terça-feira, junho 24, 2008

Mais um exemplo

dedicado aos apologistas do deixem recolher a informação que a lei protege-nos. O Reino Unido tem uma rede extensa de vigilância electrónica, não só das comunicações mas também com mais de quatro milhões de câmaras espalhadas pelas ruas (1). Para proteger os cidadãos tem o Regulation of Investigatory Powers Act (RIPA), que permite o uso destes dados apenas em casos de crime.

A BBC revelou que em alguns municípios do sul da Inglaterra o RIPA foi invocado mais de 750 vezes em 2007 e 2008. Apenas um em cada oito casos mereceu acção policial. A vigilância electrónica foi usada para detectar taxis ilegais, pessoas que não apanhavam a bosta do cão, a apanha do berbigão em locais não autorizados e até para vigiar um casal durante duas semanas para ver se estavam mesmo a morar na zona da escola onde tinham a filha (2).

Mas os cidadãos britânicos não têm nada a temer. O Information Commissioner's Office já se mostrou “preocupado” com a situação, e certamente que isto vai resolver o problema. Até parece que estou a ver o Humphrey a dizer “Yes, minister.”

1- BBC, 2-11-06, Britain is 'surveillance society'
2- BBC, 23-6-08, Councils admit using spying laws

15 comentários:

  1. Ludwig

    Em contrapartida não têm bilhete de identidade nem cartão de eleitor. Porque é controlador e por causa das sensibilidades nacionalistas.

    Quanto aos circuitos de CCTV disseram-me (estou-te a vender pelo mesmo preço) que já duram há montes de tempo e que surgiram da necessidade de controlar violência causada pelo álcool. Que resulta, por sua vez, de aquela gente não saber beber e se não se discutir como fazê-los beber menos sem dar prejuízo aos pubs. Em contrapartida não pegam no carro depois de sairem do pub, ao contrário de um certo povo que eu cá sei.

    Em vez de apagar eu proponho haver transparência nas acções da polícia e do estado. Transparência tem que ser a base de uma sociedade que funciona.

    Eu comparo um governo e uma democracia a um condomínio. Azar do carago, no primeiro condomínio em que vivi as pessoas eram muito representativas de muita coisa no país. Mormente o culpar os outros, gastar mais dinheiro que o que tinham e mal gasto, não comparecer às reuniões e praticamente cuspir para o chão.

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  2. Ludwig

    Já agora, quantos atentados se evitaram com vigilância daquela que não admites? Ah, pois é! Recordo-me de uma entrevista quando o António Vitorino era qualquer coisa da defesa europeia (falha-me o nome do cargo) e falou numa enormidade de 10 atentados abortados num ano. A jornalista que o entrevistou ia-se engasgando. E eu também.

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  3. Abobrinha,

    «Em vez de apagar eu proponho haver transparência nas acções da polícia e do estado.»

    Hão tem que ser "em vez de". Podemos ter transparência e ao mesmo tempo o direito de limitar a bisbilhotice do Estado. Mas, mais importante, a transparência adianta de pouco. Na polícia e no Estado são indivíduos que tomam as decisões mas são as organizações que assumem responsabilidade. É o exemplo melhor de desresponsabilização pelo anonimato. Neste exemplo, há muitas críticas aos municípios que abusaram desta informação mas não se apontam individuos responsáveis.

    «quantos atentados se evitaram com vigilância daquela que não admites?»

    Que eu saiba, nenhum. Casos como este são exemplo do tipo de vigilância que se deve fazer. Visando suspeitos e com fundamento. A investigação começou quando notaram uns tipos a passar várias vezes ao pé de um quartel com soldados americanos. Isto levou a descobrirem cada vez mais evidências que era um ataque terrista e ao fim de uns meses desmantelaram a rede.

    Mas nada disto passou por armazenar registos telefónicos de toda a gente ou usar CCTV para controlar quem não apanha a bosta do cão. Quando há uma suspeita que justifica vigilância, a vigilância é a sério: revistar a casa, interceptar chamadas telefónicas, seguir os suspeitos, etc.

    O tipo de vigilância generalizada que tu defendes não serve para combater o terrorismo. Só serve para dar aos burocratas mais um poder para abusarem.

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  4. Ludwig

    Quando falamos do caso dos telemóveis eu defendi a individualização da responsabilidade com o acesso à informação por um mínimo dos mínimos de pessoas e a atribuição de acessos individuais a cada um. Defendi ainda que qualquer pessoa que violasse o sigilo a que está obrigada pagasse e bem caro por isso, fosse despedida (e não reformada compulsivamente) e nunca mais autorizada a trabalhar com dados sensíveis.

