quarta-feira, outubro 08, 2008

ACTA

é um acordo internacional contra a contrafacção (Anti-Counterfeiting Trade Agreement) que foi iniciado pelos EUA, Japão, Suíça e a União Europeia, e onde participam a Austrália, Nova Zelândia, Coreia do Sul, Canadá e México nesta fase de negociação. O objectivo é reforçar o policiamento de violações de copyright e afins. Uma vez traçadas as regras entre os representantes dos maiores detentores de “propriedade” intelectual, os outros países serão “convidados” a participar neste tratado(1). Entretanto, as negociações são à porta fechada e as únicas informações públicas acerca do tratado devem-se a fugas (2).

Não me incomoda que negoceiem tratados de regulação comercial desta forma. Tarifas e licenças de comercialização não precisam ser decididas por processos abertos e democráticos. São meras questões burocráticas. Desde que não interfiram na vida pessoal dos cidadãos. E é aí que está o problema. Entre outras coisas, o ACTA prescreve buscas nas fronteiras para apreender material copiado, policiamento por parte dos prestadores de serviços de comunicação (3) e legislação que facilite a obtenção da identidade de quem os detentores de copyrights suspeitem violar os seus privilégios (2).

O ACTA é um caso extremo que já mereceu um processo contra o governo dos EUA (4) e oposição pública de membros do senado americano (5). Mas, vendo bem as coisas, a legislação recente que temos nesta matéria foi criada por processos semelhantes. Por comissões que representam principalmente os interesses de quem detém estes privilégios e que negoceiam directivas europeias ou tratados internacionais que depois forçam a legislação no nosso país.

Por definição, todos temos a obrigação legal de respeitar a lei. E, em geral, temos também a obrigação moral de a respeitar porque as leis são criadas em nosso nome por representantes que elegemos. Mas no caso do copyright deixou de haver fundamento moral para esta obrigação. A proibição de trocar conteúdos digitais, as penas de prisão por copiar CDs, o policiamento a custas do erário, os períodos de exclusividade de várias décadas e agora a violação da privacidade das comunicações ou das próprias pessoas quando atravessam fronteiras são produto de processos que não conferem a estas leis a legitimidade que têm as leis criadas democraticamente.

1- IP Justice, What is the Proposed Anti-Counterfeiting Trade Agreement (ACTA)?
2- Zeropaid, Another Critical ACTA Leak Surfaces
3- Wikipedia, ACTA
4- Intellectual Property Watch, Public Interest Groups Sue US Trade Representative Over ‘Secret’ Enforcement Treaty
5- Intellectual Property Watch, Key US Senators Warn Bush Administration On ACTA

9 comentários:

  1. vamos ter por esta acta o mesmo respeito que o governo americano tem por Quioto

    satanucho

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  2. Ludwig,

    Não questionando a tua visão sobre o copyright, pois as nossas divergencias são por questões de opinião, e independentemente da validade do copyright ou não, o que aqui descreves (A.C.T.A.) parece C.A.G.A. (vide o blog do mano) em versão juridica.
    O atropelo de diversas normas constitucionais e outras ilegalidades que aqui descreveste constitui efectivamente uma ameaça pelo simples facto que as vitimas estarão a ser prejudicadas num ponto onde não têm possibilidade de salvaguarda.
    Por exemplo. Tenho no carro um CD de MP3 com cópias de musicas das quais possuo os CDs originais todos, pelo que a minha cópia para uso no carro é completamente legal. Se algum policia se exceder e tentar enveredar pela violação dos meus direitos assumindo erradamente que é ilegal e tentar alguma acção com base nesse pressuposto errado, o termo é mesmo "está f#%!%#" pois leva logo com a chamada da praxe para o advogado de serviço, pois está a cometer logo ali um conjunto de ilegalidades, a começar por ionverter o onus da prova que é dele e não meu, e a presunção não é prova de nada ainda.
    No entanto, num aeroporto, se esta ilegalidade for cometida antes de um voo, no ponto onde fazem verificações, não há hipotese de chamar advogados sob pena de o tempo de intervenção impedir que se apanhe o voo, se for à chegada, fora do país, tens toda a estadia em risco, sem acesso a um advogado, e sem hipotese de defesa imediata.
    Esta tentativa de inverter o onus da prova é um atentado aos direntos individuais, que se torna grave quando concertada.
    Nesse ponto tens todo o meu apoio, no caso da legalidade da cópia, como divergencia de opinião já mais que debatida, não tenho mais nada a declarar.

