quarta-feira, março 10, 2010

DRM

DRM é a sigla inglesa de digital rights management ou, em português, defeitos, restrições e merdices. Faz parte de um paradigma revolucionário da industria de distribuição. Tradicionalmente, vendia-se coisas agradando aos clientes e aliciando-os a comprar. Mas as editoras discográficas e as distribuidoras de filmes romperam com esta tradição ultrapassada. Agora a estratégia é incomodar e ameaçar os clientes. Se compramos um DVD levamos um sermão sobre o roubo de carros e afins. Se vamos ao cinema ameaçam prender-nos se tivermos uma máquina de filmar. Se a moda pega, nos restaurantes vai passar a haver cartazes com as penas de prisão por furto da máquina registadora ou homicídio do cozinheiro a ver se isso abre o apetite à clientela.

O DRM leva o assédio mais longe, pois permite ao vendedor controlar o uso que damos, em nossa casa, à coisa que lhe comprámos. Por exemplo, o CD de música que instala no nosso computador um programa para nos impedir de copiar faixas para o leitor de MP3. Não que seja ilegal copiá-las. Por lei temos esse direito, de mudar o formato, ouvir noutro aparelho ou criar cópias para uso pessoal. E não é por vontade dos autores, que poucos querem “proteger” a sua música impedindo que a oiçam. É só porque o distribuidor acha que lhe dá jeito e pode fazê-lo (1). É como comprar uma torradeira com controlo remoto e, a cada pequeno almoço, telefonar ao vendedor a pedir para nos deixar fazer uma torradinha.

O sucesso desta abordagem não tem sido total. Outro dia encontrei na Amazon o Sacred 2 à venda por menos de seis libras (2). Fantástico, pensei eu. Um jogo enorme, mesmo como eu e os miúdos gostamos, barato e enviado a casa com um click. Mas com DRM. Para instalar tenho de ligar aos servidores deles e pedir autorização para jogar o jogo que comprei. Dizem-me que esses servidores «vão estar disponíveis nos próximos anos. Se não for o caso haverá uma actualização para retirar o DRM»(3). Ou seja, daqui a uns tempos o jogo deixa de funcionar e é preciso confiar que possa encontrar arranjo para isso. Como já me tramei uma vez com estas tretas das validações online em jogos que não quero jogar online (4) não me atrai a proposta. Poupo seis libras e eles vendem menos um jogo.

E isto só chateia os clientes. A Ubisoft implementou um novo sistema de DRM que obriga o cliente a estar sempre ligado aos servidores da Ubisoft enquanto joga, mesmo que não esteja a jogar online. Foi a “super-protecção” escolhida para o Silent Hunter 5, o primeiro jogo desta fornada à prova de piratas. Supostamente. Poucas horas depois do jogo sair já havia na 'net programas para tirar essas restrições (5). Quem compra o jogo tem de ficar ligado à Ubisoft para jogar. Quem o saca da 'net joga à vontade sem chatices.

Também se pode comprar o jogo e depois sacar só o crack para corrigir os defeitos do original. Mas isso é ilegal porque contorna o mecanismo de “protecção”. Curiosamente, sacar uma cópia do jogo que já venha sem estas tretas – alterada por miúdos ucranianos que se entretêm a gozar com os cotas das editoras – pode nem ser ilícito (6). Por um lado porque o mecanismo de protecção já vem desactivado e, por outro, porque tendo decidido não comprar o original defeituoso não se causa prejuízos indevidos ao descarregar a cópia. Não é certo que o juiz concorde; dependerá da sua disposição nesse dia. Mas a lei só diz ser ilícito tirar o DRM de um produto legitimamente comprado. Copiar algo que não se compra é permitido se for para uso pessoal e não causar prejuízo. Pelos vistos o problema é o cliente.

A situação ainda se torna mais ridícula quando compramos um ficheiro, como uma música ou livro em formato electrónico. Nesse caso o DRM consiste num sistema que nos permite copiar e aceder a um conjunto de bytes sem permitir copiar ou aceder a esse conjunto de bytes, o que é obviamente difícil de pôr a funcionar bem. Felizmente, há sempre alternativas. Vejam, por exemplo:

The Brads – Why DRM Doesn’t Work. Via o FriendFeed da Paula Simões.

1- The Big Picture, DRM Crippled CD: A bizarre tale in 4 parts
2- Amazon, UK, Sacred 2, Fallen Angel
3- RPG watch, Sacred 2 - Copy Protection Revealed [Update]
4- Treta da Semana: o cliente é sempre ladrão.
5- Torrentfreak, Ubisoft’s Uber DRM Cracked Within a Day
6- Se descarregar de um servidor como o rapidshare (como este exemplo), porque se usasse uma rede p2p cometeria o ilícito de distribuir sem autorização.

2 comentários:

  1. Poucos dias depois de estrear, essa "brincadeira" da Ubisoft já irritou muita gente. Os servidores de autenticação, que a Ubisoft garantia ter sob vigia constante e nunca deixar ir abaixo, foram (lá está) abaixo durante várias horas, obrigando legítimos clientes a procurar outro passatempo. Os únicos a não ser afectados foram os piratas.

    http://www.rockpapershotgun.com/2010/03/08/ubisofts-drm-servers-broken-all-day/

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  2. Deliciosamente idiota esta coisa de se ter de ligar a um servidor para se jogar.

    E se eu estiver no campo onde não há cabo nem wireless ?

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