    Temos o caso do Paulo Portas que fotocopiou documentos sensíveis quando saiu do ministério. E o que lhe aconteceu? Nada! Aliás, no nosso país nunca acontece nada! E isso sim está errado e é contra isso que nos devemos insurgir.

    No caso do Reino Unido os tipos são uns bananas com estas coisas. O que descreves não é admissível e um cidadão em condições numa sociedade transparente deveria queixar-se até às últimas consequências. É admissível tentar que não haja mortes por causa da bebedice, mas devia ir-se à causa das coisas. Nunca aproveitar uma estrutura importante para coisices.

    No nosso caso será admissível (mais: desejável) que se use video-vigilância nas estradas para detectar manobras claramente perigosas e mesmo identificar autores de atropelamentos (que são uma nódoa nas nossas cidades). Mas não sei se será admissível pequenas coisas como pisadelas milimétricas de linhas contínuas.

    Do mesmo modo é claramente inadmissível controlar a minha velocidade com a hora de entrada e saída na via verde, como se falou a dada altura que se faria. Mesmo porque a Brisa facultaria dados à polícia a que não creio que tenham direito. Inadmissível foi também na altura a jornalista que estava a moderar (?) um debate desses ter exclamado exaltada que para isso mais valia a pena dar 200 km/h o percurso todo e depois encostar a uma área de serviço para fazer tempo. Gente burra é outra coisa!

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  5. «O tipo de vigilância generalizada que tu defendes não serve para combater o terrorismo. Só serve para dar aos burocratas mais um poder para abusarem. »

    Ludwig, vê-se perfeitamente pela caligrafia que até tu hesitas a escrever isto. Por um lado tens como sagrada a liberdade individual, mas por outro conheces os números de Caracas, do Rio, da Cidade do Cabo ou Nova Iorque e compreendes que mesmo na linha de Sintra ninguém desdenha do confortável olho de vidro com um polícia do outro lado.

    Claro que a saúde social se trabalha a montante da matriz em que nos cruzamos na rua (e aqui é interessante verificar que os EUA com 5% da população mundial contribuam com 1/4 do universo prisional com 2,3 milhões de indivíduos presos - esclarecedor, ao nível das opções actuais deste bastião do pleno liberalismo), mas é fácil imaginar o que seria um país a confiar serenamente na boa natureza humana sem registos dos nossos movimentos e, de preferência, sem esse (ainda mais) estranho formato profiláctico que é a "prisão preventiva".

    E essa história do uso que dão em Londres às câmaras na via pública só demonstra que a prioridade geral é a vigilância sobre os vigilantes (o singelo vigor democrático). Mas para já, para já, o que era bom era algum londrino apanhar o Vale e Azevedo nem que fosse com um saco de plástico.


    Abobrinha,

    Essa do "reformado compulsivamente" foi apenas para não soltar a língua para outro nível de expressão (esforço que faço com desumana assiduidade).

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  6. Bruce

    Entendi que querias dizer mesmo reforma compulsiva, porque é uma coisa que se faz efectivamente. A meu ver é errado porque premeia com um mérito que a actuação da pesssoa não teve. Sobretudo não pune nem sequer com um puxão de orelhas, o que é uma tremenda injustiça.

    Acho mal apanharem o Vale e Azevedo: comparado com outros ele é um santo. E depois, é injusto ele ser punido quando outros não são (ver parágrafo acima, por exemplo). Dito isto... quero lá saber!

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  7. Lud: por Cidade do Cabo quis dizer Joanesburgo.

    Abobrinha: por reforma compulsiva quis dizer pregar-lhe as orelhas numa parede de tábuas e tirar-lhe o banco debaixo dos pés. (estou a meio das notas de viagem do Eça ao Egipto em 1869; um verdadeiro manual para o Regime Geral da Função Pública)

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  8. Bruce,

    « Por um lado tens como sagrada a liberdade individual, mas por outro conheces os números de Caracas, do Rio, da Cidade do Cabo ou Nova Iorque e compreendes que mesmo na linha de Sintra ninguém desdenha do confortável olho de vidro com um polícia do outro lado.»

    Não tenho nada como sagrado. É questão de pesar os prós e os contras.

