domingo, novembro 19, 2006

Debate sobre as atitudes religiosas dos Portugueses (parte II).

O debate do passado dia 17 foi muito bom, e agradeço aos organizadores, especialmente à Filomena Carvalho, pelo amável convite, e ao meu irmão por ter sugerido a minha presença. Moderado por Fernando Catroga, participaram António Rego pela Igreja Católica, Mário Mota Marques pela comunidade Baháï, Jónatas Figueiredo pela comunidade Evangélica, e Mahomed Abed pela comunidade Muçulmana. Eu estava no panfleto como representante da “comunidade céptica”, mas fiz questão de deixar claro que não representava uma comunidade, mas sim uma ideia: a ideia de viver sem religião. A descrença.

Comecei por esclarecer que descrença não é acreditar no contrário. Isso é apenas uma crença diferente. A descrença é perguntar em vez de afirmar, principalmente perguntar como é que o crente sabe que a sua crença é verdadeira. Como é que sabe que Maria era virgem? Que Jesus ressuscitou? Que Mahomed era mesmo um profeta? Estas perguntas incomodam os crentes, mas são perfeitamente legítimas.

E podemos ver o que acontece sem estas perguntas. As crenças religiosas apresentadas são fruto de um longo processo de aplicar a crença para obter respostas. Todas as religiões têm respostas, e todas têm a certeza absoluta que têm as respostas certas. Mas têm respostas diferentes. Parece que o método da crença não é o melhor. Principalmente porque a certeza absoluta dificulta o dialogo com os que têm a certeza absoluta do contrário, como podemos ver em muitas partes do mundo (nem sempre com crenças religiosas, mas sempre com certezas absolutas).

Por isso propus o método da dúvida, da questão, da descrença. Não dá recompensas, nem nesta vida nem na próxima, nem dá castigos para quem discorda. Não dá a verdade absoluta nem uma ligação directa ao criador. Mas dá a possibilidade de corrigirmos os nossos erros, e abertura ao dialogo com quem tem outras posições. Não tive oportunidade de o dizer no debate, mas acho que isso é melhor que qualquer deus ou verdade absoluta.

Da assistência veio a inevitável pergunta: sendo céptico, como posso evitar cair no relativismo moral? Como posso encontrar valores? Já estava à espera desta. Por sorte, imediatamente antes outro membro da assistência tinha comentado que todas estas religiões tinham em comum a prática do bem, o que me facilitou a vida. Se reconhecemos algum bem em todas é porque já temos uma noção de bem que é independente da religião. E crente ou descrente, o ponto final de qualquer juízo moral é sempre cada um de nós. Mesmo que um deus nos venha bater à porta a dizer o que é bom ou mau temos que decidir se concordamos ou não. O fundamental é sermos capazes de julgar as crenças e a fé de acordo com os nossos princípios morais, e não deixar que a fé dite o que para nós é certo ou errado. Esse é o caminho do fundamentalismo, e a razão para os extremismos em todas as crenças (não só as religiosas).

No final do debate o moderador lançou uma boa pergunta: há verdade na religião? Mais especificamente, se todas as religiões são verdadeiras, se só uma é verdadeira e as outras falsas, se todas são falsas, ou se há uma mais verdadeira que outras. Os outros participantes deram a resposta previsível: todas as religiões têm alguma verdade, mas há uma que é mais verdadeira. Claro que não houve consenso quanto àquela que supostamente é mais verdadeira.

Eu respondi que verdade não é aquilo em que acreditamos, mas aquilo que resiste à dúvida; para saber se as religiões são falsas ou verdadeiras temos que duvidar delas e ver o que aguenta. A audiência riu-se, mas acho que alguns ficaram a pensar. No fundo, era só isso que eu queria.

5 comentários:

  1. Caro Ludwig

    Pelo que conta, penso que o debate não lhe correu muito bem. Melhores dias virão.

    ResponderEliminar
  2. Tanto quanto me é possível perceber, acho que fui bem representado.

    ResponderEliminar
  3. Caro António,

    Depende do critério. De qualquer forma, não me parece que alguém na audiência tenha ficado mais Baha'i, Católico, Evangélico ou Muçulmano pelo debate.

    E parece-me que a simples presença destas várias confissões à mesma mesa levou várias pessoas a pensar acerca da sua crença. Como não quero que acreditem em mim, mas que se questionem a si próprios, conto isto como uma victória.

    ResponderEliminar
  4. Tendo estado presente no debate, acho que correu bem para a "comunidade" céptica. Claro que sendo tendencioso, não serei a melhor pessoa para julgar o resultado.

    Para mim, uma grande vitória é colocar numa mesa redonda de várias religiões um representante dos não religiosos.

    Haja pois a esperança (ia escrever fé...) de um dia os ateus serem tratados de igual modo que os crentes.

    ResponderEliminar
  5. O importante é nunca deixarmos de questionar.
    Porque quando isso acontece, então caímos nos dogmas.

    ResponderEliminar

Se quiser filtrar algum ou alguns comentadores consulte este post.