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  3. Viva Ludovico,

    Apesar de ter uma opinião bastante forte sobre o copyright, acho que essa tal ACTA é uma aberração que deve ser combatida.

    Para mim a pirataria é, sobretudo, um problema moral e se por um lado eu acho que quem grava cd's, copia as capas e anda a vendê-los no mercado merece levar com o martelo, por outro lado o utilizador privado não deve ser penalizado nem que tenha 1Pb de material com copyright armazenado em casa para consumo pessoal. "Pessoal" no sentido mais lato, claro.

    Enfim... Mais uma desculpa para o controlo...

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  4. Wyrm,

    «Para mim a pirataria é, sobretudo, um problema moral e se por um lado eu acho que quem grava cd's, copia as capas e anda a vendê-los no mercado merece levar com o martelo, por outro lado o utilizador privado não deve ser penalizado»

    Eu concordo com os aspectos de reculação comercial, e também nestes moldes de os separar da vida pessoal de cada um. Não me oponho a licenças para pastelarias desde que se possa fazer bolos em casa e trocar receitas à vontade, nem da regulação dos taxis desde que possamos passear no nosso carro quando quisermos.

    Mas discordo desse aspecto moral que invocas. Primeiro porque a troca de ideias ou informação não é imoral. Segundo porque me parece muito mais imoral obrigar por lei que o acesso à cultura seja dependente dos rendimentos. Como consequência necessária da economia é uma infelicidade, mas estipulá-lo propositadamente é condenável.

    Finalmente porque a remuneração justa é a que for acordada voluntariamente entre as várias partes, não a que é exigida a posteriroi por força da lei. Se a junta contrata um escultor para fazer uma estátua para um jardim é justo que pague o valor acordado. Se o escultor decide fazer a estátua e pô-la no jardim sem acordo nenhum não tem justificação moral para exigir dinheiro seja de quem for. Independentemente do mérito da estátua.

    Por isso, ao contrário de ti, eu acho que o sistema de copyright como o temos é muito mais imoral que copiar sequências de bytes.

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  5. António,

    «Tenho no carro um CD de MP3 com cópias de musicas das quais possuo os CDs originais todos, pelo que a minha cópia para uso no carro é completamente legal.»

    Legal, depende dos sítios e dos CDs. Se um CD tiver alguma forma de protecção de cópia, por muito infantil que seja, pode ser ilegal teres os mp3 porque é ilegal tornear essas protecções. Também pode ser ilegal a forma como obtiveste os mp3. Mas deixemos a legalidade de lado e consideremos os princípios.

    Tu consideras que não se deve ter o mp3 sem comprar o CD, mas consideras que tens o direito ao mp3 mesmo só tendo comprado o CD. Das duas uma. Ou fazes esta distinção com base naquilo que tu achas ser uma remuneração justa, e nesse caso deves concordar que essa fronteira varie de pessoa para pessoa e por isso a lei não deva impôr uma. Se eu achar que o CD não vale um tostão furado terei igual legitimidade para ter o mp3 à borla (nota que tu não pagas pelo mp3, acima de tudo, porque não precisas pagar para o ter).

    Ou então achas que isto é um direito do autor, que ele tem a legitimidade de decidir quem ouve a música dele e como a ouve. Mas nesse caso se um dos músicos (ou discográfica) disser que quem quer o mp3 tem que o pagar à parte tu terás que apagar os teus ficheiros ou dar-lhes o dinheiro.

    Penso que a tua posição é pouco coerente porque por um lado defendes que não se deve ouvir à borla porque os detentores do copyright merecem ser remunerados (é um direito deles decidir como se vende e por quanto), mas por outro decides tu ter o mp3 sem o pagar porque achas que já deste o suficiente e eles não têm nada que pedir mais...