    Câmaras no supermercado reduz o gamanço e acho que o dono tem o direito de as ter. Câmaras nos vestiários das lojas de roupa também podem ajudar, mas isso já tem mais contras que prós. Aí deve ser proibido. Para dissuadir um bombista suicida as câmaras não servem de nada, por isso a conversa do terrorismo é treta neste caso. E não é boa ideia agregar toda esta informação numa base de dados e dá-la aos burocratas.

    Abobrinha,

    «No nosso caso será admissível (mais: desejável) que se use video-vigilância nas estradas para detectar manobras claramente perigosas»

    Em princípio é má ideia porque é tratar todos os condutores como infractores. Mas um sistema de câmaras com um tempo de retenção limitado, por exemplo de umas horas, permite em caso de infracção (por exemplo atropelament) recolher a gravação e usá-la. Isso poderia estar dentro de um intervalo razoável de prós e contras.

    Mas estar a recolher informação de toda a gente de forma a tornar possível vigiar alguém só porque um burocrata quer é má ideia porque é mais que evidente que a lei aí nem vale o papel onde a escrevem.

    Finalmente, e isto para ambos, a eficácia do CCTV na pervenção do crime é muito pequena mesmo na melhor das hipóteses.

    «Across the three settings, mixed results were found for the crime prevention effectiveness of
    CCTV. In the city centre and public housing setting, there was evidence that CCTV led to a
    negligible reduction in crime of about two per cent in experimental areas compared with control
    areas. CCTV had a very small but significant effect on crime in the five UK evaluations in this
    setting (three desirable and two undesirable), but had no effect on crime in the four North
    American evaluations.
    The four evaluations of CCTV in public transportation systems present conflicting evidence of
    effectiveness: two found a desirable effect, one found no effect, and one found an undesirable
    effect on crime. For the two effective studies, the use of other interventions makes it difficult to
    say with certainty that CCTV produced the observed crime reductions. The pooled effect size for
    all four studies was a non-significant six per cent decrease in crime.»


    Home Office Research Study 252 Crime prevention effects of closed circuit television

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  9. Ludwig

    "Em princípio é má ideia porque é tratar todos os condutores como infractores."

    Hellooooooooooooooooo! Costumas andar de carro? E ver os números da sinistralidade? Se toda a gente andasse de carro como eu não haveria necessidade, mas infelizmente eu não sou a regra.

    Não tenho nada contra essa história das 2 ou 3 horas, porque seria tempo mais que suficiente para apanhar as falhas veradadeiramente gordas em vez das tais pisadelas milimétricas de traços contínuos (que eu confesso que volta e meia...).

    Sobretudo, porquê a escolha das imagens nas estradas? Adaptação à nossa realidade. A nossa criminalidade mais grave é nas estradas. Há pessoas verdadeiramente assassinadas na estrada e as únicas pessoas que pagam por ela são por regra seguradoras, vítimas e famílias destas.

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  10. Este comentário foi removido pelo autor.

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  11. Abobrinha:

    Já agora, quantos atentados se evitaram com vigilância daquela que não admites? Ah, pois é! Recordo-me de uma entrevista quando o António Vitorino era qualquer coisa da defesa europeia (falha-me o nome do cargo) e falou numa enormidade de 10 atentados abortados num ano. A jornalista que o entrevistou ia-se engasgando. E eu também.

    e quantos desses atentados foram detectactos pela video-vigilancia, pelo RIPA ou por um outro qualquer mecanismo de infração da privacidade? ou será que foram detectados devido aos antigos metodos de investigação?

    qual era a "gravidade" desses atentados? do genero do 9/11? comboio de espnha? metro de londres? ou atentados mais soft?

    quão capazes eram os "terroristas"?
    pessoas que sabiam o que estavam a fazer ou uns amadores que andavam a brincar aos mauzões?

    dizer que foram detectados 10 ataques é dizer muito pouco.

    Luís

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  12. Abobrinha:

    Quando falamos do caso dos telemóveis eu defendi a individualização da responsabilidade com o acesso à informação por um mínimo dos mínimos de pessoas e a atribuição de acessos individuais a cada um. Defendi ainda que qualquer pessoa que violasse o sigilo a que está obrigada pagasse e bem caro por isso, fosse despedida (e não reformada compulsivamente) e nunca mais autorizada a trabalhar com dados sensíveis.


    e como é que distingues um acesso legitimo de um acesso ilegitimo? a maioria das fugas de informação são feitas a partir de acessos legitimos. por exemplo, se eu tenho que fotocopiar uns papeis confidenciais, ninguem nota se em vez de uma copia eu fizer duas. e se não for eu o unico com acesso a esses papeis (que é o normal) como é que sabem que fui eu e não o vizinho do lado?


