões de anos. Trata-se aí de afirmações inteiramente dependentes de pressuposições do naturalismo filosófico ateu, sem qualquer fundamento empírico.

    Acresce que no Universo só observamos forças de conservação de energia e de aumento de entropia, bem como o decaimento da vida. As forças de criação de energia e vida não estão acessíveis à observação científica.

    A ciência é boa para construir frigoríficos, automóveis, computadores, aviões, telefones, smartphones, mas mesmo aí ela apenas mostra que códigos e informação codificada são sempre criados por seres inteligentes e que o design de máquinas complexas não pode ser deixado ao acaso, sob pena de estas nunca funcionarem.

    A actividade científica em si mesma corrobora a Bíblia, na medida em que postula a inteligibilidade do cosmos e a inteligência humana, algo que a Bíblia afirma e justifica quando diz que ambos foram criados racionalmente por um Deus racional.

    Ela é uma forma de fazer “reverse engineering” mostrando como funciona o Universo que Deus criou. Mas ela não nos diz o que se passou na semana da Criação. Provavelmente nunca o saberemos.

    A teologia não deve ser divorciada do mundo real da história criação, de Adão e Eva, da queda e da resultante corrupção, do dilúvio, de Babel, da confusão das línguas, e da dispersão pós-diluviana, da escolha de Israel, da promessa do Messias, da vida, morte e ressurreição de Jesus Cristo.

    Esse é o quadro de eventos apresentado na Bíblia e validado por Cristo.

    Este quadro bíblico ajuda-nos a interpretar correctamente as observações macro e micro, os códigos genéticos e genéticos, as mutações e a selecção natural que os degradam e destróem causando doenças e morte, as rochas sedimentares, os fósseis, a tectónica de placas, a deriva dos continentes ou a elevação das montanhas.

    Este quadro também nos permite compreender porque é que Jesus nasceu, viveu, fez milagres, morreu na cruz e ressuscitou com um corpo incorruptível e porque é que ele promete restaurar toda a criação para que nunca mais haja maldição, sofrimento e morte.

    A teologia Cristã não pode ser divorciada do mundo real. Ela é uma teologia real, baseada em factos reais ocorridos no mundo real.

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  10. Penso que o ponto essencial (pelo menos para mim) do início do artigo do Ludwig é estabelecer a diferença entre a «ciência» — que, no meu entender, se pode reduzir a «aquisição de conhecimento segundo o método científico» — e o «cientista», que pode, ou não, aplicar o método científico a determinada área de aquisição de conhecimento. Quando o faz, está efectivamente a ser um «cientista». Mas muitas vezes não o faz; pode estar a deturpar resultados para procurar sustentar a formulação de uma hipótese, pode enganar, mentir, manipular, estabelecer-se como autoridade, cortar o financiamento a outros que não concordam com ele, etc. Porquê? Porque tal como nem todos os católicos são santos (e só alguns é que aspiram a sê-lo, apesar de ser essa a sua visão, mesmo que se «esqueçam» dela), nem todos os cientistas são pessoas moralmente íntegras e exemplos a seguir enquanto membros da sociedade. Aliás, suspeito que a percentagem seja a mesma :)

    Acho que esse ponto não é suficientemente frisado, pelo menos entre a comunidade positivista, que se assume a si mesma como sendo moralmente superior meramente por fazer parte de uma ideologia. O Ludwig estava a alertar para este problema, defendendo que lá porque muitos cientistas sejam moralmente corruptos ou maus exemplos a seguir (mesmo de ponto de vista profissional), isso não quer, de todo, dizer que o método cientista esteja errado ou que não preste; da mesma forma, lá porque praticamente todos os políticos sejam corruptos, isso não quer dizer que a democracia, enquanto valor filosófico-social, seja uma má ideia. Não é. A democracia é um ideal utópico que se constrói pouco a pouco, devagarinho, porque infelizmente as pessoas que vivem em democracia não são necessáriamente «crentes» na ideologia democrática.

    Ora, onde (a meu ver) se encontra a falha de dedução lógica é em assumir que a religião (e neste caso o ataque é feito principalmente à religião proposta pela ICAR, mas podia ser qualquer outra) é uma espécie de «método alternativo de aquisição de conhecimentos», que propõe a «fé cega» como alternativa ao método científico, e que, como tal, obtém piores resultados na aquisição de conhecimentos — e, logo, deve ser abandonada.