    Já agora umas questões práticas:

    Se algum familiar estiver a ouvir o CD em casa é legítimo tu ouvires os mp3 no carro?

    Se eu comprar um CD a meias com a minha mulher podemos ambos ouvir os mp3 quando estivermos em sítios diferentes?

    Se um milhão de pessoas formarem uma associação em que cada um paga um cêntimo e a associação compra 100 mil CDs diferentes em nome do colectivo, todos agora podem ouvir mp3 por serem co-proprietários do original?

    E se for um milhão de pessoas, cada uma compra um CD diferente, e todas partilham os mp3 como se partilhassem a propriedade do CD?

    Agora a questão mais importante: a linha que traças entre o que aceitas ou rejeitas nestes cenários é traçada em função do que tu julgas ser melhor (e por a lei deve permitir que outros a tracem de outra forma) ou pelo que tu julgas ser o direito do detentor de copyright? (e por isso tens que te sujeitar ao que esse decidir, incluindo não poderes ouvir música no carro se estiver alguém em tua casa com o CD).

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  6. Ludwig,

    Todas essas questões são importantes, mas, são questões de regulação, as quais já estão parcialmente reguladas. Sendo eu casado, a propriedade é comum, e a licença permite que faça cópias para uso pessoal dos proprietários.
    Se quiserem regular o que é o uso pessoal, isso é outra questão, só que tem um problema com a A.C.T.A., é que o ónus da prova do uso indevido tem de continuar a ser das autoridades, e o que a A.C.T.A. quer impor é um estilo de regulação Kafkiana que é imoral seja sobre que regulação for. Nessa questão é como te disse, estou completamente de acordo contigo, sobre a regulação do que é devido ou indevido, é uma questão que depende de decisões legais (mais do que morais). Também é ilegal vender drogas, no entanto o consumidor que sente a necessidade de as consumir discorda disso. A moralidade desta questão não é relevante, porque o uso de drogas é uma questão social.
    A musica e a cultura também são questões sociais, a sua regulação é tão válida como qualquer outra coisa.

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  7. António,

    «Todas essas questões são importantes, mas, são questões de regulação, [...]
    Se quiserem regular o que é o uso pessoal, isso é outra questão»


    Precisamente. Se querem regular o negócio de venda de CDs e assim é uma coisa. Se querem regular quem pode ouvir mp3 é outra completamente diferente. E proibir os mp3 para proteger os lucros dos CDs não é uma medida aceitável.

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  8. Ludwig,

    Discordo, mas, estou de acordo. Parece criacionismo mas não é!
    Discordo que não possam proibir o MP3, porque podem, é uma questão de regulamentação, e tudo é regulável, desde que a sociedade para aí esteja virada. Mas, se me perguntares se estou de acordo, digo-te que não, não estou de acordo com a proibição do MP3, porque isso era o mesmo que proibir o uso de copos para acabar com o consumo de alcool. Algo semelhante existe em Inglaterra, onde é pribido beber alcool expondo o rotulo na via pública... que se tornou uma mina para os fabricantes de sacos de papel castanho!

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  9. António,

    «Discordo que não possam proibir o MP3, porque podem»

    Aí não discordamos. A minha posição não é que não possam. É que não devem.

    « Mas, se me perguntares se estou de acordo, digo-te que não, não estou de acordo com a proibição do MP3, porque isso era o mesmo que proibir o uso de copos para acabar com o consumo de alcool.»

    Mais uma vez estamos de acordo. Nem é preciso essa analogia. Um problema fundamental é o carácter extraordinário desta legislação, quer a proposta quer a vigente, que visa restringir actos pessoais com o único propósito de proteger o lucro. Isto não aceitamos em mais àrea nenhuma e nem aceitariamos nesta se esta legislação seguisse os procedimentos democráticos que a legislação em geral deve seguir.

    Achas que alguma vez se aceitaria restringir o uso de cada torradeira a uma só pessoa para promover o comércio de pequenos electrodomésticos? Quando proibem a partilha de ficheiros mp3 estão a fazer exactamente isso em relação aos CDs.

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