    No nosso caso será admissível (mais: desejável) que se use video-vigilância nas estradas para detectar manobras claramente perigosas e mesmo identificar autores de atropelamentos (que são uma nódoa nas nossas cidades). Mas não sei se será admissível pequenas coisas como pisadelas milimétricas de linhas contínuas.


    se conseguisses garantir que nunca iria haver abuso de informação, de nenhum tipo, seria um mau menor. o problema é que não consegues fazer tal garantia. pura e simplesmente não ha maneira de garantir tal coisa, nem com toda a tecnologia e controlo de acessos que possa exitir. como tal, em vez de se "guardar" tudo e esperar que 1) ninguem abuse da informação (que vai quase pelo mesmo caminho que acreditar em deus - acredita quem quiser mas todas as evidencias apontam para o lado contrario), 2) que a informação venha a servir para alguma coisa. só se procede ao registo de informação quando se está a investigar algo concreto.

    Há pessoas verdadeiramente assassinadas na estrada e as únicas pessoas que pagam por ela são por regra seguradoras, vítimas e famílias destas.

    ha muita gente condenada(geralmente a seriviço comunitario) por "acidentes" na estrada. mas essa realidade não passa para o publico porque a televisão não mostra.

    Luis

    Luís

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  13. Luís

    Desculpa a demora na resposta, mas não tinha reparado mais neste post.

    Não faço ideia da gravidade dos atentados porque foi uma questão solta no meio de outras. Digo eu que se matassem uma pessoa seria uma a mais. Não foram reveladas mais informações, o que invalida que te responda às restantes questões.

    O importante é, não caindo numa cultura de medo (com todas as implicações que isso tem), que saibamos que nem todos são boas pessoas e que há quem tenha como único objectivo matar-nos por um ódio tão profundo como irracional. E que usam como arma a nossa liberdade e hábitos democráticos.

    Não sei como se individualiza um acesso, mas não pode ser complicado. Precisamente porque tem que ser a excepção e não a regra andar a ler e ouvir o que não interessa ao menino Jesus. Por outro lado, o Bizarro (num post mais à frente) garante que numa empresa de telecomunicações é fácil saber quem teve acesso aos dados.

    Eu nunca posso garantir seja o que for. O que não me impede de fazer as coisas. O que não estás a ver é que as fugas e abusos de informação são excepções. O que não são excepções no nosso país são crimes sem castigo. Mas isso é outra treta. E bem gorda!

    Matar um peão de modo perfeitamente escusado não se pune com serviço comunitário. Mas desculpa-se porque o filho da mãe do peão não tinha nada que não atravessar na passadeira. Apesar de se vir a 200 km/h dentro de uma localidade. Por acaso há um tempo falou-se de um futebolista (o Nuno Gomes?) que foi condenado a serviço comunitário por ter feito uma porra qualquer que não me recordo. Toda a gente disse que ele tinha sido favorecido, enquanto quem de direito disse que era comum.

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  14. Foi o Luisão, não o Numo Gomes! Ou seja, a defesa em vez do ataque! ;)

    O motivo foi condução com álcool a mais, fez o teste do balão numa corriqueira operação stop, nocturna neste caso.

    E claro que a sentença de serviço comunitário é perfeitamente adequada aí, não há favorecimento nenhum e a pena deve ser proporcional à infracção, claro.

    Já a questão dos atropelamentos cuja causa pode ser imputada à má condução é, infelizmente, um problema muitíssimo mais bicudo, já que em muitos casos nem sequer há a apreensão da carta.

    Por outro lado, e fora da questão central do tema, é de facto pouco compreensível como a continuidade da dita "pequena criminalidade" parece ser tão impune na justiça portuguesa, e talvez também noutros países. Deste modo, quem comete o mesmo crime dezenas de vezes, tipo furto ou assalto a habitação, roubo de veículos e por aí, é quase julgado como se não tivesse antecedentes, ou seja, não é punida a delinquência sistemática e repetida.

    Claro que o castigo é só uma parte do processo social da justiça, daí também ter de se adequar ao crime e ao infractor, como nesse caso do futebolista ou noutros em que são julgados cidadãos ditos "socialmente integrados".

    Seja como for, isto da justiça ainda é um bico de obra maior que o da religião e da ciência... haja paciência e na estrada prudência! :)

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