    Talvez em vez de «falha de dedução lógica» devesse dizer que é mais uma consequência de estabelecimento de hipóteses diferentes. Num sistema positivista mais fundamentalista (que não será necessariamente o defendido pelo Ludwig, não quero colocar palavras na boca dele), existe um certo raciocínio circular: aposta-se na hipótese de que todo o conhecimento digno de ser adquirido só pode ser feito através do método científico, e, circularmente, todo o conhecimento adquirido pelo método científico é o único que é digno de ser registado («pescadinha de rabo na boca»). Felizmente, na história da ciência, até esta falácia de raciocínio tem sido eliminada, ao reconhecer-se que certas metodologias (como, por exemplo, o empiricismo) não eram capazes de abarcar todo o conhecimento: assim, a alternativa foi dotar a ciência de novas metodologias capazes de ir mais longe (temos a agradecer ao Popper por isso). Mas isso criou grandes discussões entre certos positivistas no início do século XX, que se recusavam a aceitar a inclusão de novas áreas da ciência que abandonavam o empiricismo em prol de outras metodologias — daí a divisão «ciências da natureza» e «ciências sociais», por exemplo.

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  11. Gosto de dar o exemplo da História. Até relativamente recentemente, a História, enquanto disciplina de acumulação de conhecimentos, não usava o método científico. Ora não era por isso que os historiadores eram considerados uma criaturas nefastas, quais filhos de Satanás, só porque não usavam o método científico. Especialmente no séc. XIX, não se conhecia nenhuma metodologia baseada no empiricismo puro que pudesse servir para os historiadores acumularem conhecimento de uma forma sistemática. Mas isso não quer dizer que os historiadores fossem colocados no mesmo saco que os astrólogos, alquimistas, quiromantes, e «endireitas». Eram apenas uma classe diferente de pessoas que tinham as suas próprias metodologias. Não eram cientistas, é verdade, mas não eram uns horrores da sociedade. Pelo contrário: há registos (históricos!) de que praticamente todas as civilizações prezavam muito o papel do historiador, mesmo que, até ao século XX, nenhum deles fosse objectivo e usasse uma metodologia baseada no método científico. Mas isso em nada desvalorizava o seu papel.

    Graças a Popper e aos seus seguidores, no entanto, o séc. XX trouxe até mesmo aos historiadores a capacidade de incorporarem o método científico nos seus processos de aquisição de conhecimento. Hoje em dia, os historiadores são também cientistas. Uma história (pun intended!) com final feliz.

    Mas há muitas áreas do conhecimento humano que não são assim. O Direito, por exemplo, acumula uma quantidade enorme de conhecimentos; no entanto, por si só, o Direito não é «científico», numa definição muito estrita da palavra. O que não impede, claro, de se escreverem teses de doutoramento sobre direito, essas sim, usando metodologias inspiradas pelo método científico. No entanto, quando um juíz pronuncia uma sentença, não o faz «cientificamente» — usa, é certo, muito conhecimento acumulado, mas também a sua própria intuição e empatia, documentando o processo e a sua decisão. É suficiente para aplicar justiça, e para permitir contraditório, recursos, etc., mas não é suficiente para ser «científico». No entanto, não atormentamos os pobres dos juízes só porque não usam o método científico.

    O mesmo se aplicam a inúmeras outras áreas do conhecimento humano, muitas das quais não são «demonizadas» pelos positivistas mais fundamentalistas, que podem não gostar delas, mas aceitam-nas com um certo grau de tolerância. Uma dessas áreas, por exemplo, é a filosofia — que, ironicamente, está na génese de toda a ciência. Não se pode negar que a filosofia também acumula conhecimento, mas fá-lo sem recurso ao método científico. Até pode usar ferramentas «parecidas» — como a lógica, por exemplo — mas nem todas as áreas da filosofia (desde a estética à ética...) são susceptíveis de aplicação do método científico. Uma das razões para isso é que, por vezes, não há nada para medir. E o método científico essencialmente foca-se em determinar variáveis que sejam mensuráveis — e a partir daí, pode-se aplicar uma metodologia qualquer que faça um registo objectivo do objecto de estudo.

    Mas quando não há nada de mensurável, o método científico não se pronuncia. Pode-se, evidentemente, como o Ludwig já propôs muitas vezes aqui no seu blog, procurar encontrar algo de mensurável; procurar algo de mensurável, por si só, é uma atitude científica, mesmo que o resultado seja «não há nada que se possa medir» (é um resultado válido!). Penso que seja isso que motiva o Ludwig a fazer afirmações do género: «não há um número plausível de registos de pessoas que tenham voltado do Céu e do Inferno e que tenham descrito as suas experiências de forma mensurável e que possam ser reprodutíveis; sendo assim, a ciência pode efectivamente estudar esses casos, mas não encontrando nada que seja mensurável objectivamente, não se pode pronunciar sobre a existência do Céu e/ou do Inferno, e, como tal, nega provisoriamente a sua existência até prova em contrário». É uma afirmação legítima do ponto de vista científico.

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  12. Mas o método científico não é a única forma de aquisição de conhecimentos. Existem modelos filosóficos alternativos que adquirem conhecimento sobre objectos de estudo não mensuráveis, e esse conhecimento, uma vez aplicado de forma sistemática, produz os mesmos resultados, de forma reprodutível, independentemente da pessoa que aplique esse conhecimento, do lugar onde está, e do tempo em que o faz. No entanto, o objecto de estudo em si não é mensurável de forma alguma. Sendo assim, esta forma de aquisição de conhecimentos não pode ser científica; mas não deixa de produzir resultados; esses resultados são previsíveis; e são reprodutíveis. Não são é mensuráveis. E, como tal, são rejeitados por causa disso mesmo.

    Não só há muitas filosofias que se encaixam neste modelo, como até alguma religiões. É a isto que o Carlos se refere quando diz «[...] porque essa EXPERIÊNCIA passou suficientes testes para mereça confiar-se que é verdade». E que testes são esses? Podemos simplesmente olhar para as sociedades nos últimos 2000 anos. Aquelas em que normalmente são postas em prática condutas éticas como as que foram propostas por Cristo, Aristóteles, Sócrates, Siddharta, etc. tendem a criar indivíduos mais felizes, sociedades mais justas, etc. do que aquelas onde se aboliram esses valores éticos (ver os exemplos totalitaristas e absolutistas onde reinava o terror e a repressão). Ora este tipo de «experiência» é reprodutível e parece ser independente do local e do espaço. No entanto, leva tempo e os benefícios não são imediatamente óbvios — por exemplo, não se basta afirmar-se «democrático» para que de repente um país se torne num paraíso. Uma Inquisição pode, ao longo de séculos, deturpar o objectivo da mensagem de Cristo ao ponto de criar um clima de terror e de repressão pior do que o de muitos regimes totalitátios; até 1950, no Tibete, era normal ver monges irromperem pelas casas dos camponeses roubando tudo o que estes tinham, violando as camponesas, batendo ou matando os filhos dos camponeses, etc. porque achavam que tinham esse direito só porque eram monges e os outros não; e veja-se o que anda a acontecer nos países árabes (e não só) que professam o islamismo, palavra essa que significa, etimologicamente, «paz». Ou seja: quando estes princípios éticos são mal interpretados (normalmente, de forma deliberada) claro que o resultado é muito diferente do que foi proposto pelos pensadores originais dessas filosofias. Tenho a certeza de que até o Espinoza pode ser mal interpretado e posto mal em prática :)

    Mas tal como não atacamos a democracia enquanto ideal utópico, mas sim os políticos por serem corruptos e na realidade não acreditarem nesse ideal, parece-me um pouco forçado este «ataque» às filosofias e religiões só porque grande parte dos seus proponentes e praticantes — no fundo, tal como quaisquer outros seres humanos — não colocam em acção aquilo que professam. Também não atacamos a Ciência com C maíusculo quando sabemos que muitos cientistas são tudo menos objectivos, e caiem em todas as falácias do livro, só para defenderem um artigo publicado que lhes permita obter financiamento. Em vez disso, gozamos da nossa liberdade de expressão para apontar o dedo àqueles que, no fundo, não estão a seguir as regras, ou a deturpar o sistema de forma a obter benefícios próprios. Por vezes, isto é o que chega. Pegando noutro exemplo: nem todos os padres católicos são pedófilos ou homossexuais, e pensar que a religião católica cria uma propensão para a pedofilia ou homossexualidade é uma infantilidade de raciocínio falacioso («tomar as partes pelo todo»). Em vez disso, condenam-se as excepções à regra, apontam-se as falhas, corrige-se o que está errado, e pronto. Isto acontece na justiça, na história, na política, etc. em maior e menor grau — mas acontece sobretudo em ciência. Assumir que não ocorre nas religiões organizadas é um generalismo demasiado forte.

    Agora, sim, claro que me parece legítimo «apontar o dedo» a quem abuse do sistema ao ponto de colocar o sistema em questão.

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  13. Já agora, vou dar um exemplo típico do que ocorre na nossa sociedade diariamente. Uma amiga minha consultava frequentemente uma bruxa, mais ou menos da mesma idade que ela (por volta dos 35 anos). Hoje em dia, as bruxas profissionais são socialmente toleradas, e é uma profissão lucrativa (basta ver a quantidade de programas na TV sobre bruxas, médiums e afins...). Como a bruxa em questão tinha uma certa capacidade empática (no sentido mundano da palavra e não no sentido sobrenatural: era uma pessoa com a capacidade de escutar e «ler entre as linhas»; com o carisma suficiente para colocar as suas «clientes» à vontade de forma a que revelassem bem mais do que pensavam; e usando essa capacidade de colocação das pessoas à vontade para lhes fazer crer que tinha «dons»...), a minha amiga consultava-a por tudo e por nada, «resolvendo» assim as suas questões.

    A dada altura, o SUV da bruxa avariou-se, e a minha amiga emprestou-lhe o carro. Ao fim de uns dias, tinha tido um acidente. Quando a minha amiga lhe perguntou o que se tinha passado, a resposta — pasmem-se! — foi: «O teu carro tem uma energia anímica muito forte e não o consegui controlar!»

    A minha amiga pode ser totó e ingénua, mas não é atrasada mental. O que lhe ocorreu foi perguntar:

    1) Como é possível alguém que esteja sempre a prever o futuro das outras pessoas não ser capaz de prever o seu próprio futuro? (evitando assim o acidente)
    2) Como é possível essa bruxa afirmar ter «poderes» para controlar espíritos, almas, e pessoas com a sua «magia», mas depois nem sequer mostrar ter «poderes» para controlar um carro?
    3) Como é possível que essa bruxa admita publicamente que tem uma mente mais fraca e menos poderosa do que a de um... automóvel?!

    Confrontando as afirmações da bruxa com a realidade, rapidamente concluiu que não fazia qualquer sentido acreditar no que esta lhe dizia, pois havia uma fortíssima contradição entre tudo o que afirmava e a prática. Obviamente que não era alguém minimamente merecedora de confiança, por mais que «acreditasse» que sim.

    Assim, quando certos cristãos vêm defender aqui a sua posição, o que estão a pedir é que não confundam as coisas e as colocam no mesmo saco, e penso que é um pedido legítimo. À excepção de fundamentalistas como o Sam Harris, que pensam o contrário, há uma diferença notória entre sociedades que desenvolveram certos valores morais e éticos, que os promovem, e cujos benefícios são tangíveis e reprodutíveis; e um conjunto de bruxas que se comporta como se não acreditasse sequer no que dizem, mas afirmam que os outros — que gostam de manipular para benefício próprio — devem acreditar cegamente no que dizem. O mesmo, claro, se passa em relação a muitos alegados e auto-proclamados líderes religiosos — do tipo que exortam os fiéis à castidade e mesmo abstinência sexual, ou à pobreza e obediência, mas que vivem em palácios com os seus haréns com BMWs novos em folha à porta.

    Confundir isso com um Papa Francisco que exorta os fiéis a uma vida simples porque ele próprio andava de transportes públicos na Argentina (e que nem se importa de fazer o mesmo no Vaticano); ou com um Dalai Lama que só tem três mudas de roupa porque não precisa de mais; é realmente meter coisas completamente antagónicas no mesmo saco. E não admira, pois, que do campo anti-ciência depois se apontem também o dedo às Elseviers deste mundo, ao pessoal da fusão fria, à indústria farmacêutica que «compra» relatórios, à indústria do tabaco, aos ecoterroristas... tudo pessoas sem escrúpulos que distorcem o método científico (e a deontologia do cientista) em benefício próprio, afirmando que são tão maus como os piores líderes de seitas. E são; mas isso não quer dizer que a ciência esteja errada — quer apenas dizer que as pessoas estão erradas. E, obviamente, o mesmo se passa com os religiosos, os filósofos, os historiadores, os juízes, etc. e todas as restantes áreas do conhecimento não-científico, mas que não deixam de produzir resultados benéficos para a sociedade. Mesmo que sejam poucos e visíveis apenas a muito longo prazo.

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  14. «É a isto que o Carlos se refere quando diz «[...] porque essa EXPERIÊNCIA passou suficientes testes para mereça confiar-se que é verdade».»

    A que Carlos se refere? O Carlos Soares não é, de certeza.

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